Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0496/14
Data do Acordão:03/12/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:MAGISTRADO JUDICIAL
APOSENTAÇÃO
INCAPACIDADE
JUNTA MÉDICA
Sumário:I - O Estatuto dos Magistrados Judiciais, na redacção em vigor à data da apresentação do pedido de aposentação, previa expressamente nos seus arts. 65º e 67º as situações em que havia direito à aposentação a saber: i) limite de idade; ii) incapacidade; iii) ou nos termos previstos no art. 37º do EA.
II - A lei configura, portanto, em simultâneo, duas situações de incapacidade, a prevista na alínea a), do nº 2 do art. 37º do EA (preceito para o qual remete) e a contemplada no art. 65º por remissão do nº 1 do art. 67º, ambos do EMJ, sendo esta uma situação jurídica de aposentação específica dos magistrados judiciais, distinta da aposentação prevista no referido art. 37º.
III - Da redacção dos arts. 65º e 67º do EMJ (ou de qualquer outro preceito do mesmo Estatuto) não resulta que o legislador tenha pretendido derrogar o regime estabelecido no Estatuto da Aposentação no que se refere ao procedimento a seguir quando esteja em causa uma aposentação por incapacidade.
IV - Se tivesse querido que a aposentação/jubilação pela incapacidade prevista no art. 65º do EMJ fosse concedida, sem mais, pelos respectivos Conselhos Superiores tê-lo-ia dito expressamente, até porque tal resultaria numa espécie de processo de justificação administrativa de incapacidade sem verificação de um órgão médico através de um exame médico.
V - Assim, não existindo um regime próprio aplicável aos magistrados judiciais no que respeita à incapacidade prevista no art. 65º do EMJ, por aplicação do art. 69º do mesmo Estatuto, é-lhes aplicável o regime estabelecido para a função pública quanto àquela incapacidade. Ou seja, tem que ser declarada pela Junta Médica da CGA, depois de elaborado o relatório do exame feito pelo médico relator, após o que será proferida a Resolução Final pela Caixa (cfr. arts. 91º, 90º e 97º do EA).
Nº Convencional:JSTA00069113
Nº do Documento:SA1201503120496
Data de Entrada:09/15/2014
Recorrente:CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCAN
Decisão:PROVIDO
Indicações Eventuais:DIR ADM GER - FUNÇÃO PÚBLICA APOSENTAÇÃO
Área Temática 1:DIR JUDIC - EST MAG
Legislação Nacional:CONST97 ART13.
EMJ85 ART65 N1 ART67 N1 ART69.
EA72 ART37 N2 A ART89 ART90 ART91 ART97.
DL 297/09 DE 2009/10/14 ART93 ART94.
DL 299/09 DE 2009/10/14 ART31.
DL 377/07 DE 2007/11/09.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0323/10 DE 2010/09/21.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. RELATÓRIO

A CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES (CGA), interpõe para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150º, nº 1 do CPTA, recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido a fls. 157 a 174 dos autos que confirmou a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a acção administrativa especial intentada por A…………, e nesta procedência condenou a recorrente a praticar o acto administrativo devido, ou seja, a executar a deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF) proferida em 15.12.2010, de emissão do acto final de aposentação do ora recorrido, ao abrigo do disposto no art. 65º, nº 2 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ) [na redacção em vigor na data de apresentação do requerimento de aposentação – 07.10.2010], e de cálculo da respectiva pensão, com os efeitos referidos nos arts. 66º e 67º do Estatuto dos Magistrados judiciais [sempre na redacção em vigor na data em que o autor requereu a “aposentação”].
Nas suas alegações formula conclusões com o seguinte teor:
1.ª As razões essenciais pelas quais deve ser aceite a presente revista é a de saber se existe o Estatuto dos Magistrados Judiciais consagra, como parece entender [o] TCAN, um processo de justificação administrativa de incapacidade para o exercício de funções sem que os interessados sejam presentes a um órgão colegial médico que avalie e verifique tal incapacidade.
2.ª Está em causa a interpretação do disposto no artigo 65.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais — norma cujo conteúdo acabou por ser replicado no atual Estatuto aprovado pela Lei n.º 9/2011, de 12 de abril e que convém esclarecer para uma melhor aplicação no futuro, não só por ser a primeira vez que esta questão se colocou, como, atendendo ao importante grupo profissional a que se reporta, a mesma assume uma particular relevância comunitária, estando em causa uma verdadeira alteração de paradigma no que concerne à verificação da incapacidade para o exercício de funções na área da justiça.
3.ª Da redação do art. 65.º do EMJ não resulta que o legislador terá pretendido derrogar o Estatuto da Aposentação e estabelecer para os magistrados judiciais uma aposentação por incapacidade em termos diversos dos que se encontram previstos para a generalidade dos subscritores, caso contrário o legislador assim o teria dito expressamente.
4.ª Nesse caso, previsto uma junta médica especial a realizar-se no âmbito do Conselho Superior da Magistratura (CSM) — o que não fez.
5.ª O artigo 65.º do EMJ concede aos respetivos Conselhos Superiores da Magistratura a possibilidade de impulsionarem um processo de aposentação por incapacidade nas situações em que verifiquem poder estar em causa um grave transtorno da justiça ou dos respetivos serviços, sem terem de aguardar por um impulso dos magistrados que se encontrem nessa situação, bem como de os afastarem preventivamente de funções, se assim o entenderem (art. 65.º, n.º do EMJ).
6.ª Trata-se de um corolário da regra já constante do art. 41º do Estatuto da Aposentação que permite que o órgão superior da administração pública promova a aposentação por incapacidade, mediante apresentação do subscritor a exame médico.
7.ª As esferas de competência estão assim devidamente traçadas: ao CSM competirá ponderar a eventual situação de grave transtorno para o funcionamento da justiça e determinar, se assim o entender, a suspensão do magistrado debilitado; à CGA competirá apreciar a incapacidade para o exercício de funções suscetível de determinar a aposentação.
8.ª Nesse contexto, o magistrado é submetido a exame médico, formalmente exigido pelo Estatuto da Aposentação na alínea a) do n.º 2 do art. 37.º (preceito para o qual remete o n.º 1 do art. 67.º do EMJ) e, bem assim, pelos seus art.s 89.º e seguintes, o qual se destina a que peritos médicos verifiquem se existe efetivamente a referida debilidade ou entorpecimento físico ou intelectual, e, em caso afirmativo, se reveste uma natureza irreversível, incompatível com o exercício de funções.
9.ª Tanto assim é que, em parte alguma do despacho do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF) de 2010.12.15, se vislumbra que aquele órgão tenha deliberado que o magistrado recorrido se encontra incapaz para o exercício de funções,
10.ª A aposentação por incapacidade prevista no art. 65.º do EMJ destina-se às situações em que a debilidade ou o entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais consubstancia uma verdadeira incapacidade absoluta e permanente para o exercício das funções, a qual, nos termos da Lei, carece de ser declarada pela Junta Médica da CGA prevista no art. 91.º do Estatuto da Aposentação, após receção do relatório clínico elaborado pelo Médico Relator previsto no art. 90.º do mesmo Estatuto.
11.ª A interpretação do disposto no artigo 65.º, n.º 1, do EMJ efetuada pelo acórdão recorrido que redunda numa espécie de processo de justificação administrativa de incapacidade sem verificação de um órgão (junta) médica(o) é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP, na medida em que aquela interpretação está em contradição intrínseca com conceção global do sistema jurídico relativo à avaliação de incapacidades para efeitos de aposentação e de proteção social, inconstitucionalidade que se invoca para todos os efeitos legais.
12.ª Deverá assim ser revogado o acórdão recorrido por violação do disposto nos artigos 65.º do EMJ, conjugado com o disposto no artigo 37.º, n.º 2, alínea a), 89.º, 90.º e 91.º do Estatuto da Aposentação, na redação do Decreto-Lei n.º 377/2007, de 9 de novembro, e ainda o já aludido artigo 13º da C. R. P..

Nas suas contra-alegações o recorrido formula as conclusões seguintes:
1. O art. 65.º do Estatuto dos Magistrados Judi[c]ais [na redacção em vigor em 16 de Dezembro de 2010] estabelece, no seu n.º 2, um “regime especial de jubilação por incapacidade”, ponderada e avaliada apenas pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de acordo com as respectivas normas do Estatuto dos Magistrados judiciais, em que o que se considera é o exercício das funções de juiz e a sua adequação ao funcionamento da máquina judicial, a sua natureza, a dignidade, a exigência, a exclusividade de exercício, a plenitude e a disponibilidade permanente.
2. A “incapacidade” contemplada no art 37.º/2-a) do Estatuto da Aposentação é avaliada pela Caixa Geral de Aposentações, à luz do Estatuto da Aposentação, nela apenas se procedendo a uma perícia médica, meramente técnico-científica, que não considera, nem pode considerar, os elementos e circunstâncias enunciados na conclusão anterior, sobre que o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais emite a sua pronúncia.
3. Face ao teor da deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de 15 de Dezembro de 2010 - “ordenar, nos termos do n.º 2 do artigo 65.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a notificação [do douto] (..), para (...) requerer o seu pedido de aposentação ou produzir, por escrito, as observações que (...) [tivesse] por convenientes” - e não tendo o recorrido formulado quaisquer “observações” ao relatório nela referido, antes requerido a “aposentação”, apenas há que proceder à sua execução.
4. Essa execução compete à Caixa Geral de Aposentações e consiste na emissão do acto final de execução e no cálculo da respectiva pensão, com os efeitos referidos nos art.s 66.º e 67.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais [frisa-se: na redacção em vigor em 16 de Dezembro de 2010, data em que o autor requereu a “aposentação”].
5. O caso dos autos contempla a situação concreta do recorrido e abrange, quando muito, um restrito grupo de cidadãos - juízes e magistrados do Ministério Público -, motivo por que as questões suscitadas não possuem “relevância jurídica ou social”.
6. A definição da entidade competente para “apreciar a incapacidade para o exercício de funções suscetível de determinar a aposentação dos magistrados judiciais por incapacidade não implica particulares dificuldades de interpretação.
7. A questão em apreço nos autos não possui “relevância jurídica ou social”, nem “a admissão do recurso (...) [é] claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”, em termos que a configurem “de importância fundamental” e justifiquem a abertura da via do recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo.
8. À luz do estatuído do art. 150.º/1 do CPTA, o presente recurso não deve ser admitido.

A formação prevista no art. 150º, nº 5 do CPTA admitiu a revista pelo acórdão, proferido a fls. 235 a 237 dos autos.

O Exmo. Magistrado do MºPº emitiu o douto parecer de fls. 244 a 247 dos autos, no sentido do provimento do recurso de revista.
O Recorrido respondeu a este Parecer dizendo, em síntese, o seguinte:
“No quadro do “regime especial de aposentação por incapacidade”, compete ao CSTAF deliberar sobre a verificação da “incapacidade” do magistrado — as manifestações, “no exercício da função” de juiz, da “debilidade ou entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais” dele —, notificando-o para requerer a aposentação ou reforma ou apresentar, por escrito, as observações que tiver por convenientes; e, requerendo o interessado a aposentação, à CGA, a esta compete a emissão do acto final de cálculo da pensão.
Como já se escreveu, neste processo [alegação do recorrido, nos termos do art.º 91.º/4 do CPTA], seria deveras incoerente, primeiro, deferir ao CSTAF a competência para notificar “os magistrados judiciais (...) [afectados] por debilidade ou entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais, manifestados no exercício da função”, julgados incapazes de “continuar nesta sem grave transtorno da justiça ou dos respectivos serviços”, para requererem a aposentação [art. 65.º/1 e 2 do Estatuto dos Magistrados Judiciais], -e,- depois, submeter esses mesmos magistrados à “Junta Médica da CGA prevista no art.º 91.º do Estatuto da Aposentação, após recepção do relatório clínico elaborado pelo Médico Relator previsto no art. 90.º do mesmo Estatuto”.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Os Factos
Da decisão judicial recorrida resultam assentes os seguintes factos:
1. O autor é Juiz Conselheiro, exercendo funções no Supremo Tribunal Administrativo.
2. Em 7/10/2010, o autor requereu ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais a sua jubilação nos termos dos artigos 65º, n.º 1 e 67º, n.º 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, invocando para tal a sua situação de doença crónica grave (Síndrome de Vidal) de que padece desde cerca do ano de 2000 (cfr. doc. de fls. 35/38 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
3. Em 10/11/2010, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais deliberou “ordenar as averiguações necessárias com vista a aferir se a “debilidade ou entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais” apontadas ao Senhor Juiz Conselheiro A………….. são de monta a poder provocar “grave transtorno da justiça ou dos respectivos serviços”, a justificar a eventual suspensão do exercício de funções prevista no nº 3 do art. 65º do EMJ” (cfr. doc. de fls. 52/56 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
4. No âmbito do referido processo de averiguações foram tomadas declarações a três médicos especialistas - um especialista em Medicina Interna, um Otorrinolaringologista e um Ortopedista a seis Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo e o próprio autor e incorporados quatro relatórios médicos, tendo sido a final emitido parecer (cfr. docs. de fls. 82/123 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
5. Em 15/12/2010, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais deliberou o seguinte (cfr. doc. de fls. 126/132 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido:
1.
2. 2. Ordenar, nos termos do n.º 2 do artigo 65º do EMJ a notificação do relatório em anexo ao Exmo. Senhor Juiz Conselheiro A……………, para, no prazo de 30 dias, requerer o seu pedido de aposentação ou produzir, por escrito, as observações que tiver por convenientes.
6. Notificado da deliberação referida em 5), o autor requereu a sua aposentação ao abrigo do disposto no artigo 65º, nº 2 do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
7. Por oficio de 5/04/2011, endereçado à Secção de Recursos Humanos do Supremo Tribunal Administrativo, foi o autor notificado para “comparecer no dia 30-05-2011, pelas 10.15 horas, no Serviço de Verificação de Incapacidades” do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, “afim de ser submetido a exame médico” (cfr. doc. de fls. 169 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
8. Por requerimento dirigido ao Senhor Presidente do Conselho Directivo da Caixa Geral de Aposentações, onde deu entrada no dia 20/05/2011, o autor comunicou que “não vai comparecer” no dia 30/05/2011 no Serviço de Verificação de Incapacidades do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, por entender que a incapacidade é ponderada e avaliada pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e não pela Caixa Geral de Aposentações e requereu que fosse efectuado o cálculo da pensão a si devida, nos termos dos artigos 66º e 67º do Estatuto dos Magistrados Judiciais (cfr. doc. de fls. 148/157 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
9. Por ofício de 27/05/2011, o autor comunicou ao Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social a sua não comparência no Serviço de Verificação de Incapacidades no dia 30/05/2011 “por entender que a "incapacidade” a atribuir-me é ponderada e avaliada pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de acordo com as respectivas normas do Estatuto dos Magistrados Judiciais” (cfr. doc. de fls. 171 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
10. Em 28/06/2011 foi emitido pela Caixa Geral de Aposentações o parecer nº 134/2011, no sentido de que “a aposentação por incapacidade prevista no art. 65º do EMJ destina-se às situações em que a debilidade ou o entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais consubstancia uma verdadeira incapacidade absoluta e permanente para o exercício das funções, a qual, nos termos da Lei, carece de ser declarada pela Junta Médica da CGA prevista no art. 91º do Estatuto da Aposentação, após recepção do relatório clínico elaborado pelo Médico Relator previsto no art. 90º do mesmo Estatuto. Recusando-se o interessado a submeter-se ao sistema de verificação de incapacidades legalmente consagrado no art. 89º e seguintes do Estatuto da Aposentação, tornando, assim, impossível a continuação do procedimento na prática, é o subscritor que não quer permitir que o mesmo se conclua e tendo em conta que a atribuição da peticionada pensão depende da sua prévia avaliação clínica, a efectuar nos termos dos referidos dispositivos legais, parece verificar a impossibilidade - superveniente - do procedimento administrativo, tal como previsto no art. 112.º do Código do Procedimento Administrativo.
Antes, porém, deverá ser promovida a audiência prévia do interessado, em cumprimento do disposto nos arts. 100º e 101º Código do Procedimento Administrativo” (cfr. doc. de fls. 187/190 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
11. Com referência ao parecer referido em 10) foi proferido o seguinte despacho pela Direcção da CGA em 28/06/2011: “concordamos” (cfr. doc. de fls. 190 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
12. O autor pronunciou-se em sede de audiência dos interessados, reiterando o que anteriormente havia alegado no requerimento referido em 8) supra (cfr. doc. de fls. 194/196 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
13. Em 27/09/2011 foi emitido pela Caixa Geral de Aposentações o parecer nº 187/2011, no sentido de que “deverá a CGA, com fundamento no disposto no art. 112º do Código do Procedimento Administrativo, declarar a impossibilidade superveniente do procedimento administrativo, uma vez que a atribuição da peticionada pensão depende na sua prévia avaliação clínica e dado que o interessado continua a recusar submeter-se ao sistema de verificação de incapacidades legalmente consagrado no art. 89º e seguintes do Estatuto da Aposentação” (cfr. doc. de fls. 220/222 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
14. Com referência ao parecer referido em 12) foi proferido o seguinte despacho pela Direcção da CGA em 27/09/2011: “concordamos” (cfr. doc. de fls. 221 [222] do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
15. Por ofício de 30/09/2011 da Caixa Geral de Aposentações dirigido ao Mandatário do autor, foi comunicado que “pelos fundamentos do Parecer do Gabinete Jurídico desta Caixa de que se junta cópia, a Direcção da Caixa Geral de Aposentações (CGA), por despacho de 2011-09-27, proferido ao abrigo da delegação de poderes publicada no D R., II Série, n.º 50, de 2008-03-11, decidiu: Confirmar o despacho proferido em 2011-06-28 pela Direcção da CGA e indeferir o pedido” (cfr. doc. de fls. 223 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).

3. O Direito
A questão a decidir na presente revista é a de saber se a verificação da incapacidade de um magistrado judicial – no caso um Conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo – para efeitos de aposentação/jubilação é da competência do respectivo Conselho Superior (no caso o CSTAF) ou da CGA.
Entenderam as instâncias que o art. 65º do EMJ consagra um regime especial de aposentação por incapacidade, no âmbito do qual compete ao CSTAF e não à CGA, a respectiva decisão, uma vez que, na avaliação da incapacidade, há que considerar o exercício das funções de juiz e a sua adequação ao funcionamento do sistema judicial, ponderações estas que apenas os Conselhos Superiores, estão habilitados a analisar e decidir.
Por sua vez, a Recorrente defende que as esferas de competência estão delimitadas do seguinte modo: ao CSM competirá ponderar a eventual situação de grave transtorno para o funcionamento da justiça e determinar, se assim o entender, a suspensão do magistrado debilitado; à CGA competirá apreciar a incapacidade para o exercício de funções suscetível de determinar a aposentação.
Nesse contexto, o magistrado é submetido a exame médico, formalmente exigido pelo Estatuto da Aposentação na alínea a) do n.º 2 do art. 37.º (preceito para o qual remete o n.º 1 do art. 67.º do EMJ) e, bem assim, pelos seus arts. 89.º e seguintes, o qual se destina a que peritos médicos verifiquem se existe efetivamente a referida debilidade ou entorpecimento físico ou intelectual, e, em caso afirmativo, se reveste uma natureza irreversível, incompatível com o exercício de funções.
Conclui que a interpretação do disposto no artigo 65º, n.º 1, do EMJ efectuada pelo acórdão recorrido que redunda numa espécie de processo de justificação administrativa de incapacidade sem verificação de um órgão médico (junta médica) é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP, na medida em que aquela interpretação está em contradição intrínseca com conceção global do sistema jurídico relativo à avaliação de incapacidades para efeitos de aposentação e de proteção social, inconstitucionalidade que invoca para todos os efeitos legais.
Assim, deverá ser revogado o acórdão recorrido por violação do disposto nos artigos 65.º do EMJ, conjugado com o disposto no art. 37.º, n.º 2, alínea a), 89.º, 90.º e 91.º do Estatuto da Aposentação, na redacção do Decreto-Lei n.º 377/2007, de 9 de Novembro, e ainda o art. 13º da CRP.

Atendendo às disposições legais aplicáveis e aqui relevantes, vejamos:
Dispunha o art. 37º do Estatuto da Aposentação (EA), na redacção aplicável ao tempo em que foi efectuado o pedido de aposentação, sob a epígrafe Condições de aposentação, o seguinte:
«1 – A aposentação pode verificar-se, independentemente de qualquer outro requisito, quando o subscritor contar, pelo menos, 60 anos de idade e 36 anos de serviço.
2 – Há ainda lugar a aposentação quando o subscritor, tendo, pelo menos cinco anos de serviço:
a) Seja declarado, em exame médico, absoluta e permanentemente incapaz para o exercício das suas funções;
b) Atinja o limite de idade legalmente fixado para o exercício das suas funções;
c) (…)».

Por sua vez, o art. 65º do EMJ, sob a epígrafe Incapacidade, dispunha que:
«1 - São aposentados por incapacidade os magistrados judiciais que, por debilidade ou entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais, manifestados no exercício da função, não possam continuar nesta sem grave transtorno da justiça ou dos respectivos serviços.
2 - Os magistrados que se encontrem na situação referida no número anterior são notificados para, no prazo de trinta dias, requererem a aposentação ou produzirem, por escrito, as observações que tiverem por convenientes.
3 - No caso previsto no n.º 1, o Conselho Superior da Magistratura pode determinar a imediata suspensão do exercício de funções do magistrado cuja incapacidade especialmente a justifique.
4 - A suspensão prevista no presente artigo é executada por forma a serem resguardados o prestígio da função e a dignidade do magistrado e não tem efeito sobre as remunerações auferidas».
E, o nº 1 do art. 67º do EMJ, sob a epígrafe Jubilação, dispõe o seguinte:
«1 - Os magistrados judiciais que se aposentem por limite de idade, incapacidade ou nos termos do artigo 37º do Estatuto da Aposentação, excluída a aplicação de pena disciplinar, são considerados jubilados».
Por fim, o art. 69º do EMJ prescreve que:
«Em tudo o que não estiver regulado no presente Estatuto aplica-se à aposentação de magistrados judiciais o regime estabelecido para a função pública.»
Vemos, assim, que, no que respeita às regras da aposentação, a regra geral está contemplada no nº 1 do art. 37º do EA, prevendo-se no respectivo nº 2 situações excepcionais.
Relativamente ao EA não se levantam dúvidas de que a incapacidade do funcionário é aferida e verificada pela CGA, nos termos previstos nos arts. 89º e seguintes do referido Estatuto. Ou seja, sempre que, preenchidos os demais requisitos da aposentação, o subscritor é submetido a exame por junta médica da Caixa, quando a aposentação dependa da verificação de incapacidade.
No entanto, o EMJ, na redacção em vigor à data da apresentação do pedido de aposentação, previa expressamente nos seus arts. 65º e 67º as situações em que havia direito à aposentação a saber: i) limite de idade; ii) incapacidade; iii) ou nos termos previstos no art. 37º do EA.
O que significa que o art. 67º distingue, de forma clara, estas três situações, “tendo o legislador optado, na sua redacção, pela partícula “ou” que indica alternativa ou opcionalidade”, como se diz no acórdão recorrido.
A lei configura, portanto, em simultâneo, duas situações de incapacidade, a prevista na alínea a), do nº 2 do art. 37º do EA (preceito para o qual remete) e a contemplada no art. 65º por remissão do nº 1 do art. 67º, ambos do EMJ, sendo esta uma situação jurídica de aposentação específica dos magistrados judiciais, distinta da aposentação prevista no referido art. 37º (cfr. neste sentido o acórdão deste STA proferido em 21.09.2010, proc. 0323/10).
A incapacidade contemplada no referido preceito pode não coincidir com a prevista no art. 37º, nº 2, alínea a) do EA (esta absoluta e permanente), podendo consistir em situações em que se verifique poder estar em causa um grave transtorno da justiça e seus serviços, face à “debilidade ou entorpecimento das faculdades físicas ou intelectuais, manifestados no exercício da função”.
Nestes casos detêm os Conselhos Superiores o poder de impulsionar um processo de aposentação sem esperar por uma iniciativa dos próprios magistrados (à semelhança do que prevê o art. 41º do EA para os casos de incapacidade previstos no art. 37º, nº 2, al. a)).
Detêm ainda a competência de, se o considerarem necessário, suspender do exercício de funções os magistrados, de forma a salvaguardar o prestígio da função e a dignidade daqueles (mantendo-se as remunerações auferidas).
No caso, face ao requerimento do interessado pedindo a sua aposentação/jubilação nos termos dos artigos 65º, nº 1 e 67º, nº 1 do EMJ, o CSTAF, após ter determinado que se procedesse a averiguações com vista a determinar uma eventual suspensão (nos termos do nº 3 do art. 65º do Estatuto), e, apesar de o inspector ter proposto essa suspensão, deliberou que ela não se justificava, notificando o magistrado para requerer a aposentação ou dizer o que tivesse por conveniente no prazo de 30 dias (nos termos do nº 2 do art. 65º).
E, no caso concreto, foi requerida a aposentação.
Da redacção dos arts. 65º e 67º do EMJ (ou de qualquer outro preceito do mesmo Estatuto) não resulta que o legislador tenha pretendido derrogar o regime estabelecido no Estatuto da Aposentação no que se refere ao procedimento a seguir quando esteja em causa uma aposentação por incapacidade.
Se tivesse querido que a aposentação/jubilação pela incapacidade prevista no art. 65º do EMJ fosse concedida, sem mais, pelos respectivos Conselhos Superiores tê-lo-ia dito expressamente, até porque tal resultaria numa espécie de processo de justificação administrativa de incapacidade sem verificação de um órgão médico através de um exame médico, como alega a recorrente.
É que a aposentação por incapacidade pressupõe sempre que esta seja declarada por uma junta médica, ou que seja homologado o parecer desta, quando lei especial o exija (cfr. arts. 37º, nº 2, al. a), 43º, nº 1, al. b) e 89º, todos do EA). É esse o caso da PSP e da GNR, cujos respectivos Estatutos prevêem expressamente a existência de juntas médicas próprias com competência para apreciar a incapacidade para o serviço daqueles profissionais (cfr., respectivamente, o art. 31º do DL nº 299/2009, de 14/10 e os arts. 93º e 94º do DL nº 297/2009, da mesma data).
Ora, o Conselho Superior da Magistratura ou o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais não têm juntas médicas ao seu serviço.
Assim, não existindo um regime próprio aplicável aos magistrados judiciais no que respeita à incapacidade prevista no art. 65º do EMJ, por aplicação do art. 69º do mesmo Estatuto, é-lhes aplicável o regime estabelecido para a função pública quanto àquela incapacidade. Ou seja, tem que ser declarada pela Junta Médica da CGA, depois de elaborado o relatório do exame feito pelo médico relator, após o que será proferida a Resolução Final pela Caixa (cfr. arts. 91º, 90º e 97º do EA).
Termos em que procede a presente revista, sendo de revogar o acórdão recorrido.

Pelo exposto, acordam em:
a) – conceder provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido, e julgando improcedente a acção;
b) – condenar o Recorrido nas custas em todas as instâncias.

Lisboa, 12 de Março de 2015. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Alberto Acácio de Sá Costa Reis.