Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01279/14.6BEPRT
Data do Acordão:01/13/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA DO CÉU NEVES
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL
FACTO LÍCITO
DANO ESPECIAL E ANORMAL
Sumário:
Nº Convencional:JSTA00071364
Nº do Documento:SA12022011301279/14
Data de Entrada:07/15/2021
Recorrente:PORTO VIVO, SRU - SOCIEDADE DE REABILITAÇÃO URBANA DA BAIXA PORTUENSE, SA E OUTROS
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:ARTS. 321.º, n.º 2, e 323.º, n.º 1, CPC/2013
ART. 16.º RRCEEP - anexo LEI N.º 67/2007, de 31/12
ARTS. 494.º e 496.º CCIV/66
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

1. RELATÓRIO

A............, melhor identificado nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF) acção administrativa comum contra Porto Vivo – SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense, S.A [fazendo intervir acessoriamente a sociedade B............, S.A. enquanto empreiteira executora da obra] peticionando que a Ré seja:
A) (…) condenada a repor a fachada de tardoz do prédio do Autor sito ao Largo dos ……… ……, Porto, no estado em que se encontrava antes da sua intervenção no interior do ……… e nos termos descritos no artigo 84º da p.i., serviços e obras aí descritos num prazo máximo de 90 dias;
B) deverá a Ré ser condenada a reparar o rebordo da laje da varanda do prédio do Autor sito ao Largo dos ........., ……, Porto, repondo-o no estado em que se encontrava antes da sua intervenção no interior do ……… num prazo máximo de 90 dias;
C) deverá ser a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia global de 75.855,73 € (setenta e cinco mil euros e oitocentos e oitenta e cinco euros e setenta e três cêntimos) a título de danos emergentes e lucros cessantes e,
D) deverá ser a Ré condenada a pagar ao Autor o montante não inferior a 5.000,00€ (cinco mil euros) a título de danos morais já apurados;
E) deverá ser ainda a Ré condenada a pagar os juros já vencidos dos empréstimos referidos nos artigos 94.º a 105.º da p.i. – e pagos pelo A. – no montante total de 32.701,54 €;
F) deverá a Ré ser condenada dos juros vincendos dos empréstimos referidos nos artigos 94.º a 105.º da p.i.;
G) deverá, por fim, a Ré ser condenada a pagar os juros vincendos das quantias referidas em C), D) e E), à taxa legal, desde a sua citação até efectivo e integral pagamento.”
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Por sentença de 04 de Dezembro de 2019, o TAF do Porto julgou a presente acção totalmente improcedente, e nesta improcedência, absolveu a Ré dos pedidos formulados pelo autor.
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O Autor apelou para o TCA Norte, e este por acórdão proferido a 22 de Janeiro de 2021, julgou a acção parcialmente procedente.
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A Ré Porto Vivo - Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense, SA, e a interveniente acessória B............, Ld.ª, inconformadas, vieram separadamente interpor recurso de revista, tendo a primeira na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões:
«1) Os danos pelos quais o Recorrido foi compensado não se deveram ao caráter perigoso da empreitada que o afetou, mas sim pelos danos laterais que lhe foram impostos, mormente o ruído e alguma deterioração da habitação, motivo pelo qual a responsabilidade pelo risco consagrada no artigo 11º do RCEE é, in casu, inaplicável.
2) Tendo em conta a identidade de regimes da responsabilidade pelo sacrifício consagrada no pretérito Decreto-Lei 48051, de 21 de novembro, artigo 9º, nº 1 e 2, e o atual artigo 16º do RCEE, mantém plena atualidade os pressupostos para aplicação de tal mecanismo tal como descritos por Gomes Canotilho, segundo o qual um dos requisitos é que o sacrifício seja imposto no interesse público e não no interesse da pessoa titular do direito sacrificado.
3) É curial dizer, e vai de encontro ao espírito do artigo 16º do RCEE – salvaguarda do Princípio da Igualdade na contribuição para os encargos públicos – que existe o sacrifício não compensável, desde logo aquele que seja imposto não só no interesse público mas também no interesse da pessoa titular do direito sacrificado.
4) No caso vertente, a existir algum dano especial e anormal, facto é que o sacrifício imposto ao Recorrido o foi em próprio benefício, pois é notório que a reabilitação do edificado traz vantagens não só para a comunidade em geral, que vê tal edificado recuperado, embelezado, como também para os residentes da área reabilitada. Melhor dito: a reabilitação do edificado importa vantagens sobretudo para quem nele habita ou nas proximidades, não sendo comparável o benefício do residente remoto face à área intervencionada, com o benefício do cidadão que nela reside.
5) Sendo a localização um dos aspetos essenciais na determinação do valor de mercado de um imóvel, é inegável que todos os habitantes de áreas reabilitadas sofrem um benefício que a restante população não obtém – ou seja, contrariamente a outros residentes do município do Porto ou de qualquer outro município do país, os que residem em áreas alvo de intervenção prioritária pelas autoridades públicas, de entre elas, a Recorrente, são substancialmente mais beneficiados com o incremento no valor de mercado dos edifícios dos quais são proprietários.
6) De entre estes, serão ainda mais beneficiados aqueles que possuem maior área locável ou vendável, neste estrito grupo se encontrando o Recorrente que, além de ser residente no ........., é também investidor imobiliário, arrendando frações do seu prédio a terceiros, como sobejamente decorre da prova produzida nos presentes autos e da matéria de facto dada como provada.
7) Facto também ele público e notório e marginalizado pelo Tribunal a quo, é a inegável melhoria na qualidade de vida de todos os habitantes do ……… e, bem assim, o incremento no lucro auferido pelos investidores/proprietários imobiliários em sequência da reabilitação operada, realidade essa ignorada.
8) Donde, resulta que não existe, no presente caso, um sacrifício juridicamente tutelável pois, como prius face à análise dos requisitos para verificação de um sacrifício compensável, antes de mais há que observar se realmente existiu um sacrifício, na medida em que o particular só tenha sofrido desvantagens na sua esfera e não, simultaneamente, uma vantagem que, a médio/longo prazo, suplante a desvantagem temporária verificada.
9) Quanto ao requisito da especialidade do dano, resulta este da violação do Princípio da Igualdade implicando que, face à ocorrência do facto lícito, uma pessoa ou grupo de pessoas seja especialmente afetado, de modo tal que ocorre uma verdadeira rutura da igualdade de repartição dos encargos públicos, como reconhecido pelo Acórdão do TCAN de 08 de maio de 2008, Proc. nº 00155/06.BEPNF.
10) A violação do Princípio da Igualdade da repartição dos encargos públicos, para se ter como verificada, implica que o sujeito de tal violação não venha a posteriori a beneficiar dessa intervenção ablativa – como ocorre nos presentes autos, como se defendeu – mas também exigindo que o resultado ablativo incida especialmente sobre o lesado.
11) Como sublinham os Acórdãos do STA de 30 de abril de 2008 (Proc. nº 0913/07) e 05 de novembro de 2003 (Proc. nº 01100/02) não cumpre tal requisito o sujeito que, no decurso da execução de obras públicas seja afetado, pois que qualquer pessoa em tal situação seria também afetada. Ou seja, na área de intervenção da empreitada, não obstante uns sofrerem mais que outros, todos sofrerão um sacrifício.
12) Por seu turno, e como “contrapeso” cumpre não olvidar que quão maior a exposição à realização de obra pública, maior o benefício, o que por si só traduz a inexistência de violação do Princípio da Igualdade na contribuição para os encargos públicos. I.e., o residente mais próximo das obras de requalificação mais beneficia com estas, ao passo que o residente mais remoto beneficia menos – pense-se nos casos de construção de parques públicos, caso no qual os imóveis que confrontem com o parque sofrerão mais com o ruído da obra, mas que posteriormente obterão vistas de maior qualidade.
13) Como sublinhou o STA no citado Acórdão de 30 de Abril de 2008 (Processo 0913/07), não se pode tolher a iniciativa da melhoria do espaço público a cargo das entidades públicas com pedidos de indemnização não suficientemente graves, sob pena de tornar excessivamente onerosas tais iniciativas.
14) Como defende Carla Amado Gomes, quanto ao requisito do “dano anormal” apenas é atendível a lesão intolerável numa perspetiva de solidariedade de sacrifícios necessários à sustentabilidade do Estado Social, sendo o nível de tolerabilidade apurado à luz da teoria do gozo standard, e à qual alude o Tribunal a quo mas aplica erradamente.
15) Numa obra pública e de grande envergadura como o foi a reabilitação do ........., é expectável que os habitantes sejam expostos à produção de ruídos, pó e vibrações. Porém, e como forma de minorar tais danos, o Regulamento Geral do Ruído, aprovado pelo Decreto-Lei nº 9/2007 de 17 de janeiro prevê, no seu artigo 16º, nº 1 que “As obras de recuperação, remodelação ou conservação realizadas no interior de edifícios destinados a habitação, comércio ou serviços que constituam fonte de ruído apenas podem ser realizadas em dias úteis, entre as 8 e as 20 horas, não se encontrando sujeitas à emissão de licença especial de ruído.”
16) Não consta da matéria de facto provada ou não provada que a intervenção no ......... tenha sido feita contra tal regulamentação, apenas constando da matéria de facto dada como não provada sob o ponto 6 que “A operação urbanística em causa nos autos, em concreto a execução da empreitada, não observou as regras e normas de segurança aplicáveis”
17) Sob os pontos Y, Z e AA da matéria de facto dada como provada consta que inúmeras atividades continuaram a ser realizadas no ........., e sob o ponto X, que apenas os habitantes de parcelas diretamente intervencionadas pela Entidade Demandada e pela C………… foram realojados.
18) Se tais atividades são exercidas durante o período diurno, coincidindo com o horário em que as obras foram realizadas, como é que o Tribunal a quo pode invocar que tal gozo standard foi violado?
19) Quanto aos demais habitantes, todos eles na mesma situação do Recorrido (indiretamente afetados), das duas uma: ou todos eles saíram da unidade de intervenção ou conformaram-se com a realização das obras.
20) Não resultando dos autos tal “debandada”, mas apenas e tão-só que resultaram “constrangimentos” no local (factos provados BB e CC) temos que chegar à conclusão, também por esta via, que não ocorreu tal perturbação do gozo “standard”.
21) O Tribunal a quo para retirar a conclusão de que houve perturbação do “gozo standard” baseia-se nos factos dados como provados P e R, bem como constatando ser “patente que as obras efetuadas (…) sempre perturbariam a vivência quotidiana do agregado familiar do Recorrente”.
22) Parece assim resultar para esta instância que sempre seria inevitável a compensação do Recorrido. Porém, este raciocínio não só é desprovido de substrato fático que o legitime, como é perigoso, pois dele se extrai que tais obras sempre importariam danos anormais para os habitantes indiretamente afetados (i.e., em cujos prédios não ocorreram intervenções diretas) impondo uma obrigação generalizada de compensação em tais casos.
23) Tal contraria o pressuposto da especificidade, ao impor uma obrigação generalizada, bem como contraria o caráter “anormal” dos danos.
24) Nestes termos, o douto Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 2º e 16º do RCEE, pois não existiu um sacrifício juridicamente tutelável tendo em conta o conexo benefício decorrente da reabilitação do edificado ou, caso assim não se entenda, por não estarem verificados os requisitos da anormalidade e especialidade do dano, pelo que deve o mesmo ser revogado, improcedendo a ação.
25) Mesmo que se considerem preenchidos os pressupostos para atribuição da compensação pelo sacrifício ao Recorrido – o que por mera cautela de patrocínio se admite – ainda assim não deveria o Tribunal a quo ter-lhe atribuído uma compensação nos termos em que o fez.
26) Resulta do Acórdão Recorrido que o Tribunal a quo condenou a Recorrente no pagamento não só dos danos emergentes da prática do facto lícito, como também dos lucros cessantes.
27) O âmbito da obrigação de indemnizar resultante do artigo 16º do RCEE é bastante distinto do âmbito do regime geral da obrigação de indemnizar pela Administração, constante do artigo 3º do RCEE, que por sua vez é um eco do regime da obrigação de indemnizar civilística constante do artigo 562º do Código Civil.
28) No regime geral da responsabilidade da Administração, a indemnização visa a reparação integral do dano sofrido, de preferência por reconstituição in natura e considerando a teoria da diferença.
29) Tendo em conta a redação díspar do artigo 16º do RCEE face ao regime consagrado no artigo 3º do RCEE, bem como o espírito daquela norma, facilmente se determina que o legislador não pretendeu equiparar a ressarcibilidade da compensação pelo sacrifício à consagrada para o regime geral da responsabilidade da Administração. Aqui, pretende-se a reposição do lesado no estado em que se encontraria não fora a ocorrência do facto ilícito; ali uma compensação variável consoante o grau de afetação do direito violado – no presente caso, o direito de propriedade.
30) Por tal facto, o sacrifício implica o pagamento de compensação e não uma reparação tout court, visando tornar o sujeito indemne, i.e., intacto ou incólume.
31) A generalidade da doutrina e jurisprudência defendem que apenas são ressarcíveis, no âmbito da responsabilidade pelo sacrifício, os danos emergentes, posição essa ignorada pelo tribunal a quo.
32) Se o fundamento da compensação pelo sacrifício resulta da violação do Princípio da Igualdade na contribuição para os encargos públicos, e não com base no risco de uma atividade ou ilicitude do facto, justifica-se que os danos ressarcíveis sejam menores do que os que seriam indemnizáveis à luz do regime geral.
33) Sendo a compensação pelo sacrifício extraordinária e dependente da verificação de danos especiais e anormais, contendo-se na medida do “grau de afetação do conteúdo substancial do direito violado” entende-se que só os danos emergentes sejam alvo de compensação pois apenas estes decorrem de tal violação imediata.
34) A não ser assim, o cômputo do lucro cessante sempre será incerto, sendo de difícil cálculo. Esta incerteza quanto à previsibilidade do dano a ressarcir gera um grave perigo: à entidade pública será impossível prever o montante provável a indemnizar, antes de tomar a resolução de intervir no espaço público.
35) A somar à dificuldade de estabelecer o perímetro de sujeitos a indemnizar, por ter de contabilizar não só os diretamente afetados pela empreitada, mas também os indiretamente afetados – análise árdua, tendo em conta a subjetividade inerente – terá ainda de contabilizar danos incertos e futuros, os quais nem são contemporâneos à data de início da empreitada.
36) O Tribunal a quo não deveria ter condenado a Recorrente, como condenou, no pagamento do lucro cessante peticionado pelo Recorrido pelo que, se o Tribunal ad quem não revogar totalmente o Acórdão Recorrido, deverá pelo menos revogá-lo parcialmente, não se condenando a Recorrente no pagamento do lucro cessante peticionado pelo Recorrido».
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Por sua vez, a interveniente B............, Ldª, concluiu as suas alegações do seguinte modo:
«1 - Do itinerário cognitivo do tribunal recorrido não se vislumbra onde entra aqui a responsabilidade do empreiteiro, tanto mais é que o próprio acórdão que dá a entender que a obrigação de indemnizar já existia ainda antes da obra se iniciar, radicando na responsabilidade da Administração por factos lícitos.
2 - O acórdão recorrido é nulo porquanto não especifica os concretos fundamentos de facto e de direitos que suportam a condenação da Chamada, a mera empreiteira na obra em causa nestes autos – artigo 615.º, alínea b), do CPC, nulidade que se invoca expressamente.
3 - O acórdão está ferido de nulidade, também, porquanto os seus fundamentos estão em clamorosa contradição com a decisão, já que suporta-se na responsabilidade civil por facto lícitos da Administração, cita abundante jurisprudência nesse sentido mas a acaba a condenar, também, a empreiteira, a qual se limitou a executar um projeto e que só poderia responder por factos ilícitos – artigo 615º, nº 1, alínea c).
4 - O acórdão recorrido está, ainda, ferido de nulidade por uma outra razão: nas suas contra-alegações de recurso para o Tribunal Central Administrativo do Norte, a Chamada invocou que se limitou a executar a obra em conformidade com as autorizações e licenciamentos concedidos pelas autoridades competentes, os quais foram previamente obtidos pelo dono da obra e que não foi dado como provado (nem sequer alegado…) qualquer facto que apontasse gerasse responsabilidade civil do empreiteiro, pelo que não há qualquer facto voluntário que faça emergir, da sua ação, a obrigação de indemnizar, pelo que o Tribunal recorrido deveria ter-se pronunciado acerca desta questão e não o fez, nem sequer en passant, o que determina a nulidade do acórdão – artigo 615º, nº 1, alínea d).
5 - Sendo certo que a chamada é responsável no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, também não é menos verdade que tal só ocorre desde que no exercício dessa sua atividade e na execução dos trabalhos para realização da obra, desrespeite ilicitamente e com culpa direitos de terceiro, provocando-lhe danos (artigo 483º, nº 1, do Código Civil), mas para que haja essa responsabilidade é necessário que se mostrem verificados todos os requisitos da responsabilidade civil, os quais não se encontram plasmados no acervo de factos dados como provados.
6 - Os factos provados G), P), BB), CC) e DD) são absolutamente insuficientes para suportar a condenação da Recorrente-Empreiteira.
7 - O facto provado na alínea P) reporta-se a “os danos” existentes na habitação do Autor, nas não se concretiza que danos são esses, não se dando sequer por provado qualquer dano em concreto, sé é grande ou pequeno, aliás, tal facto é até conclusivo, devendo ser expurgado, pois dele não se extrai qualquer realidade concreta.
8 - Os factos provados BB) e CC) reportam-se a…. “constrangimentos”, outro conceito conclusivo e indeterminado e que não encerra em si qualquer realidade fáctica mensurável ou sequer minimamente apreensível, devendo ser expurgado.
9 - O facto BB) diz respeito aos edifícios adjacentes e nem sequer diz respeito à casa do Autor e o facto CC) reporta-se à existência de “constrangimentos e queixas relacionados com o ruído e o pó causado pela obra executada”, sem se provar ou indiciar sequer a existência de ruído ou pó anormalmente produzido, pelos que de tais factos não resulta qualquer conduta menos adequada da Chamada.
10 - Na cláusula 12.ª do contrato de empreitada (junto como doc. 1 da contestação da Ré) verifica-se que a chamada só é responsável pela reparação dos danos sofridos por terceiros decorrentes “do modo de execução dos trabalhos, da atuação do pessoal do empreiteiro ou dos seus subempreiteiros e fornecedores e do deficiente comportamento ou falta de segurança das obras, materiais, elementos de construção e materiais”, o que não resultou provado nesta ação.
11 - O Tribunal foi chamado a decidir se houve para o Autor um prejuízo anormal com a existência da própria obra (causa de pedir), sendo que prejuízo anormal é aquele que não seja inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos, ultrapassando os limites impostos pelo dever de suportar a atividade lícita da administração (Porto Vivo, SRU) e jamais poderia condenar a Ré no pedido, pois nem o Autor alegou factos na sua Petição Inicial, nem a Ré na sua contestação, idóneos a responsabilizar a Recorrente pelo que, naturalmente, também não foram provados quaisquer factos conducente à sua condenação.
12 - A Chamada não pode ser responsabilizada pelos transtornos que a existência da própria obra sempre acarretaria ao Autor, logo, nunca seria sobre a empreiteira que impenderia o ónus de indemnizar os cidadãos/munícipes que por serem vizinhos da obra tiveram de, durante muitos meses, sujeitar-se aos transtornos inerentes a uma intervenção urbanística desta envergadura, pelo que mal andou o Tribunal recorrido na condenação da Recorrente.»
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O recorrido, A............, contra-alegou concluindo:
«1. O recurso de revista é um recurso de natureza excepcional e no caso concreto não se verificam os pressupostos da sua admissão, pelo que deverá ser rejeitado nos termos do artigo 150º, nº 1 do CPTA.
2. Sem prejuízo e sem conceder, caso a revista seja admitida, nenhuma das conclusões apresentadas pelas recorrentes merece provimento.
3. Mostra-se intocada a justeza, o equilíbrio, a coerência, o bom-senso e a certeza da aplicação do direito pelo julgador na decisão recorrida.
4. No caso sub judice encontram-se verificados todos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual por atos lícitos, praticados no domínio da gestão pública: a produção de danos; nexo causal entre a conduta e os danos; os danos advêm de prejuízos especiais e anormais; tais encargos e prejuízos foram impostos a um particular, na prossecução do interesse público e não se apresentam como resultantes do risco normalmente suportado por todos em virtude da vida em comunidade.
5. É unanimemente aceite pela doutrina e jurisprudência que a atuação da Administração, ainda que lícita, pode ser geradora de responsabilidade civil extracontratual, atendendo, nomeadamente, à tipologia dos danos provocados, conforme expressamente previsto no artigo 16º do RCEE, que consagra a indemnização pelo sacrifício.
6. No caso vertente estamos perante um dano especial e anormal, uma vez que as obras profundas levadas a cabo pelas Recorrentes, com diversas demolições em zona adjacente, transformaram o prédio do Recorrido num estaleiro de obra, paredes meias com uma demolição de edificado, sofrendo danos como trepidações, fissuras, rachadelas, infiltrações de água, poeiras e ruídos, queda de estuque no quarto, para além de tentativas de intrusão (conforme consta da matéria de facto dada por provada sob os pontos BB, CC, DD, EE e P, R,Q), privando o recorrido da tranquilidade, saúde, repouso e bem-estar, forçando-o a sair com o seu agregado familiar da sua habitação própria, durante mais de 4 anos, desde Setembro de 2008 a Dezembro de 2012 (pontos F, H, O da matéria provada), determinando o arrendamento de outra habitação durante o período de duração das obras, a expensas próprias, uma vez que a recorrente Porto Vivo, SRU não cuidou do seu realojamento temporário, ao contrário do que fez com outros moradores (pontos I, J, K, L, O, X da matéria provada).
7. O dano sofrido pelo recorrido foi inquestionavelmente grave, porquanto o direito ao repouso e à tranquilidade enquanto aspectos dos direitos fundamentais de personalidade do Recorrido, o seu direito ao respeito da vida privada e familiar foram severamente afectados, com ruídos e danos no domicílio nos termos supra expostos, que afetaram o seu bem-estar físico e a sua vida privada, tornando a vivência na sua habitação própria impossível durante mais de 4 anos, não se tratando de um pequeno transtorno aceitável como risco usual próprio da vida em sociedade; qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, explicitando-se que os ruídos e outras perturbações que causem danos no domicílio, afectam o bem-estar físico do indivíduo e atingem a sua vida privada.
8. O dano incidiu desigualmente sobre o Autor/Recorrido, já que a recorrente Porto Vivo cuidou de realojar outros moradores do ........., mas não o recorrido, ignorando os vários pedidos de realojamento deste, tendo ficado assim o recorrido onerado com os custos de arrendamento de residência alternativa (que se viu obrigado a arrendar durante mais de 4 anos); para além disso, o Recorrido deixou de receber as rendas da fracção do 2º andar do seu prédio, com a saída dos locatários que, conforme resultou provado sob o ponto W da matéria de facto, rescindiram o contrato de arrendamento comercial única e exclusivamente em virtude das obras levadas a cabo pelas Recorrentes, que impossibilitaram que continuassem a desenvolver a atividade profissional de solicitadoria no locado, e consequentemente, significaram para o recorrido o dano correspondente à perda dessas rendas, bem como, cumulativamente, o recorrido sofreu tristeza, desgosto e revolta (ponto R da matéria provada), danos morais igualmente valoráveis.
9. In casu, é notório que não estamos perante um pequeno sacrifício, um pequeno transtorno, ou uma pequena limitação que não dá lugar a uma afetação do gozo-standard do bem, mas, pelo contrário, a atuação das recorrentes, por força das obras levadas a cabo, vêm afectar de modo especial o proprietário, impondo-lhe sacrifícios que ultrapassam muito o respeito pelo gozo standard do seu imóvel, desde logo privaram-no de um ambiente sadio, de uma vivência quotidiana com o mínimo de qualidade e provocaram danos que implicaram a sua saída forçada do seu imóvel por um largo período de tempo.
10. O recorrido viu-se forçado a arrendar habitação alternativa, com o consequente pagamento de renda mensal, durante esse hiato temporal, já que a Entidade Pública não o realojou temporariamente, como fez com outros moradores do ........., pese embora os seus pedidos, conforme consta da matéria de facto dada por provada.
11. Os prejuízos sofridos pelo recorrido devem ser considerados danos especiais e anormais, como assim entendeu o Tribunal Central Administrativo Norte, uma vez que ultrapassam o ónus natural decorrente da vida em sociedade e gozam de gravidade, importância e peso que justificam a sua ressarcibilidade, não colhendo a tese inovadora ora apresentada pela recorrente, em sede de recurso excecional de revista para o STA, de que o sacrifício imposto ao recorrido não seria compensável, pois foi imposto no seu próprio interesse e benefício.
12. A recorrente invoca que o prédio do recorrido valorizou com as obras no ......... e que findas as obras terá ganhos como “investidor imobiliário”, referindo-se a arrendamento ou hipotética venda (ou arrendamento) do seu prédio. Ora, sucede que antes das obras das Recorrentes, conforme resulta dos autos, o prédio do recorrido encontrava-se em excelente estado de conservação, pois em data anterior à decisão de realização das obras pela recorrente Porto Vivo SRU, o recorrido havia recuperado e restaurado totalmente o seu prédio, dotando-o de todas as características adequadas ao perfil académico e artístico do seu agregado familiar, tendo-o feito a expensas próprias e recurso a empréstimos bancários, para que nele pudesse habitar com a sua família com todo o conforto.
13. O fim habitacional do prédio do recorrido apenas sofreu um interregno de cerca de 4 anos, provocado única e exclusivamente pelas obras das recorrentes (de 2008 a 2012) que o tornaram inabitável, pois logo que pôde regressar ao seu imóvel, em 2012, depois da reparação dos danos causados pelas obras pelo empreiteiro C…………, o recorrido voltou a habitar o seu imóvel, onde se mantém a residir ininterruptamente até à data de hoje, em 2021, não tendo qualquer interesse em vendê-lo ou sequer qualquer prova logrou a recorrente fazer no sentido ora defendido em recurso excecional de revista.
14. Mais, as obras das recorrentes não trouxeram novos locatários nem maior lucro ao recorrido, que antes daquelas já tinha parte do seu prédio arrendado para fim comercial, não tendo sido por causa das obras das Recorrentes que passou a arrendá-lo, nem sequer passou a arrendar o andar em condições económicas mais vantajosas, aliás, a recorrente em momento algum alegou, ou provou, que o recorrido tenha passado a retirar ganhos económicos superiores do seu prédio fruto das obras de requalificação levadas a cabo pelas recorrentes no ........., conforme a matéria de facto assente nestes autos (provada e não provada) e insindicável nesta fase.
15. Importa aqui assinalar que na base do recurso, parece estar, na realidade, a invocação de um eventual erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais, pese embora nos termos do nº 4 do art. 150º do CPTA, esteja, por norma, vedado ao tribunal de revista a reapreciação dos factos e dos juízos de facto fixados pelo tribunal a quo.
16. A matéria ora invocada pela recorrente quanto a uma invocada melhoria, a longo prazo, da situação financeira do recorrido e até suposto benefício que passou a usufruir, fruto das obras das recorrentes, choca com a realidade do caso concreto, nem foi alegada anteriormente por qualquer das partes e por essa razão nunca constituiu objeto de qualquer discussão (inexiste, aliás, um único ponto da matéria provada ou não provada que refira esta questão), pelo que a invocação desses factos apenas em sede de recurso de revista integra um verdadeiro pedido de reapreciação de factos e juízos de facto, inadmissível nesta fase.
17. O mesmo quanto a recorrente dizer que outros cidadãos permaneceram a residir no ........., quando nenhuma prova fez, nem sequer consta da matéria de facto (provada ou não provada) que qualquer outro cidadão tenha permanecido a residir no Largo dos ........., ou mesmo no .......... No prédio do recorrido, provou-se que este e o seu agregado familiar, bem como os locatários do 2º andar, foram forçados a sair do prédio como causa directa das obras.
18. A recorrente Porto Vivo, SRU, tratou de realojar os outros moradores do ........., mas não o recorrido, pese embora os seus pedidos nesse sentido, conforme resulta de forma cristalina da matéria de facto provada, tratando-o desigualmente face aos outros moradores, sendo que só a si mesma pode imputar tal conduta omissiva, pois nem sequer se coloca, no caso vertente, a questão da culpa de terceiros, ou do lesado, que tenha contribuído para o dano, por forma a reduzir (ou excluir) a obrigação de indemnizar.
19. À crítica de que soluções como a do caso concreto - com atribuição de indemnização ao Autor/recorrido por danos emergentes, lucros cessantes e danos morais sofridos-, representam um peso para os cofres públicos e para os contribuintes, e receio manifestado pela recorrente Porto Vivo SRU, de que a manutenção de condenações, como a presente, onerem demasiado a Entidade Pública (desconhecendo-se, nem tal foi alegado ou provado pela recorrente, a pendência de casos semelhantes) e haja uma aplicação “desmedida” a casos futuros, há que argumentar que apenas se trata de reparar situações cuja gravidade, por se ter verificado um prejuízo especial e anormal, se venha a apurar no caso concreto, tendo de se preencher, em cada caso concreto, todos os requisitos de que a lei faz depender a sua aplicação, nomeadamente o referido duplo-travão. Há que sublinhar que ainda que as opções consagradas na Lei representem inconvenientes aos olhos da Entidade Pública, não deixam de ser as normas legais que o legislador consciente e advertidamente quis consagrar e, por conseguinte, deverão ser aplicadas e cumpridas num Estado de Direito.
20. As Recorrentes, fazendo tábua rasa da matéria de facto dada por provada, e do princípio da proporcionalidade, contestam que o dano sofrido pelo autor/recorrido, seja especial e anormal e pugnam que o sacrifício imposto foi em seu próprio benefício, advogando que a reabilitação do edificado traz vantagens para a comunidade em geral, que vê tal edificado recuperado, embelezado, como também para os residentes da área reabilitada, recorrido em particular, o que implicaria, segundo esta nova tese aventada (que, diga-se, não encontra qualquer suporte legal e factual), que se excluísse a indemnização. Na tese da recorrente Porto Vivo falha, não só a apreciação da verificação do dano especial e anormal, comprovadamente existente no caso sub judice, conforme a matéria de facto provada, que reclama a ressarcibilidade dos prejuízos sofridos, como a consideração de que o prédio do autor antes da intervenção não se encontrava degradado, como outros, mas totalmente recuperado, não tendo desta forma beneficiado na mesma medida que outros proprietários cujos prédios, à data, se encontravam por recuperar; o prédio do recorrido apresentava um estado de conservação excelente, do ponto de vista estético e funcional, em virtude das obras de recuperação e restauro feitas pelo recorrido aquando da compra do prédio, a expensas próprias e com recurso a financiamento bancário, antes da decisão de realização das obras de intervenção dos recorrentes, pelo que, nesse sentido não veio a beneficiar, em particular, de tais obras. De salientar que ao contrário de outros proprietários do ........., antes das obras profundas levadas a cabo pelas recorrentes, o recorrido não só vivia no seu prédio, como tinha já parte do mesmo arrendado para fim comercial, não tendo alterado o destino do prédio após as obras das recorrentes, ou sido essas, que possibilitaram tal arrendamento, já que, como se disse, o recorrido continua hoje (como antes das obras das recorrentes) a residir no seu prédio e a arrendar parte do mesmo para fim comercial, não tendo alterado o seu perfil de habitação/investimento após as obras das recorrentes, ou sequer obtido ganhos económicos com tais obras (nem tal resulta da matéria de facto provada).
21. Não pode colher, por falta de fundamento legal e factual, a tese de que no caso em apreço não existe um sacrifício juridicamente tutelável, tentando-se desta forma, com tal nova alegação, passar uma esponja nos mais de 4 anos que o recorrido, juntamente com o seu agregado familiar, se viu forçado a residir fora da sua habitação própria (de setembro de 2008 a dezembro de 2012) com grande desgosto, a expensas próprias, única e exclusivamente por força dos danos no seu imóvel resultante da atuação das recorrentes, como se tal saída forçada durante tal hiato temporal fosse apenas um pequeno transtorno, que se espera que qualquer cidadão suporte em comunidade.
22. O recorrido foi atingido de forma desigual, face a outros particulares e mesmo perante outros moradores da zona (a quem foi garantido o conforto habitacional pela recorrente, com o seu realojamento temporário) e os danos provocados pelas recorrentes, são por si só, de tal forma graves e anormais, que merecem ser ressarcidos, por ultrapassarem (pelo seu caráter e duração) claramente aquilo que é razoável fazer suportar ao cidadão normal socialmente integrado. Ao tribunal ad quem, em sede de recurso de revista, não é permitido reanalisar os fundamentos de facto atendidos por parte do tribunal a quo para efeitos de fixação da indemnização.
23. É manifesto que a alteração da fachada de tardoz do prédio do recorrido não foi considerada como um embelezamento pelo recorrido, pois este, na sua petição inicial, formulava o pedido de reposição da fachada de tardoz no seu estado original, o que certamente não faria caso considerasse tal alteração um embelezamento.
24. As obras de requalificação das recorrentes não trouxeram um ganho de qualidade de vida ao recorrido, nem a recorrente logrou fazer tal prova, já que antes dessas obras o recorrido já residia, tranquilamente, com o seu agregado familiar, no prédio de que era proprietário e que se encontrava totalmente recuperado e em excelente estado de conservação; o recorrido viu a sua vida suspensa de 2008 a 2012, quando se viu forçado a abandonar a sua habitação própria, sem qualquer culpa ou contribuição para o dano da sua parte, e com muito sofrimento, sendo que logo que a intervenção terminou, em 2012, e que os danos provocados no prédio foram reparados pelo empreiteiro C…………, (ponto P dos factos provados) regressou ao seu prédio para nele voltar a habitar como até aí, retomando assim a qualidade de vida que lhe foi retirada pela recorrente, durante mais de 4 anos.
25. Não se provou que tenha havido qualquer incremento no lucro auferido pelo autor na sequência da reabilitação operada; não se provou que tenha advindo um benefício para o autor que suplantasse a desvantagem que sofreu durante mais de 4 anos. Neste caso concreto, é notório que existe um sacrifício juridicamente tutelável e compensável, conforme decidido pelo TCAN, e que houve uma verdadeira ruptura com a igualdade na repartição dos encargos públicos, a justificar a intervenção restauradora da indemnização. Foi o recorrido/autor tratado de forma diferente face ao que era igual (desde logo falhando o seu realojamento, que se impunha) violando-se o princípio da igualdade a que a Administração Pública está vinculada na sua atuação (cfr. o artigo 266/2 da CRP).
26. Se a responsabilidade por factos lícitos tem o seu fundamento no princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos, e se nela se desvaloriza a ocorrência de danos generalizados e de pequena gravidade, não há justificação para que, além deste, haja outro factor limitativo da indemnização de danos, os quais são inequivocamente graves e incidem desigualmente sobre certos cidadãos, por só abrangerem um indivíduo ou um grupo restrito de indivíduos.
27. Não passou o recorrido a beneficiar mais da reabilitação do ......... face aos outros moradores que foram realojados, pelo contrário, não só se viu obrigado a custear a expensas próprias o seu realojamento - comprovadamente necessário durante os 4 anos de obras – ao contrário dos demais, como se aqueles puderam passar a arrendar as suas frações, força da intervenção urbanística, quanto ao recorrido não pode afirmar-se que este passou a fazê-lo, mas antes, retomou o que se viu impedido durante mais de 4 anos de intervenção das recorrentes a fazer, ou seja, retomou o arrendamento das mesmas frações que anteriormente à intervenção das recorrentes já arrendava, em termos semelhantes ao que fazia antes da intervenção, não tendo sido feita qualquer prova no sentido que, por exemplo, tenha passado a arrendar as mesmas frações a valores superiores ao passado, fruto da intervenção urbanística, nem nenhuma prova foi feita pela recorrente do sentido do benefício concreto do recorrido decorrente das obras de reabilitação do edificado no ..........
28. As particularidades deste caso evidenciam um dano especial e anormal indemnizável, sendo cristalino que o recorrido sofreu danos especiais, anormais e inequivocamente graves pela sua importância, peso, lesão intolerável numa perspectiva de solidariedade de sacrifícios, e que houve violação do gozo “standard” do imóvel. Bastava a recorrente ter cuidado do realojamento temporário do recorrido, como fez com os demais moradores, para não ter agora de suportar os custos do realojamento do recorrido. Contrariamente à ideia defendida por parte do recorrente, in casu, subsiste inequivocamente um prejuízo especial na medida em que o dano ocorrido se verificou exclusivamente na esfera patrimonial do autor e o sacrifício por si sofrido, em prol do interesse geral, não foi repartido ou assumido pelos demais cidadãos. Do mesmo passo é inexorável considerar que o autor sofreu um prejuízo anormal, sendo o carácter anormal determinado igualmente pela dimensão do prejuízo sofrido pelo recorrido, tendo-se apurado que a mesmo em nada contribuiu para a sua verificação, e em momento algum foi alegada e muito menos ainda demonstrada qualquer responsabilidade (ou culpa) do recorrido para o sucedido.
29. Quanto ao montante indemnizatório fixado, posto agora em causa pela recorrente, o Tribunal Central Administrativo Norte pronuncia-se a esse respeito de forma clara e precisa, existindo qualquer razão ou fundamento legal válido, para nos afastarmos do decidido que se mostra muito equilibrado e justo, não existindo qualquer disposição legal aplicável ao caso dos autos que permita de alguma forma limitar o valor indemnizatório que foi apurado no processo.
30. Na fixação da obrigação de indemnizar têm que se aplicar os princípios dos artigos 562º, 563º e 564º do Código Civil, decorrendo do art. 3º, nº 3 do RCEE que a responsabilidade prevista na presente lei compreende os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os já produzidos e os danos futuros, nos termos gerais de direito. Não há assim razão para que o dano, uma vez qualificado como especial e anormal, possa ser reduzido por razões de interesse público, uma vez que as regras de delimitação de quantificação do dano são as regras gerais. O art. 3º do RCEE consagra a teoria da diferença, segundo a qual o lesado deve ver reconstituída a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, assim se determinando, portanto, que o dano (desde que bastante para desencadear a obrigação de indemnizar) deva ser reparado integralmente.
31. O nosso legislador exige, no artigo 2º do RCEE, a existência de um dano ou encargo especial e anormal como pressuposto de aplicação do regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, o que não significa qualquer restrição aos danos ressarcíveis, o que significa que os lucros cessantes (perda das rendas) são indemnizáveis. A esse respeito, veja-se o acórdão do TCAS, de 11.04.2013, no Proc. nº 06958/10, in www.dgsi.pt, que decidiu: “A indemnização por facto lícito de gestão pública inclui os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucros cessantes)”. No mesmo sentido, os acórdãos do mesmo tribunal de 04.10.2012 no Proc. nº 05204/09, de 01.03.2012, no Proc. nº 07528/11 e de 15.04.2010 no Proc. nº 02065/06, que confirmam decisões condenatórias de indemnizações por lucros cessantes e igualmente o acórdão do STA de 28.02.2012 no Proc. nº 01077/11, todos in www.dgsi.pt.
32. As regras enunciadas no RCEE relativamente à obrigação de indemnizar apresentam identidade com as sobreditas normas do Código Civil, prescrevendo o artigo 3.º desse regime que quem esteja obrigado a reparar um dano, segundo o disposto na presente lei, deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, mais precisando expressamente que a responsabilidade prevista na presente lei compreende os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os danos já produzidos e os danos futuros, nos termos gerais de direito.
33. Não há uma verdadeira relação de especialidade do artigo 16º RCEE relativamente ao artigo 3º do RCEE, no sentido de que o primeiro consagraria uma exceção à regra estabelecida no segundo, prevendo um dever de indemnizar enfraquecido como limite à extensão do dever de indemnizar (para além dos limites já expressos na norma no que diz respeito à especialidade e à anormalidade dos danos). Com efeito, uma limitação com tal importância e mexendo com “a dignidade constitucional do fenómeno reparatório”, como refere Gomes Canotilho, reclamaria do legislador uma acrescida responsabilidade pela adequada expressão literal, por exemplo, fazendo uso da fórmula patenteada em outras normas do RCEE como é o caso do artigo 15º, nº 5. Aliás, o recurso à decisão por equidade só deve aceitar-se quando resulte expresso na lei e já não quando dela possa ser extraído em limite de esforço hermenêutico.
34. Mesmo no apuramento de uma mera compensação equitativa destinada a repor a igualdade dos cidadãos na repartição de encargos públicos, a exclusão para esse efeito dos lucros cessantes será um ponto de partida errado para alcançar uma verdadeira e plena igualdade, conforme referido por Gomes Canotilho, Fausto Quadros e Pedro Machete. Há que atender a danos emergentes e a lucros cessantes (v. art. 3º), apurados uns e outros – até para se poder concluir sobre a sua especialidade e anormalidade (“pressupostos-travão” expressos no artigo 16º RCEE) –, haverá então que calcular a indemnização nos termos dos artigos 562º, 563º e 564º do Código Civil.
35. Por outro lado, importa considerar que as situações de facto abrangidas na previsão do artigo 16º RCEE, na sua patente diversidade, ainda que pelo grau de compressão dos direitos ou interesses implicados possam em alguns casos justificar simples “compensações”, não excluem em outros casos a exigência de indemnizações verdadeiramente reparatórias, existindo danos causados por factos lícitos causadores de danos especiais e anormais relativamente aos quais a indemnização não pode deixar de ser estabelecida por apelo direto ao critério da reparação integral estabelecido no artigo 3º do RCEE, como é a situação do caso em apreço, que deve conduzir à reposição do património e à reparação dos demais prejuízos tipicamente conexos com a atuação lícita lesiva, nos precisos termos atribuídos pelo Tribunal Central Administrativo Norte. Afigura-se-nos que em situações como a presente a indemnização deve ser reparatória, não desprezando lucros cessantes e contemplando igualmente danos morais, uma vez demonstrada a existência de uns e outros e a sua especialidade e a normalidade.
36. De uma outra perspetiva, mesmo no plano de uma decisão por equidade, esta não pode, por natureza, ficar à partida limitada por soluções pré-fixadas em abstrato. Pelo contrário, se a solução indemnizatória comum instituída no sistema legislado contempla a indemnização de lucros cessantes, a haver lugar à fixação do quantum indemnizatório por recurso à equidade, não deve tal decisão alhear-se dos critérios do sistema que devem ter-se como auxiliares para encontrar a solução equitativa.
37. O TCAN reconheceu ao recorrido/autor o direito a juros de mora desde a citação da ré, por força do disposto no art. 805º, nº 3, do Código Civil, aplicável por interpretação extensiva. O facto do art. 805º, nº 3, não aludir expressamente à responsabilidade por facto lícito é explicável pela sua residual e assistemática aparição no Código Civil. O que verdadeiramente importa é ver se a ratio do regime instituído pela norma para os casos de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco é transponível para as situações de responsabilidade por actos lícitos, e essa transposição é imperiosa, pois todos esses tipos de responsabilidade, enquanto prossecutores do mesmo, que é a reparação de um qualquer dano apurado, hão-de fazê-lo de igual modo, ou seja, através de um modo que, por sua vez, considere o incremento trazido ao dano pelo atraso em repará-lo. Tudo indica, portanto, que o legislador, ao abster-se de referir no art. 805º, nº 2, do Código Civil a responsabilidade por actos lícitos, minus dixit quam voluit, ou seja, não podem restar dúvidas que a letra da lei ficou aquém do seu espírito, que o legislador disse menos do que queria e, por isso, há que dar à letra da lei um alcance conforme ao pensamento legislativo, o que legitima e impõe que tal norma seja extensivamente interpretada por forma a abranger ainda esse tipo de responsabilidade – como este Supremo, aliás, já decidiu, vide os acórdãos de 15/1/2013 e de 18/6/2015 proferidos, respectivamente, nos procs. nºs 610/12 e 1314/13, in www.dgsi.pt. No mesmo sentido, o acórdão proferido no processo 597/05.9BELRS 0861/17 de 11/21/2019, que decidiu “ O art. 805º nº 3 do Código Civil deve ser interpretado por forma a abranger a responsabilidade por actos lícitos”.
38. A quantia peticionada pelo recorrido que foi reconhecida pelo Tribunal Central Administrativo Norte é líquida, devendo ser pago ao autor/recorrido o montante de 2.835,73€, correspondente à mudança para a Rua .........; as rendas pagas entre setembro de 2008 até 29 de Dezembro de 2012 no locado arrendado na Rua .........; as rendas que deixou de receber desde Junho de 2008 a dezembro de 2012, relativos ao 2º andar do prédio sito ao Largo dos ........., bem como 5.000,00€ a título de danos não patrimoniais, e ao valor da indemnização acrescem juros de mora contabilizados desde a citação da Ré Porto Vivo e até integral pagamento, em conformidade com o estipulado nos artºs. 559, nº 1, 566º, nº 2 e 805º, nº 3 do CC e 661º do CPC.
39. A interveniente, B............, Lda., foi chamada pela Ré Porto Vivo SRU., e admitida a intervir nos autos no âmbito do incidente de intervenção acessória provocada, tendo em vista o exercício de direito de regresso contra o empreiteiro, invocado como fundamento para o chamamento por parte da entidade pública, nos termos do art. 321º do CPC.
40. A intervenção acessória visa impor ao chamado os efeitos do caso julgado da ação, de modo a que não seja possível (nem necessário), que na subsequente ação de regresso que vier a ser proposta pela Ré contra o chamado se voltem a discutir as questões já decididas no anterior processo enquanto elemento condicionante ou prejudicial da existência do direito de regresso ou indemnização, ou seja, os pressupostos concernentes à existência e ao conteúdo do direito a indemnização da titularidade do autor, pois apesar de a sentença final proferida não apreciar a ação de regresso, constitui caso julgado quanto às questões de que dependa o direito de regresso do autor do chamamento.
41. Uma análise cuidada da douta decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo do Norte revela que a mesma, pela sua coerência, justiça, equilíbrio, bom-senso e boa aplicação do direito ao caso concreto, em cumprimento dos artigos 2º e 16º do RCEE, 483º nº 2, 562º, 563º, 566º, 805º nº 3 do Código Civil, 2º, 9º, 13º, 22º, 25º, nº 1, 26º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, artigo 24º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e artigo 8º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, não merece o mínimo reparo e deverá manter-se na íntegra.»
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O “recurso de revista” foi admitido por acórdão deste STA [formação a que alude o nº 6 do artº 150º do CPTA], proferido em 24 de Junho de 2021].
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O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 146º, nº 1 e 147º do CPTA, pronunciou-se no sentido da procedência de ambos os recursos.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. MATÉRIA DE FACTO
Mostram-se provados os seguintes factos:
A. O Autor é possuidor e legítimo proprietário de prédio urbano, composto de casa com seis pavimentos com dependência, sito no Largo dos ........., …/…, freguesia da Sé, Município do Porto, descrito na conservatória do registo predial sob o número ……… e inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo …… – cfr. documento 1 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
B. A entidade demandada tem por objeto a promoção da reabilitação e reconversão do património degradado da área crítica de recuperação e reconversão urbanística do concelho do Porto, definida no Decreto-regulamentar nº 11/2000, de 24 de Agosto – cfr. documento de fls. 534 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
C. A 21 de Novembro de 2005, o Conselho de Administração da entidade demandada deliberou a definição de Unidade de Intervenção correspondente ao ........., tendo sido aprovado o documento estratégico constante de fls. 797 a 913 do processo físico;
D. No seguimento do documento estratégico aprovado pela entidade demandada, esta, após reunião de 31 de Agosto de 2007, deliberou expropriar com carácter de urgência e posse administrativa imediata, a parcela 36 do prédio indicado em A) e do qual o Autor era proprietário – cfr. documento 2 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
E. A decisão resultante da deliberação supra referida, foi comunicada ao Autor a 5 de Setembro de 2007 – cfr. documento 5 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
F. As obras realizadas no ......... interior do Largo das ......... tiveram o seu início em Março de 2008 – cfr. documento de fls. 926 e 928 do processo físico;
G. A realização das obras de demolição e obras urbanísticas no interior do ......... ficaram a cargo da empresa C…………, S.A., interveniente acessória nestes autos – facto não controvertido;
H. Após a realização das obras de demolição, as quais perduraram entre os meses de Março de 2008 e Maio de 2008, os trabalhos de execução da obra ficaram suspensos devidos aos trabalhos arqueológicos que tiveram a duração de cerca de um ano, após escavações que duraram, pelo menos, dois meses – cfr. documentos de fls. 928, 930 verso, 931, 933, 935 verso e 965 verso do processo físico e prova testemunhal;
I. O Autor solicitou, por diversas vezes, à entidade demandada, o realojamento da sua família na pendência da operação urbanística no interior do ......... – cfr. documento 12 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
J. O Autor, por diversas vezes, que transmitiu à entidade demandada as suas preocupações motivadas por questões de segurança da obra e do seu prédio, dada a natureza da operação urbanística em questão – cfr. documentos 12, 13, 14,15 e 18 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
K. A 29 de Fevereiro de 2008, o Autor celebrou com D…………, o que designaram de contrato de arrendamento para fim habitacional, o qual teve por objeto o prédio urbano sito na Rua ........., número ……, da freguesia de Massarelos, da cidade do Porto, tendo-se mudado para aquela moradia em Setembro de 2008 – cfr. documento 34 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal e por declarações de parte;
L. O Autor pagou uma renda mensal de valor correspondente a 500€ entre os meses de Março de 2008 até Fevereiro de 2010 e 600€ a partir de Março de 2010, até à data da sua saída, sendo que a sua mudança ocorreu em setembro de 2008;
M. O Autor realizou obras de remodelação e recuperação na moradia objeto do contrato de arrendamento supra referido – cfr. prova testemunhal e por declarações de parte;
N. O Autor suportou a quantia correspondente a 2.835,73€, com as mudanças para a moradia sita na Rua ......... – cfr. documento 52 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e prova testemunhal;
O. O Autor voltou a habitar o seu prédio sito no Largo dos ......... em Dezembro de 2012 – cfr. prova testemunhal e por declarações de parte;
P. Os danos provocados no prédio do Autor sito no Largo dos ........., com consequência direta da execução da empreitada em causa nos autos, foram reparados pela interveniente acessória – facto confessado;
Q. Durante o período que o Autor esteve a residir na moradia sita na Rua ........., teve de mudar os seus hábitos e rotinas diárias; - prova testemunhal e por declarações de parte;
R. Durante aquele mesmo período, o Autor sentiu tristeza, desgosto e revolta – cfr. prova testemunhal e por declarações de parte;
S. A 29 de Julho de 2005, o Autor e a sociedade E…………, LDA., celebraram um contrato que designaram de contrato de arrendamento comercial, o qual tinha por objeto o primeiro andar traseiras do prédio urbano sito no Largo dos ........., número …… e ……, da freguesia da Sé, da cidade do Porto, propriedade do Autor, e pelo período de um ano prorrogável por períodos de igual duração – cfr. documento de fls. 88 a 90 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
T. A 29 de Julho de 2005, o Autor e a sociedade F………… SL, celebraram um contrato que designaram de contrato de arrendamento comercial, o qual tinha por objeto o rés-do-chão do prédio urbano sito no Largo dos ........., números …… e ……, da freguesia da Sé na cidade do Porto, propriedade do Autor, pelo período de um ano e prorrogável sucessivamente por períodos de igual duração – cfr. documento de fls. 100 a 102 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
U. A 1 de Abril de 2004, o Autor celebrou com G………… e H…………, o que designaram de “Contrato de Arrendamento”, o qual tinha por objeto o prédio urbano sito no Largo dos ........., número …… e ……, da freguesia da Sé, na cidade do Porto, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 30º e descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número ……, com a duração de seis meses prorrogável por períodos de igual duração e mediante o pagamento de renda mensal no valor de 450,00€ – cfr. documento 43 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
V. A 8 de Janeiro de 2008, os arrendatários indicados em U), comunicaram ao Autor que transmitiram a sua posição de arrendatário à sociedade I………… – Sociedade de Solicitadores, R.L. – cfr. documento 44 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
W. A 29 de Maio de 2008, a sociedade I………… – Sociedade de Solicitadores, RL, comunicou ao Autor o seguinte:
Vimos por este meio resolver o contrato de arrendamento celebrado com V. Exª, relativo ao segundo andar do imóvel sito no Largo dos ........., ……/……, nesta cidade do Porto (…)
Com efeito, ainda que involuntariamente e inconscientemente, encontra-se V. Exª em incumprimento contratual, uma vez que não está a assegurar o gozo da coisa locada para os fins a que destina (…)
Encontra-se em curso, já há algum tempo, as obras respeitantes ao Projeto de Intervenção do ........., da responsabilidade da Porto Vivo, S.R.U. – Sociedade de Reabilitação Urbana, S.A.
Obras essas a decorrer nas traseiras do arrendado.
Os ruídos e as poeiras resultantes das demolições já efetuadas, resultaram na deslocação de todos os colaboradores para a parte dianteira do edifício.
Uma vez que, a atividade por nós desenvolvida, a qual se reveste de uma componente de exigência bastante elevada em termos intelectuais e de concentração, foi seriamente colocada em causa.
Atualmente, todos os colaboradores (num total de 7) ocupam a sala da frente do arrendado, encontrando-se a sala das traseiras desocupada.
As obras já realizadas, e de uma forma mais gravosa, as obras de perfuração projetadas, prejudicam cabalmente as nossas condições de trabalho e produtividade, impedindo-nos de alcançar um normal desempenho das nossas funções.
Até mesmo a segurança, bem como a integridade física dos nossos colaboradores poderá ser posta em causa com as obras que se avizinham, situação que não é salvaguardada pela entidade responsável pelas obras em discussão.(…)
Pelo exposto, e uma vez que não podemos gozar, de forma plena, do arrendado para os fins a que se destina, e que encontram contratualmente estabelecidos, é nosso entendimento existir fundamento de resolução do contrato de arrendamento existente.
Desta forma, a cessação do referido contrato ocorrerá no próximo dia 30 de Junho de 2008, data em que será o arrendado entregue livre de pessoas e bens.” - cfr. documento de fls. 335 e 336 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
X. Os habitantes de parcelas diretamente intervencionadas pela entidade demandada e pela C………… foram realojados – facto não controvertido;
Y. O Arquiteto J………… saiu da sua habitação sita no Largo dos ......... no decurso das obras, tendo, no entanto, mantido o seu escritório de arquitetura em atividade – cfr. prova testemunhal;
Z. O Banco ………… sito no Largo dos ......... manteve-se em atividade no período em que se realizaram as obras – cfr. prova testemunhal;
AA. Outros serviços, como cabeleireiros e cafés, mantiveram-se em atividade no período em que se realizaram as obras – cfr. prova testemunhal;
BB. Foram registados constrangimentos nas parcelas contíguas à obra executada pela entidade demandada e pela C………… designadamente infiltrações, fissuras e humidade – cfr. prova testemunhal;
CC. Foram, do mesmo modo, registados constrangimentos e queixas relacionados com o ruído e o pó causado pela obra executada pela entidade demandada e pela C………… – cfr. prova testemunhal;
DD. A 25 de Maio de 2008 a Polícia de Segurança Pública elaborou auto de notícia, no seguimento de participação efetuada pelo Autor, na qual consta o seguinte:
(…) No local contactei o participante, o qual informou-me que, desde a altura em que o antigo palácio das ......... entrou em obras de demolição do interior do ........., que todos os dias vários meliantes se deslocaram para aquele local a fim de furtar cobre e alumínio, sendo que já tentou contactar a empresa que é proprietário do edifício, da qual este apenas sabe que tem o nome de #............# (…)
Pelos factos atrás narrados, desloquei-me ao referido edifício, sendo-me possível verificar que no n.º ……, o portão que ali se encontra, o qual dá acesso ao Palácio e a um outro edifício, se encontra aberto, pelo que entrei e verifiquei que o suspeito atrás mencionado se encontrava naquele local, preparando-se para furtar cobre e alumínio, pelo que me imediato abordei, tendo este me informado que era a primeira vez que ali se deslocava, para furtar cobre. (…)” - cfr. documento 23 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
EE. A 20 de Junho de 2008, mediante carta remetida ao Presidente do Conselho de Administração da entidade demandada, o Autor expôs a sua preocupação em relação a alegadas tentativas de intrusão no seu prédio sito no Largo dos ......... – cfr. documento 22 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido”.
Factos não Provados
1. Devido à intervenção dos demandados no interior do ........., designadamente nas parcelas ...... e ......, contíguas ao prédio do Autor, e por estas obras colocarem em risco a segurança do edifício e a própria integridade física dos seus habitantes, o Autor viu-se forçado a mudar de residência e arrendar uma habitação para realojamento da sua família na Rua (...);
(…)
3. Devido à intervenção dos demandados no interior do ........., designadamente nas parcelas ...... e ......, contíguas ao prédio do Autor, geraram uma perda de rendimento ao Autor e do seu agregado familiar, o que motivou a contrair dois empréstimos bancários nos anos de 2008 e 2012, num montante global de 60.945,97 euros;
4. Devido à intervenção dos demandados no interior do ........., designadamente nas parcelas ...... e ......, contíguas ao prédio do Autor, este teve de dilatar pelo período de 20 anos, o pagamento dos empréstimos bancários contraídos nos anos de 1999 e 2000;
5. A fachada de tardoz do prédio do Autor sito no Largo dos ........., não foi reposta pelos Demandados;
6. A operação urbanística em causa nos autos, em concreto a execução da empreitada, não observou as regras e normas de segurança aplicáveis;”
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2.2. O DIREITO
A............, intentou no TAF do Porto, acção administrativa comum, contra Porto Vivo e viu deferido o incidente do chamamento da “B............, S.A.” a título de intervenção acessória provocada nos termos do disposto nos artºs 321º a 324º da actual redacção do CPC/2013 – cfr. despacho proferido nos autos em 08/07/2013 - tendo o TAF julgado a acção totalmente improcedente.
Em sede de recurso de apelação, o TCA Norte veio a conceder parcial provimento ao recurso e condenar a Ré e a interveniente acessória B............, Ldª, no seguinte:
a) No pagamento ao Autor, aqui Recorrente de 2.835,73€ correspondente à mudança para a Rua .........;
b) No pagamento às rendas pagas entre setembro de 2008 até 29 de Dezembro de 2012 no locado arrendado na Rua .........;
c) No pagamento das rendas que o Recorrente deixou de receber, desde Junho de 2008 a Dezembro de 2012, relativos ao 2.º andar do prédio sito ao Largo dos .........;
d) No pagamento de 5.000€ a título de danos não patrimoniais;
e) Acrescem aos referidos valores, os juros de mora desde a citação até integral pagamento;
f) Improcede o pedido relativo ao “atraso na Justiça
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Face a esta condenação, importa analisar em primeiro (1º) lugar o recurso interposto pela recorrente, interveniente acessória, B............, Ldª.
E isto, porque no âmbito do incidente de intervenção acessória, a recorrente nunca poderia ser condenada a título principal juntamente com o Réu, atento o disposto no nº 4 do artº 323º do CPC que expressamente prevê: “A sentença proferida constitui caso julgado quanto ao chamado, nos termos previstos no artº 332º, relativamente às questões de que dependa o direito de regresso do autor do chamamento, por este invocável em ulterior ação de indemnização”.
Com efeito, o interveniente acessório não é parte [interveniente principal] no processo, pelo que procedendo a acção, este nunca pode vir a ser condenado a título principal, mas apenas numa eventual acção de regresso que venha a ser intentada pelo Réu e desde que se mostrem reunidos os requisitos legais.
Ou seja, a intervenção acessória apenas visa impor ao chamado os efeitos do caso julgado da acção, de forma a que não seja possível (nem necessário) que na subsequente acção de regresso que vier a ser proposta pelo réu contra o chamado se voltem a discutir as questões já decididas no anterior processo enquanto elemento condicionante da existência de direito de regresso ou indemnização [os pressupostos referentes à existência e ao conteúdo do direito a indemnização da titularidade do autor].
Daí que, na intervenção acessória, o terceiro é chamado a assumir na lide uma posição com estatuto de assistente (art.º 323º, nº 1 do CPC) e, por isso, a sua intervenção circunscreve-se à discussão das questões que tenham repercussão na acção de regresso invocada como fundamento do chamamento (art.º 321º, nº 2 do CPC) e a sentença final não podendo apreciar a acção de regresso, constitui caso julgado relativamente às questões de que dependa o direito de regresso do autor do chamamento, com as limitações do art.º 323, nº 3 do CPC).
Procede, pois, o recurso interposto pela recorrente/interveniente acessória, com a fundamentação supra exposta, revogando-se o acórdão recorrido no decidido quanto a esta nos pedidos em que foi condenado e ficando deste modo prejudicado o conhecimento das nulidades pelo mesmo imputadas ao acórdão recorrido.
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Vejamos agora do acerto do acórdão recorrido, no que concerne ao recurso interposto pelo Réu “Porto Vivo”.
O acórdão recorrido, revogando a sentença de 1ª instância, que havia julgado a acção totalmente improcedente, julgou verificados todos os requisitos previstos no artº 16º da Lei nº 67/2007 de 31.12 que aprovou o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, que prevê a indemnização pelo sacrifício, dispondo: “O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público indemnizam os particulares a quem, por razões de interesse público, imponham encargos ou causem danos especiais e anormais, devendo, para o cálculo da indemnização, atender-se, designadamente, ao grau de afectação do conteúdo substancial do direito ou interesse violado ou sacrificado”.
Resulta do exposto que os pressupostos em que assenta esta responsabilidade civil do Estado, por factos lícitos, são os seguintes:
(i) a prática de um acto lícito;
(ii) para satisfação de um interesse público;
(iii) causador de um prejuízo "especial" e "anormal";
(iv) existência de nexo de causalidade entre o acto e o prejuízo.
E entende-se por prejuízo especial aquele que não é imposto à generalidade das pessoas, mas a pessoa certa e determinada em função de uma relativa posição específica; e por prejuízo anormal o que não é inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos, ultrapassando os limites impostos pelo dever de suportar a actividade lícita da Administração” - (cfr. acórdão do STA de 01.12.04, in proc. nº 0670/04).
Como refere António Dias Garcia, in: “Da Responsabilidade Civil Objectiva do Estado e Demais Entidades Públicas”, na compilação coordenada por Fausto Quadros, Responsabilidade Civil Extracontratual da Administração Pública, 2ª edição, pág. 208 “... para que um prejuízo se possa ter como especial é necessário que se prove que um cidadão ou grupo de cidadãos, tenha sido, através de um encargo público, colocado em situação desigual em relação à generalidade das pessoas. Assim, o sacrifício será especial na medida em que viole o princípio da igualdade, a que a Administração Pública está vinculada na sua actuação (cfr. artigo 266º nº 2 da CRP).
É também o que resulta da jurisprudência dos Tribunais Superiores, designadamente deste Supremo Tribunal, já desde a vigência do DL nº 48051 de 21.11.1967.
Assim, a especialidade do dano decorre do desigual tratamento, que apenas atinge um ou alguns, no sentido de violar o princípio da igualdade, e a anormalidade resulta da sua gravidade intrínseca, não assimilável à normal compressão de direitos ou à imposição de pequenos encargos que a actividade administrativa e a vida em sociedade naturalmente comportam.
Trata-se, pois, de um dever de indemnizar que surge à margem de qualquer ilicitude ou censura jurídica, enquadrando-se apenas e só na circunstância de ter sido imposto ao administrado, em nome do interesse público, um sacrifício que ultrapassa os encargos normais da vida em sociedade ou de um sacrifício considerado grave e especial.
A nível da doutrina, refere o Prof. Gomes Canotilho, “O Problema da Responsabilidade do Estado por Actos Lícitos”, pág. 282/283: «(…) a exigência da anormalidade outra função não tem que salientar a importância, o peso que o sacrifício deverá ter para lhe ser atribuída relevância indemnizatória. Ora, a anormalidade do dano, de acordo com o já exposto, não pode nem deve substituir a necessidade da especialidade do prejuízo. Caso contrário, mesmo os danos generalizados de excepcional gravidade mereceriam tutela reparatória já que, sendo anormais, eram, ipso facto, especiais.
A ideia da exigência destes dois requisitos na responsabilidade objectiva só pode fundar-se na necessidade de um duplo travão ou limite: 1) – evitar a sobrecarga do tesouro público, limitando o reconhecimento de um dever indemnizatório do Estado ao caso de danos inequivocamente graves. 2) – procurar ressarcir os danos que, sendo graves, incidiram, desigualmente sobre certos cidadãos.
Introduzem-se, assim, dois momentos perfeitamente diferenciáveis: em primeiro lugar, saber se um cidadão ou grupo de cidadãos foi, através dum encargo público, colocado em situação desigual aos outros; em segundo lugar, constatar se o ónus especial tem gravidade suficiente para ser considerado sacrifício.»
É, assim, fundamento deste tipo de responsabilidade civil extracontratual o princípio da igualdade dos cidadãos na repartição dos encargos públicos, ou seja, a igualdade de contribuição dos cidadãos no suporte daqueles encargos. Por isso, se exige um prejuízo “especial”, não imposto à generalidade das pessoas, mas a pessoa certa e determinada em função de uma específica posição relativa. E “anormal”, no sentido de não inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados pela generalidade dos cidadãos.
Estarão, pois, afastados deste direito indemnizatório os danos gerais, normais ou comuns, ou seja, aqueles que recaem sobre a generalidade dos cidadãos, ou sobre grupos indeterminados e abstratos de pessoas, e que são considerados normais e inerentes ao risco próprio da vida em sociedade, constituindo como que “encargos sociais compensados por vantagens de outra ordem proporcionadas pela actuação da máquina estatal” (cfr. entre muitos outros, o Ac. deste STA de 10.10.2002, in rec. 048404, e os demais nele citados, bem como os Acs. de 02.12.2004, proc. 0670/04).
Revertendo ao caso dos autos, podemos desde já afirmar que resulta claro que os “danos” dados como provados não podem considerar-se anormais e especiais, pois não configuram um sacrifício tal que pela sua importância ultrapasse o ónus decorrente da vida em sociedade, impossibilitando o gozo normal do direito de propriedade do autor, o que veremos de forma discriminada em relação a cada dano invocado.
Em concreto, depois da enumeração do quadro legal aplicável aos autos, sustentou-se no acórdão recorrido:
«Em face do que precede, mostram-se claramente preenchidos os referidos pressupostos relativamente à situação do Autor, aqui Recorrente e do seu agregado familiar, pois que não é suposto que ninguém abandone casa própria que detém, para um arrendado, cerca de 4 anos se não houvesse razões especiais e anormais que o justificassem, pois que a realização de obras profundas, com diversas demolições em zona, nomeadamente, adjacente ao seu prédio mostra-se impeditiva de uma vivência quotidiana com um mínimo de qualidade.
A sentença ora recorrida embora tenha admitido a existência de danos, entendeu que o aqui Recorrente se antecipou relativamente à verificação dos danos em concreto, o que terá comprometido a atribuição de indemnização.
O que é facto é que o Recorrente teve de arrendar uma outra habitação uma vez que não teria condições de permanecer no local durante o período em que seriam realizadas as obras, sendo que, ao contrário de outros residentes no local, não foi realojado, ainda que o tenha requerido, não obstante, em termos indemnizatórios, sempre relevar apenas o período em que efetivamente não ocupou a sua residência.
Não acompanhamos o entendimento de que o aqui Recorrente teria de aguardar pela efetivação do risco decorrente das demolições que se iriam realizar para que então sim, estivessem plenamente preenchidos os pressupostos da Responsabilidade Civil.
Independentemente da data em que foi assinado o contrato de arrendamento da residência “alternativa”, como se disse, o que releva em termos indemnizatórios é o facto do agregado familiar do Recorrente se ter mudado para o locado em setembro de 2008, como resulta, aliás, do facto provado K).
Estão provados os danos reclamados no seu prédio, como decorre dos factos Provados infra transcritos, fixados em 1ª instância:
“BB. Foram registados constrangimentos nas parcelas contíguas à obra executada pela Entidade Demandada e pela L., designadamente infiltrações, fissuras e humidade;”
“CC. Foram, do mesmo modo, registados constrangimentos e queixas relacionados com o ruído e pó causado pela obra executada pela Entidade Demandada e pela L.;”
Quanto às questões de segurança, refere-se nos factos Provados DD e EE, o seguinte:
“DD. A 25 de Maio de 2008 a Polícia de Segurança Pública elaborou auto de notícia, no seguimento de participação efetuada pelo Autor, na qual consta o seguinte (...) no local contactei o participante, o qual informou-me que desde a altura em que o antigo palácio das (...) entrou em obras de demolição do interior do ........., que todos os dias vários meliantes se deslocaram para aquele local a fim de furtar cobre e alumínio (...) desloquei-me ao referido edifício, sendo-me possível verificar que no n.º 33, o portão que ali se encontra, o qual dá acesso ao Palácio e a um outro edifício, se encontra aberto, pelo que entrei e verifiquei que o suspeito atrás mencionado se encontrava naquele local, preparando-se para furtar cobre e alumínio (...)”
“EE. A 20 de Junho de 2008, mediante carta remetida ao Presidente do Conselho de Administração da Entidade Demandada, o Autor expôs a sua preocupação em relação a alegadas tentativas de intrusão no seu prédio sito no Largo dos ......... - cfr. documento 22 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.”
Não é suposto que um qualquer agregado familiar esteja obrigado a residir praticamente num estaleiro de obra, paredes meias com uma demolição de edificado, sendo que se viu obrigado a residir fora da sua casa cerca de 4 anos, desde setembro de 2008, até ao seu regresso em Dezembro de 2012.
Consta incontornavelmente do facto provado P) que “Os danos provocados no prédio do Autor sito no Largo dos ........., com consequência direta da execução da empreitada em causa nos autos, foram reparados pela interveniente acessória facto confessado”
Se foram reparados, é por que efetivamente houve danos, designadamente, a queda do estuque do teto de um dos quartos, o que denota a impossibilidade de permanência no prédio.
O Tribunal de 1ª instância reconheceu até, no facto R, que “Durante aquele mesmo período, o Autor sentiu tristeza, desgosto e revolta”.
De facto independentemente da necessidade de realizar as obras levadas a cabo no ......... intervencionado, os particulares não estão sujeitos ao dever de em nome do interesse público, suportar exclusivamente lesões dos seus direitos ou suportar sacrifícios em nome do bem comum.
O direito ao repouso e à tranquilidade, constituindo uma imanação dos direitos fundamentais de personalidade, constitucionalmente tutelados, é superior ao direito das Recorridas que sempre deveriam ter cuidado de mitigar os danos sofridos pelo agregado familiar do Recorrente, de modo a que os níveis de conforto habitacional pudessem ser assegurados, ainda que por recurso ao realojamento temporário.
Desde logo, a Declaração Universal dos Direitos do Homem realça que toda a pessoa tem direito ao repouso (artigo 24º), acrescentando a Convenção Europeia dos Direitos do Homem que qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar (artigo 8º, n.º 1), explicitando-se que os ruídos e outras perturbações que causem danos no domicílio e afetem o bem-estar físico do indivíduo, atingem a sua vida privada.
(…)
Em concreto, é patente que as obras efetuadas no referido ........., sempre perturbariam a vivência quotidiana do agregado familiar do Recorrente, pondo em causa, nomeadamente, o direito ao repouso, à tranquilidade, enquanto aspetos do direito à integridade pessoal (artigo 25º, n.º 1 da CRP), que faz parte do elenco dos direitos fundamentais, do acervo de direitos análogos às liberdades e garantias pessoais.
Estes direitos de personalidade são assim protegidos contra qualquer ofensa licita ou ilícita, não sendo precisa a culpa para se verificar uma ofensa, nem sendo necessária a intenção de prejudicar o ofendido, pois decisiva é a ofensa em si.
Já quanto ao locatário do Recorrente, que ocupava o 2º andar do prédio sito no Largo dos ........., ……/……, é patente que a rescisão do arrendamento resultou igualmente das obras, como decorre, aliás, do Facto Provado W, fixado em 1ª Instância:
W. A 29 de Maio de 2008, a sociedade I………… – Sociedade de Solicitadores, RL, comunicou ao Autor o seguinte:
“Vimos por este meio resolver o contrato de arrendamento celebrado com V. Exa., relativo ao segundo andar do imóvel sito no Largo dos ........., ……/……, nesta cidade do Porto (…)
Com efeito, ainda que involuntariamente e inconscientemente, encontra-se V. Exa. em incumprimento contratual, uma vez que não está a assegurar o gozo da coisa locada para os fins a que destina (…)
Encontra-se em curso, já há algum tempo, as obras respeitantes ao Projeto de Intervenção do ........., da responsabilidade da Porto Vivo, S.R.U. – Sociedade de Reabilitação Urbana, S.A.
Obras essas a decorrer nas traseiras do arrendado.
Os ruídos e as poeiras resultantes das demolições já efetuadas, resultaram na deslocação de todos os colaboradores para a parte dianteira do edifício. (...)
É assim igualmente manifesto o nexo de causalidade entre as obras (facto lícito) e a saída dos inquilinos do 2º andar do prédio do Recorrente e consequente dano, resultante da perda das correspondentes rendas.
Mostra-se pois que as obras estruturais levadas a cabo no identificado ......... se consubstanciam num fato lícito, causador de danos anormais, determinando a impossibilidade da continuidade de habitação em condições aceitáveis no local.
Efetivamente não é suposto, nem aceitável que alguém seja “obrigado” a residir cerca de 4 anos em pleno estaleiro de obra sujeito a todas as trepidações e ruídos, resultantes, designadamente das demolições levadas a cabo no ......... urbanisticamente intervencionado, o que sempre constituiria uma situação danosa anormal, ainda que lícita.
Sem prejuízo do referido, não logrou o Recorrente fazer prova que tenha sido em decorrência dos factos e circunstâncias descritas que tenha tido necessidade de prorrogar o pagamento de empréstimos contraídos em 1999 e 2000 e a contrair novos empréstimos em 2008 e 2012.
(…)
Danos Não Patrimoniais/Morais
Vêm peticionados a título de danos morais 5.000€
Deu o tribunal a quo como provado (Facto R) que “Durante aquele mesmo período, o Autor sentiu tristeza, desgosto e revolta”
Nos termos do art.º 496º, nº 3, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em conta as circunstâncias referidas no art.º 494º do CC.
(…)
A quantia peticionada de 5.000€ a título de danos morais/não patrimoniais atenta a necessidade do Recorrente em manter todo o seu agregado familiar afastado da sua residência cerca de 4 anos mostra-se adequado para ressarcir os danos não patrimoniais verificados ao longo desse período.
A indemnização dos danos não patrimoniais é limitada àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496° do CC), medindo-se tal gravidade através de um padrão objetivo.
A ressarcibilidade dos danos não patrimoniais depende da gravidade dos mesmos, aferida por padrões objetivos e tendo em conta as circunstâncias do caso.
A indemnização por danos não patrimoniais tem uma natureza mista, visando por um lado reparar, mais do que indemnizar e por outro reprovar ou castigar a conduta do lesante.
Constituem danos não patrimoniais, relevantes para efeitos de reparação, nos termos do art° 496° do Código Civil, designadamente a dor sofrida pelo aqui Recorrente, em resultado do afastamento de casa de todo o seu agregado familiar por mais de 4 anos.
Na fixação da indemnização por danos não patrimoniais, há que atender pois, entre outros fatores, à culpa dos Réus (arts. 496º, nº 3, e 494º do Código Civil), a qual se consubstanciou no facto de não ter assegurado uma habitação alternativa para o Recorrente.
(…)
Neste enquadramento legal, cabe ao julgador, ao fixar a indemnização por tais danos, guiar-se por critérios de equidade, sendo que a gravidade daqueles danos há-de aferir-se por um padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias do caso) e não à luz de fatores subjetivos.
(…)
Na fixação da indemnização deve atender-se pois aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Tendo em linha de conta a responsabilidade dos Réus pelo ocorrido, justifica-se que o quantum indemnizatório fixado para os danos não patrimoniais atente na equidade, à luz dos critérios legalmente definidos nos artigos 494º e 496º, número 3 do Código Civil, entendendo-se como adequado e suficiente a atribuição dos peticionados 5.000€.
(…)».
Vejamos, atendendo unicamente à matéria de facto que foi julgada provada pelas instâncias e não a juízos conclusivos que não a têm como suporte e seguindo a ordem por que foram analisados no acórdão recorrido, tendo em consideração igualmente a alegação do autor em sede de petição inicial:
Alega o autor que é possuidor e legítimo proprietário de um prédio urbano composto de casa com seis pavimentos com dependência, sito no Largo dos ........., freguesia da Sé, município do Porto; mais concretamente, situado no ......... na cidade do Porto, o qual foi alvo de intervenção urbanística [reabilitação com vista à resolução dos problemas de degradação física e funcional no .........] a cargo da entidade demandada, sendo que, e por causa daquela mesma intervenção, foi expropriado numa parcela do prédio de que é proprietário [com carácter de urgência e posse administrativa imediata], a qual corresponde à parcela …… da Unidade de Intervenção do .......... Mais alega que, por conta da operação urbanística implementada no ......... [a qual ficou a cargo, na qualidade de empreiteira da obra, a sociedade B............], designadamente devido à intervenção nas parcelas ...... e ...... [da operação urbanística], contíguas ao seu prédio e na parcela 36 – e por estas colocarem em risco a segurança do edifício e a própria integridade física dos seus habitantes – sofreu danos e prejuízos de natureza diversa.
A saber:
· Queixas apresentadas pelos seus inquilinos [do segundo andar e rés-do chão], motivados pelo ruído e pó induzidos pelos trabalhos da obra, que levou, à saída dos inquilinos do segundo andar do local arrendado, o que comportou a perda de rendimento do seu agregado familiar; furtos no interior do prédio do Autor, devido à falta de condições de segurança do local;
· Danos materiais no seu prédio, mormente infiltrações de água, queda de estuque, fissuras nas paredes, quebra de vidros das janelas, [degradação material e funcional do prédio];
· Descaracterização do seu prédio, mormente ao nível da fachada de tardoz dos dois primeiros pisos do seu prédio, dado que a mesma não foi reposta conforme combinado quando do processo expropriativo;
· Realojamento forçado da sua família, que, em face da insegurança que sentia ao habitar no seu prédio durante a intervenção e as obras em questão, se viu obrigada a procurar outra habitação [também pela incapacidade da Entidade Demandada proceder ao seu realojamento];
· Gastos com a mudança para a casa sita em ........., designadamente em obras para tornar a casa habitável e transporte dos seus bens, dado que teve pouco tempo para encontrar uma habitação alternativa que satisfizesse as necessidades da sua família;
· Contracção de empréstimos bancários e, bem assim, renegociação de empréstimos já contraídos, para conseguir fazer face às despesas em que estava a incorrer com o realojamento forçado da sua família durante o período de intervenção e das obras no .........;
· A transformação do seu prédio, outrora classificado como estando em muito bom estado de conservação [estético, funcionamento e equipamento], num prédio degradado do ponto de vista material e funcional;
· Tristeza e desgosto sentidos pelo Autor e pela sua família, com verem a sua casa completamente danificada;
· Danos por si sofridos no que respeita, em concreto, às obras efectuadas na casa de ......... [assim com, quanto às rendas pagas durante os meses em que aí habitaram], às despesas contraídas com a mudança forçada, às despesas incorridas com a contracção de novos empréstimos e renegociação de outros créditos, à perda de rendimentos com a saída dos inquilinos do segundo andar, à reparação da fachada de tardoz do seu prédio e, por fim, ao ressarcimento dos danos não patrimoniais infligidos a si e à sua família.
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Quanto aos pedidos formulados pelo autor relativo à condenação de reposição da fachada do seu prédio, sito no Largo dos ........., ……, no estado em que se encontrava antes da intervenção no interior do ........., bem como quanto à reparação da laje da varanda do prédio, repondo-o no estado em que se encontrava, é manifesta a improcedência dos pedidos uma vez que não consta da matéria de facto provada que as mesmas não tenham sido repostas e reparadas (e tratando-se de factos constitutivos do direito alegado, era ao autor que competia prova-los).
Quanto à condenação da Ré/recorrente no pagamento das quantias referentes aos valores das rendas pagas pelo realojamento calculado desde 01.03.2008 até Dezembro de 2012, importa desde já ter em consideração que a decisão tomada pelo autor de arrendar outra casa e de fazer obras na mesma, não podem ser imputadas a quaisquer danos que se devam caracterizar como anormais ou especiais, de acordo com as definições supra enumeradas.
Com efeito, das alíneas F), G) e H) da factualidade provada apenas resulta que foram efectuadas obras de demolição e urbanísticas no interior do ........., sendo que as obras de demolição perduraram entre os meses de Março de 2008 a Maio de 2008 e os trabalhos de execução da obra ficaram suspensos devido aos trabalhos arqueológicos que tiveram a duração de cerca de um ano, após as escavações que duraram, pelo menos, dois meses; mais se provou que o autor celebrou contrato de arrendamento em 29.02.2008, mas que apenas se mudou para a casa arrendada em Setembro de 2008, ou seja, muito depois do início das obras no ......... onde possuía o prédio rústico e onde habitava.
Não resulta, pois, provado que tenha sido a intervenção dos demandantes no interior do ......... que tenha motivado a saída do autor (e respectivo agregado familiar) da casa que habitava, ou mesmo que tenha inviabilizado a sua manutenção na casa.
Igualmente se provou que os danos provocados no prédio do autor [que se desconhecem em concreto, uma vez que não se mostram provados], foram reparados pela interveniente acessória [cfr. al. P] e que foram registados constrangimentos nas parcelas contíguas à obra executada pela ora recorrida, designadamente fissuras, infiltrações e humidade e registados constrangimentos e queixas relacionados com o ruído [desconhecendo-se se este ruído violava os valores legais permitidos] e o pó que a obra causava [cfr. als. BB e CC].
Ora estes constrangimentos [que igualmente se desconhecem em termos de intensidade, grau e extensão] não podem de forma alguma ser considerados danos anormais ou especiais, nos termos do disposto no artº 16º da Lei nº 67/2007 de 31.12, não só porque, por um lado, não se apresentam como especiais, dado que se mantiveram em funcionamento, no local, outras actividades como se prova do teor das als Y), Z) e AA) da factualidade provada, e portanto, a ter havido incómodos ou constrangimentos, estes foram extensivos a mais pessoas que ali tinham a sua actividade comercial e profissional [que diga-se, alias, eram exercidas durante o dia, ou seja, presumivelmente durante o tempo em que as obras foram sendo executadas], antes se devendo considerar como “danos” ou riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos que habitavam ou trabalhavam naquele ........., pelo que também por este prisma está afastada a anormalidade dos danos.
Acresce além do mais, que os habitantes das parcelas directamente intervencionadas – parcelas ...... e ...... - pelas obras foram realojados [cfr. al. X) da factualidade provada], sendo que o prédio do autor não foi directamente intervencionado, pelo que, por esse motivo não houve necessidade de realojamento.
Mas mesmo não sendo directamente intervencionado, não deixou de beneficiar das obras de requalificação operadas no referido ..........
Temos, assim, por um lado que os constrangimentos sofridos pelo autor não foram unicamente sofridos por si ou pelo seu agregado familiar em especial, mas antes por todos quantos habitavam ou trabalhavam na zona intervencionada e, por outro lado, atendendo também à natureza da obra de requalificação, não podem ser considerados danos anormais, mas antes danos compagináveis com o risco de uma vida em sociedade, sendo que, para além dos mais, requalificaram a zona de forma a trazer uma mais-valia a quem ali vive, trabalha ou se desloca.
Acresce a tudo quanto se deixa exposto, que mesmo que assim não se caracterizassem estes incómodos, nunca resultaria provado o nexo de causalidade entre os alegados prejuízos relativos ao arrendamento de outra casa para viver, nem quanto às rendas pagas, nem quanto às obras ali realizadas, como aliás bem se refere na decisão proferida em 1ª instância.
Relativamente à alegada perda de rendimentos, que o autor alega que o levou a contrair dois empréstimos bancários em 1999 e 2000, também não resulta da matéria provada que tal tivesse havido qualquer relação causa-efeito com a obra de requalificação efectuada pela demandante, pelo que, também por falta do necessário nexo de causalidade, improcede este pedido de ressarcimento de danos.
No que respeita aos danos causados pela resolução do contrato de arrendamento a que se referem as als U), V) e W) da factualidade provada, motivada pelo ruído e poeira que se fazia sentir, importa ter em consideração, por um lado, que os funcionários que ali trabalhavam, não deixaram de o fazer porque se mudaram para a sala da frente do imóvel, e, por outro lado, também não se pode enquadrar esta resolução do contrato de arrendamento na definição dos danos especiais e anormais previsto no artº 16º da Lei nº 67/2007.
E isto, porque os constrangimentos da obra em causa foram impostos a uma generalidade de pessoas que residiam e tinham os seus locais de trabalho nas parcelas contíguas à obra, ao longo de todo o ........., pelo que este sacrifício não foi imposto apenas e unicamente ao autor; aliás, estabelecimentos houve que ali continuaram a laborar em horário diurno independentemente dos referidos constrangimentos.
O referido contrato de arrendamento que inicialmente foi celebrado com G………… e H…………, relativamente ao prédio urbano sito no Largo dos ......... nºs …… e ……, e que estes arrendatários cederam a sua posição contratual à Sociedade I…………, em 08 de Janeiro de 2008, tinha a duração de 6 meses, prorrogáveis por iguais períodos; Em 29 de Maio de 2008 a referida Sociedade comunicou ao autor que pretendia resolver o contrato com fundamento nas obras em causa, uma vez que estavam a perturbar o normal funcionamento e desenrolar da actividade ali desenvolvida – cfr. als U) e V) da factualidade assente.
Porém, pese embora ter sido invocado este fundamento, a verdade é resulta da missiva enviada ao autor, que os ruídos e poeiras resultantes das demolições já efectuadas não inviabilizaram o exercício da actividade, uma vez que os trabalhadores que se encontravam na parte traseira do prédio se deslocaram para a parte dianteira do mesmo.
Assim, o dano sofrido pelo autor, pela rescisão do contrato de arrendamento, pese embora os fundamentos dela constantes, não pode ser considerado como um dano anormal e especial, antes se inserindo nos constrangimentos impostos a todos os residentes/trabalhadores das parcelas contíguas à obra, independentemente da forma como cada uma dessas pessoas reagiu a esses constrangimentos.
De qualquer modo, mesmo que se considerasse este valor das rendas não recebidas como um prejuízo especial e anormal, nunca o autor poderia ser ressarcido por rendas não recebidas até Dezembro de 2012, uma vez que, o contrato de arrendamento foi celebrado por um prazo de 6 meses, renovável por iguais períodos e em Abril de 2008 renovou-se por igual período de tempo. Porém, inexiste nos autos qualquer elemento que demonstrasse que os arrendatários ali permaneceriam até Dezembro de 2021, mas apenas que o contrato se manteria de Abril a Outubro de 2008 pelo que também pelo valor em causa [2.250.00€] nunca poderíamos considerar este valor como um prejuízo especial e anormal.
No que respeita aos danos não patrimoniais que o autor e suas filhas alegam que sofreram e que foram computados em 5.000.00€, diga-se, desde logo, que as filhas do autor não são parte do processo, pelo que, quanto a elas o pedido improcede sem mais.
No mais, apenas resulta da factualidade provada que o mesmo durante o período em que esteve a residir na casa arrendada, sentiu tristeza, desgosto e revolta – cfr. als P) e Q) da factualidade assente, sendo que do facto constante da al. DD) não resulta que o autor tivesse sentido qualquer receio pela sua integridade física.
A indemnização por danos não patrimoniais visa compensar de forma justa, satisfatória e equilibrada aqueles que foram forçados a suportar desgostos e sofrimentos causados por factos lícitos ou ilícitos de outrem por forma, a que se sintam compensados por terem sido sujeitos a tais sofrimentos. Todavia, só podem ser indemnizados os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito e, atenta a impossibilidade da sua quantificação, o seu montante tem de ser fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (art.ºs 496º e 494º do CC). Sendo certo que a gravidade desses danos deve ser medida por um padrão tanto quanto possível objectivo e não à luz de factores subjectivos” (P. de Lima e A. Varela, com a colaboração de Manuel Henrique Mesquita, Código Civil Anotado, em anotação ao artigo 496º).
Ora, tendo presente estes ditames, é imperioso concluir pela improcedência do pedido no que aos danos não patrimoniais diz respeito, pois a tristeza, desgosto e revolta de ter de ir viver para outra casa e mudar hábitos de vida não assumem a gravidade tutelada pelo direito, para além de faltar também o nexo de causalidade, dado que como supra se referiu o autor não logrou provar que tivesse mudado de casa por causa de qualquer facto directamente relacionado com a obra em questão.
Face ao exposto, impõe-se revogar o acórdão recorrido e julgar a acção intentada pelo autor, totalmente improcedente, como aliás decidido em sede de 1ª instância.
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3. DECISÃO
Face ao exposto, acordam os juízes que compõem este Tribunal em revogar o acórdão recorrido e em julgar totalmente improcedente a presente acção.
Custas nesta e na 2ª instância a cargo do Autor.

Lisboa, 13 de Janeiro de 2022. – Maria do Céu Dias Rosa das Neves (relatora) – Cláudio Ramos Monteiro – José Francisco Fonseca da Paz.