Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0487/12
Data do Acordão:06/14/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA
MATÉRIA DE FACTO
MATÉRIA DE DIREITO
Sumário:I - Para determinação da competência hierárquica, à face do preceituado nos artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a) do ETAF de 2002 e artigo 280.º, n.º 1, do CPPT, o que é relevante é que o recorrente, nas alegações de recurso e respectivas conclusões, suscite qualquer questão de facto ou invoque, como suporte da sua pretensão, factos que não foram dados como provados na decisão recorrida.
II - Os juízos de facto (juízos de valor sobre matéria de facto ou sua omissão indevida) só podem ser apreciados pelos tribunais com poderes no domínio da fixação da matéria de facto.
Nº Convencional:JSTA00067679
Nº do Documento:SA2201206140487
Data de Entrada:05/07/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:MASSA INSOLVENTE DE A...., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SEN TAF VISEU
Decisão:INCOMPETÊNCIA
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:ETAF02 ART26 B ART38 A
CPTA02 ART13
CPPTRIB99 ART16 N2 ART18 N2
ART170 ART280 N1
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC324/11 DE 2011/05/11; AC STA PROC738/09 DE 2009/12/16; AC STA PROC189/10 DE 2010/04/21
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO


MASSA INSOLVENTE DE A……, LDA., representada pela Administradora da Insolvência, nos termos do disposto nos artigos 276.° e seguintes do Código do Procedimento e de Processo Tributário reclamou do despacho do SF que manteve o anterior despacho para a reclamante prestar garantia, pedindo a revogação do mesmo.
Por sentença de 31 de Dezembro de 2011, o TAF de Viseu, julgou a reclamação totalmente procedente e em consequência revogou o despacho reclamado. Reagiu a Fazenda Pública ora recorrente, interpondo o presente recurso, cujas alegações integram as seguintes conclusões:


a) Incide o presente recurso sobre a douta sentença que julgou procedente a reclamação apresentada nos autos com a consequente revogação do despacho reclamado;
b) Por não ter sido efectuado o pagamento de IVA relativo ao exercício de 2008 no prazo de pagamento voluntário, o Serviço de Finanças de Tondela instaurou o processo de execução fiscal n.° 2704 2010 01012843, tendo sido citada a Administradora de Insolvência, nos termos do art.° 156° do CPPT;
c) Nessa sequência, a Administradora de Insolvência apresentou oposição à execução fiscal (processo n°. 209/11.1BEVIS), na qual foi proferida douta sentença de convolação em processo de arguição de nulidades, a apreciar no âmbito do processo de execução fiscal respectivo;
d) Considerando que, aquando da interposição da oposição não foi prestada garantia, nos termos dos art.°s 169° e 199º do CPPT, foi a reclamante notificada para a efectuar, conforme resulta dos autos;
e) Em resposta, a reclamante solicitou a dispensa de prestação de garantia, nos termos do art.° 170º do CPPT, tendo tal pedido sido indeferido pelo Órgão de Execução Fiscal, sendo que, inconformada com o despacho de indeferimento a reclamante interpôs a presente reclamação;
f) Conforme esclarecido na resposta oportunamente apresentada pela Fazenda Pública, considerando o meio processual em uso e que, foi na sequência do acto praticado pelo Órgão de Execução Fiscal de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, que emergem os presentes autos, apenas em relação a essa questão e sobre a alegada preterição do direito de audição antes dessa decisão se debruçou a Fazenda Pública;
g) Não tendo relevado, pura e simplesmente, os restantes argumentos invocados pela reclamante por, no seu entender, não caberem no âmbito de apreciação de um processo de reclamação de actos do Órgão de Execução Fiscal;
h) A reclamante, notificada da resposta do serviço de finanças de Tondela no sentido do indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, apresentou a presente reclamação nos termos do art.° 276° do CPPT;
i) Refere a douta sentença que o pedido formulado pela reclamante ao serviço de finanças competente, em consequência da notificação para prestar garantia, não foi de dispensa da sua prestação mas de não prosseguimento da execução fiscal;
j) E que, portanto, nesse requerimento foi formulado um pedido principal — consistente na impossibilidade de o processo de execução fiscal prosseguir seus termos -, e um pedido subsidiário daquele — precisamente, de dispensa de prestação de garantia;
k) Acrescentando que as razões sustentadas para que a execução fiscal não possa continuar o seu rumo prendem-se com a circunstância alegada de o crédito exequendo não ter sido reclamado no processo de Insolvência e ainda, atenta a jurisprudência invocada na sentença, da não demonstração da penhora de bens diversos dos que constam da massa insolvente;
l) Sendo que, concluiu a douta sentença que “A execução tal como se configura nos autos, em que é executada Drª B……, na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A…… LDA, não vemos como possa prosseguir sem causar prejuízos irreparáveis aos credores, situação que aquela pode e deve acautelar”;
m) Seguidamente, faz notar que o despacho reclamado para prestar garantia não é legalmente admissível, não importando apreciar se a reclamante reúne, ou não, os pressupostos para a concessão da isenção de garantia, pois que, a impossibilidade de prosseguimento da execução prejudica a análise da dispensa de prestação de garantia e de preterição do direito de audição antes da decisão sobre a atribuição dessa dispensa;
n) Ora, se bem interpretamos a douta sentença sob recurso, daquela resulta, como consequência, a extinção da execução fiscal n°. 2704 2010 01012843, no âmbito de uma reclamação de actos do órgão de execução fiscal motivada pelo indeferimento de um pedido de dispensa de prestação de garantia;
o) Independentemente dos doutos considerandos e demais jurisprudência e doutrina invocada pelo Mmo Juiz “a quo” para sustentar tal entendimento, que não se pretende aqui questionar, entende a Fazenda Pública que tal argumentação não tem cabimento no presente meio processual;
p) Ou seja, os argumentos atinentes à “alegada impossibilidade de prosseguimento da execução”, sobre os quais discorreu o Mmo. Juiz, concluindo que o facto de haver declaração de insolvência e ausência de reclamação, na insolvência, da quantia exequenda impossibilita o prosseguimento da execução, deveria ser apreciado no âmbito do processo de oposição à execução fiscal e não no presente meio processual;
q) Não podemos concordar, portanto, com o aproveitar do indeferimento de um pedido de dispensa de prestação de garantia, para no posterior recurso judicial dessa decisão, arguir a extinção da execução, com os fundamentos previstos para o processo de oposição à execução fiscal;
r) E nem se diga que o facto de a agora reclamante, aquando do pedido de dispensa de prestação de garantia dirigido ao Órgão de Execução Fiscal ter igualmente solicitado a extinção da execução, torna possível nesta sede o conhecimento e determinação dessa consequência — extinção da execução;
s) Não se pode descurar o alcance, sentido, objecto e limites de um processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal previsto no art.° 276° do CPPT, segundo o qual qualquer acto praticado no âmbito da execução fiscal que afecte os direitos ou interesses legalmente protegidos dos interessados é susceptível de recurso judicial;
t) A reclamação de acto praticado na execução fiscal constitui uma verdadeira acção impugnatória incidental da execução fiscal, formulada no curso de execução pendente, tendo por objecto determinado acto que nela foi praticado pelo órgão da execução fiscal e por finalidade a apreciação da validade desse acto;
u) A reclamação prevista no art.° 276° destina-se a obter a anulação de actos praticados no processo de execução fiscal, como decorre dos seus próprios termos, e não a extinção do próprio processo de execução fiscal;
v) Pois que, o meio processual destinado a obter a extinção da execução fiscal é o processo de oposição, regulado nos art.°s 203° e seguintes do CPPT, conforme anotação 12 ao ad.° 276° do CPPT Comentado e Anotado de Jorge Lopes de Sousa;
w) Nos termos da exposição vinda de referir, conclui a Fazenda Pública que apenas a questão relativa ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e a ilegalidade decorrente da preterição do direito de audiência prévia, de entre a totalidade dos argumentos apresentados, seriam os únicos que se enquadram na previsão do presente meio judicial;
x) Todavia, como resulta da douta sentença recorrida, esta apenas conheceu da impossibilidade do prosseguimento da execução, pelo facto de haver declaração de insolvência e ausência de reclamação, na insolvência, da quantia exequenda, desatendendo, por conseguinte, a toda a argumentação aduzida pela Fazenda Pública, no sentido que tais argumentos não cabem no âmbito de apreciação de processo de reclamação nos termos do art.° 276° do CPPT;
y) Sendo que, na procedência da impossibilidade do prosseguimento da execução, considerou a douta sentença prejudicada a análise da dispensa de prestação de garantia e a preterição do direito de audiência prévia;
z) De qualquer forma, atente-se que não tem sentido determinar-se a extinção do processo executivo com o fundamento de que não foi demonstrada a existência de outros bens, para além dos que constam do processo de insolvência;
aa) Pois que, um dos fundamentos para que possa operar a reversão do processo de execução contra os responsáveis subsidiários consiste precisamente na comprovação da inexistência ou insuficiência de bens do devedor principal, ao abrigo do art.° 153°, n°. 2 do CPPT;
bb) Devendo o serviço de finanças respectivo, no cumprimento do estipulado no art.° 180°, n°. 1 e 2 do CPPT sustar o processo de execução fiscal aludido enquanto perdure o processo de Insolvência, e podendo/devendo ser objecto de tramitação subsequente a partir da remessa do referido processo de execução ao órgão de execução fiscal, após o encerramento do processo de insolvência;
cc) O que resulta do determinado no art° 180°, n°. 4 do CPPT, nos termos do qual: “Os processos de execução fiscal avocados serão devolvidos no prazo de 8 dias, quando cesse o processo de recuperação ou logo que finde o de falência”;
dd) Nessa sequência, após o encerramento do processo de Insolvência e consequente devolução do processo executivo ao órgão de execução fiscal, deve ser retomada a tramitação do mesmo, ao abrigo do art.° 180°, n°. 5 do CPPT;
ee) O que vem de encontro à posição defendida por Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, 6° edição 2011, Áreas Editora, Volume III, Anotação 7 ao art.° 180° (Página 324), segundo o qual: “Diferente é a situação de, depois de findo o processo de falência ou insolvência, poderem ser instauradas novas execuções ou prosseguirem as anteriormente instauradas contra o falido ou insolvente ou contra responsáveis subsidiários, hipóteses que têm cobertura no n°. 5 deste art.° 180°”;
ff) Do exposto decorre que, o facto de ao devedor originário não serem conhecidos outros bens, não é impeditivo da continuação do processo de execução fiscal, mormente para se poder operar a reversão contra os responsáveis subsidiários, figura jurídica expressamente prevista no art.° 153°, n°. 2 do CPPT;
gg) Pelo que, não se concebe uma qualquer impossibilidade legal de prosseguimento da marcha do processo executivo, antes podendo e devendo o mesmo continuar seus trâmites em vista da cobrança da dívida, quanto mais não seja através da reversão da execução contra os responsáveis subsidiários;
hh) Aqui chegados e em consonância com o referido aquando da resposta apresentada nos termos do n.° 2 do art.° 278° do CPPT, reitera-se que as questões a apreciar na presente reclamação devem-se cingir ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e à ilegalidade decorrente da preterição do direito de audiência prévia.
ii) Questões essas que não foram analisadas na douta sentença, por se ter considerado prejudicado o seu conhecimento, face à decisão de impossibilidade de prosseguimento da execução;
jj) Ao determinar a impossibilidade de prosseguimento do processo executivo, essa decisão na prática representa a extinção do próprio processo principal de que o presente meio processual — recurso de actos do Órgão de Execução Fiscal -, constitui mero incidente;
kk) Ora, do nosso ponto de vista, o Meritíssimo Juiz não podia determinar a extinção do processo executivo (processo principal), num seu incidente de Reclamação de Actos do Órgão de Execução Fiscal, que tem por escopo a apreciação de um concreto acto decisório praticado no processo executivo;
II) O que culminou num excesso de pronúncia, que constitui causa de nulidade da sentença nos termos do preceituado no art.° 668°., n°. 1, alínea d) do CPC, o qual estatui “É nula a sentença quando: O juiz ... conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”;
mm) De qualquer forma, sem prescindir;
nn) Importa realçar que, aquando da notificação da Fazenda Pública para os efeitos consignados no n.° 2 do art.° 278° do CPPT, informou-se o douto Tribunal da pendência dos autos de oposição sob o n°. 209/11.1 BEVIS;
oo) Portanto, ao tempo existia uma oposição à execução referente ao processo executivo n.° 2704 2010 01012843, o que significa que se encontrava reunido um dos pressupostos para a reclamante poder requerer a dispensa de prestação de garantia, nos termos do art.° 170° do CPPT;
pp) Sucede que, em 06.12.2011 foi a FP notificada da conta elaborada no processo de oposição judicial antes identificado, na sequência do trânsito em julgado ocorrido;
qq) Ou seja, aquando da prolação da sentença recorrida, esse pressuposto inexistia, pelo que carece de objecto a presente reclamação, pois que inexistindo meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da divida subjacente ao referido processo executivo, nos termos do n.° 169° do CPPT, não se mostram reunidos os pressupostos para a reclamante poder beneficiar da dispensa de prestação de garantia;
rr) Motivo porque, do nosso ponto de vista, caberia ao Mmo Juiz, declarar a inutilidade superveniente da lide, daí decorrente;
ss) Nem se afirme que o Mmo Juiz não tinha conhecimento da sentença proferida no processo de oposição referenciado, pois que a Fazenda Pública aquando da sua resposta efectuou alusão, no respectivo articulado 11°, da existência daquele processo de oposição, pelo que previamente à prolação da presente sentença cumpriria, com o devido respeito por opinião diversa, indagar da situação daqueles autos de oposição;
tt) Concretamente, uma vez que a solicitação de garantia para suspender a execução fiscal e o consequente pedido de dispensa da mesma tinha, precisamente, por base tal processo judicial de oposição, já decidido, não se vislumbra qualquer utilidade na presente reclamação de actos do órgão de execução fiscal:
uu) Termos em que deve ser declarada a inutilidade superveniente da lide, decorrente da falta de fundamento legal para a suspensão da execução fiscal, pois que a solicitação de garantia para suspender a execução fiscal e o consequente pedido de dispensa da mesma tinha, precisamente, por base o processo judicial de oposição n.° 209/11.1BEVIS, já decidido:
vv) Resumindo, o conhecimento efectuado pelo Mmo Juiz da extinção da execução em sede de reclamação de actos do órgão de execução fiscal, na sequência do indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, contraria, frontalmente, o campo de aplicação dos meios processuais em mérito (oposição e reclamação de actos do órgão de execução fiscal);
ww) Deve, pois, ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença que, no âmbito dos presentes autos — reclamação de actos do órgão de execução fiscal deduzido na sequência do indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia — conheceu da impossibilidade do prosseguimento da execução, pelo facto de haver declaração de insolvência e ausência de reclamação, na insolvência, da quantia exequenda, quando, do nosso ponto de vista, a apreciação do Tribunal se devia circunscrever ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e à ilegalidade decorrente da preterição do direito de audiência prévia;
xx) Em conformidade, uma vez que a solicitação de garantia para suspender a execução fiscal e o consequente pedido de dispensa da mesma tinha, precisamente, por base o processo judicial de oposição n°. 209/11.1BEVIS, já decidido, não se vislumbra qualquer utilidade na presente reclamação de actos do órgão de execução fiscal, devendo ser declarada a inutilidade superveniente da lide decorrente da falta de fundamento legal para a suspensão da execução fiscal.
Termos em que, concedendo-se provimento ao presente recurso, deve a decisão recorrida ser revogada, com as devidas consequências legais.

A recorrida formulou as seguintes contra-alegações:
VENERANDOS E ILUSTRES SRS. DRS.,
MMOS. JUÍZES CONSELHEIROS
DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

Salvo o devido respeito, quer a factualidade, quer a juridicidade expostas na douta sentença de mérito não sofrem de qualquer ilegalidade, insuficiência ou, sequer, irregularidade.

Quer os factos, quer as normas jurídicas aplicadas e respectivas operações de subsunção jurídica encontram-se correctamente efectuadas, não merecendo a douta sentença recorrida qualquer censura, devendo assim ser integralmente mantida, nos seus precisos termos.
TERMOS EM QUE;
Mantendo-se a douta decisão recorrida e negando-se provimento ao presente recurso, pela improcedência das suas conclusões ou, ainda, por outras razões com que, V. Exas., Venerandos Juízes Conselheiros,
se dignarão suprir;
Se Fará Justiça!

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:

A recorrente acima identificada vem sindicar a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, exarada a fls. 130/138, em 31 de Dezembro de 2011.
A decisão recorrida, abstendo-se de conhecer do mérito (ou de parte dele) da reclamação e que tem a ver com o indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e preterição do direito de audição prévia julgou procedente o recurso e anulou o acto do OEF, uma vez que face à declaração de insolvência da executada a execução não pode prosseguir.
A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 157/166, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684.°/3 e 685°- A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.
A recorrida contra-alegou nos termos de fls. 179/180 que aqui, também, se dão por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais.
O STA é competente para conhecer dos recursos jurisdicionais interpostos de decisões dos tribunais tributários de 1ª instância se estiver apenas em causa matéria de direito, conforme estatuído nos artigos 26.°/b) e 38.°/a) do ETAF.
Ora, salvo melhor juízo, o presente recurso jurisdicional não se funda, exclusivamente, em matéria de direito pelo que se verifica a excepção de incompetência do Tribunal, em razão da hierarquia., que merece imediata e prioritária apreciação, nos termos do disposto no artigo 13º do CPTA e 16.°/2 do CPPT.
Como refere o ilustre Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa ¹ (Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6.ª edição 201,I volume, página 225, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa.), “A jurisprudência tradicional do STA quanto à delimitação da sua competência em relação à dos Tribunais Centrais Administrativos, vinha sendo no sentido de ser efectuada com base nos fundamentos do recurso, devendo entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito sempre que nas conclusões das respectivas alegações, que fixam o objecto do recurso (art. 684.°, n.° 3, do CPC), o recorrente pede a alteração da matéria de fáctica fixada na decisão recorrida ou invoca, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, independentemente da atendabilidade ou relevo desses factos para o julgamento da causa”.
O recurso não tem exclusivamente por fundamento matéria de direito se nas respectivas conclusões se questionar a questão factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, que porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos. ² (Acórdão do STA, de 200.9.12.16, proferido no recurso n.° 0738/09, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt.)
Ora, a recorrente, como fundamento da sua pretensão, invoca o facto constante da conclusão c), que não tem suporte na decisão recorrida e do qual pretende extrair consequências jurídicas (conclusão qq).
Na verdade, a recorrente alega que na sequência da citação da executada /reclamada esta apresentou oposição à execução fiscal (processo n.° 209/1 1.1BEVIS), na qual foi proferida douta sentença de convolação em processo de arguição de nulidades, a apreciar no âmbito do processo de execução fiscal respectivo, pelo que, aquando das prolação da sentença, inexistindo meio judicial pendente para discussão da exigibilidade da dívida, não se mostravam preenchidos os pressupostos para a reclamante beneficiar da dispensa da prestação de garantia, pelo que deve ser declarada a inutilidade superveniente da lide.
Este STA é, pois, incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, sendo competente para o efeito o TCAN.
A recorrente poderá requerer a remessa do processo ao Tribunal competente, nos termos do estatuído no artigo 18.°/2 do CPPT.
Termos em que deve ser julgada verificada a excepção de incompetência deste STA, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso, por ser competente para o efeito o TCAN.

2 – FUNDAMENTAÇÃO
O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:
A) O Serviço de Finanças de Tondela, instaurou execução fiscal contra A……, LDA., com o n. ° 2704201001012843, referente a IVA, do exercício de 2008, no montante de €2.992,80, acrescido de custas juros de mora, perfazendo um total de €3141,94;
B) O SF de Tondela, no âmbito da execução fiscal mencionada em A. tentou proceder à citação da executada, mas a carta veio devolvida com a indicação “Encerrado” e, por isso, a citação foi realizada na pessoa da “DR. B……, na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A……, LDA;
C) O Órgão de Execução Fiscal através de despacho notificou a DR.ª B……, na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A……, LDA, para, no prazo de 15 dias, prestar garantia idónea;
D) A notificada apresentou resposta à notificação mencionada em C., referindo, para além do mais que a notificada foi declarada insolvente em 27-10-2008; que o crédito exequendo não foi reclamado e, por isso, “o procedimento executivo não tem razão para prosseguir termos, designadamente para os da notificação a que se responde”; se assim não se entender deve a execução ser suspensa com dispensa de prestação de garantia;
E) O crédito exequendo não foi reclamado nos autos de insolvência n° 464/08.4TBTND e não consta da sentença de graduação de créditos;
F) O Órgão de Execução Fiscal analisando o requerido, vide al. D), fazendo o seu enquadramento jurídico-factual indeferiu, por despacho de 19 de Agosto de 2011, com os fundamentos: “... da falta de produção de prova da irreparabilidade do prejuízo causado à executada e, por outro da falta de produção de prova da irresponsabilidade da executada pela situação de insuficiência/inexistência de bens”. Quanto à participação prévia à decisão mais referiu: “Está superiormente esclarecido (al. a) do ponto 3 da circular n° 13/99, de 08/07, da Direcção Geral dos Impostos) que a audiência dos interessados pode ser dispensada, para além de outras situações, quando a administração tributária apenas aprecie os factos que lhe foram dados pelo contribuinte, limitando-se na sua decisão a fazer a interpretação das normas legais aplicáveis ao caso.”, vide fls. 38 e 39;
G) Despacho comunicado à Reclamante em 24-08-2011 reagindo a ele, através da reclamação que deu origem aos presentes autos, apresentada, via fax, no dia 05-09-2011;
H) A Entidade reclamada pronunciando-se sobre a reclamação manteve o despacho reclamado e remeteu os autos a Tribunal;
I) A sociedade A……, LDA., foi declarada insolvente em 27-10-2008.

3 – DO DIREITO

A meritíssima juíza do TAF. de Viseu, julgou a reclamação totalmente procedente por entender que:

MASSA INSOLVENTE DE A……, LDA., representada pela Administradora da Insolvência, veio, nos termos do disposto nos artigos 276.° e seguintes do Código do Procedimento e de Processo Tributário (doravante CPPT) reclamar do despacho do SF que manteve o anterior despacho para a reclamante prestar garantia, pedindo a revogação do mesmo.
Alegou, em síntese, que:
A aqui executada foi declarada insolvente em 27-10-2008;
O despacho reclamado confunde sociedade em liquidação com sociedade insolvente e massa insolvente;
O crédito aqui em causa não foi reclamado no processo de insolvência pelo que os autos de execução não têm razão para prosseguir; assim não se entendendo deve ser dispensada a prestação de garantia por se enquadrar a situação no âmbito de aplicação do artigo 170º do CPPT.
Quanto ao conhecimento imediato da reclamação defende-o dizendo que se ele ocorresse apenas, a final, seria inútil e traduzir-se-á em prejuízo para todos os credores da massa insolvente.
O Autor do despacho reclamado sustentou-o e ordenou a remessa dos autos a este Tribunal para apreciação e decisão.

A Fazenda Pública respondeu alinhando, em síntese, os seguintes fundamentos:
Depois de definir o âmbito de aplicação da presente forma processual referiu que parte da argumentação é atinente à legalidade da liquidação, a qual deve ser apreciada e discutida em sede de processo de impugnação judicial; outra parte é alusiva à extinção da execução pelo que deve ser apreciada e discutida no âmbito do processo de oposição defendendo que os únicos argumentos a apreciar nesta sede se devem cingir ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e à preterição do direito de audiência prévia.
Relativamente à alegada violação do artigo 60° e 98° da LGT argumentou que o n° 4 do artigo 170º do CPPT, o prazo aí estipulado para a decisão, não comporta o exercício do direito de audição; por outro lado o pedido de dispensa insere-se num procedimento que se inicia com a notificação do contribuinte para prestar garantia e aquele deve ser fundamentado de facto e de direito devendo, por isso, a prova que houver ser logo apresentada, participando nesse momento na formação da decisão não se justificando seja dada nova oportunidade ao contribuinte para participar e daí se compreender o prazo de 10 dias definido no n° 4 do artigo 170° para a “resolução do pedido de dispensa de garantia”.
Foram os autos com vista ao Digno Procurador da República, o qual ratificou “contestação da Fazenda Pública”.

Cumpre apreciar e decidir.
Da subida imediata da reclamação e seu conhecimento
A argumentação da Reclamante sobre a subida imediata e apreciação da reclamação radica, em seu entender, no facto de se ela ocorresse apenas, a final, seria inútil e traduzir-se-ia em prejuízo para todos os credores da massa insolvente pois poderia determinar a penhora de bens da massa insolvente.
Sobre esta questão mais nenhuma pronúncia ocorreu.
Dir-se-á, simplificando a resposta, porque situações idênticas à presente têm sido, com frequência, decididas neste Tribunal, que a associação do prejuízo irreparável, como pressuposto do conhecimento imediato das reclamações, ao da perda da utilidade das mesmas, situação que no bom rigor também nestes autos se verifica, é recorrente e uniforme na jurisprudência dos nossos tribunais superiores. Veja-se, entre outros os Acs. do TCA N de 23-04-2009 proferido no 1690 08 1 B e 02653/07.0BEPRT, 15-01-2009 e os Ac. do STA de 2-3-2005, proc. 010/05 e 18-08-2010, proc. de 0639/10. Vem-se defendendo que o conhecimento da reclamação deve ser imediato sob pena de aquela perder utilidade. Face ao vindo de referir, com a devida vénia, nomeadamente ao Ac. mais recente entendemos também que a reclamação deve ser conhecida agora.
2. FUNDAMENTAÇÃO
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria, da hierarquia, e do território.
O processo é o próprio, e não enferma de nulidades insupríveis.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Inexistem quaisquer outras questões prévias ou excepções de que cumpra conhecer e obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Factos provados
Mostram-se provados, com interesse para a decisão da causa, os factos que a seguir se indicam:
A) O Serviço de Finanças de Tondela, instaurou execução fiscal contra A……, LDA., com o n.° 2704201001012843, referente a IVA, do exercício de 2008, no montante de €2.992,80, acrescido de custas juros de mora, perfazendo um total de €3141,94;
B) O SF de Tondela, no âmbito da execução fiscal mencionada em A. tentou proceder à citação da executada, mas a carta veio devolvida com a indicação “Encerrado” e, por isso, a citação foi realizada na pessoa da “DR. B……, na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A……, LDA;
C) O Órgão de Execução Fiscal através de despacho notificou a DR.ª B……, na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A……, LDA, para, no prazo de 15 dias, prestar garantia idónea;
D) A notificada apresentou resposta à notificação mencionada em C., referindo, para além do mais que a notificada foi declarada insolvente em 27-10-2008; que o crédito exequendo não foi reclamado e, por isso, “o procedimento executivo não tem razão para prosseguir termos, designadamente para os da notificação a que se responde”; se assim não se entender deve a execução ser suspensa com dispensa de prestação de garantia;
E) O crédito exequendo não foi reclamado nos autos de insolvência n° 464/08.4TBTND e não consta da sentença de graduação de créditos;
F) O Órgão de Execução Fiscal analisando o requerido, vide al. D), fazendo o seu enquadramento jurídico-factual indeferiu, por despacho de 19 de Agosto de 2011, com os fundamentos: “... da falta de produção de prova da irreparabilidade do prejuízo causado à executada e, por outro da falta de produção de prova da irresponsabilidade da executada pela situação de insuficiência/inexistência de bens”. Quanto à participação prévia à decisão mais referiu: “Está superiormente esclarecido (al. a) do ponto 3 da circular n° 13/99, de 08/07, da Direcção Geral dos Impostos) que a audiência dos interessados pode ser dispensada, para além de outras situações, quando a administração tributária apenas aprecie os factos que lhe foram dados pelo contribuinte, limitando-se na sua decisão a fazer a interpretação das normas legais aplicáveis ao caso.”, vide fls. 38 e 39;
G) Despacho comunicado à Reclamante em 24-08-2011 reagindo a ele, através da reclamação que deu origem aos presentes autos, apresentada, via fax, no dia 05-09-2011;
H) A Entidade reclamada pronunciando-se sobre a reclamação manteve o despacho reclamado e remeteu os autos a Tribunal;
I) A sociedade A……, LDA., foi declarada insolvente em 27-10-2008.

Motivação
Os factos provados assentam na análise crítica dos elementos constantes dos autos.
Factos não provados
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão.

Do Direito
Incumbe ao Tribunal o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: n.° 1 do art. 95.° do CPTA, ex vi, al. e) do art. 2° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Questão prévia:
Na verdade a execução foi instaurada, contra A……, LDA. e, logo após a tentativa de citação da executada, porque a carta foi devolvida com a indicação “Encerrado”, se diligenciou, e conseguiu, pela citação de “DR.ª B……, na qualidade de Administradora da Massa insolvente C….., LDA.”.
À data da instauração da execução já a A……, LDA, havia sido declarada insolvente há mais de um ano, situação que foi comunicada à Administração Fiscal. Aliás está na informação prestada imediatamente à citação de DR.ª B……., na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A……, LDA., no ponto 1 referiu o decretamento da insolvência e respectiva data.
Encerrando a presente nota direi que a referência inicial à sociedade A……, LDA se deveu, estamos certos, à inércia e automatismo de a certidão de dívida, porque resultante de liquidação oficiosa realizada nos termos dos artigos 41º e 88° do CIVA, por falta de apresentação da declaração periódica, mencionar a entidade que constaria dos registos, a já aludida sociedade em vez de se atender à liquidação de insolvência da mesma e o surgimento de Entidade diversa, a massa insolvente representada pela Administradora da Insolvência.

Importa agora apreciar e decidir as questões invocadas pela reclamante:
Segundo o RFP, nesta sede as questões devem-se cingir ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e à preterição do direito de audiência prévia.
Já que as outras constituem argumento doutras formas processuais, como a impugnação judicial ou a oposição.
Segundo a Reclamante trata-se de uma situação de alegada impossibilidade de prosseguimento da execução. E a impossibilidade alicerça-a a Reclamante quer no facto de a quantia exequenda não ter sido reclamada na insolvência e também na alegada confusão por parte da Administração Fiscal da sociedade em liquidação do CSC com a figura da massa insolvente.
Para a reclamante os fundamentos para o pedido de dispensa de garantia, tem como fundamento os argumentos apontados, sobre os quais a AF não tomou posição aquando da prolação do despacho que recaiu sobre o requerimento.
No entendimento da AF não foram alegados e provados factos que comprovem a verificação dos pressupostos da concessão da dispensa de garantia previstos no art. 52.° da LGT.
Cumpre desde já referir que, em parte, concordamos com a posição da FP, ou seja só constitui objecto destes autos a apreciação das questões:
- do indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia;
- e da preterição do direito de audiência prévia.
Quanto á primeira questão a FP alega que não foram alegados e provados factos que comprovem a verificação dos pressupostos da concessão da dispensa de garantia previstos no art. 52.° da LGT.
Vejamos.
Efectivamente a reclamante pouco alega sobre os pressupostos para a concessão da isenção da prestação de garantia. No fundo o que a reclamante alega é a impossibilidade de prosseguimento da execução. E a impossibilidade alicerça-a a Reclamante quer no facto de a quantia exequenda não ter sido reclamada na insolvência e também na alegada confusão por parte da Administração Fiscal da sociedade em liquidação do CSC com a figura da massa insolvente.
No entanto, não podemos esquecer que a reclamante pretende atacar verdadeiramente o despacho do SF que ordenou a notificação para prestar garantia, pois segundo a reclamante dada a situação de insolvência a execução não pode prosseguir.
Como resulta dos factos provados, primeiro a reclamante foi notificada para prestar garantia, nos termos do disposto no art. 169.° do CPPT, em consequência apresentou resposta, essa resposta foi objecto de despacho que indeferiu o pedido da reclamante, na sequência da notificação deste despacho a reclamante procede à reclamação do mesmo nos termos do art. 276.° e ss do CPPT.
Sucede que o pedido formulado pela reclamante ao SF, na sequência da notificação para prestar garantia, não foi de dispensa de garantia, mas de não prossecução da execução fiscal, aliás o pedido de dispensa de garantia que a FP considera ter existido, só é feito subsidiariamente pela reclamante com o pedido de suspensão da execução.
Assim, afigura-se-nos que nos presentes autos o pedido principal não consubstancia um pedido de isenção de prestação de garantia.
Dito isto, importa ter presente que as normas do Código de Procedimento e de processo tributário, as atinentes à insolvência e as demais constantes dos vários códigos, neste caso o de IVA, têm que ser analisadas, conjugadamente para delas retirar um efeito útil, caso contrário seremos confrontados com uma impossibilidade de concatenação. A propósito veja-se a mui lúcida jurisprudência que se retira do Ac. do STA n° 0326/11, 07-09-2011, ISABEL MARQUES DA SILVA:
I - A declaração de insolvência da sociedade executada não obsta à instauração da execução por créditos vencidos antes da declaração de insolvência, havendo, contudo, que, logo após a instauração, proceder à respectiva sustação em conformidade com o disposto no n.° 1 do artigo 180.° do CPPT.
II - A instauração da execução fiscal por créditos vencidos posteriormente à declaração de falência, como são os créditos exequendos, encontra expresso apoio legal no disposto no n.° 6 do artigo 180.º do CPPT, preceito que há-de ser, contudo, interpretado razoavelmente, atenta a unidade do sistema jurídico, no sentido de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência se forem penhorados bens não apreendidos naquele processo.
Idem 0981/10, 06-04-2011, ISABEL MARQUES DA SILVA e AC do TCA N, 0170/04.9BEBRG, 18-10-2007, Moisés Rodrigues, EXECUÇÃO FISCAL INSTAURADA APÓS FALÊNCIA:
II - Os artigos 180.°, n.°s 1 e 6, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e 154.°, n.° 3, do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresa e de Falência são disposições literalmente contraditórias que devem ser harmonizadas.
III - Tal harmonização consegue-se operando um entendimento restritivo daquela última disposição legal, sempre sem prejuízo da sua ratio, no sentido de que aquele n.° 3 não se aplica ao processo de execução fiscal que, assim, pode sempre ser instaurado.
Também a avalizada doutrina, vide Código de Procedimento e de processo tributário anotado de Jorge de Sousa, pag. 233, defende que, apesar de poderem prosseguir execuções só se forem penhorados bens diversos dos que estão na insolvência.
Mas a situação vinda de referir “só se forem penhorados bens diversos dos que estão na insolvência”, levada às ultimas consequências quebra outro incontornável princípio, “o da universalidade do procedimento contra o insolvente, quando se debatam interesses relativos à massa insolvente, princípio que se traduz em não se poder conhecer da responsabilidade patrimonial do insolvente fora do processo de falência”, entenda-se também insolvência. A este propósito veja-se, v. g. Ac do TCA S, 09-02-2010, JOSÉ CORREIA.
Dito de outra forma, e não vislumbramos que outro entendimento se pode perfilhar, é que se forem penhorados bens diversos dos que estão na insolvência, a massa insolvente deve absorvê-los sob pena da violação do aludido princípio da universalidade do procedimento da insolvência, com os consequentes prejuízos para os credores e um sério abalar no comércio jurídico.
Portanto, no bom rigor a hipótese de penhora de bens diversos dos que estão na insolvência é situação que pode e deve ser cogitada para a insolvência de pessoas singulares em que a declaração de insolvência não impossibilita que em momento posterior o Insolvente não venha a adquiriu bens ou rendimentos diversos dos que constituem ou constituíram a massa insolvente, com disciplina e fins distintos desta.
Nos presentes autos a dívida fiscal é posterior à declaração de insolvência da executada.
Pelo que, ao abrigo do supra afigura-se-nos que o despacho notificado à executada para prestar garantia não pode manter-se na ordem jurídica. Pois como dissemos do requerimento dirigido pela reclamante ao SF, resulta que a mesma questiona a legalidade da existência de tal despacho, por considerar que o mesmo não deveria existir e não tanto por considerar que reúne as condições para uma dispensa de garantia, aliás, se entende-se que reunia as condições para beneficiar da isenção de garantia não teria elaborado um requerimento dirigido ao SF a atacar a “inadmissibilidade legal” do despacho para prestar garantia, por considerar que a execução não devia prosseguir. A presente reclamação surge na sequência do indeferimento do requerido.
O Órgão de Execução Fiscal, secundado pela Fazenda Pública e MP ativeram-se ao elemento formal da liquidação oficiosa, geradora da certidão de dívida e, sobre a especial finalidade da massa insolvente e a sua intocabilidade fora dos créditos reclamados, e, ainda que surgissem outros bens para além dos que constam do processo de insolvência, como já supra se disse, mesmo que fossem indicados, eles teriam que se submeter à força aglutinadora da massa insolvente e servir o escopo da liquidação cujo é o da satisfação dos credores que reclamaram e viram os seus créditos graduados.
A execução tal como se configura nos autos, em que é executada DR.ª B……, na qualidade de Administradora da Massa Insolvente A……., LDA., não vemos como possa prosseguir sem causar prejuízos irreparáveis aos credores, situação que Aquela pode e deve acautelar.
Daqui decorre que se o despacho para prestar garantia não é legalmente admissível, não importa apreciar se a reclamante reúne os pressupostos para a concessão da isenção de garantia como o pretende fazer ver a FP.
Assim, sem necessidade de mais considerandos, o despacho reclamado não pode manter-se.
A decisão à primeira questão que resulta da conclusão antecedente prejudica a analise e apreciação das outras questões supra enunciadas.

3. DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a reclamação totalmente procedente e em consequência revoga-se o despacho reclamado.


DECIDINDO NESTE STA:
O EMMP neste Supremo Tribunal Administrativo, considera que a matéria do presente recurso não é exclusivamente de direito por, no seu entender, a recorrente como fundamento da sua pretensão invocar o facto constante da conclusão C), consistente no facto de a Administradora de Insolvência ter apresentado oposição à execução fiscal (processo nº 209/11.1 BEVIS) na qual, segundo refere, foi proferida sentença de convolação em processo de arguição de nulidades, a apreciar no âmbito do processo de execução fiscal respectivo, daí retirando a consequência jurídica de que ao tempo existia uma oposição à execução nº 2704 2010 01012843 o que no entender da ora recorrente significa que se encontrava reunido um dos pressupostos para a reclamante poder requerer a dispensa de prestação de garantia nos termos do artº 170º do CPPT. Das conclusões de recurso PP) a SS) retira-se, ainda o entendimento da recorrente de que não é oportuno (segundo se infere) o pedido agora formulado de dispensa de prestação de garantia bancária que devia ter conduzido à declaração de inutilidade superveniente da lide mesmo que para isso o Mº juiz de 1ª Instância tivesse de indagar da situação daqueles autos de oposição.
As partes foram notificadas do parecer do Ministério Público e nada disseram.
Vejamos:
Como se decidiu no Ac. deste STA de 11/05/2011, tirado no recurso nº 0324/11, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas conclusões do respectivo recurso se questionar a questão factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos (v., entre outros, os acórdãos do STA de 16/12/2009 e de 21/04/2010, proferidos nos recursos n.ºs 738/09 e 189/10, respectivamente). No caso em apreço, como destaca o EMMP, em face das conclusões de recurso c) e qq) (designadamente) e dos factos ali afirmados, a recorrente defende que deve ser declarada a inutilidade superveniente da presente lide (reclamação de actos do órgão de execução fiscal praticados no âmbito do processo de execução fiscal nº 2704201001012843), pois aquando da prolação da actual sentença nos presentes autos inexistia meio judicial pendente para a discussão da exigibilidade da dívida pelo que não se mostravam preenchidos os pressupostos para a reclamante beneficiar da dispensa de prestação de garantia que impetrou.
Ou seja, é invocado um facto que é fundamento da pretensão da recorrente o qual não foi fixado e considerado na decisão recorrida.
Assim e pelo exposto, tem de entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito, pelo que o Supremo Tribunal Administrativo é hierarquicamente incompetente para o conhecimento do recurso, e das questões prévias nele solicitadas, cabendo a competência para o conhecimento do mesmo à Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul – artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a) do ETAF de 2002 e artigo 280º, n.º 1, do CPPT.

4- DECISÃO:
Termos em que, face ao exposto, se decide julgar a Secção de Contencioso Tributário do STA incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, indicando-se, nos termos do art. 18.º, n.º 3, do CPPT., como tribunal que se considera competente o Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário), para o qual os recorrentes poderão requerer a remessa do processo, de harmonia com o preceituado no n.º 2 do mesmo artigo.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça devida em 2 UC(s).

Lisboa, 14 de Junho de 2012. – Ascensão Lopes (relator) – Pedro Delgado – Valente Torrão.