Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0797/16
Data do Acordão:07/07/2016
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
Sumário:Não é de admitir revista se vem apenas discutida a não integração do caso na previsão do artigo 120.º, 1, a), do CPTA e a solução do acórdão recorrido é juridicamente plausível.
Nº Convencional:JSTA000P20794
Nº do Documento:SA1201607070797
Data de Entrada:06/24/2016
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE VALONGO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1.

1.1. A…………, SA, intentou providência cautelar, contra o Município de Valongo, requerendo:
«a) Ser decretada a suspensão de eficácia do acto praticado pelo Sr. Presidente da Câmara de Valongo com data de 30 de Outubro de 2015 de deslocalizar a Feira Semanal de Valongo para a Av. Emídio Navarro e algumas vias a ela adjacentes a partir de 14 de Novembro de 2015 (inclusive) ou, a verificar-se entretanto a mesma, ordenar a imediata cessação da realização da Feira Semanal de Valongo na Av. Emídio Navarro e vias adjacentes;
b) Ser a entidade Requerida intimada a abster-se de praticar quaisquer actos para execução material da Feira na Av. Emídio Navarro e vias contíguas;»

1.2. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, por sentença de 07.01.2016 (fls.323/331), julgou improcedente a providência cautelar requerida.

1.3. O Tribunal Central Administrativo Norte, por acórdão de 21.04.2016 (fls.416/419) manteve o indeferimento da providência».

1.4. É desse acórdão que a recorrente vem requerer a admissão do recurso de revista, ao abrigo do artigo 150.º, n.º 1, do CPTA, que justifica ser claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

1.5. O recorrido contra alegou pugnando pela não admissão da revista.

Cumpre apreciar e decidir.

2.

2.1. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada no acórdão recorrido.

2.2. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2.ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».
A jurisprudência deste STA, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. Trata-se, efectivamente, não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

2.3. As instâncias convergiram julgando improcedente o pedido de suspensão de eficácia do acto de 30/10/2015, tal como identificado pela ora recorrente.
Tal acto consubstancia-se num ofício pelo qual o Presidente do Município demandado comunicou ao recorrente a deslocalização da Feira Semanal de Valongo para a Av. Emídio Navarro e para algumas vias adjacentes, situação esta que inviabiliza, no dia da feira, a exploração de 104 lugares de estacionamento que integram a concessão do fornecimento, instalação e exploração de pacómetros colectivos nas zonas de estacionamento de duração limitada na cidade de Valongo, concessionada à recorrente.
O TAF começou por julgar não se estar perante uma situação de evidência de pretensão formulada ou a formular no processo principal, pelo que afastou a adopção da providência no quadro do artigo 120.º, 1, a), do CPTA. Depois, já no quadro da alínea b do mesmo número e artigo julgou não estar demonstrado periculum in mora, pelo que acabou a indeferir a providência.
Para o Tribunal Central, e para além de questão relativa a matéria de facto, a requerente defendeu apenas a aplicação daquele artigo 120.º, 1, a), nada contestando quanto à decisão sobre o artigo 120.º, 1, b).
Ora, o Tribunal Central confirmou a ponderação efectuada pelo TAF. Disse, nomeadamente: «a própria alegação da Recorrente confirma o já afirmado na sentença recorrida: que a apreciação do eventual sucesso da sua pretensão invalidatória implica a análise de um conjunto de questões jurídicas (designadamente, quanto à qualificação do ato aqui em causa, à competência para a sua prática e aos eventuais efeitos que o mesmo possa projetar sobre o contrato de concessão, nomeadamente quanto a saber se o mesmo constitui uma alteração unilateral do contrato, como pretende a Recorrente, ou antes uma alteração das circunstâncias em que o mesmo foi celebrado, ou eventualmente nenhuma destas hipóteses), cuja resposta não é ostensiva nem se atinge sem esforço de exegese, como é demonstrado, além do mais, pela sucessão de desvalores jurídicos que, com base em factos similares, a própria Recorrente assaca ao ato (inexistência, nulidade e anulabilidade)».

A recorrente intenta novamente a evidência do bem fundado da sua pretensão, e traz a seu favor, designadamente, três acórdãos deste Supremo Tribunal em matéria que permitiria concluir desse modo.
O primeiro acórdão, de 3.3.99, proc. 41899, reporta-se a uma «aparência de deliberação de órgão colegial criada por decisão individual de dois dos seus membros, sem precedência de formação de vontade desse órgão colegial»;
O segundo, de 19.12.2001, proc. 46027, reporta-se a «decisão tomada em nome do conselho directivo do INGA, por dois dos seus membros, fora do âmbito de qualquer reunião convocada para formação da vontade colectiva deste Instituto»;
O terceiro, de 12.3.2009, proc. 22/09, reporta-se a um acto «de uma câmara municipal a emitir uma declaração do género [declaração de utilidade pública de expropriação] – quando o art. 14.º do Código das Expropriações é claríssimo ao reservar tal competência para o membro do Governo e, em casos contados para as assembleias municipais».

Ora, será pelo menos controversa a integração do problema em causa nos tipos tratados naqueles acórdãos: quanto ao último, por se tratar, aí, de referência a legislação específica das expropriações, que não é do que se cuida, agora; quanto aos dois primeiros, por não se vislumbrar na comunicação que foi transmitida à ora recorrente, que tenha tido intenção de aparentar deliberação colegial; finalmente, porque essa comunicação respeita à localização da feira semanal: ora, as implicações que essa localização tem na concessão de lugares de estacionamento e, consequentemente, na competência para ser determinada, são matéria que não têm correspondência naqueles casos.
No mais, e pelos seus próprios termos, o acórdão apresenta solução juridicamente plausível, pelo que a problemática não se aparenta com a evidência que nos permitiria concluir por claro erro de direito, situação em que haveria lugar a admissão da revista, nos termos do último dos requisitos acima assinalado.
No resto, a matéria não se apresenta como de importância fundamental.
Aliás, a problemática suscitada nos autos não incide, verdadeiramente, sobre algum aspecto em que a decisão deste Tribunal pudesse conter uma pronúncia definitiva.
Com efeito, a questão submetida à apreciação deste Tribunal não se reconduz a quaisquer problemas de direito sobre a tramitação das providências cautelares ou a condições em que devem ser apreciadas; diversamente, o que se visa, é um entendimento sobre a legalidade do acto comunicado, para dele se extraírem consequências na providência. Ora, o entendimento sobre a legalidade desse acto teria sempre valor provisório, que é inerente às providências.
Por último, a possibilidade de repetição de casos com o presente é reduzida até porque, entretanto, o novo regime do CPTA, aprovado pelo DL n.º 214-G/2015, de 2.10, já não contém norma equivalente à do artigo 120.º, n.º 1, a).

3. Pelo exposto, não se admite a revista.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 7 de Julho de 2016. – Alberto Augusto Oliveira (relator) – Vítor GomesSão Pedro.