Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01071/14
Data do Acordão:05/11/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:IRC
REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
INQUÉRITO CRIMINAL
Sumário:I – A contagem do prazo de caducidade do direito de liquidar tributos nos termos do art. 45º, nº 5, da LGT, só ocorre se o acto tributário de liquidação e a investigação criminal se referirem aos mesmos factos.
II- No caso dos autos tal similitude ocorre e daí não se verificar a caducidade do direito à liquidação pois que, não tinha decorrido o prazo de 4 anos até à altura em que foi instaurado inquérito contra a ora impugnante nem decorreu mais um ano desde o arquivamento do dito inquérito, até à data em que foi efectuada e notificada a liquidação.
III- Também se mostra devidamente aplicado o coeficiente de 0,45 previsto à data no artº 53º nº 4 do CIRC por se tratar do proveito (enquadrável em restantes proveitos) resultante da venda ocasional de um imóvel sede da impugnante.
Nº Convencional:JSTA00069702
Nº do Documento:SA22016051101071
Data de Entrada:10/03/2014
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUG JUDICIAL.
Legislação Nacional:LGT98 ART45 N1 N4 N5.
CIRC01 ART53 N4.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0473/09 DE 2009/09/16.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO (no qual os destaques a negritos são da nossa autoria)

A sociedade comercial A…………, Ldª com o nº de identificação fiscal nº ………, veio deduzir impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2006, no montante de € 114.486,49.

Por sentença de 22 de abril de 2014, o TAF de Sintra julgou improcedente a acção de impugnação judicial.

Inconformada com o assim decidido, reagiu a recorrente, interpondo o presente recurso com as seguintes conclusões das alegações:

«1ª - A liquidação efectuada à Impugnante de um IRC de 2006, é manifestamente ilegal, porque ocorreu depois de decorrido o prazo máximo de caducidade de liquidação de IRC que é, nos termos das diferentes disposições do artigo 45.º da LGT, de 5 (cinco) anos.
2ª - Na verdade, o facto de o responsável pela Impugnante ter sido constituído arguido no âmbito de um processo-crime (que corre os seus termos sob o 1490/10.9IDLSB) apenas permite a suspensão da contagem do prazo de caducidade durante um ano, donde o prazo de caducidade nunca poderá exceder o prazo de 5 anos a contar da data em que se tenha verificado o acto gerador do imposto, que ocorreu, no caso em apreço, no último dia (31 de Dezembro) do exercício de 2006.
3ª - Assim, na data da liquidação do IRC — final de Março de 2013 — já tinha caducado o direito à liquidação, mesmo contando com o ano suplementar decorrente do disposto no nº 5 do artigo 45º da LGT.
4ª - A conceder-se, porém, que o prazo de caducidade ainda não tinha decorrido o cálculo do IRC liquidado à impugnante está errado, na medida em que ao proveito obtido foi aplicado o índice 0.45 quando, de acordo com a lei aplicável, deveria ter sido aplicado o índice 0.20, o que reduziria, de forma significativa a matéria colectável da impugnante e consequentemente, o imposto a pagar.»

Não houve contra alegações.

O EMMP pronunciou-se, emitindo parecer do seguinte teor:
«1 - Objeto do recurso.
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo o tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 608.º, n.º 2, 635.º, nºs 2 e 3 e 639.º, todos do Código de Processo Civil.
Analisando, pois, as apresentadas e, delimitando-se o objeto do recurso, resulta para decidir a caducidade da liquidação de IRC efetuada em 2006 em face do prazo máximo de 5 anos, nos termos das diferentes disposições do art. 45.º da L.G.T., bem como erro de cálculo da liquidação de acordo com a o art. 53.º n.º 4 do C.I.R.C..
2 - O caso concreto.
Do conjunto de factos dados como provados a fls. 2 e ss. da sentença recorrida (fls. 81 e ss. dos autos), resulta, resumidamente, que antes de liquidação de I.R.C. que foi efetuada à impugnante quanto ao exercício de 2006, por terem sido omitidos os proveitos resultantes da venda do imóvel sede da impugnante conforme escritura realizada a 20-11-2006 em Cartório de Alverca do Ribatejo, foi instaurado o inquérito n.º 1490/2010.9TDLSB, a 25-8-10, por crime de fraude fiscal, em que foi despacho de arquivamento contra a ora reclamante a 5-12-12, sendo após emitida liquidação a 20-3-13, que foi notificada a 27 desse mesmo mês, com base em certidão extraída do mesmo.
3 - Posições em confronto.
A recorrente vem defender que ocorreu a caducidade, por ter sido excedido o prazo máximo de cinco anos.
Na sentença recorrida julgou-se não ter sido excedido esse prazo, considerando que, não tendo decorrido o prazo de 4 anos até que foi instaurado o dito inquérito, nem decorrido mais um ano desde o dito arquivamento, nos termos previstos no art. 45.º nºs 1, 4 e 5 da L.G.T..
Por outro lado, o recorrente defende aplicação do índice 0,20 ao dito proveito, por aplicação do art. 45.º n.º 4 do C.I.R.C., enquanto na sentença recorrida se julgou válida a aplicação do coeficiente de 0,45 por se enquadrar em “restantes proveitos”.
4 - Direito aplicável.
Não são os factos apurados explícitos quanto aos factos que se referiu o dito inquérito, o que poderá resultar de fls. 17 a 20 do P.A.T. em que se sustenta o que ficou a constar na al. G).
Afigura-se, assim, ser de mandar ampliar a matéria de facto, nos termos do art. 682.º n.º 3 do C.P.C., aplicável subsidiariamente aplicável, nos termos do art. 2.º al. e) do C.P.P.T., conforme decidido pelo acórdão do S.T.A. de 1-10-14 proferido no recurso n.º 178/14, acessível em www.dgsi.pt.
Ainda assim, é de adiantar que o entendimento defendido pelo recorrente não tem suporte dos vários nºs do art. 45.º da L.G.T.
Com efeito, no n.º 5 deste dispositivo é previsto o alargamento do prazo de caducidade a que se refere o n.º 1 “até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano”.
Também não é de acolher o que a recorrente defende quanto à aplicação do previsto no art. 45.º do C.I.R.C. na versão vigente à data dos factos, disposição em que sob a epígrafe de “regime simplificado de determinação do lucro tributável”.
Previa-se no seu n.º 4 a aplicação de dois coeficientes: o de 0,20 ao “valor das vendas de mercadorias e produtos” e o de 0,45 para os “restantes proveitos”.
E, apesar de não haver no caso dependência de contabilidade, este último é ainda um conceito contabilístico que abrange as outras realidades para além das mercadorias vendidas e dos produtos fabricados, conforme previsto no art. 50.º n.º 1 do C.I.V.A. e se refere em artigo sobre os Regimes Simplificados em sede de I.R.S., I.R.C e IVA, acessível em www.otoc.pt/fotos/editor2/regimessimplificados.pdfbe.
Foi também já decidido, pelo acórdão do S.T.A. proferido a 16-9-09, no recurso n.º 0473/09, ser o coeficiente de 0,45 o aplicável.
5 - Concluindo:
É de revogar o decidido e remeter os autos ao tribunal recorrido, a fim de que, após apuramentos dos factos a que se referiu o referido inquérito criminal o que é essencial quanto à questão da caducidade, seja proferida nova decisão.»

2 – FUNDAMENTAÇÃO (na qual os destaques a negritos são da nossa autoria)

O Tribunal “ a quo” deu como provada a seguinte factualidade:
A. A impugnante é uma sociedade por quotas, com sede na Rua ………, actual Rua ………, nº ……, ………, Lisboa, cujo objecto é a indústria metalúrgica, enquadrada em IRC pelo regime simplificado, sendo B…………, o gerente único [cf. fls. 31 a 33 do PAT em apenso].
B. A 20.11.2006, no Cartório Notarial em Alverca do Ribatejo, B…………, na qualidade de sócio gerente da sociedade impugnante, celebrou uma escritura pública, onde declarou vender o prédio urbano sito na Rua ………, na freguesia da ………, concelho de Lisboa, pelo valor de €1.150.000,00 que recebeu da sociedade “C…………, S.A.” [cf. fls. 34 e 35 do PAT em apenso].
C. A venda identificada no ponto anterior não foi declarada como proveito na declaração de rendimentos para o ano de 2006 apresentada pela sociedade impugnante [cf. fls. 36 a 39 do PAT em apenso].
D. A 17.02.2009, B…………, representante legal da impugnante foi constituído arguido em sede do NUIPC 1105/08.5JDLSB-01 do Departamento de Investigação e Acção Penal [cf. fls. 50 do PAT em apenso].
E. A 25.08.2010 foi instaurado o processo de inquérito nº 1490/109IDLSB, com base em certidão extraída do NUIPC 1105/08.5JDLSB-01 do Departamento de Investigação e Acção Penal [cf. fls. 52 do PAT em apenso].
F. A 03.12.2010, a sociedade impugnante foi encerrada e a matrícula cancelada, facto registado na Conservatória do Registo Comercial [cf. fls. 106 do PAT em apenso].
G. Em cumprimento do despacho da Exma. Senhora Procuradora Adjunta da secção 0805 do DIAP — Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, datado de 05.07.2012, foi proferido despacho de arquivamento contra a sociedade impugnante, em virtude de estar a sua matrícula cancelada, cessando a sua personalidade jurídica, deduzida acusação contra B………..., por crime de fraude fiscal, e determinada a extracção de certidão dos autos do inquérito n.º 1490/10.9IDLSB, e a comunicação dos factos à Direcção de Finanças de Lisboa [cf. fls. 17 a 20 do PAT em apenso].
H. Na sequência do despacho identificado no ponto anterior, foi elaborado documento de correcção único com vista à liquidação do imposto correspondente a IRC de ano de 2006, determinando-se o lucro tributável de €517.500,00 (€1.150.000,00x0,45) [cf. fls. 22 do PAT em apenso].
I. O DC único identificado no ponto anterior resultou, em 20.03.2013, na emissão de liquidação de IRC n.º 8310001448, de 2006, no valor de €112.661,43, que originou uma nota de cobrança no valor de €114.488,46, com data limite de pagamento a 29.04.2013 [cf. fls. 13 do PAT em apenso].
J. A liquidação identificada no ponto anterior foi notificada à impugnante a 27.03.2013 [cf. fls. 48 do PAT em apenso].
K. Em virtude da liquidação identificada em I) não ter sido paga, foi extraída certidão de dívida que deu origem à instauração do processo de execução fiscal nº 3239201301072161 [cf. fls. 49 do PAT em apenso].
L. A presente impugnação judicial foi remetida via postal em 21.05.2013 [cf. carimbo aposto a fls. 3 dos autos].

3 – DO DIREITO
Para se decidir pela improcedente da impugnação, e absolvição da Fazenda Pública do pedido considerou-se na sentença recorrida a seguinte fundamentação de direito:
(…)
1112. DE DIREITO
A questão decidenda centra-se em saber, por um lado e a (i) título principal, se padece a liquidação ora controvertida de vício de lei, por ter sido emitida para além do prazo de caducidade, nos termos artigo 45º da Lei Geral Tributária, e a (ii) título subsidiário, se a mesma padece de excesso de quantificação, por ter sido calculado o imposto de forma indevido atendendo às regras do regime simplificado, no qual a sociedade impugnante se encontrava enquadrada.
Cumpre decidir.
(i.) Caducidade de direito de liquidação
A questão principal a decidir consiste em saber se o Impugnante foi notificado da liquidação de IRC dentro do prazo de caducidade do direito à liquidação. Alega o impugnante que, na data em que foi notificado da referida liquidação, já tinha decorrido o prazo de quatro anos, nos termos do artigo 45º, n.º 1 da Lei Geral Tributária.
O instituto da caducidade estabelece que os direitos, quer por força da lei ou de convenção das partes, devem exercidos dentro de certo prazo, e extinguem-se pelo seu não exercício durante o mesmo prazo.
O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos.
Em sede de direito tributário, estipula o artigo 45.º da Lei Geral Tributária, na redacção aplicável aos factos em apreço, que:
“1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.
(…)
4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. (Redação dada pela lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro)
5 - Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o nº 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença acrescido de um ano (aditado pelo nº 1 do artigo 57.º da Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro)
(…)
Sendo assente que estamos perante um imposto periódico – IRC, prazo de caducidade inicia a sua contagem a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, o que significa, no caso dos autos, que será o dia 31.Dez.2006 que marca o início do prazo de caducidade – cf. artigos 45.º, nº 4 da LGT, e artigo 8.º, nº 1 do CIRC.
Definida a data do início da contagem do prazo de caducidade, importa agora determinar qual o seu termo, entendendo o impugnante que a aplicação do prazo de quatro anos, nos termos do nº 1 do artigo 45º da LGT, e defendendo a AT a aplicação do disposto no nº 5 do citado dispositivo.
O disposto no nº 5 do artigo 45º da LGT é aplicável aos prazos de caducidade em curso à data da entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, por força do nº 2 do artigo 57.º, da referida lei.
De acordo com a factualidade assente, no ano de 2010 foi instaurado o processo de inquérito nº 1490/10.9IDLSB, com base em certidão extraída do NUIPC n.º 1105/08.5JDLSB-01 do Departamento de Investigação e Acção Penal (cf. aI. E) dos factos assentes).
Este facto ocorreu antes de ter sido ultrapassado o prazo de caducidade estabelecido no n.º 1 do artigo 45º da LGT, ou seja, quatro anos após 31.Dez.2006 – 31.Dez.2010.
Por despacho da Exma. Senhora Procuradora Adjunta da secção 0805 do DIAP, datado de 05.07.2012, foi proferida decisão de arquivamento contra a sociedade impugnante, em virtude de estar a sua matrícula cancelada, e determinada a comunicação dos factos à Direcção de Finanças de Lisboa, para os efeitos dados por convenientes [cf. al. G) dos factos assentes].
Nos termos do nº 5 do artigo 45º da Lei Geral Tributária, o prazo de caducidade de quatro anos (prazo geral) é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano no caso de instauração de inquérito criminal.
No caso em apreço verificamos que em virtude da matrícula da sociedade impugnante ter sido cancelada, constando tal facto registado na Conservatória do Registo Comercial (cf. al. F) dos factos assentes], tal importou a extinção da sua personalidade jurídica, o que determinou o despacho de arquivamento do procedimento criminal, não obstante ter sido deduzida acusação contra o representante legal daquela sociedade.
Assim, proferido o despacho de arquivamento do procedimento criminal contra a sociedade impugnante, a 05.07.2012, o prazo de caducidade para proceder à liquidação de IRC, relativa à sociedade, por factos surgidos em sede daquele procedimento, foi alargado por mais um ano.
Considerando que a liquidação aqui em análise foi recepcionada pelo impugnante a 27.03.2013 [cf. al. I) dos factos assentes], verificamos que não foi excedido o prazo de um ano após o despacho de arquivamento do procedimento criminal instaurado contra a sociedade impugnante.
Termos em que se julga improcedente o fundamento invocado pelo impugnante quanto à caducidade de direito de liquidação.
Subsidiariamente, importa então analisar o seguinte fundamento.
(ii) Excesso de quantificação
Alega o impugnante que aplicando o regime simplificado na determinação da matéria tributável, o valor a ser encontrado deveria ser 20% (factor 0,20) do valor da alienação de €1.150.000,00, na medida em que estamos perante um bem/produto, propriedade da empresa, e não o factor 0,45, como defende a AT.
Tal resultaria, no entendimento da impugnante, na fixação da matéria colectável em €230.000,00, ao qual se aplicaria a taxa de 20%, nos termos do artigo 809, n.2 3 do CIR, resultando no montante de imposto a pagar de €46.000,00.
Vejamos.
Nos termos do nº 4 do artigo 53º do IRC em vigor à data dos factos, “[n]a ausência de indicadores de base técnico-científica ou até que estes sejam aprovados, o lucro tributável, sem prejuízo do disposto no nº 11, é o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e do coeficiente de 0,45 ao valor dos restantes proveitos, com exclusão da variação de produção e dos trabalhos para a própria empresa, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado.”
Ou seja, determinante para aferirmos sobre qual o coeficiente a aplicar ao rendimento bruto para determinação do lucro tributável, será saber qual a qualificação do rendimento em análise, ou seja, saber se estamos perante uma mercadoria/produto da sociedade, ou de um outro proveito.
As mercadorias consistem em bens que se encontram registados nas existências, bens armazenáveis adquiridos ou produzidos pela empresa e que se destinam à venda ou a serem incorporados na produção.
Como resulta dos factos provados, o rendimento aqui em análise consiste no produto da venda da sede da sociedade impugnante [cf. als. A) e B) dos factos assentes], sendo que a sociedade impugnante tem por objecto social a indústria metalúrgica [cf. al. A) dos factos assentes], logo, não se trata de um bem que possa ser qualificado como mercadoria ou produto da empresa.
Situação diferente seria aquela em que uma sociedade tem por objecto a compra e venda de imóveis, onde os imóveis podem ser considerados mercadorias. Não sendo esse o caso em análise, não se pode enquadrar a sede da sociedade como uma mercadoria (existência), mas sim como imobilizado corpóreo.
Verificamos assim que no caso aqui em análise o bem alienado com faz pode ser enquadrado no conceito de mercadorias e outros produtos similares, e como tal sujeito a um coeficiente de 0,20, mas sim enquadrável nos “restantes proveitos”, sujeitos a um coeficiente de 0,45.
Assim sendo, temos de concluir pela improcedência da presente acção, mantendo-se o acto impugnante na esfera jurídica, e absolvendo-se a Fazenda Pública do pedido.
Fixa-se o valor da acção em €114.488,46 (cf. artigos 296º. e 30º., nº 1 e 2, ambos do CPC/2013, aplicável ex vi al. e) do artigo 2º do CPPT, e do artigo 97º-A, nº 1, aI. a) do CPPT — cf. al. I) dos factos assentes).

Tendo dado causa ao processo, é o Impugnante responsável pelo pagamento das custas respectivas (artigo 527º do CPC/2013 ex vi al. e) do artigo 2º do CPPT).

IV - DECISÃO
Nestes termos e nos das disposições legais citadas, julga-se improcedente a presente acção de impugnação, mantendo-se o acto de liquidação impugnado, e absolvendo-se a Fazenda Pública do pedido.
Custas pelo Impugnante (artigo 527º do CPC/2013). Registe e notifique.
Após trânsito comunique a presente decisão ao Proc. 1490/10.9IDLSB, do 5.° Juízo Criminal de Lisboa -5º Juízo/2ª Secção.

DECIDINDO NESTE STA

As questões que se suscitam e que cumpre a este STA dilucidar consistem em saber se ocorre ou não a caducidade do direito da Fazenda Pública à liquidação do IRC do ano de 2006, liquidado em 2013, e se chegarmos à conclusão de que não ocorre a alegada caducidade cumprirá saber se a liquidação efectuada está errada por ao proveito obtido ter sido aplicado o índice 0.45 quando, segundo alega a recorrente de acordo com a lei aplicável, deveria ter sido aplicado o índice 0.20.
Do probatório resulta que antes de ser efectuada liquidação de I.R.C. à efectuada à impugnante, por terem sido omitidos proveitos resultantes da venda do imóvel sede da impugnante foi instaurado contra esta inquérito, por crime de fraude fiscal, no qual foi proferido despacho de arquivamento em 05-07-2012, com remessa de certidão dos autos de inquérito nº 1490/10.9IDLSB à Direcção Distrital de Finanças de Lisboa após o que foi emitida liquidação de IRC de 2006 em 20-03-2013, que foi notificada a 27 desse mesmo mês, com data limite de pagamento a 29/04/2013.
Entende a ora recorrente que ocorreu a caducidade, por ter sido excedido o prazo máximo de cinco anos.
Mas na sentença recorrida julgou-se não ter sido excedido esse prazo, considerando que, não tinha decorrido o prazo de 4 anos até quando foi instaurado inquérito contra a ora impugnante nem decorrido mais um ano desde o dito arquivamento, até à data em que foi efectuada a liquidação.
Tal julgamento, adiantamos desde já, mostra-se acertado.
Vejamos melhor: No caso em apreço, estamos perante um tributo de IRC do ano de 2006, e tratando-se de um imposto periódico, o prazo de caducidade da liquidação conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, o que significa que, é o dia 31-12-2006 que marca o início do prazo em apreço, pelo que a Administração Tributária tinha de proceder à sua liquidação e notifica-la até 31-12-2010, de acordo com o regime estabelecido no art. 45º nºs 1 e 4 da LGT..
Sucede que, por força da Lei nº 60-A/2005, de 30-12-2005, que entrou em vigor a 1-1-2006, foi aditado um novo nº 5 ao citado artigo 45º da LGT, o qual dispõe que, sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o nº 1 desse normativo é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.
Assim aplicando-se ao caso dos autos o dito nº 5 do artigo 45º da LGT, é evidente que à data em que aquela liquidação foi emitida e notificada - 27/03/2013 - (cf. resulta da alínea J) do probatório) não tinha ocorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação do referido tributo, pelo simples facto de, a partir de 1-1-2006 (data da entrada em vigor do art. 45º, nº 5, da LGT), ter entrado em vigor uma causa de suspensão daquele prazo: a instauração de inquérito criminal. A tese da ora recorrente de que este mencionado preceito estipula um prazo máximo de cinco anos de caducidade quando no seu dizer refere: “apenas permite a suspensão da contagem do prazo de caducidade durante um ano, donde o prazo de caducidade nunca poderá exceder o prazo de 5 anos a contar da data em que se tenha verificado o acto gerador do imposto, que ocorreu, no caso em apreço, no último dia (31 de Dezembro) do exercício de 2006” não tem o mínimo suporte legal.
Em conclusão não obstante a notificação da liquidação do IRC de 2006 ter sido efectuada só em 27/03/2013 ainda não tinha decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação por aplicação do disposto no artº 45º nº 5 da LGT em virtude da instauração de inquérito criminal à sociedade impugnante e ora recorrente o qual só foi arquivado em 05/07/2012.
Resta acrescentar que no caso dos autos os elementos levados ao probatório permitem perceber que a liquidação impugnada deriva de correcções efectuadas à declaração de IRC do ano de 2006 motivadas pela venda de um imóvel que constituía a sede da impugnante cujos proveitos não foram declarados. Assim e com todo o respeito pelo parecer do Sr. Procurador Geral Adjunto neste STA, supra destacado, entendemos que não se justifica a ampliação do probatório como foi determinado no recurso citado no dito parecer (no qual o ora Relator interveio como adjunto) sendo em ambos os recursos muito distinta a matéria de facto dada como assente em ambos os recursos e com graus de esclarecimento muito diferentes qualificando-se a do presente, como suficientemente esclarecedora dos termos e razões da liquidação ora impugnada. Com efeito, a nosso ver mostra-se estabelecida a identidade entre os factos investigados no inquérito criminal referido nas alíneas B) a E) do probatório, e os factos que, na sequência do procedimento de inspecção, deram origem à liquidação impugnada vide alíneas G) a I) do mesmo probatório,

Cumpre agora verificar se ocorreu algum erro da sentença quando considerou legal a liquidação.
Concordamos que também não é de acolher o que a recorrente defende quanto à aplicação do previsto no art. 45.º do C.I.R.C. na versão vigente à data dos factos, disposição em que sob a epígrafe de “regime simplificado de determinação do lucro tributável”, previa no seu número n.º 4 a aplicação de dois coeficientes: o de 0,20 ao “valor das vendas de mercadorias e produtos” e o de 0,45 para os “restantes proveitos”, ou seja residualmente para todas as situações em que a venda não abrange as mercadorias vendidas e os produtos fabricados.
Dispunham à data os preceitos que agora nos interessam o seguinte:

artigo 53º

Regime simplificado de determinação do lucro tributável

1 - Ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos residentes que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30 000 000$00 ((euro) 149 639,37) e que não optem pelo regime de determinação do lucro tributável previsto na secção II do presente capítulo.
(Redacção do Decreto-lei n.º DL 198/2001, de 3 de Julho)
(…)
4 - Na ausência de indicadores de base técnico-científica ou até que estes sejam aprovados, o lucro tributável, sem prejuízo do disposto no n.º 11, é o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e do coeficiente de 0,45 ao valor dos restantes proveitos, com exclusão da variação de produção e dos trabalhos para a própria empresa, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado.
(Redacção dada pelo n.º 1 do artigo 44º da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro)

Como se decidiu no acórdão deste S.T.A. proferido a 16-9-09, no recurso n.º 0473/09, em situação similar:

“(…) quanto à questão da determinação do lucro tributável emergente do apurado e anormal ganho obtido pela Recorrente durante o questionado exercício e decorrente da apurada e não controvertida venda do referido e convenientemente identificado prédio urbano, cremos não poder deixar de concluir que lhe assiste razão.
Com efeito e tal como se sustenta nas conclusões 5ª a 7ª das alegações da Recorrente, ao contribuinte que esteja sujeito ao regime simplificado de determinação do lucro tributável – cfr. artigo 53º do CIRC -, este lucro tributável haverá de ser sempre determinado mediante aplicação, a todos os proveitos obtidos durante o exercício em causa e, como aqui, mesmo aos ganhos anormalmente conseguidos, mediante aplicação, dizia, do coeficiente respectivo – 0,20 para venda de mercadorias e ou produtos e de 0,45 ao valor dos restantes proveitos.
Ora, compulsados os presentes autos, designadamente o teor da questionada e impugnada liquidação adicional – cfr. fls. 73 demonstração de liquidação – importa concluir que ao apurado ganho com a venda do referido imóvel “ …prédio urbano pelo valor de € 1.072.500,00, o qual foi adquirido em 21/05/1974, por € 3.446,69 (valor actualizado mediante aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda – Portaria n.º 267/2003, de 3 de Abril) ganho que constituiu uma mais-valia de €977.991,67. Quiçá por não oportunamente declarado, na liquidação adicional subsequente, não foi aplicado, como deveria – cfr. artigo 53º n.º 4 e 10 do CIRC -, o coeficiente aplicável – 0,45 – pois de outros ou restantes proveitos se tratava, para, assim, se determinar o lucro tributável respectivo e a tributar adicionalmente, uma vez que a Impugnante estava, ao tempo do exercício, abrangida pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável.
E mesmo tratando-se de proveito qualificável como mais valia tal, por si só, não demanda alteração nas regras de determinação do lucro tributável e tributação aplicáveis, no regime pelo qual a Impugnante se encontrava abrangida.
É certo que o invocado artigo 53º do CIRC, no seu número 4º, prevê ainda, salvaguardando, para a determinação do lucro tributável neste regime simplificado, a possibilidade de correcção dos valores de base contabilística necessários pela Direcção Geral dos Impostos, nos termos gerais. Mas, ainda assim e como aqui, sem prejuízo do disposto no seu número anterior, isto é, “Cessa a aplicação do regime simplificado …, caso em que o regime geral de determinação do lucro tributável se aplica a partir do exercício seguinte …”
Quer dizer, porventura corrigidos os valores contabilísticos a atender no apuramento do lucro tributável, ao contribuinte abrangido pelo regime simplificado de determinação daquele lucro não deixam, nesse exercício, de continuar a ser-lhe aplicáveis as regras antes fixadas – cfr. artigo 53º n.º 4 do CIRC -, a saber: a aplicação do coeficiente respectivo – 0,20 ou 0,45 – aos valores corrigidos ou apurados.
Não pode pois, face ao que exposto fica, manter-se a impugnada liquidação adicional nem a sindicada sentença que lhe deu acolhimento.(…)

Do mesmo modo, nos presentes autos foi bem aplicado o coeficiente de 0,45 por ser o previsto legalmente para a venda isolada do edifício sede da impugnante.

Preparando, a decisão formulam-se as seguintes conclusões:

I – A contagem do prazo de caducidade do direito de liquidar tributos nos termos do art. 45º, nº 5, da LGT, só ocorre se o acto tributário de liquidação e a investigação criminal se referirem aos mesmos factos.
II- No caso dos autos tal similitude ocorre e daí não se verificar a caducidade do direito à liquidação pois que, não tinha decorrido o prazo de 4 anos até à altura em que foi instaurado inquérito contra a ora impugnante nem decorreu mais um ano desde o arquivamento do dito inquérito, até à data em que foi efectuada e notificada a liquidação.
III- Também se mostra devidamente aplicado o coeficiente de 0,45 previsto à data no artº 53º nº 4 do CIRC por se tratar do proveito (enquadrável em restantes proveitos) resultante da venda ocasional de um imóvel sede da impugnante.

Por tudo o que ficou dito improcede o recurso sendo de manter a decisão recorrida.

4- DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso confirmando a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente.
Lisboa, 11 de Maio de 2016. – Ascensão Lopes (relator) – Ana Paula LoboDulce Neto.