Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0421/17.0BEVIS
Data do Acordão:06/26/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
LEGITIMIDADE ACTIVA
Sumário:Não se justifica admitir recurso excepcional de revista relativamente à questão de saber se o subscritor de um projecto de arquitectura tem legitimidade activa para impugnar o acto que indeferiu uma pretensão urbanística, com o qual o requerente se conformou.
Nº Convencional:JSTA000P24720
Nº do Documento:SA1201906260421/17
Data de Entrada:04/29/2019
Recorrente:A............
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE VISEU
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………, devidamente identificado nos autos, recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Norte, proferido em 11 de Janeiro de 2019, na ACÇÃO ADMINISTRATIVA por si intentada contra o MUNICÍPIO DE VISEU, confirmando a sentença que julgou verificada a excepção da ilegitimidade activa e, consequentemente, absolveu o réu da instância.

1.2. Fundamenta a admissibilidade da revista por entender que a questão poderá influir noutros profissionais do sector – uma vez que o acto indeferiu uma pretensão urbanística com o único fundamento do autor (ora recorrente) não ter competência para assinar o respectivo projecto de arquitectura.

1.3. A entidade recorrida não contra-alegou.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. Tanto a primeira instância, como o TCA Norte – embora este com um voto de vencido – entenderam que o autor (ora recorrente) não tinha legitimidade activa para impugnar o indeferimento de uma pretensão urbanística formulada por B…………, apesar do único fundamento desse indeferimento ter sido a incompetência do autor – detentor da qualidade de Agente Técnico de Arquitetura e Engenharia – não ter competência para elaborar e assinar o projecto de arquitectura.

3.2. O TCA Norte colocou a questão nos termos seguintes: “resta saber se a eventual anulação do acto impugnado teria como consequência directa e imediata a inscrição na esfera jurídica do recorrente, de uma vantagem ou utilidade concreta de natureza patrimonial ou não patrimonial, a ponto de lhe conferir legitimidade processual ou, noutra perspetiva, interesse em agir ou necessidade de tutela jurisdicional”. Questão a que respondeu negativamente, por entender que a eventual anulação do acto, com efeitos restritos ao caso concreto, não lhe concederia, naturalmente, a faculdade legal de poder imediatamente elaborar tais projectos e vê-los aceites em todos os procedimentos de licenciamento de obras. Assim a anulação do acto impugnado trazia ao recorrente “… uma mera satisfação de ver o seu projecto de arquitectura aceite in casu, inclusive perante o seu cliente (requerente do licenciamento), sem qualquer influência directa e certa no exercício actual e futuro da sua actividade, na vertente em causa”.

O acórdão recorrido tem um voto de vencido, como já referimos, admitindo a legitimidade passiva com o argumento de que o recorrente foi lesado no direito a subscrever projectos de arquitectura.

3.3. A nosso ver não se justifica admitir a revista, desde logo porque o interesse jurídico directamente lesado com a prática do acto impugnado localiza-se na esfera jurídica do requerente da pretensão urbanística indeferida. O titular do interesse directo afectado com a prática do acto – requerente do licenciamento - conformou-se com o indeferimento e, portanto para ele, as consequências do desfecho desta acção, são inócuas. No âmbito das acções impugnatórias (que visam o julgamento da validade de actos administrativos), a legitimidade activa é aferida em função da alegação da titularidade de um “interesse directo e pessoal”, afastando-se assim – como decidiram as instâncias – os casos em que é alegado um interesse indirecto ou reflexo – art. 55º, 1, a) do CPTA. Ou seja, no âmbito das acções impugnatórias de actos administrativos a noção de legitimidade activa está ligado aos efeitos concretos do acto administrativo na esfera daquele que é seu destinatário imediato.

Por outro lado, a lei confere legitimidade activa para a instauração de acções administrativas – não impugnatórias de actos administrativos – a “(…) quem invoque utilidade ou vantagem imediata, para si, na providência jurisdicional pretendida, designadamente por existir uma situação de incerteza, de ilegítima afirmação por parte da Administração da existência de determinada situação jurídica, como nos casos de inexistência de ato administrativo, ou o fundado receio de que a Administração possa vir a adoptar uma conduta lesiva, fundada numa avaliação incorrecta da situação jurídica existente.” – art. 39º, 1 do CPTA. Sendo possível pedir, através da acção administrativa (não impugnatória de acto administrativo) o “reconhecimento de qualidades ou do preenchimento de condições” – art. 37º, 1, g) do CPTA. Ou seja, a lei prevê a existência da acção administrativa visando especialmente a finalidade pretendida pelo ora recorrente, fora do âmbito da acção impugnatória; isto é, uma acção através da qual o ora recorrente pode pedir o reconhecimento da qualidade que o Município ora recorrido lhe negou.

Deste modo, perante o actual quadro legal não se justifica a intervenção deste Supremo Tribunal uma vez que, por um lado, o conceito de legitimidade activa, nas acções impugnatórias de actos administrativos, acolhido no acórdão recorrido, não se mostra eivado de erro manifesto e, por outro lado, é patente a existência de meios processuais adequados que possibilitam ao autor a discussão e, se tiver razão, a imposição à Administração do reconhecimento da qualidade que lhe foi negada.

Não se justifica, portanto, a admissão da revista.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pelo recorrente.

Porto, 26 de Junho de 2019. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.