Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0490/17
Data do Acordão:05/23/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:ISENÇÃO DE CUSTAS
CUSTAS DE PARTE
Sumário:A isenção de custas não abarca as custas de parte (nº 7 do art. 4º do RCP).
Sendo aplicável o disposto no n° 7 do art. 4° do RCP (na redação actual), a isenção de custas de que goza a Fazenda Pública não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte.
Nº Convencional:JSTA000P23316
Nº do Documento:SA2201805230490
Data de Entrada:04/24/2017
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:EDP - ENERGIAS DE PORTUGAL, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública interpõe recurso do despacho proferido em 4/10/2016 (a fls. 574) no Tribunal Tributário de Lisboa, no qual se julgou improcedente a reclamação que apresentara contra a nota discriminativa e justificativa das custas de parte, apresentada pela impugnante/recorrida EDP – Energias de Portugal, S.A.

1.2. Terminou as alegações formulando as conclusões seguintes:
a. O presente recurso vem interposto da decisão proferida pelo Exmo. Juiz do Tribunal a quo, que julgou improcedente a reclamação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte no processo à margem referenciado.
b. Destarte, salvo o devido respeito pela opinião sufragada na decisão ora recorrida, somos da opinião que o Meritíssimo Juiz a quo fez uma errada interpretação da lei aplicável ao caso em apreço, como infra melhor se exporá.
c. Considera, o Meritíssimo Juiz no douto despacho aqui em crise, para julgar improcedente a presente reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, que:
Assim, considerando a norma transitória constante do n° 12 do art. 8° da Lei n° 7/2012, de 13 de Fevereiro, e a nova redação dada por este diploma ao n° 7 do artigo 4° do RCP, e atenta a data de entrada em tribunal da nota discriminativa e justificativa de custas de parte (20.04.2015), há lugar, no caso dos autos, ao pagamento de custas de parte pela Fazenda Pública.
d. Neste pendor, o thema decidendum assenta em determinar se, nos processos instaurados antes de 01/01/2004, onde a FP se encontrava isenta de custas, a mesma é, apesar da isenção e enquanto parte vencida, responsável pelo pagamento de custas de parte à parte vencedora.
e. Por outro lado — no caso da decisão ir no sentido de que a FP é responsável pelo pagamento das referidas custas de parte —, importa saber se, integrando-se as custas de parte no âmbito da condenação judicial por custas, e não tendo a FP sido condenada em custas em nenhuma fase do processo, pode, ainda assim, ser responsabilizada pelas custas do processo.
f. Diga-se, desde já, que é nosso entendimento que não poderá ser assacada, à FP, qualquer responsabilidade pelo pagamento de tais custas de parte.
g. No acórdão do TCA Sul de 15 de Janeiro de 2013 [cuja redação, na parte relativa a custos, foi alterado pelo acórdão de 19 de Março de 2015], cujo segmento decisório, na parte relativa às custas, pôs termo ao processo, não foi, a FP condenada em custas, dispondo, tal decisão no segmento referente a custas, o seguinte:
Sem custas”.
h. Ora, in casu estamos perante uma impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação de IRC referente ao exercício de 1993, cuja petição inicial deu entrada nos serviços competentes em 10 de Fevereiro de 1999, tendo o processo sido instaurado no TT de Lisboa em 2003.
i. Assim sendo, ao mesmo aplica-se o CCJ, aprovado pelo DL 224-A/96 de 26/11 [prévio à entrada em vigor do RCP], na redação anterior às alterações introduzidos pelo DL 324/03 de 27/12, dado que estas só se aplicam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor [de acordo com o disposto no art. 14° deste último diploma].
j. Desta forma, deve atender-se ao previsto na al. a) do n° 1 do art. 2° do CCJ, que contém uma isenção subjectiva, quanto a custas, relativamente ao Estado, incluindo os seus serviços ou organismos, ainda que personalizados.
k. Acresce que, após a entrada em vigor do RCP, aprovado pelo DL 34/2008 de 26/2, a FP — atento o disposto no art. 27° deste diploma legal — continuou a beneficiar da referida isenção.
1. O mesmo se verificando, actualmente, após a entrada em vigor das alterações introduzidas ao RCP pela Lei 7/2012 de 13/02, a qual, no n° 4 do art. 8°, prevê que “Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, (...) e a isenção aplicada não encontre correspondência na redação que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei mantém-se em vigor no respetivo processo, a isenção de custas (sublinhado da recorrente).
m. Nesta senda, abrangendo o conceito de custos processuais nos termos do disposto no n° 1 do art. 3° do RCP, a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte tal isenção terá, necessariamente, de implicar a não obrigação de pagamento de custas de parte nos presentes autos.
n. No entanto, ainda que assim não fosse (o que só por mera hipótese académica se coloca), verifica-se que a FP jamais foi condenada em custas nos segmentos decisórios dos diversos arestos que, em cada instância, decidiram o processo.
o. Significa isto que, abrangendo o conceito de custas processuais as custas de parte, e não tendo, a FP sido condenada em custas em qualquer fase do processo, jamais poderia ser condenada ao pagamento de custas de parte.
p. Ainda assim, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo entende ser de aplicar, in casu, o n° 12 do art. 8° da Lei 7/2012 de 13/02, que prevê:
São aplicáveis a todos os processos pendentes as normas do Regulamento das Custas Processuais, na redação que lhe é dada pela presente lei respeitantes às custas de parte, incluindo as relativas aos honorários dos mandatários, salvo se a respectiva nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior à entrada em vigor da presente lei.”
q. Salvo o devido respeito entende, a FP, que o n° 12 do art. 8° da Lei 7/2012 de 13/02, não se poderá aplicar aos processos isentos de custas ao abrigo do n° 4 do art. 8° da mesma lei, uma vez que, da análise à mencionada Lei, resulta claro que o referido n° 12 se aplica às custas de parte nos processos instaurados a partir de 01/01/2004.
r. Ou seja, o que este n° 12 vem dizer é que, aos processos pendentes instaurados a partir dessa data (01/01/2004), são aplicáveis as normas do RCP na redacção introduzida pelo Lei 7/2012 de 13/02, excepto se a nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior à entrada em vigor da referida lei.
s. Em função do exposto, dúvidas não restam de que a sentença recorrida fez uma aplicação inadequada da Lei 7/2012 de 13/02, razão pela qual não merecerá ser confirmada.
Termina pedindo que seja dado provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida.

1.3. Contra-alegou a recorrida EDP apresentou contra-alegações, nos termos seguintes, além do mais:
«II. DA RESPONSABILIDADE PELAS CUSTAS DE PARTE
18° - A Fazenda Pública beneficiou no presente caso de uma isenção subjectiva de custas prevista no artigo 2°, n° 1, al. a), do Código das Custas Judiciais («CCJ»), que abrange o Estado e inclui os seus serviços ou organismos, nomeadamente a Fazenda Pública.
19° - Apesar de esta isenção ter sido revogada pelo Decreto-Lei n° 324/2003, de 27/12, que procedeu à alteração do CCJ, esse diploma só se aplica aos processos instaurados após 1 de Janeiro de 2004, a data da sua entrada em vigor.
20° - Desta forma, tendo o presente processo sido instaurado no Tribunal Tributário de Lisboa em 1999, a isenção subjectiva de custas foi devidamente aplicada no presente processo.
21° - Acrescente-se que esta isenção veio a ser salvaguardada pelo artigo 27° do Decreto-Lei n° 34/2008, de 26 de Fevereiro, diploma que aprovou o Regulamento das Custas Processuais.
22° - Mais, esta isenção também se manteve após a entrada em vigor das alterações introduzidas ao RCP pela Lei n° 7/2012 de 13/02, a qual no seu artigo 8°, n° 4 estabelece que:
Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, ou em que não havia lugar ao pagamento de custas em virtude das características do processo, e a isenção aplicada não encontre correspondência na redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei, mantém-se em v:gor, no respectivo processo, a isenção de custas.
23° - Questão diferente consiste em saber se esta isenção de custas abrange as custas de parte.
24° - Temos então que atender ao disposto na norma transitória prevista no artigo 8°, n° 12, da Lei 7/2012, de 13 de Fevereiro que, como referido anteriormente, veio introduzir alterações ao RCP. Dispõe esta norma que:
São aplicáveis a todos os processos pendentes as normas do Regulamento das Custas Processuais na redacção que lhe é dada pela presente lei, respeitantes às custas de parte, incluindo as relativas aos honorários dos mandatários, salvo se a respectiva nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior à entrada em vigor da presente lei.” (...)
25º - Ou seja, relativamente às custas de parte, esta norma transitória manda aplicar o disposto no RCP aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, desde que a nota discriminativa tenha sido remetida à outra parte após a entrada em vigor da Lei n° 7/2012, de 13 de Fevereiro.
26° - Assim, ainda que pelas razões previamente explanadas se aplique neste processo a isenção prevista no CJ (pese embora este diploma já tenha sido revogado), em matéria de custas de parte é salvaguardada a aplicação das normas do RCP.
27° - Também neste sentido se pronunciou o Exmo. Senhor Magistrado do Ministério Público em parecer emitido a 5 de Setembro de 2016, no âmbito do presente processo: “Assim, e no que a estas diz respeito, o legislador veio estabelecer, no art. 8º n° 12, da Lei nº 7/2012, de 13-02, que as custas de parte nos processos pendentes à data da sua entrada em vigor são devidas nos termos aí expressos […]”.
28° - Desta forma, para aferir da responsabilidade pelo pagamento das custas de parte, devemos tomar em consideração o que dispõe o artigo 4º, n° 7, do RCP:
Com excepção dos casos de insuficiência económica, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, a isenção de custas não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte que, naqueles casos, as suportará” (...)
29° - Pelo que se deve entender que, apesar de a Fazenda Pública estar isenta de custas, esta isenção não abrange as custas de parte devidas à ora recorrida enquanto parte vencedora no presente processo.
30° - Por outras palavras, ainda que uma entidade goze de uma isenção de custas, sendo vencida num processo, sempre deve suportar os gastos em que a parte vencedora tenha incorrido com o processo.
31° - Neste sentido, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 7 de Janeiro de 2016, proferido no âmbito do processo n° 0315/15:
Assim, a norma do n° 7 do artigo 4° do RCP (na redação atual) é aplicável […] pelo que o Autor/Recorrido, não obstante estar em geral isento de custas não está isento, por expressa determinação da lei, da componente referente às custas de parte devidas à Ré/Recorrente.” (...)
32° - Conforme evidencia Salvador da Costa, o artigo 4°, n° 7 do RCP contém um dispositivo inovador no âmbito deste Regulamento e «[d]ele resulta que as entidades que gozem de isenção subjectiva ou objectiva de custas, sejam de direito público ou privado, e fiquem vencidas, devem, em regra, suportar o pagamento às partes vencedoras do valor que elas hajam despendido com o processo e se integre no âmbito do conceito de custas de parte.» — cfr. Regulamento das Custas Processuais Anotado, Almedina, 2013, p. 185.
33º - Em suma, e ao contrário do que sustenta a Fazenda Pública, a expressão “sem custas” mencionada no acórdão de 19 de Março de 2015, refere-se tão só à isenção de custas de que a Fazenda Pública tem direito enquanto parte vencida, não abrangendo as custas de parte, nem a desonerando da responsabilidade pelo respectivo reembolso à parte vencedora.»
Termina pedindo que o recurso seja julgado improcedente e se confirme a decisão recorrida.

1.4. O Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal emitiu Parecer nos termos seguintes:
«Recorre a Fazenda Pública da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa de 04.10.2016, a fls. 573 a 575, que julgou improcedente a reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte.
Creio que não assiste razão à ora Recorrente revendo-se o MP, nesta sede, no conjunto de argumentos vertidos no parecer de fls. 567 e sgs. e na decisão recorrida que encontram inegável amparo na letra da lei e na jurisprudência deste STA, concretamente no douto acórdão da SCA de 07.01.2016, in proc. n° 0315/15, referenciado na Contra-Alegação da entidade recorrida.
Com efeito, de acordo com a regra do art. 6°, n° 1 da Lei n° 7/2012, de 13 de Fev., o RCP, na redacção dada por essa lei, é aplicável aos processos iniciados após a sua entrada em vigor e aos processos pendentes nessa data, sem prejuízo das regras transitórias definidas nos números seguintes. Uma das regras, com aplicação no caso dos autos, é a da manutenção em vigor da isenção de custas, quando a isenção aplicada não encontre correspondência na redacção que é dada ao RCP pela Lei n° 7/2012, sendo certo que as custas de parte se incluem no conceito de custas processuais (art. 8°, n° 4 da Lei n° 7/2012, de 13 de Fev. e art. 3°, n° 1 do RCP).
Contudo, no que especificamente respeita às custas de parte, dispõe o n° 12 do citado art. 8° da Lei n° 7/2012 que as normas do RCP a elas respeitantes, na redacção dada pelo diploma em causa, são aplicáveis a todos os processos pendentes, salvo se a respectiva nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior à entrada vigor da lei, o que manifestamente não é o caso (sublinhado nosso). A norma não exclui da aplicação dessas regras quaisquer processos, não excluindo designadamente os processos instaurados em data anterior a 01.01.2004. A expressão “todos” utilizado na norma não dá margem para outro entendimento, O argumento aduzido pela Recorrente de que a regra do n° 12 do art. 8° da Lei n° 7/2012 apenas se aplica às custas de parte nos processos instaurados a partir de 01.01.2004 (cfr. Conclusões q. e r,) não tem, salvo o devido respeito e melhor entendimento, qualquer apoio legal.
Nesta conformidade, negando-se provimento ao presente recurso, sou de parecer que deverá ser mantida a decisão recorrida.».

1.5. Corridos os Vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
2.1. A decisão recorrida é a seguinte:
«Tendo a Impugnante apresentado nota discriminativa e justificativa de custas de parte, com um valor a pagar de € 8.697,75 [cfr. fls. 524 dos autos (numeração em suporte de papel, tal como nas posteriores referências sem menção de origem)], a Fazenda Pública apresentou, a fls. 536 a 540, reclamação da mesma, ao abrigo do disposto no artigo 33° da Portaria n° 419-A/2009, de 17 de Abril, alegando, em síntese, que não lhe deve se assacada qualquer responsabilidade pelo pagamento das custas de parte, dado que, integrando-se as mesmas no âmbito da condenação judicial por custas, a Fazenda Pública não foi condenada em custas.
Requer, a final, a procedência da reclamação.
Atento o disposto no artigo 33° da Portaria n° 419-A/2009, de 17 de Abril, cumpre analisar o mérito da pretensão da reclamante.
A questão que se coloca traduz-se em saber se, não tendo a Fazenda Pública sido condenada em custas, porquanto se encontrava isenta do seu pagamento à data da interposição da impugnação, podem ser-lhe exigidas as custas de parte por ter sido vencida na acção.
Como decorre do disposto nos artigos 533° do Código de Processo Civil (CPC) e 26° do Regulamento das Custas Processuais (RCP), as custas de parte são pagas pela parte vencida, na proporção do seu decaimento.
Contudo, de facto, à data da apresentação da presente impugnação, a Fazenda Pública estava isenta de custas [embora as disposições que isentavam a Fazenda Pública de custas tivessem sido revogadas pelo artigo 4° do Decreto-Lei n° 324/2003, de 27 de Dezembro, deixando a Fazenda Pública de beneficiar de isenção no Código das Custas Judiciais que entrou em vigor no dia 01.01.2004 (artigo 16°), este diploma só se aplica aos processos instaurados após a sua entrada em vigor (artigo 14°, n° 1)], razão pela qual não foi condenada no pagamento das custas do processo.
Esta isenção tem vindo a ser salvaguardada, de resto, tanto pelo artigo 27° do Decreto-lei n° 34/2008, de 26 de Fevereiro, diploma que aprovou o RCP, como, posteriormente, pela norma transitória contida no n° 4 do artigo 8° da Lei n° 7/2012, de 13 de Fevereiro, diploma que introduziu alterações ao RCP, a qual estabelece que:
“Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, ou em que não havia lugar ao pagamento de custas em virtude das características do processo, e a isenção aplicada não encontre correspondência na redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei, mantém-se em vigor, no respectivo processo, a isenção de custas”.
Sendo certo que, como decorre do disposto no artigo 529°, n° 1, do CPC, e artigo 3º, n° 1, do RCP, as custas processuais abrangem não só a taxa de justiça e os encargos como também as custas de parte, as quais se integram no âmbito da condenação judicial por custas (artigo 26°, n° 1, do RCP).
Salienta, todavia, a reclamada, impugnante nos autos, que, nos termos do n° 12 do artigo 8° da Lei n° 7/2012, de 13 de Fevereiro, “são aplicáveis a todos os processos pendentes as normas do RCP, na redacção que lhe é dada pela presente lei, respeitantes às custas de parte, incluindo as relativas aos honorários dos mandatários, salvo se a respectiva nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior à entrada em vigor da presente lei”.
Partindo desta disposição legal, conclui que, contrariamente ao que entende a Fazenda Pública, o facto de beneficiar de isenção de custas é indiferente para o caso, considerando que, nos termos do artigo 4°, n° 7, do RCP, “[c]om excepção dos casos de insuficiência económica, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, a isenção de custas não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte, que, naqueles casos, as suportará”.
Efectivamente, como refere o Exmo. Magistrado do Ministério Público, no seu parecer, o legislador, em 2012, através da Lei n° 7/2012, de 13 de Fevereiro, veio estabelecer uma diferente regra relativamente às custas de parte, prevendo no n° 12 do seu artigo 8° que “as custas de parte, incluindo as relativas aos honorários dos mandatários, devidas nos processos pendentes aquando da entrada em vigor da lei nova, e estatui que esta se lhes aplica, salvo se a respectiva nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior. Estamos, assim, perante um normativo que se reporta ao direito transitório aplicável aos processos pendentes em 29 de março de 2012 no que concerne às custas de parte” (Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado, 2013, 5ª edição, pág. 41).
Em harmonia com a citada disposição legal, foi inserida no RCP, pelo artigo 2° da Lei n° 7/2012, a norma constante no n° 7 do artigo 4°, supra reproduzida.
Como refere o ilustre autor acima citado, em anotação a esta norma, a isenção de custas, “com exceção dos casos de insuficiência económica, nos termos da lei de acesso ao direito e aos tribunais, não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte.
É um normativo inovador em relação ao sistema de custas deste Regulamento, corolário do princípio regra da justiça gratuita para o vencedor, decorrente do que se prescreve, além do mais, no artigo 527°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Dele resulta que as entidades que gozem de isenção subjectiva ou objectiva de custas, sejam de direito público ou privado, e fiquem vencidas, devem, em regra, suportar o pagamento às partes vencedoras do valor que elas hajam despendido com o processo e se integre no âmbito do conceito de custas de parte” (ob. cit., pág. 185).
Assim, considerando a norma transitória constante do n° 12 do artigo 8° da Lei n° 7/2012, de 13 de Fevereiro, e a nova redacção dada por este diploma ao n° 7 do artigo 4° do RCP, e atenta a data de entrada em tribunal da nota discriminativa e justificativa de custas de parte (20.04.2015), há lugar, no caso dos autos, ao pagamento de custas de parte pela Fazenda Pública.
Nestes termos, julga-se improcedente a presente reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte.».

2.2. Do teor da alegação da recorrente e da contra-alegação da recorrida, bem como do teor do despacho recorrido, emergem como questões a decidir as de saber (i) se não tendo havido uma condenação em custas da Fazenda Pública (FP), pode, ainda assim, ser-lhe exigido o pagamento das custas de parte por ter sido vencida na acção e (ii) se nos processos instaurados antes de 1/1/2004, relativamente aos quais a FP se encontrava isenta de custas, ela é, apesar da isenção e enquanto parte vencida, responsável pelo pagamento de custas de parte à parte vencedora.
Ora, do despacho recorrido e da tramitação dos autos e ocorrências processuais resulta que:
A recorrida EDP – Energias de Portugal S.A. deduziu, em 10/2/1999, impugnação judicial do indeferimento tácito da reclamação graciosa que anteriormente apresentar contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 1993.
Esta impugnação foi julgada improcedente e tendo a impugnante interposto recurso para o TCAS, veio ali a ser proferido acórdão, em 25/9/2012, dando provimento ao recurso e determinando-se em sede de custas, o seguinte: “Custas pela Recorrente, apenas em 1ª instância e na proporção do respectivo decaimento.”
No seguimento, a Fazenda Pública arguiu nulidades do acórdão e requereu a reforma do mesmo (por entender que ocorria lapso manifesto quanto a determinada questão), tendo em 15/1/2013 sido proferido acórdão desatendendo tais arguição de nulidade e pedido de reforma, e condenando a impugnante nas custas.
Ambas as partes vieram, então, pedir a reforma do acórdão na parte relativa a custas, e ambos os pedidos de reforma foram julgados procedentes; e nessa medida, por acórdão proferido em 19/3/2015, foi alterado o anterior acórdão proferido a 15/1/2013, que passou a estabelecer: “Sem custas”.
A EDP, S.A. apresentou então, em 20/4/2015, nota discriminativa e justificativa para pagamento das custas de parte que lhe são devidas, nos termos e para os efeitos do art. 25° do Regulamento das Custas Processuais (RCP), tendo então a Fazenda Pública apresentado Reclamação da mesma, por entender não poder ser responsabilizada pelo pagamento de custas de parte, na medida em que não havia sido condenada em custas.
Tendo em 4/10/2016 sido proferido o despacho ora recorrido.

3.1. Relativamente à questão atinente à alegada ausência de responsabilidade, por parte da Fazenda Pública, quanto ao pagamento das custas de parte, por não ter sido condenada em quaisquer custas, dado que o acórdão do TCAS, de 19/3/2015, alterando o anterior acórdão do mesmo Tribunal, de 15/1/2013, exarou a decisão (no segmento referente a custas) “Sem custas”, afigura-se-nos que a recorrente carece de razão legal, pois que a apontada expressão “Sem custas” tem que ser entendida no contexto referente à isenção de custas de que goza a Fazenda Pública, enquanto parte vencida, não abrangendo, todavia, as custas de parte, nem a desonerando da responsabilidade pelo respectivo reembolso à parte vencedora.
Nesta parte, improcede, pois, o recurso.

3.2. Vejamos, então, a questão de saber se nos processos instaurados antes de 1/1/2004, relativamente aos quais a Fazenda Pública estava isenta de custas, essa entidade é, apesar da isenção e enquanto parte vencida, responsável pelo pagamento de custas de parte à parte vencedora.
Apoiando-nos na explanação sobre a sucessão temporal dos regimes de custas, constante do Parecer de fls. 568 a 571 vemos que em 20/4/2009 entrou em vigor o Regulamento das Custas Processuais (RCP) (Este Regulamento das Custas Processuais (RCP) foi aprovado pela Lei nº 34/2008, de 26/2, com as alterações introduzidas pela Declaração de Rectificação nº 22/2008, de 24/4, pela Lei nº 43/2008, de 27/8, pelo DL nº 181/2008, de 28/8 e pela Lei nº 64-A/2008, de 31/12 (OE para 2009).
No art. 26º daquele DL n° 34/2008, previa-se que o RCP entraria em vigor a 1/9/2008.
Posteriormente, porém, o art. 1° do DL n° 181/2008 veio diferir a entrada em vigor para 5/1/2009 e acabou por ser o art. 156° da Lei n° 64-A/2008, que fixou a data de 20/4/2009 para a efectiva entrada em vigor do Regulamento.), no âmbito do qual se restringiram as isenções (subjectivas e/ou objectivas) de custas (cfr. art. 4º do RCP, bem como o Preâmbulo do DL nº 34/2008), afastando-se o paradigma até então estabelecido no Código das Custas Judiciais de 1996 (CCJ), no qual se contemplavam inúmeras isenções a diversas entidades, designadamente ao Estado e seus serviços ou organismos, tais como a Fazenda Pública (cfr. a al. a) do nº 1 do seu art. 2º).
Mas a par deste regime, e no que aos processos tributários respeita, vigorava o regime estabelecido no Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT), aprovado pelo DL nº 29/98, de 11/2, onde se estabelecia a aplicação supletiva do CCJ e legislação complementar (art. 2º do RCPT), a par da previsão de uma isenção subjectiva para o Estado, incluindo os seus serviços e organismos, ainda que personalizados, nos mesmos termos que se encontravam previstos no CCJ (v. al. a) do nº 1 do art. 3° do RCPT).
No caso vertente, a impugnação foi deduzida em Fevereiro de 1989, data em que estava em vigor o CCJ (que veio a ser revogado pelo DL nº 342/2003, de 27/12.
Contudo, ainda assim, não pode olvidar-se que apesar de o nº 6 do art. 4º deste DL nº 324/2003, ter revogado expressamente as disposições relativas aos processos judiciais tributários contidas no RCPT, essas disposições continuam a ser aplicáveis aos processos pendentes em 1/1/2004 (data da entrada em vigor do apontado DL nº 324/2003), pois as normas sobre custas tributárias por ele aditadas ao CCJ (ou seja, os arts. 73º-A a 73º-F) apenas eram aplicáveis aos processos instaurados a partir da data da sua entrada em vigor (cfr. art. 14º, nº 1), que ocorreu em 30/12/2003 (cfr, entre muitos outros, o ac. do STA, de 28/9/2011, no proc. nº 0772/11.
Ora, estando os presentes autos pendentes em 1/1/2004, as custas a aplicar continuam a ser determinadas pelas disposições do RCPT, com aplicação supletiva do CCJ (ex vi do art. 2º do RCPT), e não pelo disposto no RCP, sendo que, dado o disposto nos arts. 529º, nº 4 e 527º, nº 1, do CPC e considerando que as custas processuais integram, a par da taxa de justiça e dos encargos, as custas de parte, pareceria que a Fazenda Pública se encontraria dispensada o respectivo pagamento.
E só assim não é porque, não obstante a apontada regra inerente às custas processuais, já no que especificamente respeita às custas de parte o legislador veio estabelecer, em 2012, no nº 12 do art. 8º da Lei nº 7/2012, de 13/2, uma diferente regra: as custas de parte, em todos os processos pendentes à data da entrada em vigor da mesma Lei, são devidas nos termos aí expressos, salvo se a respectiva nota discriminativa tiver sido remetida às partes responsáveis em data anterior. Como sublinha o MP, a norma não exclui da aplicação de tais regras quaisquer processos, não excluindo designadamente os processos instaurados em data anterior a 1/1/2004, sendo que a expressão “todos” utilizado na norma não dá margem para outro entendimento, falecendo a argumentação da recorrente no sentido de que a regra do n° 12 do art. 8° da Lei n° 7/2012 apenas se aplica às custas de parte nos processos instaurados a partir daquela data.
Em idêntico sentido se decidiu, aliás, nos acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, proferidos em 7/1/2016 e em 29/10/2015, respectivamente, no proc. nº 0315/15 e no proc. nº 061/14.
Em suma, sendo o n° 7 do art. 4° do RCP (na redação actual) aplicável aos presentes autos, a isenção de custas de que goza a recorrida Fazenda Pública não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte, devendo, por isso, suportá-las.
Impondo-se, em consequência, a confirmação do despacho recorrido, que também assim decidiu.
E improcedendo, portanto, o recurso.

DECISÃO
Nestes termos acorda-se em, negando provimento ao recurso, confirmar o despacho recorrido.
Sem custas, nos preditos termos.

Lisboa, 23 de Maio de 2018. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.