Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0123/05.0BEALM 01322/17
Data do Acordão:10/09/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:IRC
CUSTOS
AMORTIZAÇÃO DE QUOTA
DESVALORIZAÇÃO EXCEPCIONAL
ABATE
Sumário:Na vigência do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12/01, a dedução como custo do valor correspondente ao valor líquido dos bens abatidos, desmantelados, abandonados ou inutilizados, quando este ultrapassa as quotas de amortização desses bens para o exercício, não depende apenas da comprovação externa do seu abate físico, do desmantelamento ou inutilização, mas também da comprovação dos factos que originaram a sua desvalorização excecional no procedimento próprio.
Nº Convencional:JSTA000P24983
Nº do Documento:SA2201910090123/05
Data de Entrada:11/22/2017
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. Relatório

1.1. A……….., S.A., sociedade anónima com sede (indicada na petição inicial) na …………, Seixal, pessoa coletiva n.º ……….., matriculada na Conservatória do Registo Comercial do Seixal sob o número 3260, não se conformando com a sentença do Mm.º Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou improcedente a impugnação da liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas n.º 8310014037, relativa ao exercício de 1998, no valor de € 23.436,10, e do ato de indeferimento do recurso hierárquico dessa liquidação, dela interpôs recurso para este tribunal, na parte que deriva da correção à matéria tributável relacionada com o abate de bens do ativo imobilizado e na parte em que o tribunal se recusou «a apreciar a possibilidade desse mesmo montante ser deduzido, alternativamente, nos exercícios seguintes, de acordo com as quotas de amortização e reintegração aplicáveis, caso esses bens se tivessem mantido no activo da Recorrente».

Recurso este que foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Notificada da sua admissão, apresentou alegações, que rematou com as seguintes conclusões:

«(…) A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada no processo n.º 123/05.0BEALM, na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada contra a correcção à matéria tributável do IRC do exercício de 1998, no montante de € 609.542,58, respeitante a bens do activo imobilizado da Recorrente abatidos em razão da sua desvalorização excepcional e na parte em que se recusa a apreciar a possibilidade desse mesmo montante ser deduzido, alternativamente, nos exercícios seguintes, de acordo com as quotas de amortização e reintegração aplicáveis, caso esses bens se tivessem mantido no activo da Recorrente.

B. Foi pacífico ao longo de todo o processo que a Recorrente procedeu ao abate de todos os bens em causa, que estes pertenciam ao seu activo imobilizado e que a razão do abate foi a respectiva desvalorização excepcional, em virtude do seu estado obsoleto – estes factos não são, nem nunca foram, controvertidos.

C. Foi, do mesmo modo, pacífico ao longo de todo o processo que cada um dos três abates realizados foi precedido de comunicação atempara à Direcção de Finanças do Porto, com o teor reproduzido nas mesmas e cuja cópia se encontra nos Autos, tendo dois deles sido presenciados por funcionário da Administração fiscal – estes factos não são, igualmente, controvertidos.

D. O Tribunal a quo negou conceder provimento ao peticionado pela Recorrente por considerar que as comunicações em causa não são susceptíveis de dar cumprimento ao procedimento explanado no artigo 10.º, n.º 3 do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro, que prevê que a dedutibilidade fiscal dos custos incorridos com a amortização de bens por desvalorização excepcional dos mesmos depende de autorização expressa da Administração fiscal.

E. Atentas as comunicações remetidas à Direcção de Finanças do Porto e o sancionamento dos procedimentos de abate por parte de funcionário da Administração fiscal é seguro afirmar que a Administração conhecia as intenções da Recorrente em proceder ao abate dos bens em causa por considera-los obsoletos, tendo optado por não se manifestar em qualquer sentido, relativamente à dedutibilidade dos custos daí decorrentes.

F. A falta de resposta da Administração tributária perante as comunicações da Recorrente viola o princípio da colaboração com os contribuintes a que está adstrita, em virtude do artigo 59.º da LGT, e não pode ser assacada à ora Recorrente, prejudicando igualmente o seu direito a deduzir custos em que efectivamente incorreu, conforme resultou provado na sentença recorrida.

G. Inexistindo qualquer dúvida sobre o direito à dedutibilidade os custos ou perdas incorridos pela Recorrente, mas antes e apenas sobre o cumprimento de meros formalismos procedimentais, tal evidência deveria implicar que a Administração se abstivesse de proceder à quantificação da correção em crise, em obediência ao princípio da verdade material previsto nos artigos 6.º do RCPIT e 100.º do CPPT e também violado pela decisão recorrida.

H. mesmo assumindo-se como verdadeiro que os procedimentos adoptados pela Recorrente não se subsumem aos previstos no artigo 10º, n.º 3 Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, sempre teria, ainda assim, que valer o imperativo legal de que, na dúvida sobre o sentido ou aplicabilidade de normas de incidência fiscal, deve atender-se à substância económica dos factos tributários, atento o disposto no artigo 11.º, n.º 3 da LGT.

I. Neste contexto, não colhe a afirmação do Tribunal no sentido de que só poderia discutir-se semelhante princípio no caso de a Recorrente ter cumprido os procedimentos; fosse esse o caso e não existiria qualquer divergência entre a forma e a substância a ser ponderada.

J. Ao contrário, é apenas e justamente num cenário em que as comunicações dirigidas pela Recorrente à Direcção de Finanças do Porto não possam qualificar para efeitos do cumprimento do procedimento previsto no artigo 10.º, n.º 3 do Decreto Regulamentar n.º 2/90 de 12 de Janeiro, ou seja, em que a forma exigida na lei não se considera cumprida, que faz sentido discutir a prevalência da substância económica dos factos tributários sobre ela.

K. Ao não dar prevalência ao facto – considerado provado – de que a Recorrente suportou, efectivamente, um custo económico no montante de € 609.542,58 com o abate dos bens excepcionalmente desvalorizados forma violados aquele normativo e o princípio da prevalência da substância sobre a forma nele contido.

L. Ao adoptar a tese plasmada na decisão recorrida, o Tribunal incorreu ainda em grave violação do princípio constitucional da tributação das empresas pelo rendimento real efectivo, conforme plasmado no artigo 104.º, n.º 2 da CRP, a que a Lei ordinária não deixou de acolher – cfr. n.º 9 do Preâmbulo ao Código do IRC.

M. É certo que o que se prevê no artigo 104.º, n.º 2 da CRP é que a tributação do lucro das empresas assenta fundamentalmente – e não totalmente – na respectiva contabilidade, mas as derrogações legalmente previstas a este princípio apenas ocorrem (a par do previsto quanto a regimes simplificados), em casos graves de inexistência de elementos contabilísticos, recusa na sua apresentação ou falta de credibilidade dos registos – ou seja, em situações nas quais não é possível aferir dos rendimentos reais da actividade das empresas como explica Sérgio Vasques no seu Manual de Direito Fiscal – pp. 257 e 258.

N. Não sendo essa manifestamente a situação da recorrente, como resulta da factualidade provada, nada justifica a derrogação do princípio constitucional da tributação das empresas pelo seu lucro real, operada por interpretação do Tribunal a quo, pelo que a sentença recorrida veicula uma interpretação manifestamente inconstitucional das normas contidas no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 2/90, de 12 de Janeiro e 23.º do Código do IRC em face do princípio contido no artigo 104.º, n.º 2, da CRP, devendo ser revogada.

O. Os poderes de cognição do tribunal têm por limite a factualidade exposta pelas partes e a apreciação que dela é feita para efeitos das soluções de Direito aplicáveis – mas não as próprias soluções de Direito passíveis de concretizarem a Justiça em cada caso.

P. Perante os factos provados em primeira instância importaria ao Tribunal indagar qual a solução de Direito que melhor se adapta aos factos que considerados demonstrados pelas partes, tarefa na qual não se encontra condicionado pelo petitório apresentando.

Q. Nos termos do disposto no artigo 5.º, n.º 3 do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea a) do CPPT, «[o] juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito», o que é densificado por vasta jurisprudência dos Tribunais superiores, designadamente pelos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 12 de Dezembro de 2006, no processo n.º 7365/2006-1 e do STJ, proferido em 19 de janeiro de 2017, no processo n.º 873/10.9T2AVR.P1.S1.

R. Da jurisprudência citada resulta a vinculação do tribunal matéria de facto alegada, mas não ao seu enquadramento jurídico, pelo que, se o tribunal entender que a solução jurídica do caso, em face dos concretos factos alegados e provados, é diferente da propugnada pelas partes, deve decidir conforme assim entender.

S. O pedido formulado pela Recorrente na sua petição inicial foi o de anulação do acto de correcção à matéria tributável sob apreço nos termos peticionados de demais de direito que o Tribunal a quo entendesse convenientes, pelo que, em sede de alegações a recorrente apenas concretizou o alerta já efectuado na sua petição inicial, de que poderiam existir diferentes enquadramentos de direito que, não coincidindo com aquele por si defendido, seriam adequados a dar satisfação ao seu pedido e a prosseguir o propósito último da Justiça.

T. Perante o pedido dirigido ao Tribunal a quo e a factualidade que deu como provada na sentença recorrida, este podia e devia ter decidido quanto à possibilidade de a Recorrente deduzir fiscalmente o montante corrigido de € 609.542,58, ainda que não na forma concretamente solicitada, à luz do Direito que o Tribunal determinasse aplicável.

U. Não o fazendo a sentença a quo violou o disposto no artigo 5.º, n.º 3 do CPC, devendo ser revogada e substituída por decisão que aprecie a questão com os contornos expostos.».

Concluiu pedindo a revogação da sentença recorrida, com as demais consequências legais, designadamente a anulação da correção à matéria tributável e a correspondente aceitação dos custos que representa, senão no próprio exercício de 1998, pelo menos nos exercícios seguintes e por referência às quotas que resultariam aplicáveis se os bens excecionalmente desvalorizados se tivessem mantido no seu ativo imobilizado.

A RECORRIDA não apresentou contra-alegações.

1.2. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

O Ex.mo Senhor Procurador Geral-Adjunto emitiu douto parecer, onde pugnou:

a) Que a decisão impugnada não violou o princípio da decisão a que alude o artigo 56.º da Lei Geral Tributária;

b) Que a decisão impugnada não violou o princípio da colaboração a que alude o artigo 59.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária;

c) Que a decisão impugnada não violou o princípio do inquisitório a que alude o artigo 58.º da Lei Geral Tributária;

d) Que a decisão impugnada não violou o princípio da prevalência da substância sobre a forma aflorado no artigo 11.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária;

e) Que a decisão impugnada não violou o princípio da tributação das empresas pelo lucro real, consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa pugnou pela caducidade do direito exercido nesse requerimento e pelo consequente deferimento da reclamação;

f) E que a sentença que assim entendeu deve, por isso, ser confirmada.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.



2. Do objeto do recurso e das questões a decidir

O recurso abrange apenas a parte da sentença recorrida que apreciou a correção à matéria tributável do valor dos prejuízos fiscais do exercício de 1998, no montante de € 609.542,58, que corresponderia ao valor líquido de certos elementos do ativo imobilizado abatidos ou inutilizados nesse ano. É o que resulta, desde logo, da alínea “A.” das conclusões do recurso.

São questões a decidir a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que a desconsideração como custo deste valor não violava a lei e ao concluir que não podia conhecer de um «pedido alternativo», formulado em alegações escritas e onde a ora RECORRENTE, pedia que fosse ordenado que «o montante acrescido pelo fisco [fosse] deduzido, para efeitos do apuramento do resultado fiscal dos exercícios seguintes em aberto (2003-2007), na exata medida das reintegrações que os bens teriam, caso se encontrassem ainda registados no seu ativo corpóreo».



3. Dos fundamentos de facto

Foi o seguinte o julgamento de facto em primeira instância:

«1. A Impugnante é uma sociedade anónima que exerce a actividade si de produção e comercialização de produtos siderúrgicos (facto que se extrai do relatório de inspecção de fls. 39 a 42 do processo administrativo – PA – apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

2. No exercício de 1998 a Impugnante adquiriu ao Banco……… cheques-auto no valor total € 71.334,76 (14.301.335 Esc.), valor esse que registou na contabilidade na conta …… – Combustíveis (cfr. fls. 170 a 184 dos autos e fls. 41 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

3. Em 06-05-1998 a Impugnante remeteu à Direcção de Finanças do Porto comunicação a informar que iria proceder à destruição, no dia 15-05-1998, de bens considerados obsoletos no valor total de 61.699.369 Esc. (cfr. fls. 50 a 57 e 153 a 160 dos autos e fls. 57 a 64 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

4. Em 15-05-1998 foi pela impugnante elaborado auto de destruição dos bens referidos no número antecedente (cfr. fls. 49 e 163 dos autos e fls. 43 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

5. Em 18-06-1998 a Impugnante remeteu à Direcção de Finanças do Porto comunicação a informar que iria proceder à destruição, no dia 26-06-1998, de bens considerados obsoletos no valor total de 90.413.605 Esc. (cfr. fls. 36 a 48 e 133 e 161 dos autos e fls. 44 a 56 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

6. Em 26-06-1998 foi pela impugnante elaborado auto de destruição dos bens referidos no número antecedente (cfr. fls. 131 e 164 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

7. A destruição dos bens referida em 5) e 6) foi presenciada por um funcionário da Direcção Geral dos Impostos (cfr. nota de visita a fls. 132 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

8. Em 18-11-1998 a Impugnante remeteu à Direcção de Finanças do Porto comunicação a informar que iria proceder à destruição, no dia 30-11-1998, de bens considerados obsoletos no valor total de 24.353.722 Esc. (cfr. fls. 58 a 64, 129 e 162 dos autos e fls. 66 a 72 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

9. Em 30-11-1998 foi pela impugnante elaborado auto de destruição dos bens referidos no número antecedente (cfr. fls. 130 e 165 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

10. Em 09-10-2000, na sequência da realização de procedimento de inspecção interno à Impugnante com vista à análise da declaração modelo 22 do IRC referente ao exercício de 1998, foi elaborado pela Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária relatório final, do qual consta o seguinte:

“(...) Correcções ao cálculo do imposto – Despesas confidenciais

Tributação autónoma das despesas não documentadas inscritas no Quadro 20 linha 21 do mapa de apuramento Mod. DC-22 no montante de 14.301.335$00 à taxa de 30% nos termos do Art.º 4º do Dec. Lei nº 192/90 de 9 de Julho, com a redacção dada pelo Art. 31º da Lei 52-C/96, de 27 de Dezembro.

Reintegrações e amortizações não aceites como custos (art.º 32, nº 1)

O sujeito passivo considerou como custo extraordinário do exercício o valor do abate dos bens do activo imobilizado a seguir discriminados, com o valor líquido contabilístico de 122.202,315$00, sem possuir autorização da Direcção-Geral dos Impostos para ser aceite como custo do exercício a desvalorização excepcional, nos termos do nº 3 do Art. 10º do Decreto Regulamentar 2/90 de 12/1, pelo que, infringiu o disposto no artº 32º, nº 1, al. c) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas.

Designação Valor de Aquisição

Amortizações acumuladas

Valor Líquido do Abate Trem contínuo 88.800.000 27.741.000 61.059.000 Rede de energia 50.000.000 15.620.000 34.380.000 Rede de água 4.000.000 1.249.000 2.750.000 Peças de reserva 61.801.375 27.778.460 24.012.915 Total 122.202.315

Designação
Valor de Aquisição
Amortizações acumuladas
Valor Líquido do Abate
Trem contínuo
88.800.000
27.741.000
61.059.000
Rede de energia
50.000.000
15.620.000
34.380.000
Rede de água
4.000.000
1.249.000
2.750.000
Peças de reserva
61.801.373
27.778.460
24.012.915
Total
122.202.315
Outros não especificados anteriormente

O sujeito passivo contabilizou na conta …… – Combustíveis, o valor de 14.301.335$00 referente a cheques-auto adquiridos a instituições bancárias documentando os respectivos assentos contabilísticos com os recibos metidos por aquelas entidades. Aquando da aquisição dos cheques-auto a empresa não incorre, nesse momento, em qualquer custo, mas procede apenas a uma troca de meios de pagamento, pelo que os documentos passados pelas referidas entidades não são comprovantes justificativos de quaisquer encargos, para efeitos fiscais, como resulta da conjugação da alínea a) do nº 3 do Artº 98º com o nº 3 do Art. 17º ambos do CIRC, considerando-se tais custos não documentados nos termos da alínea b) do nº 1 do Art. 41º do mesmo código.

Sendo no momento da aquisição do combustível, quer o pagamento seja feito através de cheque-auto ou outro meio de pagamento, que se efectiva o correspondente encargo, deverá o mesmo ser comprovado, com recibo emitido pela gasolineira.

Como o sujeito passivo acresceu ao Q17 da declaração de rendimentos Mod. 22, nos termos do Artº 41º, nº 4 do CIRC, o montante de 2.860.267$00 correspondente a 20% de 14.301.335$00, o valor agora considerado como encargo não dedutível é de 11.441.668$00 (14.301.335$00 – 2.860.267$00). (...)” (cfr. fls. 39 a 42 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

11. Em 17-11-2000 foi em nome da Impugnante emitida a liquidação adicional de IRC n.º 8310014037 e juros compensatórios no valor total de € 23.436,10 (4.698.517 Esc.) (cfr. fls. 35 dos autos e fls. 37 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

12. Em 08-01-2001 a Impugnante procedeu ao pagamento do valor identificado no número antecedente (cfr. fls. 65 dos autos);

13. Em 26-03-2001 a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios identificada em 11) (cfr. fls. 66 a 69 dos autos e fls. 32 a 36 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

14. Em 14-10-2003 a Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal elaborou informação a propor o indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Impugnante (cfr. fls. 85 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

15. Sobre a informação identificada no número anterior recaiu despacho concordante do Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal, proferido em 15-10-2003, o qual considerou a mesma como projecto de decisão, determinando a sua remessa à impugnante para esta se pronunciar sobre o mesmo (cfr. fls. 84 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

16. O projecto de decisão referido no número anterior foi remetido à impugnante em 16-10-2003, através do ofício n.º 28775, o qual foi recebido em 17-10-2003 (cfr. fls. 86 e 87 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

17. Em 27-10-2003 a Impugnante pronunciou-se por escrito sobre o projecto de decisão identificado em 15) (cfr. fls. 88 a 100 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

18. Por despacho do Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal proferido em 09-02-2004, o projecto de decisão identificado em 15) foi convertido em definitivo, determinando-se o indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Impugnante (cfr. fls. 119 e 120 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

19. A decisão de indeferimento referida no número antecedente foi remetida à impugnante em 20-02-2004, através do ofício n.º 284/EF, o qual foi recebido em 23-02-2004 (cfr. fls. 121 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

20. Em 24-03-2004 a Impugnante apresentou recurso hierárquico contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa (cfr. fls. 73 a 95 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

21. Em 30-06-2004 foi elaborado informação pela Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento a propor o indeferimento do recurso hierárquico apresentado pela Impugnante, sobre a qual recaiu despacho concordante do Subdirector-Geral dos Impostos proferido em 15-10-2004, que determinou o indeferimento da do recurso hierárquico (cfr. fls. 22 a 34 dos autos e fls. 17 a 30 do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

22. A decisão de indeferimento do recurso hierárquico identificada no número anterior foi remetida à Impugnante em 17-11-2004, através do ofício n.º 9836/EF, o qual foi entregue em 18-11-2004 (cfr. fls. 20 dos autos e fls. do PA apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

23. Nos dias 15-05-1998, 18-06-1998 e 30-11-1998 a Impugnante procedeu à destruição de vários bens do seu imobilizado, em virtude de os mesmos se encontrarem obsoletos e sem qualquer valor económico, nomeadamente, um trem contínuo, uma turbina kongsberg, quatro filtros de areia, bem como diversos bens do armazém, nomeadamente peças de reserva (facto que se extrai do depoimento das testemunhas);

24. Nos abates realizados nos dias 15-05-1998 e 18-06-1998 esteve presente um funcionário da Administração tributária (facto que se extrai do depoimento das testemunhas);

25. A presente impugnação judicial deu entrada neste Tribunal em 15-02-2005 (cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos).


* * *

B) FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.


*

Relativamente aos factos provados, constantes nos números 1 a 22, a convicção do tribunal baseou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nas informações oficiais e documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada número do probatório.

Quanto ao facto provado, constante nos números 23 e 24, o Tribunal fundou a sua convicção no depoimento das testemunhas inquiridas, conforme infra se descreve.

Ambas as testemunhas – ………. e ………. –, revelaram conhecimento directo dos factos, fruto do exercício de funções ao serviço da Impugnante, tendo uma delas – ……….. – presenciado a destruição e procedido à elaboração dos autos de destruição,

Evidenciaram as testemunhas, de forma coerente e credível, que no ano de 1998 a Impugnante procedeu à destruição de bens, destruição essa que se deveu ao facto de tais bens se encontrarem obsoletos. Mais evidenciaram que os bens em causa não tinha qualquer valor económico e que, inclusive, não teriam qualquer utilidade para outras empresas. Ambas as testemunhas confirmaram a destruição dos bens, tendo identificado como bens destruídos, um trem contínuo, uma turbina kongsberg, quatro filtros de areia, bem como diversos bens do armazém, nomeadamente peças de reserva. A testemunha ………… evidenciou ainda que nos abates ocorridos nos dias 15-05-1998 e 18-06-1998 esteve presente um funcionário da Administração tributária.

Em suma, a prova testemunhal produzida pela Impugnante, aliado ao facto de a Fazenda Pública não ter impugnado tal matéria, logrou convencer o Tribunal que os bens em causa foram efectivamente destruídos e que tal destruição se deveu ao facto de os mesmos se encontrarem obsoletos e já não terem qualquer utilidade para a impugnante, quer para qualquer outra empresa, na perspectiva de uma eventual venda».



4. Do Direito

4.1. Vem o presente recurso interposto da sentença do Mm.º Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada na parte em que concluiu que não violava a lei a não aceitação como custo fiscal «[d]as perdas em imobilizado, correspondentes ao valor líquido contabilístico dos elementos do activo imobilizado abatidos no exercício de 1998, no montante de € 609.452,58» (citação extraída da decisão do recurso hierárquico, pág. 6, fls. 22 do processo administrativo).

Com o assim decidido não se conforma a RECORRENTE por entender, desde logo, que o tribunal recorrido fez errada interpretação do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro (entretanto revogado pelo artigo 23.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro).

A questão que aqui se coloca será a de saber se, não estando em causa que a RECORRENTE comunicou previamente à Administração Tributária a data do abate e indicou discriminadamente os bens a abater tendo esta acompanhado o abate e a inutilização dos bens, foi dado «pleno cumprimento» aquele dispositivo legal.

Pretende a RECORRENTE dizer, no fundo, que o procedimento adotado cumpre as formalidades necessárias à dedução de uma quota de amortização superior à que resultava do método de amortização que vinha sendo adotado relativamente aos mesmos bens. Uma quota que lhe permitisse deduzir como custo do exercício de 1998 o valor líquido dos bens abatidos.

A esta questão respondemos negativamente. A dedução como custo de valor correspondente ao valor líquido dos bens abatidos, quando este ultrapassa as quotas de amortização desses bens para o exercício não depende apenas da comunicação prévia e subsequente comprovação do seu abate físico, nos termos e com as formalidades previstas no n.º 4 daquele artigo 10.º. Depende também da aprovação de novas quotas de amortização, nos termos e com as formalidades previstas no seu n.º 3 e do artigo 28.º, n.º 5, alínea b), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas [na redação então em vigor, que era a anterior à reforma da tributação do rendimento introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro].

Isto sucede, desde logo, porque com a amortização não se deduz o valor correspondente ao desgaste do elemento do ativo imobilizado em cada exercício, mas a parcela do custo suportado com a aquisição ou produção desse elemento do ativo imobilizado, expresso em quotas constantes que refletem a sua vida útil previsível [sobre as duas teses contrapostas desenvolvidas na Alemanha em torno do significado e da função da amortização ver, por todos, ENRIQUE ORTIZ CALLE, in «El Régimen Jurídico Tributário de las Amortizaciones en el Impuesto sobre Sociedades», Editorial Colex 2001, pág. 15].

Ou seja, o pressuposto de facto do direito à dedução não é a existência de um custo de utilização no período de tributação, mas a determinação de uma parcela do custo de aquisição no período de tributação. O desgaste só releva como indicador de que a distribuição destas parcelas não coincide com a vida útil esperada do bem.

A comunicação do abate, em si mesma, diz-nos que um bem deixou de ter utilidade e que, por conseguinte, o custo de utilização é equivalente ao respetivo valor líquido nesse período de tributação. Mas não nos diz que o custo suportado com a aquisição deva ser concentrado nesse período. Tal só sucederá depois de se confirmar que a distribuição das respetivas quotas foi desadequada.

Importa, assim, desencadear um procedimento destinado a corrigir os critérios legais de distribuição deste custo, de modo a conferir-lhes maior aderência à realidade. Comprovada a desvalorização excecional e determinadas as suas causas, poderão então aprovar-se quotas de amortização superiores, sem o que o valor correspondente ao excesso não poderá ser deduzido – artigo 32.º, n.º 1, alínea c) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.

No caso em que os factos que determinaram a desvalorização excecional e o abate decorrem no mesmo período de tributação, a quota de amortização a aprovar corresponde ao valor líquido fiscal dos bens, mas depende também da comprovação das causas anormais que tenham determinado a sua desvalorização excecional.

A este entendimento se chega por aplicação direta da parte final do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar supra referido. Mas a ele se chegaria também por maioria de razão: é que uma desvalorização súbita, integrada num único período de tributação, é ainda mais improvável e reclama ainda mais a ação fiscalizadora da Administração Tributária.

Admitindo que nunca obteve a aceitação da parte da Direção-Geral dos Impostos e que nunca sequer a requereu, a RECORRENTE contrapõe, no entanto, que a administração tributária também não se dignou, nesse processo, a invocar a falta de autorização expressa ou a alertar para a consequente recusa da dedutibilidade fiscal do valor dos abates. O que, no seu entendimento, constitui violação do dever de colaboração que sobre si recaía e que deriva do artigo 59.º, da Lei Geral Tributária.

Parece que o que a RECORRENTE pretende dizer é que não recebeu o apoio que lhe era devido para desencadear o procedimento adequado e assim, cumprir mais esclarecidamente o ónus que sobre si própria recaía. E – sem o dizer abertamente – deixa subentendido que poderá a administração tributária não ter atuado de boa fé (nas doutas alegações do recurso afirma-se que a administração «optou pelo silêncio»).

Ora, não há elementos que permitam concluir que a administração tributária não atuou de boa fé. Até porque – como, de resto, se salientou na decisão do recurso hierárquico – a comunicação do abate também adere à recomendação inserida no ofício-circulado n.º 35 264, de 24/10/86, da Direção dos Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado, onde se estabelecia a participação prévia do abate como forma mais segura de elidir a presunção prevista no artigo 80.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (redação então em vigor). Precisamente a norma invocada no auto de destruição elaborado aquando dos abates.

Por outro lado, não resulta dos factos que a RECORRENTE tivesse apresentado alguma dúvida sobre o melhor cumprimento dos seus deveres perante a administração tributária e que esta se tivesse escusado a esclarecer cabalmente. E não se concede num enquadramento na falta de colaboração assente apenas no facto de a administração tributária não ter antecipado ou prevenido uma atuação mais esclarecida do sujeito passivo, visto que tal equivaleria a subverter integralmente os deveres que sobre este recaem.

Adiante, a RECORRENTE invoca o princípio da verdade material. Para dizer (na essência) que, inexistindo qualquer dúvida sobre o direito à dedutibilidade dos custos ou perdas em que incorrem em consequência do abate, a administração tributária não se devia ter enquistado em falhas procedimentais e, ao invés, deveria ter-se abstido de efetuar a correspondente correção à matéria tributável.

Deve observar-se, antes de mais, que a sua argumentação não é totalmente coerente, neste segmento. Porque, se o que está em causa é a ocorrência das perdas e sobre estas não sobram dúvidas, então também não seria necessário a administração tributária realizar diligências oficiosas tendo em vista o apuramento da verdade material sobre essa ocorrência.

A verdade, porém, é que – como já foi dito e ora se reafirma – não são as perdas decorrentes da depreciação que são deduzidas, mas as parcelas do custo de aquisição ou de produção do bem depreciado, distribuídas pelos exercícios correspondentes à sua vida útil previsível. E não é o abate em si mesmo, mas as suas causas [as «causas anormais», para utilizar a expressão da alínea b) do n.º 5 do artigo 28.º citado], que poderão servir para demonstrar que a vida útil previsível do bem abatido era no caso, inferior à que deriva do método de amortização pré-estabelecido. Mas sobre as causas do abate nada se sabe. A verdade material não foi apurada.

E a administração tributária também não teria que sobre ela indagar oficiosamente. O dever de investigação oficiosa e da correspondente descoberta da verdade material, consagrado no artigo 58.º da Lei Geral Tributária, é um dever procedimental. Pressupõe a instauração do procedimento adequado. Que, no caso, nunca existiu. Porque a RECORRENTE não o requereu.

E teria que ser a RECORRENTE a requere-lo, porque o que aqui está em causa é, na prática, o acesso a um benefício: o benefício de antecipar a dedução de um custo que, em condições normais, teria que escalonar por diversos exercícios e traduzir em quotas constantes.

Ainda a este propósito, alega a RECORRENTE que num cenário em que as comunicações dirigidas à Direção de Finanças do Porto não possam qualificar-se para efeitos do cumprimento previsto no artigo 10.º, n.º 3, do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro, a evidência de que incorreu em custos e de que estes são suscetíveis de dedução fiscal, deveria ter prevalecido sobre o incumprimento de formalismos procedimentais, à luz do princípio da prevalência da substância sobre a forma. Invocou o artigo 11.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária.

Uma vez que o artigo 11.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária é mobilizado para a interpretação de normas de incidência tributária sobre as quais persistam dúvidas interpretativas após utilização das regras hermenêuticas gerais, a evidência de que os custos são suscetíveis de dedução fiscal implicaria concluir que não existem dúvidas interpretativas sobre a aplicação das respetivas regras de incidência e que, por conseguinte, não há que recorrer ao artigo 11.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária.

Deve entender-se, por isso, que a RECORRENTE não quis dizer bem isso, mas que embora existam dúvidas sobre o sentido em que deve ser interpretada a norma inserida no artigo 10.º, n.º 3, do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro (e designadamente, sobre se a norma deve ser interpretada no sentido de que a dedução do custo correspondente depende do cumprimento de certos formalismos), a resposta deve ser negativa à luz da substância económica dos factos tributários.

Mas deve contrapor-se – novamente – que não estão em causa apenas formalismos: está em causa a comprovação externa da desvalorização extraordinária do bem e das respetivas causas.

A RECORRENTE parece fazer alguma confusão entre as causas de desvalorização extraordinária do bem e o abate ou a inutilização em si mesmos: o que interessa ao caso não é que tenha havido uma desvalorização do bem decorrente do abate e inutilização (essa existiu necessariamente, na medida em que implicou uma perda total correspondente ao valor líquido do mesmo), mas que o abate ou a inutilização tenham sido consequência de uma desvalorização extraordinária precedente. Porque é esta que revela que o período de vida útil do bem era (em consequência, por exemplo, de uma utilização mais intensiva ou de obsolescência tecnológica) mais reduzida e que, por conseguinte, deveriam ser maiores as respetivas quotas de amortização.

E sobre a substância das razões que levaram ao abate a RECORRENTE nada disse, nem no procedimento próprio nem ulteriormente.

Deve acrescentar-se de qualquer modo, que as disposições em causa não suscitam as dúvidas interpretativas que a RECORRENTE aponta. Porque são particularmente evidentes as razões que ditaram aqueles formalismos: está em causa a necessidade de prevenir a evasão fiscal que derivaria da muito fácil manipulação dos valores de deperecimento ou do próprio conceito de vida útil. O afastamento destas regras só pode ser consentido depois de se ter despistado, em procedimento próprio, que tal risco inexiste.

Adiante, a RECORRENTE invoca o princípio constitucional da tributação das empresas pelo rendimento real efetivo, consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa. Para dizer, no fundo, que impedir a dedutibilidade de custos que com toda a evidência existem constitui uma derrogação inadmissível deste princípio.

O que a RECORRENTE pretende dizer aqui é que, tendo sido suportado um custo correspondente ao deperecimento do bem no ano do abate, o princípio da tributação pelo rendimento real impõe que o custo seja deduzido no ano do abate.

Nesta fase, já não vale a pena repetir que não está em causa o custo com o deperecimento do bem. Sobre esta questão resta remeter para o que acima já foi dito.

O que valerá a pena dizer a este propósito é que um sistema de tributação assente em regras de amortização contidas em parâmetros rígidos (parâmetros estes que devem mais a uma expetativa de vida útil normal do bem sujeito a deperecimento do que ao desgaste efetivo sofrido) não viola o princípio constitucional da tributação das empresas pelo rendimento real. A determinação da vida útil do bem supõe o «preenchimento de variáveis [que] contêm, em si mesmo, um gérmen subjetivo de adesão à realidade» [cit. TOMÁS MARIA CANTISTA DE CASTRO TAVARES, «da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na determinação do rendimento das pessoas coletivas: algumas reflexões ao nível dos custos», in Ciência e Técnica Fiscal, n.º 398, outubro-dezembro de 1999, pág. 76] e que justificam, por isso, uma certa simplificação e consequente normalização dessa realidade, sob pena de abrir as portas à evasão [no mesmo sentido, JOSÉ XAVIER DE BASTO, «O princípio da tributação do rendimento real e a Lei Geral Tributária», in Revista de Direito e Gestão Fiscal de janeiro de 2001 (Fiscalidade n.º 5), pág. 13].

De todo o exposto deriva que a douta decisão recorrida não fez errada interpretação das normas citadas e que, por conseguinte, não padece do erro de julgamento que lhe é imputado. O recurso não merece provimento por aqui.

4.2. Na última parte das suas alegações de recurso e nas alíneas “O.” e seguintes das respetivas conclusões, a RECORRENTE vira-se contra a decisão de não tomar conhecimento de um «pedido alternativo» (expressão retirada do penúltimo parágrafo da parte “III-C” da sentença) que teria sido formulado já em sede de alegações escritas: o de que «o montante acrescido pelo Fisco [fosse] deduzido, para efeitos do apuramento do resultado fiscal dos exercícios seguintes em aberto (2003-2007), na exacta medida que os bens teriam, caso se encontrassem ainda registados no seu activo corpóreo» (ponto “58.” daquelas alegações e alínea iii) a final].

Na douta sentença recorrida, o Mmº Juiz a quo entendeu que não podia conhecer deste pedido por não ter sido formulado na petição inicial e por a questão não ter sido submetida, em momento algum, à apreciação da Administração Tributária.

A RECORRENTE nada contrapõe a esta argumentação. Mas objeta que se limitou a alertar o tribunal recorrido para a necessidade de garantir a dedutibilidade do montante em causa e que o «pedido alternativo» correspondente se contém dentro dos poderes de cognição do tribunal.

A RECORRENTE coloca a questão ao contrário: os poderes de cognição do tribunal é que se devem conter dentro dos limites do pedido (e da causa de pedir). Na decisão a proferir sobre as questões que lhe forem colocadas, o tribunal não pode, designadamente, condenar em objeto diverso do que se pediu. É o que deriva do artigo 609.º do Código de Processo Civil.

A doutrina alude a este propósito, ao princípio da correspondência entre a ação e a sentença: o juiz deve pronunciar-se sobre tudo o que se pedir e só sobre o que lhe for pedido [ALBERTO DOS REIS, in «Código de Processo Civil Anotado», Volume V, Coimbra Editora 1984, pág. 52].

O âmbito do artigo 5.º, n.º 3, desse Código é distinto, porque já pressupõe que a questão suscitada se contenha nos limites do pedido e da causa de pedir. O juiz é livre na indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, mas «tem de manter-se dentro do limite fundamental que lhe marca a ação» [Idem, ibidem, pág. 93] e, por conseguinte, só pode aplicar o seu juízo de direito à providência pedida.

No caso, um pedido de reconhecimento de que a RECORRENTE teria direito a deduzir custos em exercícios diferentes, mesmo que tivesse sido formulado logo na petição inicial, não seria admissível neste processo de impugnação judicial também pela outra razão que o Mm.º Juiz a quo tão bem assinalou: é que o seu âmbito é também delimitado pelo ato impugnado e o ato impugnado não se pronunciou sobre essa questão.

Pelo que ao recurso deve ser negado provimento na totalidade.



5. Conclusão

Na vigência do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12/01, a dedução como custo do valor correspondente ao valor líquido dos bens abatidos, desmantelados, abandonados ou inutilizados, quando este ultrapassa as quotas de amortização desses bens para o exercício, não depende apenas da comprovação externa do seu abate físico, do desmantelamento ou inutilização, mas também da comprovação dos factos que originaram a sua desvalorização excecional no procedimento próprio.



6. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em negar provimento ao recurso.

Custas pela RECORRENTE.

Registe e notifique.

Lisboa, 09 de outubro de 2019. – Nuno Bastos (relator) – Isabel Marques da Silva – Ascensão Lopes.