Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0917/16
Data do Acordão:12/20/2017
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:DULCE NETO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P22734
Nº do Documento:SAP201712200917
Data de Entrada:09/07/2016
Recorrente:DIRECTORA GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:EDP - ENERGIAS DE PORTUGAL, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. A Exma. Senhora Diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira dirigiu ao Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto nos artigos 25º, nºs 2, 3 e 4, e 26º do Dec. Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro e do artigo 152º do CPTA, recurso da decisão proferida no âmbito de pedido de pronúncia arbitral formulado pela sociedade EDP – Energias de Portugal, S.A, no processo nº 328/2015-T do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), que julgou procedente o pedido e anulou o acto de liquidação de IRC e de juros compensatórios referente ao exercício de 2004, no valor de € 6.012.903,81.

1.1. Invoca, para o efeito, a oposição da decisão arbitral com os acórdãos proferidos pelo Tribunal Central Administrativo Sul nos processo nº 04403/10 e nº 07526/14, datados de 3/06/2016 e de 18/06/2015, respectivamente, e com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 5/07/2012, no processo nº 0658/11.

Rematou as alegações do recurso com o seguinte quadro conclusivo:

1. Entre os doutos Acórdãos em causa, os fundamentos e o recorrido, decisão prolatada pelo tribunal arbitral no âmbito do processo nº 328/2015-TCAAD, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente, uma vez que as questões referente a saber: 1ª) se a distribuição aos trabalhadores de resultados de exercícios anteriores podia ser considerada como custo no ano em que foram pagos e se tal não ofendia o princípio da especialização dos exercícios, 2ª) se para efeitos do limite previsto no nº 2 do referido preceito legal, são unicamente consideradas despesas com o pessoal todas as despesas que, tendo a natureza genérica de remunerações, são objecto de descontos obrigatórios para a Segurança Social; 3ª) se os custos estavam devidamente comprovados, pese embora a inexistência de documento externo que titulasse o objecto da operação em nome do adquirente, sujeito passivo que pretende deduzir o custo; 4ª) se as amortizações referentes a anos anteriores podiam ser admitidas como custos em determinado exercício atento o princípio da especialização dos exercícios, em contraponto com o princípio da justiça, foram decididas diferentemente no Acórdão recorrido e nos Acórdãos fundamento.

2. Quanto à primeira questão de direito em oposição, verifica-se a identidade de situações de facto porquanto quer no Acórdão fundamento - Ac. do CT -2º Juízo do TCA Sul de 03/03/16, Proc. nº 04403/10 - quer no Acórdão recorrido esteve em causa determinar se determinado custo, o qual foi incorrido em determinado exercício podia, ou não, ser aceite no ano em que foi pago tendo em conta o princípio da especialização dos exercícios.

3. De facto, depois de o Acórdão recorrido ter afastado a aplicação ao caso em análise do art. 24º do CIRC, acaba por analisar a questão segundo o prisma da aplicação do art. 23º do CIRC, tendo considerado que se estava, já não perante gratificações atribuídas a título de participação nos resultados, mas perante meras gratificações enquadráveis simplesmente no art. 23º do mesmo CIRC. E, deste modo, acaba por analisar a questão sobre este prisma e atendendo ao princípio da especialização dos exercícios, consubstanciado no art. 18º do CIRC.

4. Assim em ambos os processos os custos consubstanciados, num caso, Ac. fundamento, na emissão de facturas relativas ao fornecimento de peças e equipamentos de veículos automóveis datadas do 3º trimestre de 2005, no outro, Ac. recorrido, na distribuição de resultados ou atribuição de gratificações a trabalhadores decidida no ano de 2002, foram determinados e eram conhecidos pelo sujeito passivo no ano em que foram emitidas as facturas ou no ano em que foi determinada a atribuição das gratificações.

5. E, em ambos os casos, o sujeito passivo pretendeu contabilizar tais custos em exercícios posteriores àquele em que foram incorridos.

6. Verifica-se a identidade da questão de direito, uma vez que quer o Acórdão fundamento quer a decisão arbitral recorrida, analisaram a questão de saber se os custos podiam ser aceites atendendo ao princípio da especialização dos exercícios patente no art. 18º do CISC.

7. Contudo, o Acórdão fundamento e o Acórdão arbitral recorrido decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada.

8. Assim, enquanto para a decisão arbitral recorrida o princípio da especialização dos exercícios cede, sem mais, perante o da justiça, já para o Acórdão fundamento, pelo contrário, o princípio da especialização dos exercícios só cede perante o da solidariedade dos exercícios e quando, nos termos do nº 2 do art. 18º do CIRC, no ano em que os custos deveriam ser imputados e até ao encerramento das contas estes eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos.

9. Acresce ainda que, entre a emissão do Acórdão fundamento e do Acórdão arbitral recorrido, não ocorreu qualquer modificação legislativa que fosse susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida, no sentido de servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados na determinação da solução jurídica.

10. E que se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre o Acórdão arbitral recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que o art.º 18º nº 1 do CISC foi entendido e aplicado diferentemente, quanto aos casos em que o mesmo princípio pode ser afastado, pelos referidos Acórdãos, sendo certo, igualmente, que a orientação perfilhada na decisão impugnada não está de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

11. Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts. 25º nº 2 do RJAT, 152º nº 1 do CPTA e 27º nº 1 al. b) do ETAF.

12. Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que o Acórdão arbitral recorrido, ao ter considerado que o custo considerado como tal ao abrigo do art. 23º do CIRC podia ser aceite em ano diferente daquele em que foi incorrido, a tal não obstando o princípio da especialização dos exercícios, fez, salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 18º nº 1 e nº 2 aos factos.

13. Na verdade, considerou o Acórdão arbitral recorrido que as gratificações atribuídas aos trabalhadores da EDP Distribuição e da EDP Produção, podiam ser aceites nos termos do artigo 23º do CIRC no ano que foram efectivamente pagas (2004) não obstante as mesmas tivessem sido deliberadas atribuir no ano de 2002.

14. Mais, tais custos eram conhecidos e não eram imprevisíveis no ano em que foi decidida a sua atribuição.

15. Logo, ainda que se aplicasse o artigo 23º do CIRC, como efectivamente foi considerado pelo Acórdão arbitral recorrido, por força da aplicação do princípio da especialização dos exercícios, que assenta, em primeira linha, num critério de competência económica, a dedução da variação patrimonial negativa provocada pela atribuição das gratificações de balanço não pode ocorrer no exercício do pagamento ou da colocação à disposição (2004), só podendo efectivar-se no exercício durante o qual foram prestados os serviços a gratificar.

16. Ora, assim sendo, tendo em conta que o custo/variação patrimonial negativa foi incorrida e contabilizada em 2002, por força do principio da especialização dos exercícios, só poderia ser imputada a esse ano/exercido de 2002.

17. A menos que, como se deliberou no Acórdão recorrido, nos termos do nº 2 do art.º 18º do CIRC, no ano em que a despesa deveria ser imputada o custo fosse imprevisível ou manifestamente desconhecido.

18. Termos pelos quais, o princípio da especialização dos exercícios, no caso subjacente ao Acórdão recorrido, não poderia deixar de ser aplicado com base num princípio de justiça, uma vez que o custo não era manifestamente imprevisível ou desconhecido da então requerente no ano em que foi incorrido.

19. Ao deliberar, nesta situação, aplicar o princípio da justiça, pese embora a situação não se enquadrasse no nº 2 do art.º 18º do CIRC, o acórdão arbitral recorrido fez uma incorrecta aplicação dos nºs 1 e 2 do art.º 18º do CIRC aos factos, não devendo ser mantido.

20. Quanto à segunda questão de direito em oposição, entre os Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento - Ac. do 2º Juízo do CT, do TCA Sul de 06/18/2015, Proc. nº 07526/14 - existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente, porquanto a questão a dirimir, e que consiste em saber se, para efeitos do limite previsto no nº 2 do artigo 40º do CIRC, apenas são consideradas despesas com o pessoal, as que, tendo natureza genérica de remunerações, sejam objecto de descontos para a Segurança Social, obtiveram decisões diferentes no Acórdão Recorrido e no Acórdão Fundamento.

21. No que concerne ao requisito das situações de facto substancialmente idênticas, temos, subjacente ao acórdão recorrido a seguinte factualidade:

i. A Requerente deduziu, em 2004, para efeitos fiscais os custos suportados com contractos de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis e para regimes completares de Segurança Social, que garantiam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, invalidez ou sobrevivência a favor dos respectivos trabalhadores.

ii. A AT considerou que as referidas deduções foram excessivas em virtude de não ter sido respeitado o limite do nº 2 do artigo 40º do CIRC, porquanto entendeu que apenas poderiam ser tidas em conta as despesas com pessoal que se encontrassem sujeitas a contribuições para a Segurança Social.

22. Por seu turno, o Acórdão Fundamento é alicerçado na seguinte factualidade: “Em resultado de uma análise externa efectuada pela AT ao exercício de 2005 e 2007, foram efectuadas as seguintes correcções dos custos relevados pela empresa: “... Não foi considerado como custo na rubrica realizações de utilidade social o montante de € 77.317,29 e de € 3.861,48, respectivamente, respeitante a despesas com o pessoal escriturados a título de remunerações, ordenados e salários, por não terem sido objecto de descontos obrigatórios para a segurança social ou para qualquer regime substitutivo”.

23. Demonstra-se, assim, que entre o Acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto.

24. Verifica-se igualmente identidade de questão de direito uma vez que quer o Acórdão fundamento quer o Acórdão arbitral recorrido analisaram a interpretação dos nºs 2 e 3 do artigo 40º do CIRC, no sentido de descortinar se, para efeitos do limite previsto no nº 2 do referido preceito legal, são consideradas despesas com o pessoal todas as despesas que, tendo a natureza genérica de remunerações, são objecto de descontos obrigatórios para a Segurança Social.

25. Todavia, o Acórdão fundamento e o Acórdão recorrido decidiram em sentidos opostos quanto à questão de direito enunciada.

26. Assim, o Acórdão fundamento entendeu que: «Se é certo que os encargos em questão são cometidos de uma função social importante, também é verdade que a percentagem passível de dedução respeita a despesas que têm igualmente uma considerável relevância social, a qual se efectiva de uma forma inequívoca através dos descontos obrigatórios efectuados sobre essas importâncias para a segurança social ou para qualquer regime substitutivo.»

27. Para concluir que: «Assim sendo, atendendo ao objectivo do art. 40º do CIRC deste artigo - Realizações de utilidade social - devem considerar-se como “despesas com pessoal” todas as despesas que tendo a natureza genérica de remunerações (aquelas que nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho) sejam objecto de descontos obrigatórios para a segurança social ou para qualquer regime substitutivo».

28. Pelo contrário, o Acórdão arbitral ora recorrido considerou que: «Deste modo, não se vislumbra nenhum argumento que justifique qualquer desvio em relação ao sentido escrito da lei, considerando-se que se o legislador quisesse que a base de cálculo para o referido limite fosse o do conjunto de remunerações que serve de base de cálculo às contribuições para a segurança social, tê-lo-ia dito, em lugar de utilizar a expressão “despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao exercício”».

29. Entre a emissão do Acórdão fundamento e do Acórdão arbitral recorrido, não ocorreu qualquer modificação legislativa que fosse susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida, no sentido de servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados na determinação da solução jurídica.

30. O presente conflito de jurisprudência deve pois ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que a decisão arbitral recorrida, ao ter considerado que o que está em causa na previsão da norma em questão, não são liberalidades, mas sim formas alternativas de remuneração da prestação de trabalho, sendo o espírito que preside à sua atribuição uma vontade de remunerar o pessoal em contrapartida do trabalho prestado, fez salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação do disposto nos nº 2 e 3 do artigo 40º do CIRC aos factos.

31. Na verdade, foram razões de política fiscal que estiveram na base da instituição do artigo 40º do CIRC que considera como custos determinadas liberalidades que, como tal, não seriam consideradas à luz dos artigos 23º e 24º do mesmo Código.

32. Pois que o legislador pretendeu incentivar as empresas a realizar determinado tipo de despesas (com contratos de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como com contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social) por considerar as mesmas como de utilidade social.

33. Posição corroborada pelo Acórdão fundamento, nos termos do qual “afastada a indispensabilidade do custo, o legislador aceita a dedutibilidade do mesmo no pressuposto de que os limites em que assenta são recondutíveis à função social das despesas escrituradas como remunerações, isto é, as que contribuem para o sistema de protecção social.

34. A AT considerou que o nº 2 do art.º 40º tem por objectivo a dedução de encargos com contribuições facultativas para fundos de pensões ou equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social que visem garantir aos trabalhadores um reforço dos benefícios assegurados pelo regime geral de segurança social.

35. Ora, se o direito aos benefícios conferidos pelo regime geral obrigatório de segurança social é sustentado pelas correspondentes contribuições para a segurança social — efectuadas pela entidade patronal e pelo trabalhador — cuja base de cálculo é constituída pelas remunerações, tal como definidas pelo respectivo quadro regulamentar, mal se entenderia que o limite das contribuições facultativas para os regimes de natureza complementar tivesse uma base de cálculo diferenciada.

36. Tenha-se ainda em conta que o legislador utilizou a mesma base de cálculo nos números 2 e 3 do art.º 40º do Código do IRC, e que, neste último número, cabem as situações em que os trabalhadores não tenham direito a pensões da segurança social.

37. De facto, não faria sentido e revelaria uma total incoerência do legislador se, para os trabalhadores abrangidos pelo nº 3, a entidade patronal efectuasse contribuições calculadas sobre uma base remuneratória diferente daquela que é utilizada para o cálculo dos descontos dos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social.

38. Não se compreende, de facto, também perante a existência do nº 3, que o legislador pretendesse ver consagrado o entendimento segundo o qual seria irrelevante a qualificação em termos contabilísticos das despesas cujo valor contribui para a fixação desse limite, como sustenta o Acórdão Recorrido.

39. Pelo contrário refere o legislador que tais despesas têm que ser escrituradas a título de “remunerações, ordenados ou salários”.

40. E tratando-se de valores relativos a rendimentos do trabalho, o normal é que sobre os mesmos recaiam contribuições para a Segurança Social, daí a necessidade de se estabelecer um nº 3 que retrata e acolhe um limite superior, por razões de política fiscal e considerando uma maior utilidade social, caso os trabalhadores não tenham direito a pensões de segurança social.

41. Daí que, como bem refere o Acórdão fundamento “4) Atendendo ao objectivo do art.º 40º do CIRC - Realizações de utilidade social - devem considerar-se como “despesas com pessoal” todas as despesas que, tendo a natureza genérica de remunerações (aquelas que nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho), sejam objecto de descontos obrigatórios para a segurança social ou para qualquer regime substitutivo. 5) As razões de interpretação da norma assim o determinam, quer atendendo à teleologia do preceito (a garantia a neutralidade fiscal, permitindo que as despesas que constituam a base da contribuição obrigatória para a segurança social, possam constituir a base do limite do custo dedutível), quer atendendo as razões sistemáticas, pois que, uma vez afastado o critério da indispensabilidade do custo, o legislador aceita a dedutibilidade do mesmo, no pressuposto de que os limites em que assenta são recondutíveis à função social das despesas escrituradas como remunerações, isto é, as que contribuem para o sistema de protecção social.”

42. Quanto à terceira questão de direito em oposição, verifica-se a identidade de situações de facto e tendo presente que a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais, porquanto:

43. Quer no Acórdão fundamento - Ac. da 2ª Sec. do STA, de 05/07/12, Proc. nº 0658/11 - quer no Acórdão arbitral recorrido, estava em causa determinar se os custos apresentados pelo sujeito passivo estavam ou não devidamente documentados.

44. Em ambos os processos a AT, uma vez que o sujeito passivo suportou tais custos com base, na situação subjacente ao Ac. fundamento em documentos internos, inexistindo quaisquer facturas e/ou notas de débito emitidos pelos beneficiários dos rendimentos, na situação subjacente ao Ac. recorrido em documento externo/factura emitida em nome de terceiro, entendeu que esses custos não estavam devidamente documentados para efeitos do art.º 23º nº 1 do CIRC.

45. Verifica-se a identidade da questão de direito uma vez que quer o Acórdão fundamento quer a decisão arbitral recorrida analisaram a questão de saber se os custos estavam devidamente comprovados, pese embora a inexistência de documento externo que titulasse o objecto da operação em nome do adquirente.

46. Contudo, o Acórdão fundamento e o Acórdão arbitral recorrido decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada.

47. Assim, enquanto para a decisão arbitral recorrida a falta de documento externo que identifique as características da operação que titula e de que foi emitido a favor do sujeito passivo que o apresenta como custo, não obsta à comprovação do custo com base em prova adicional que demonstre que a operação foi realizada e a favor de quem foi realizada (no caso serviços de medicina assistencial prestados aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães - terceiro), já para o Acórdão fundamento, pelo contrário, para aceitar a relevância fiscal e considerar que o custo está devidamente documentado, para efeitos do art.º 23º nº 1 e também do 42º, nº 1 al. g) do CIRC, não basta que o sujeito passivo se limite a apresentar meros documentos internos sem identificação das principais características das operações efectuadas, tais como o objecto, o adquirente, o fornecedor e o preço. Neste caso, considera o Acórdão fundamento, porque são documentos que não identificam as principais características das operações efectuadas, são insusceptíveis de relevar como suporte documental idóneo a comprovar os respectivos custos.

48. Acresce ainda que, entre a emissão do Acórdão fundamento e do Acórdão arbitral recorrido, não ocorreu qualquer modificação legislativa que fosse susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida, no sentido de servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados na determinação da solução jurídica.

49. E se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre o Acórdão arbitral recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que o art.º 23º nº 1 do CIRC foi entendido e aplicado diferentemente, quanto à exigência de prova, pelos referidos Acórdãos, sendo certo, igualmente, que a orientação perfilhada na decisão impugnada não está de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

50. Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts. 25º nº 2 do RJAT, 152º nº 1 do CPTA e 27º nº 1 al. b) do ETAF.

51. Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que o Acórdão arbitral recorrido ao ter considerado que pese embora não exista factura emitida em nome do então requerente, o custo estava devidamente comprovado para efeitos do art.º 23º nº 1 do CIRC, fez, salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 23º nº 1 e 42º nº 1 al. g) do CIRC, aos factos.

52. Na verdade, para o Acórdão fundamento o custo foi considerado indevidamente documentado por estar apenas suportado em documentos internos dos quais não decorre a necessária relação entre o custo suportado pela requerente e o efectivo recebimento pelas entidades beneficiárias desse pagamento.

53. Ora, também no Acórdão recorrido se admite que a factura apresentada para além de não ter sido emitida a favor da então requerente não contém qualquer descritivo sobre o tipo de serviço prestado.

54. E um custo não está justificado quando é apresentado um documento externo que o justifica como custo suportado por terceiro.

55. O único documento externo que a então requerente apresentou para justificar o custo está emitido em nome de um terceiro e, muito embora a EDP Distribuição - Energia, S.A., tenha assumido, legal e contratualmente, os encargos com os pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães S.A., caberia a esta entidade emitir um documento apropriado - factura ou nota de débito - para repercutir sobre aquela sociedade os valores que lhe foram facturados pela ………………, S.A., sob pena de inexistir possibilidade material de escrutínio dos gastos em causa, nomeadamente quanto à real natureza dos serviços prestados e dos correspondentes beneficiários (trabalhadores no activo, reformados ou familiares), ficando assim prejudicada a apreciação da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos e a manutenção da fonte produtora, nos termos do nº 1 do art.º 23.º do Código do IRC.

56. Deste modo, ainda que se considere que a lei fiscal não exigia que os encargos financeiros estivessem suportados por factura ou nota de débito para efeitos da sua aceitação como gasto fiscal em termos de IRC, como se refere no Ac. fundamento, sempre seria necessária a existência de um documento que comprovasse o efectivo pagamento do serviço prestado pela entidade que pretende deduzir o custo.

57. De outro modo, não é feito um eficaz controlo das relações económicas, quer do lado da então requerente quer do beneficiário, uma vez que, à revelação de um custo para um agente, contrapõe-se um proveito para o outro.

58. Ora, o Acórdão arbitral recorrido acaba por dar como documentado e pago pela EDP Distribuição um custo com base numa factura que não está emitida em nome da mesma EDP e nem contém qualquer descritivo do tipo de serviço prestado Considerando que foi realizada prova, não documental, que comprovava que o custo respeitava a serviços de medicina assistencial prestados aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães, o que é manifestamente insuficiente para descrever, como se exige no Ac. fundamento, os elementos da operação que a mesma factura visava titular, ou seja, o pagamento pela EDP Distribuição, de prestação de serviços de medicina assistencial prestados aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães.

59. Daí que, como bem se refere no Acórdão fundamento, decidir no sentido do decidido pelo Acórdão recorrido, “seria fazer tábua rasa da obrigação que impende sobre a recorrente quanto às exigências de contabilidade organizada e, ao mesmo tempo, convidar a ficarem fora do sistema fiscal múltiplos agentes económicos.”.

60. Quanto à quarta e última questão de direito em oposição, verifica-se a identidade de situações de facto e tendo presente que a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais, porquanto:

61. Quer no acórdão fundamento – Ac. da 2ª Sec. do STA, de 05/07/12, Proc. nº 0658/11 – quer no Acórdão arbitral recorrido estava em causa determinar se as amortizações que o sujeito passivo pretendia nesse ano contabilizar como custos podiam ser admitidas nesse exercício de forma agregada, pese embora as mesmas não tenham sido contabilizadas, de acordo com as respectivas quotas anuais, no exercício a que respeitavam.

62. Efectivamente, em ambos os processos o sujeito passivo não distribuiu correctamente as amortizações segundo os anos de utilização dos bens mas, outrossim, pretendeu inscrever no ano de 2004 (o caso tratado no Acórdão recorrido) ou em 3 anos (o caso tratado no Acórdão fundamento) o valor correspondente a amortizações, perdidas, relativas a anos anteriores.

63. Verifica-se a identidade da questão de direito uma vez que quer o Acórdão fundamento quer a decisão arbitral recorrida analisaram a questão de saber se tais amortizações podiam ser admitidas como custos atento o disposto no art.º 1º do Decreto Regulamentar nº 2/90, art.º 28º nº 3 do CIRC, bem como o princípio da especialização dos exercícios, tendo também em contraponto ao mesmo o princípio da justiça.

64. Contudo, o Acórdão fundamento e o Acórdão arbitral recorrido decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada.

65. Na verdade enquanto para a decisão arbitral recorrida o principio da especialização dos exercícios pode ceder, em casos de não consideração da totalidade dos custos com amortizações nos anos a que os mesmos respeitam, já para o Acórdão fundamento se as amortizações são o processo contabilístico de distribuir, de forma racional e sistemática, o custo de um activo que se deprecia pelos diferentes exercícios abrangidos pela sua vida útil, elas só podem ser aceites quando contabilizadas como custos ou perdas do exercício a que respeitam, segundo o art.º 1º nº 3 do Decreto-Regulamentar nº 2/90. E, assim, o princípio da justiça não pode dar cobertura a situações com estas que colidem com o interesse público da prevenção e combate da evasão fiscal.

66. Acresce ainda que, entre a emissão do Acórdão fundamento e do Acórdão arbitral recorrido não ocorreu qualquer modificação legislativa que fosse susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida, no sentido de servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados na determinação da solução jurídica.

67. E se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre o Acórdão arbitral recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, sendo certo, igualmente, que a orientação perfilhada na decisão impugnada não está de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

68. Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts. 25º nº 2 do RJAT, 152º nº 1 do CPTA e 27º nº 1 al. b) do ETAF.

69. Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que o Acórdão arbitral recorrido ao ter considerado que a AT devia, com base no princípio da justiça e da tributação pelo rendimento real, ter aceite os custos com amortizações incorridos em anos anteriores, fez, salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação dos art.º 1º do Decreto Regulamentar nº 2/90, art.º 28º nº 3 do CIRC, bem como, do princípio da especialização dos exercícios, aos factos.

70. Antes de mais, de acordo com o nº 3 do art.º 28º do CIRC, na redacção em vigor em 2004, e da alínea a) do nº 2 do art.º 1º do Decreto Regulamentar nº 2/90, os elementos do activo imobilizado consideram-se sujeitos a deperecimento depois da sua entrada em funcionamento.

71. E, em consonância com esta regra, o nº 4 do art.º 3º do mesmo Decreto Regulamentar estabelece que os períodos mínimo e máximo de vida útil contam-se a partir da data da entrada em funcionamento dos bens.

72. Assim, se os bens já se encontravam a ser utilizados deveriam ter sido registadas as correspondentes quotas anuais de reintegração e amortização.

73. A sua contabilização, em 2004, das quotas de reintegração dos bens relativas aos anos decorridos desde a data em que entraram em funcionamento implica a sua não aceitação como custo.

74. Ora, no caso sob análise, tal como no caso subjacente ao Acórdão fundamento, esta regra não foi observada, porquanto se procedeu à contabilização, em 2004, de forma agregada, das reintegrações relativas ao período compreendido entre os anos (entre 1981 e 1988) da entrada em funcionamento dos bens e aquele exercício.

75. Por outro lado, tal circunstância colide com o princípio da especialização dos exercícios.

76. Que, como se considera, e bem, no Ac. Fundamento, não pode, segundo os argumentos aí indicados, ceder perante os princípios da justiça e da tributação pelo rendimento real.

Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deve decidir-se no sentido de que existe oposição de julgados, conhecer-se do objecto do presente recurso e resolver-se o conflito de jurisprudência quanto às quatro questões de direito enunciadas, no sentido do deliberado nos Acórdãos fundamento, uma vez que a decisão arbitral recorrida fez uma incorrecta apreciação e aplicação dos artigos 18º nºs 1 e 2 do CIRC quanto à aceitação, no ano do seu pagamento, de um custo incorrido em ano anterior; do art.º 40º do CIRC, por ter considerado que para efeitos do limite previsto no nº 2 do referido preceito legal, eram atendíveis as despesas com o pessoal tendo a natureza genérica de remunerações, e ainda que não tivessem sido objecto de descontos obrigatórios para a Segurança Social; dos artigos 23º e 42º nº 1 al. g) do CIRC, por ter considerado como documentado um custo com base em documento que não comprova o efectivo pagamento do serviço prestado pela entidade que pretende deduzir o custo; e, finalmente, dos artigos 1º do Decreto Regulamentar nº 2/90, art.º 28º nº 3 do CIRC, bem como, do princípio da especialização dos exercícios, ao ter considerado que se podia aceitar com custo de um determinado exercício o valor das amortizações respeitantes a anos anteriores, aos respectivos factos.


1.2. A EDP – Energias de Portugal, S.A. apresentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma:

1. O presente recurso não pode ser conhecido por não se verificarem os respectivos pressupostos de admissibilidade essenciais, relativamente às quatro questões objecto de recurso.

2. Quanto à questão relacionada com a desconsideração do custo fiscal decorrente da distribuição de resultados a trabalhadores referentes ao exercício de 2002 da EDP Distribuição e da EDP Produção, analisada no ponto i. da decisão arbitral recorrida, constata-se que as situações fácticas subjacentes ao acórdão-fundamento e à decisão arbitral recorrida nada têm de idêntico, não se subsumindo às mesmas normas legais.

3. Em concreto, se nos presentes autos se encontraram subjacentes custos atinentes a gratificações atribuídas aos trabalhadores de algumas das sociedades do Grupo EDP em 2004 e naquele ano deduzidas para efeitos fiscais, as quais não se encontravam reflectidas em quaisquer facturas de anos anteriores e não foram pagas em anos anteriores, no acórdão-fundamento o contribuinte deduziu em 2006 custos relacionados com facturas datadas de 2005 e que foram pelos seus serviços pagas naquele mesmo exercício de 2005.

4. O Tribunal Arbitral conformou, pois, a questão a dirimir assumindo que os custos em causa foram correctamente considerados em 2004 na medida em que se mostram dedutíveis ao abrigo do artigo 23º do Código do IRC e que se respeita o prescrito no número 1 do artigo 18º, por os mesmos serem imputáveis a 2004.

5. A referência ao princípio da especialização dos exercícios na decisão arbitral recorrida é feita apenas de uma perspectiva subsidiária, concluindo que, ponderados outros princípios, como sejam o princípio da proporcionalidade e da justiça, o da especialização dos exercícios teria de ceder, o que no caso sub judice sempre conduziria à conclusão no sentido da dedutibilidade das gratificações pagas pelas sociedades do Grupo EDP em 2004 naquele exacto ano.

6. Diferentemente, o acórdão-fundamento assume a verificação de uma situação de violação do artigo 18º, nº 1, do Código do IRC, em que seria necessário aferir da aplicação da excepção do número 2 do mesmo artigo, cujos pressupostos acaba por não considerar verificados.

7. Assim, para além da falta de identidade das situações de facto, não existindo identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, não se mostra verificada qualquer contradição susceptível de permitir a admissão deste recurso.

8. Sem embargo, urge ainda notar que o Tribunal Arbitral apenas se pronunciou sobre a questão da existência de uma hipotética violação do princípio da especialização dos exercícios de forma lateral e secundária, pelo que falha outra das condições substanciais de admissibilidade do presente recurso no sentido de ser necessário que tenha sido perfilhada “solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta”.

9. Finalmente, quanto à articulação do princípio da especialização dos exercícios com outros princípios com relevância fiscal, a decisão arbitral recorrida adoptou posição que segue a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, donde, falece igualmente esta última condição substancial à admissibilidade do presente recurso.

10. No que respeita à segunda oposição invocada, atinente à questão da desconsideração por parte da Administração Tributária, de parte dos custos relevados como respeitando a realizações de utilidade social da EDP Distribuição e da EDP Produção, analisada no ponto iii. da decisão arbitral recorrida, falha imediatamente um dos requisitos formais essenciais à admissão do recurso sob análise, por o acórdão-fundamento invocado pela Administração Tributária — acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18 de Junho de 2015, proferido no processo n.° 07526/14 — ter sido objecto de recurso de revista e não ter, assim, transitado em julgado, pelo que se conclui imediatamente pela impossibilidade de conhecimento do presente recurso nesta parte.

11. Mesmo que assim não se entenda — o que apenas por absurdo se admite, sem conceder — o não preenchimento dos requisitos substanciais impede o conhecimento do presente recurso.

12. É que, ao contrário do que sucedeu no caso subjacente ao acórdão-fundamento, nenhuma das sociedades do Grupo efectuou qualquer correcção voluntária e a Administração Tributária nunca solicitou qualquer esclarecimento à Recorrida sobre o regime de Segurança Social aplicável aos valores em causa, sendo patente que ao acórdão-fundamento estiveram em causa despesas de natureza distinta daquelas que foram analisadas na decisão arbitral recorrida.

13. Estas diferenças factuais implicam que a questão jurídico-tributária apreciada no processo arbitral em apreço e no acórdão-fundamento tenha de se considerar distinta, o que nos termos já acima expostos impede a conclusão no sentido da existência de oposição e, como tal, determina que não se possa ter o presente recurso por admissível.

14. Relativamente, à terceira oposição invocada pela Administração Tributária, relacionada com a desconsideração, para efeitos fiscais, de custo suportado pela EDP Distribuição e respeitante ao pagamento de serviços de cuidados de saúde prestados pela …………… aos pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães, analisada no ponto iv. da decisão arbitral recorrida, mostra-se evidente que não existe qualquer contradição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão-fundamento o acórdão proferido em 5 de Julho de 2012, no processo nº 0658/11.

15. Na situação subjacente à decisão arbitral recorrida, a EDP Distribuição deduziu o custo que se encontrava documentado em factura emita por um terceiro, ou seja em documento externo estando, pois, apenas e eventualmente em causa, a insuficiência dos elementos constantes daquele documento externo, o qual foi in casu complementado por outros elementos de prova, a saber, outros documentos externos e prova testemunhal.

16. Diferentemente, no caso do acórdão-fundamento, o contribuinte não juntou ao processo qualquer documento de externo que permitisse suportar os custos por este deduzidos, limitando-se a disponibilizar simples documentos internos pelo mesmo elaborados e não apresentando quaisquer elementos de prova adicionais.

17. Ante o que se expôs, a questão apreciada pelo Tribunal Arbitral, ou seja a de saber se um custo comprovado por documento externo, em concreto uma factura que continha erro de identificação, e cujo conteúdo foi complementado com recurso a outros meios de prova, é susceptível de se ter por documentado e dedutível, é distinta da tratada no acórdão-fundamento em que este Supremo Tribunal aferiu se custos que não se encontravam suportados por documento externo — e estavam apenas reflectidos em documentos internos que se mostravam insuficientes, não tendo sido apresentados quaisquer outros elementos de prova — poderiam ser considerados documentados.

18. A posição de direito assumida pelo Tribunal Arbitral e aquela que foi seguida por este Supremo Tribunal Administrativo no acórdão-fundamento não se mostram contrárias, sendo até coincidentes; sendo até o acórdão-fundamento um dos acórdãos a que recorte o Tribunal Arbitral para explanar a sua posição relativamente à necessidade de documentação dos custos e a saber o que essa necessidade significa em termos de prova.

19. Simplesmente, ainda que assumindo entendimento idêntico na apreciação daquela questão, face aos factos de cada um dos casos concretos e da prova aí produzida — que são totalmente diferentes — o Tribunal Arbitral concluiu pela relevância e dedutibilidade do custo em causa e este Supremo Tribunal teve de afastar uma e outra.

20. Quer dizer: não se encontram preenchidos os requisitos para que se considere existir oposição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão-fundamento sobre a mesma questão jurídico-tributária, não sendo o recurso em causa — de todo em todo — admissível.

21. Também no que respeita à quarta oposição invocada pela Recorrente, a posição adoptada pelo Tribunal Arbitral quanto à possibilidade de deduzir em 2004 amortizações de anos anteriores, considerando o prescrito pelo princípio da especialização dos exercícios e os princípios da justiça e da tributação pelo lucro real, mostra-se consentânea com a seguida no acórdão-fundamento, i.e., o já mencionado acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 5 de Julho de 2012, no processo n.° 0658/11, inexistindo uma qualquer situação de oposição.

22. Com efeito, no acórdão-fundamento, o contribuinte, em violação manifesta do disposto no artigo 28º, nº 3, do Código do IRC e no artigo 1º do Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, e, como tal, do princípio da especialização dos exercícios que justifica as normas constantes daqueles artigos, contabilizou a amortização relativa a toda uma empreitada no período de três exercícios, não se distinguindo as partes concretas desta empreitada que foram amortizadas e não evidenciando quais os critérios ou factores de ponderação que utilizou naquelas amortizações.

23. Tendo, por isso, este Supremo Tribunal entendido que naquele caso “o interesse público da prevenção e combate da evasão fiscal, subjacente à prevenção da manipulação do princípio da especialização dos exercícios, deve prevalecer sobre os princípios da justiça e da tributação pelo rendimento real”.

24. Já na decisão arbitral recorrida, o Tribunal Arbitral julgou que a consideração em 2004 de amortizações respeitantes a anos anteriores deveu-se ao facto de nos encontrarmos perante situação factual complexa, que determinou que apenas naquele ano de 2004 tivesse sido passível de considerar a amortização, por só aí terem ficados esclarecidos os termos da repartição entre a EDP Produção e o Estado, não havendo qualquer risco ou indício de aplicação de um qualquer plano alternativo e à margem da lei no que toca às regras de amortização e reintegração.

25. A esta luz, inexistindo qualquer suspeita que, em concreto, se vise diferir no tempo os lucros, fraccionar os lucros, distribuindo-os por exercícios diferentes, com o objectivo de evitar, num imposto de taxas progressivas, a tributação por taxas mais elevadas, ou concentrar o lucro em exercício onde se podem efectivar deduções mais avultadas, então, na esteira até do acórdão-fundamento, “o interesse público da prevenção e combate da evasão fiscal’ não é afectado pela violação das normas relativas ao regime das amortizações”, pelo que “não deverão as normas do regime em apreço, enquanto expressão do princípio da especialização de exercícios, prevalecer sobre os princípios da justiça e da tributação pelo rendimento real”.

26. Daí que, é tão-somente a circunstância de os Factos serem num e noutro casos muito diferentes que permitiu ao Tribunal Arbitral alcançar solução final díspar da sufragada no acórdão-fundamento cuja jurisprudência é por este seguida, pelo que não se encontram preenchidos os requisitos para que se considere existir oposição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão-fundamento sobre a mesma questão jurídico-tributária, não sendo o recurso em causa - de todo em todo - admissível.

27. Caso V. Exas. não confirmem a inexistência de qualquer oposição entre a decisão recorrida e os acórdãos-fundamento — o que se admite por mero dever de patrocínio, sem conceder —, sempre se teria de concluir que a decisão arbitral recorrida adoptou a posição legalmente mais acertada, em rigor, a única posição legalmente possível no que concerne a todas as ditas questões.

28. Começando pelo primeiro tema, em 2003, duas sociedades do Grupo do qual a Recorrida é a sociedade dominante, deliberaram pagar aos seus trabalhadores gratificações relacionadas com o exercício de 2002, as quais foram consideradas para efeitos fiscais naquele ano, nos termos do número 2 do artigo 24º do Código do IRC (na sua redacção à data dos factos), por os resultados serem respeitantes exactamente a 2002.

29. Na medida em que nenhuma das ditas sociedades pagou até 31 de Dezembro de 2003 a totalidade dos montantes que tinham deliberado atribuir, aquelas sociedades acresceram, em obediência ao disposto no número 5 do artigo 24º do Código do IRC, nas respectivas Mod. 22 de 2003, o IRC que haviam deixado de liquidar em razão da dedução acima mencionada, bem como os correspondentes juros compensatórios.

30. No exercício de 2004, a EDP Distribuição e a EDP Produção registaram e concretizaram o pagamento aos seus trabalhadores, a título de gratificações, dos valores de, respectivamente, € 353.771,01 e € 44.000,00, que não tinham sido pagos em 2003 — tendo incluído os mesmos no campo 237 do quadro 7 das correspondentes Modelo 22.

31. O pagamento assim concretizado em 2004 não se sujeitou ao regime do artigo 24º do Código do IRC, vertendo a sua dedutibilidade, ao invés, da regra geral prevista no artigo 23º do mesmo compêndio normativo — foi isto mesmo o que decidiu o Tribunal Arbitral, o que se encontra assente e não foi objecto de recurso.

32. Sendo, pois, os relevantes custos imputáveis a 2004, não decorre da sua dedução precisamente em 2004, qualquer violação do princípio da especialização dos exercícios, consagrado no número 1 do artigo 18º do Código do IRC.

33. De todo o modo, e como tem consistentemente sido afirmado por este Supremo Tribunal, o princípio da especialização não é um princípio absoluto, sendo que nos casos em que a Administração Tributária não teve qualquer prejuízo com a dedução de determinado custo em outro ano que não aquele a que o custo respeita e essa dedução não resultou de omissões voluntárias ou intencionais, com vista a operar as transferências de resultados entre exercícios — justamente como se verifica na situação sub judice —, deve ser admitida a relevância fiscal do custo por assim o determinarem os princípios da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé.

34. Só este entendimento permite assegurar o respeito pelo princípio que orienta a tributação do rendimento das pessoas colectivas, tal como este foi consagrado no número 2 do artigo 104.º da Constituição, nos termos do qual estas devem ser tributadas de acordo com o seu rendimento real.

35. Bem andou, assim, o Tribunal Arbitral ao anular a correcção em apreço e em considerar os custos em causa dedutíveis, decisão que não deverá ser alterada, sendo o recurso em apreço considerado improcedente nesta parte.

36. No que respeita ao segundo tema, i.e., à correcção atinente às “realizações de utilidade social”, discute-se essencialmente a interpretação do que se devem considerar “despesas com pessoal” para efeitos da aplicação do limite à dedução das realizações de utilidade social vertido no número 2 do artigo 40º do Código do IRC, sustentando a Administração Tributária que apenas podem ser tidas em consideração as despesas com o pessoal que sejam objecto de descontos para a Segurança Social ou para qualquer regime substitutivo.

37. Da redacção daquele número 2 do artigo 40º do Código do IRC decorre que o legislador, através da consagração do regime de dedutibilidade ao lucro tributável, quis acautelar preocupações de natureza extrafiscal, designadamente de melhoria da segurança social dos trabalhadores e familiares, o que o fez impondo alguns limites.

38. Assim e no que se refere aos custos suportados pelas empresas com contratos de seguro a favor dos seus trabalhadores e familiares foi permitida a respectiva dedução ao lucro tributável até ao limite de 15% “das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao período de tributação”, sem qualquer outra limitação.

39. Ora, dispõe o artigo 9º do Código Civil, aplicável ex vi do artigo 11º, nº 1, da LGT, que a interpretação, não obstante não se dever cingir à letra da lei, tem de ter na mesma um mínimo de correspondência verbal, o que não sucede com a tese de que as “despesas com pessoal” a ter em conta serão apenas as sujeitas à Segurança Social.

40. Na verdade, da letra do número 2 do artigo 40º do Código do IRC decorre ao invés e de modo claro a intenção de considerar todas as despesas com pessoal “escrituradas na contabilidade”, sendo que na fixação do sentido e alcance da Lei o intérprete tem de presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento de modo adequado.

41. Ademais, a ratio desta norma materializa-se na concretização do tipo de contribuições que, sendo optativas, podem ser deduzidas para efeitos fiscais e não no balizamento do tipo de “despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao período de tributação” a considerar para o cálculo da percentagem de 15% que fixou como limite de dedutibilidade.

42. Estamos, pois, perante uma norma que cumpre na plenitude com o requisito da igualdade face ao termo de comparação escolhido, i.e. a dedutibilidade admitida segue um critério uniforme para todas as empresas que tem por base as “despesas com pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários”, em suma, aquilo que em linguagem de gestão se apelida de “massa salarial”.

43. Por outro lado, de uma perspectiva sistemática, cumpre realçar que o número 3 do artigo 40º do Código do IRC eleva a percentagem prevista no nº 2 para 25% das “despesas com pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários”, em caso de inexistência do direito a pensões da Segurança Social, pelo que se os trabalhadores em causa não têm o direito a pensões para a Segurança Social, então o critério de apenas poderem ser tidas em conta as despesas à mesma sujeitas é a todos os títulos inadequado.

44. Acresce que ao já referido que a interpretação efectuada pela Administração Tributária da norma constante do número 2 do artigo 40º do Código do IRC, no sentido de exigir que as “despesas com pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários” relevadas sejam apenas as sujeitas a contribuições para a Segurança Social é inconstitucional por violação do princípio constitucional da legalidade, disposto no número 2 do artigo 103º da Constituição, inconstitucionalidade que, desde já, se alega para todos os efeitos legais.

45. Nestes termos, a decisão arbitral recorrida no sentido da anulação dos ajustamentos ora em discussão efectuados aos lucros tributáveis individuais da EDP Distribuição, da EDP Produção e da Recorrida, e da anulação da liquidação adicional ao grupo na parte respectiva deverá ser integralmente mantida.

46. No que se reporta ao terceiro tema, ou seja, à recusa da dedutibilidade de custo no valor de € 582.669,70 relativa a factura emitida pela ………….., importa notar que, como foi considerado provado pelo Tribunal Arbitral, este respeita ao encargo com cuidados de saúde suportado com os reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães — pessoal dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Gás da Câmara Municipal do Porto —, encargo que foi imposto à EDP Distribuição pela incorporação da actividade de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão no Município do Porto.

47. Em concreto, foi estabelecido no respectivo contrato de concessão — cfr. artigos 45º e 47º do contrato junto como doc. nº 23 em anexo ao r.i. —, e ficou plenamente firmado em sede judicial, que passou a caber à EDP Distribuição assegurar o financiamento e suportar todos os encargos da Caixa Cristiano Magalhães, nos quais se incluem os relacionados com os serviços médicos prestados aos seus reformados e pensionistas.

48. Como igualmente entendeu o Tribunal Arbitral ter ficado provado, é a ………… que presta cuidados de saúde aos trabalhadores do grupo e seus reformados, pelo que, nos termos acima mencionados, passou a fazê-lo igualmente para os reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães, imputando os custos daqueles serviços à EDP Distribuição.

49. Foi de acordo com este procedimento que foi emitida a factura junta ao r.i. como parte integrante do doc. nº 25, ou seja pela mesma foram facturados os serviços relacionados com cuidados de saúde prestados aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães, sendo que o facto de ter sido incluída na mesma a referência à Caixa Cristino Magalhães resultou de simples lapso.

50. Ademais, como igualmente foi considerado provado pelo Tribunal Arbitral, foi a EDP Distribuição que suportou este custo, concretizando o pagamento do montante fixado na relevante factura à ………… — cfr. doc. nº 25 em anexo ao r.i.

51. O custo em apreço tem racionalidade empresarial, sendo concretizado no interesse da EDP Distribuição, sendo pois dedutíveis nos termos gerais do artigo 23º do Código do IRC.

52. Deste passo, como decidiu o Tribunal Arbitral, os princípios da justiça e verdade material, bem como, e sobretudo, da tributação pelo rendimento real exigem que se atendam a outros meios de prova, concretamente idóneos a dissipar as dúvidas que, eventualmente, se coloquem ante a análise do documento externo que reflecte o custo em causa — factura emitida pela …………. —, na medida em que as exigências formais e de segurança jurídica, maxime o combate à fraude e evasão fiscal, e as derivadas do princípio fundamental de que todo o registo contabilístico deve ter um apoio adequado, não têm natureza absoluta.

53. Pois bem, tendo em conta a prova completar produzida pela Recorrida (outros documentos externos e o depoimento prestado por uma das testemunhas arroladas), todas as dúvidas quanto à documentação do custo em crise ficaram afastadas, pelo que bem andou o Tribunal Arbitral ao anular a correcção em apreço e ao considerar o custo em causa dedutível, decisão que não poderá ser alterada sendo o recurso em apreço considerado improcedente nesta parte.

54. A última das correcções anuladas pelo Tribunal Arbitral e objecto de recurso pela Administração Tributária que cabe apreciar, prende-se com reintegrações e amortizações que, respeitando a anos anteriores, não poderiam ser consideradas, segundo a Administração Tributária, em 2004.

55. A consideração em 2004 de amortizações respeitantes a anos anteriores deveu-se ao facto de nos encontrarmos perante situação factual complexa, que determinou que apenas naquele ano de 2004 tivesse sido passível de considerar a amortização, por só aí terem ficados esclarecidos os termos da repartição entre a EDP Produção e o Estado.

56. Como esclarece o Tribunal Arbitral face à prova produzida, estão em causa amortizações relativas a obras executadas num processo realizado e acompanhado com elevado grau de proximidade pelo próprio Estado, inexistindo qualquer indício ou suspeita de que se visava diferir no tempo os lucros, fraccionar os lucros, distribuindo-os por exercícios diferentes, com o objectivo de evitar, num imposto de taxas progressivas, a tributação por taxas mais elevadas, ou concentrar o lucro em exercício onde se podem efectivar deduções mais avultadas — antes pelo contrário.

57. Quer isto significar que, inexistindo in casu preocupações relacionadas com a prevenção e combate da evasão fiscal que caiba acautelar, como ficou provado, então o princípio da justiça deve prevalecer face ao da especialização dos exercícios, por forma a permitir a imputação ao exercício de 2004 das amortizações respeitantes a exercícios anteriores, conduzindo, pois, à manutenção da decisão arbitral recorrida que assim o entendeu e que determinou a anulação da liquidação impugnada em conformidade.


1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer nos seguintes termos: «A recorrente invoca vários acórdãos em fundamento das quatro questões que suscita. // A recorrida apresenta contra-alegações em que invoca, nomeadamente, não estarem reunidos os requisitos necessários de que depende o recurso interposto, incluindo o trânsito em julgado do acórdão proferido a 18/06/2015, pelo TCA Sul no processo 0726/14. Ora, é de concordar com estas contra-alegações. Aliás, o requisito do trânsito em julgado é exigível, nos termos previstos no art.º 688º nº 2 do CPC, subsidiariamente aplicável. // Nestes termos, é de julgar o recurso como não provido.».


1.4. Notificada do parecer emitido pelo Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, veio a Recorrente confirmar que o acórdão do TCAS, de 18/06/2015, proferido no processo nº 07526/14, ainda não transitou em julgado, dado que dele foi interposto e admitido recurso de revista excepcional para o Supremo Tribunal Administrativo.


1.5. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre apreciar e decidir em conferência do Pleno da Secção.


2. Na decisão arbitral recorrida julgaram-se como provados os seguintes factos:

1. A Requerente encontra-se sujeita ao RETGS (Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades), desde o exercício de 2001, sendo que, no exercício de 2004, ora em causa, tinha um perímetro fiscal efectivo, no qual era a sociedade dominante, que incluía, para além da Requerente, as seguintes 25 sociedades: 1 ….… 2 ….… 3 ….… 4 ….… 5 ….… 6 …… 7 ……… 8 ……… 9 …… 10 …… 11 ……12 …… 13 …… 14 ……15 …… 16 ……… 17 …… 18 ……… 19 …… 20 …… 21 …… 22 …… 23 ……… 24 ………… 25 ………….

2. Na sequência da Ordem de Serviço nº OI 200800136, a Requerente foi objecto de procedimento de inspecção externa parcial ao IRC relativo ao exercício de 2004, com o objectivo de verificar o cumprimento das obrigações fiscais inerentes à aplicação do Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades.

3. Como resultado do referido procedimento de inspecção, a AT efectuou correcções à matéria tributável do grupo no montante de 31.859.993,13 € e correcções ao cálculo do imposto no montante 528.584,01 €, dando, assim, origem à liquidação adicional nº 2008 831 0038235, de 24-11-2008, no montante de 17.098.299,06 €.

4. A mencionada liquidação de IRC e de juros compensatórios foi notificada à Requerente na qualidade de sociedade dominante do Grupo EDP e nos termos prescritos pelo RETGS; na sequência foi apurado o montante de 9.301.341,44 € a pagar adicionalmente a título de IRC e o valor de 1.292.504,55 € a pagar a título de juros compensatórios.

5. A Requerente submeteu reclamação graciosa na qual sustentou a anulação das sustentadas correcções à matéria colectável do grupo, solicitando a anulação parcial da liquidação impugnada relativamente a correcções cujo valor ascendia a 7.117.890,10 €.

6. Analisados os factos e argumentos expendidos pela Requerente, então reclamante, foi o pedido parcialmente deferido por despacho de 30-06-2011, exarado pelo Director de Serviços de Inspecção Tributária, que determinou a anulação parcial da liquidação em crise em 622.614,50 €.

7. Da decisão, foi a Requerente notificada em 04-07-2011, através do ofício n.º 1792 de 01-07-2011.

8. Em 28-07-2011 deu entrada na Direção de Serviços de Inspecção Tributária recurso hierárquico (distribuído sob o nº 3247201110000517) tendo como objecto a decisão de indeferimento proferida na reclamação graciosa supra identificada, que se cingiu, às correcções efectuadas pela AT que, não obstante terem sido reclamadas, não foram objecto de anulação pelo Director dos Serviços de Inspecção ou de posterior aceitação pela Requerente, ascendendo a 6.313.785,34 € o valor da liquidação de IRC e juros compensatórios objecto de contestação naquela fase.

9. No seguimento do recurso hierárquico, a AT anulou mais algumas correcções — em certos casos, apenas parcialmente —, anulações essas que se reflectiram numa redução do montante apurado na liquidação de IRC e de juros compensatórios de 62.665,57 €.

10. A Requerente procedeu, em 21 de Janeiro de 2009, ao pagamento de uma parte da liquidação sub judice — no valor total de 5.175.546,86 €.

11. Em 2013, a Requerente efectuou um segundo pagamento parcial da liquidação — no valor total de 2.136.945,64 €, tendo, na sequência deste pagamento e ao abrigo do Regime Excepcional de Regularização de Dívidas de Natureza Fiscal então em vigor, sido perdoado o valor de 296.947,70 € a título de juros compensatórios.

i.

12. Com referência ao exercício de 2002, a EDP Distribuição e a EDP Produção deliberaram, em 2003, a concessão de gratificação aos seus trabalhadores, materializada na distribuição de resultados.

13. A sociedade EDP Distribuição deduziu, na sua Declaração de IRC Mod. 22 relativa ao exercício de 2002, o montante de 15.565.100,00 € a título de variações patrimoniais negativas, em razão de gratificações de balanço concedidas aos trabalhadores.

14. A EDP Distribuição acresceu na Mod. 22 de 2003, o IRC que havia deixado de liquidar em razão da dedução acima mencionada, em montante de 830.783,05€, bem como os correspondentes juros compensatórios, no valor de 33.322,37€.

15. Durante o exercício de 2004, a EDP Distribuição colocou à disposição dos seus trabalhadores o remanescente das gratificações com origem nos resultados obtidos por esta sociedade em 2002, tendo então deduzido o correspondente valor (353.771,00 €) no campo 237, do quadro 07 da Declaração de rendimentos Mod. 22 de 2004, enquanto variação patrimonial negativa daquele exercício, ou seja de 2004.

16. De modo semelhante, a sociedade EDP Produção deduziu, na sua Mod. 22 relativa ao exercício de 2002, o montante de 2.809.400,00 € a título de variações patrimoniais negativas, com referência a gratificações de balanço concedidas aos trabalhadores nesse exercício.

17. A EDP Produção acresceu, na Mod. 22 de 2003, o IRC que havia deixado de liquidar em razão da dedução acima mencionada, em montante de 154.777,40€, assim como os correspondentes juros compensatórios, no valor de 6.191,10€.

18. Durante o exercício de 2004, a EDP Produção colocou à disposição dos seus trabalhadores as gratificações com origem nos resultados obtidos por esta sociedade em 2002, deduzindo o respectivo valor (44.000,00 €) no campo 237, do quadro 07 da Declaração de rendimentos Mod. 22 de 2004, enquanto variação patrimonial negativa daquele exercício, ou seja de 2004.

19. Os pagamentos concretizados em 2004 pela EDP Produção e pela EDP Distribuição suscitaram unicamente registos em contas de terceiros por contrapartida de disponibilidades.

20. No procedimento de inspecção, a AT considerou que como as referidas importâncias haviam sido relevadas como variação patrimonial negativa no ano/exercício de 2002, o sujeito passivo, em função das regras definidas no nº 2 do art.º 24º do CIRC, tinha deixado precludir o direito aí contemplado e, por isso, considerou que tais pagamentos, em 2004, não eram subsumíveis enquanto encargos dedutíveis para efeitos fiscais, tendo procedido a uma correcção ao lucro tributável do montante considerado como indevidamente deduzido em 2004, no montante de 353.771,01 €, relativamente à EDP Distribuição, e no montante de 44.000,00 €, relativamente à EDP Produção.

21. Tais correcções foram mantidas em sede de reclamação graciosa e do recurso hierárquico interpostos da liquidação adicional de IRC do ano de 2004.

ii.

22. Em sede de inspecção tributária a AT considerou que a Requerente registou na conta 662 – Amortizações do Imobilizado Corpóreo, o montante de 535.661,22 € referente a amortizações de bens adquiridos em estado de uso, que não foram aceites como custos fiscais, por ter concluído que os correspondentes períodos de utilidade esperada determinados pela Requerente já tinham terminado em anos anteriores a 2004, conforme o seguinte quadro:



23. Do valor referido no ponto anterior a Requerente contesta o montante de 491.296,77 €. A Requerente apresentou como suporte da sua argumentação, o quadro relativo ao cálculo de amortizações e reintegrações (doc. 20 p.i.) da CPPE. relativo a 2003 e 2004:


24. Os bens que originam os ajustamentos aqui em causa foram integrados na esfera da D… (à época designada ……………..) em resultado de fusão por incorporação por esta sociedade das sociedades “…………….” (“…”) e “……….” (“…”), com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2004, a qual foi efectuada segundo o regime de neutralidade fiscal.

25. Na sequência da mencionada fusão, em 2003, a EDP Produção registou na sua contabilidade, no exercício de 2004, os itens de imobilizado do activo das empresas incorporadas pelos valores que tinham na contabilidade da …….. e da ………………, em 31/12/2003.

26. Na sequência desta fusão (i.e. no exercício de 2004), a EDP Produção alterou a taxa de amortização dos bens incorporados por fusão para 3,125%, correspondente a um período de vida útil de 32 anos, independentemente do ano de aquisição e de início de utilização dos bens, registando aquele prazo temporal na coluna 9 – número de anos de utilidade esperada, dos mapas de reintegração.

27. No seguimento desta alteração, o sistema informático que gere os mapas fiscais da EDP Produção inscreveu, automaticamente e sem a ponderação de qualquer outro factor, no campo que se refere ao número de anos de utilidade esperada, o número de anos subjacente à nova taxa (i.e., 1/nova taxa de amortização), como se a nova taxa de amortização mais elevada tivesse sido aplicada desde que os bens entraram em funcionamento nas sociedades incorporadas, o que se traduziu em que no mapa de amortizações constasse um número de anos de utilidade esperada que, em algumas situações, já se encontrava ultrapassado em 2004 face à data em que os bens em causa começaram a ser amortizados.

28. Em momento algum, foram registadas contabilisticamente, na esfera quer da ………….. e da ……………. (2,5%), quer da EDP Produção (3,12% ou 3,13%), amortizações referentes aos bens em apreço inferiores às decorrentes da aplicação das taxas mínimas previstas na lei.

29. No exercício de 2006, a AT, que tinha, num primeiro momento, proposto correcção análoga à correcção aqui em apreço, veio, na sequência do exercício, pela EDP Produção, do direito de audição ao projecto de relatório de inspecção tributária, a considerar procedente argumentação daquela, anulando a dita correcção.

30. Em sede de recurso hierárquico, a AT aceitou a dedução como custo da reintegração no valor de 35.484,12 € efectuada com referência ao bem adquirido em 1972, pelo valor de 1.135.492,80 €, tendo a Requerente decidido, por seu lado, aceitar correcção no valor de 8.880,33 €.

iii.

31. A EDP Distribuição, a EDP Produção e a Requerente, deduziram, em 2004, para efeitos fiscais, e até ao limite que entenderam legalmente permitido, os custos suportados por estas sociedades com contratos de seguros de vida, contribuições para os fundos de pensões e equiparáveis e para regimes complementares de Segurança Social, que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, invalidez ou sobrevivência a favor dos respectivos trabalhadores.

32. Assim, e para além do mais, a EDP Distribuição procedeu ao registo contabilístico nas contas 6222305000 – Seguros de Acidentes Pessoais e 6440001000 – Prémios para pensões das quantias de 328.758,63 € e 44.625.673,78 €, respectivamente, totalizando 44.954.432,41 €.

33. Por sua vez, a EDP Produção procedeu ao registo contabilístico nas contas 6222305000 – Seguros de Acidentes Pessoais, 6222306000 – Seguro de Doença e 6440001000 – Prémios para Pensões, das quantias de 46.640,00 €, 77.178,17 € e 8.908.865,70 €, respectivamente totalizando 9.032.683,87 €.

34. No que se refere à EDP Energias de Portugal, a mesma procedeu ao registo contabilístico nas contas POC 6222305000 – Seguros de Acidentes pessoais, 6222399000 - Seguros- outros, 6430001000 – Cmp Pens Reform obr, 6440001000 – Prémios para pensões e 6470099000 – CST Acç Soc-Serv Méd, das quantias de 6.674,78 €, 19.545,21 €, 42.858,88 € e 776.830,54 €, respectivamente, totalizando um valor de 845.909,41 €.

35. A AT considerou que as referidas deduções foram excessivas por, no seu entendimento não ter sido, pelas mencionadas sociedades, respeitando o limite do número 2 do artigo 40.º do Código do IRC, porquanto para, estes efeitos, entendeu que apenas poderiam ser tidas em conta as despesas com o pessoal que se encontrassem sujeitas a contribuições para a Segurança Social, pelo que concluiu que a EDP Distribuição teria deduzido, a mais e em violação do dito artigo do Código do IRC, o montante de 6.794.007,48 €, a EDP Produção o valor de 1.421.960,30 € e a Requerente o montante de 6.846,45 €.

36. A AT desconsiderou, com vista ao cômputo do limite de 15% das “despesas com pessoal, escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários” a que alude o número 2 do artigo 40º do Código do IRC, as verbas registadas nas relevantes rubricas contabilísticas que não tinham sido objecto de descontos para a Segurança Social ou para qualquer regime substitutivo.

37. Na sequência de tal procedimento, apurou a AT um novo limite ascendendo este, relativamente à Requerente, a 36.715.632,25 € que, comparado com as realizações de utilidade social tomadas pelo sujeito passivo para o seu cálculo determinou um acréscimo, para efeitos de lucro tributável de 8.238.800,16 €.

38. Considerando que o sujeito passivo já havia acrescido, para efeitos de determinação do lucro tributável, o montante de 1.444.792,68 €, resultou uma correcção pela diferença que ascendeu a 6.794.007,48 €.

39. Relativamente à EDP-Produção, procedeu a AT ao recálculo do limite referido no nº 2 do artigo 40º do CIRC, ascendendo este a 7.536.835,09 €, considerando que deveria aquele sujeito passivo ter acrescido, para efeitos de determinação do resultado tributável, a importância de 1.495.848,78 €, correspondente aos encargos suportados a título de realizações de utilidade social, não dedutíveis para efeitos fiscais.

40. No entanto, considerando que já havia sido acrescido, para efeitos de determinação do lucro tributável, o montante de 73.888,48 €, resultou uma correcção pela diferença ascendendo esta ao montante de 1.421.960,30 €.

41. Verificando que a Requerente, na autoliquidação de imposto relativa ao ano de 2004, apresentou no campo 209, do quadro 07, referente a “Realizações de Utilidade Social Não Dedutíveis” o valor de 251.893,20 €, relativo à EDP Energias de Portugal, entendeu a AT que deveria ter sido acrescido o valor de 69.250,54 €, declarando-se o montante de 321.143,75 €, correspondente à diferença entre 845.909,41 € e 524.765,66 €.

42. Em sede de direito de audição, a Requerente manifestou a sua concordância parcial com o enquadramento feito pela AT relativamente aos encargos referidos nas contas POC 6222305000 – Seguros de Acidentes pessoais, e 6440001000- Prémios para pensões, discordando quanto às demais contas, 6222399000 - Seguros- outros e 6430001000 – Cmp Pens Reform Obr.

43. No ponto 13º do direito de audição, informou a Requerente que na conta…– Seguros-Outros, se encontravam contabilizados encargos referentes a Seguros de Acidentes de Trabalho e a Seguros de Responsabilidade Civil, encontrando enquadramento na al. d) do nº 1 do art. 23º do CIRC, no que a AT considerou que lhe assistia razão pelo que ajustou a correcção em conformidade.

44. De igual modo, foram aceites pela AT, relativamente à conta POC 6430001000, os encargos que a Requerente indicou serem passíveis de individualização referentes a encargos pagos a trabalhadores (logo que atinjam a idade normal para a passagem à reforma) ou a sobreviventes de trabalhadores ou pensionistas, consoante aplicável, de complemento aos benefícios concedidos pelas Instituições Oficiais de Previdência, respectivamente, em caso de reforma por velhice ou de falecimento de trabalhadores ou pensionistas, por se enquadrarem na al. d) do nº 1 do art. 23º do CIRC.

45. Pelo que foi efectuada uma correcção no montante de 6.846,45 €, tendo sido aceite a dedutibilidade fiscal dos encargos contabilizados nas contas 6222399000 Seguros-outros e…, Complementos de Pensões de Reforma e Sobrevivência.

46. As correcções que, na totalidade, tendo em conta as 3 empresas, EDP Distribuição, EDP Produção e EDP Energias de Portugal, ascendem a 8.222.814,23 €, foram mantidas em sede de reclamação graciosa e de recurso hierárquico interpostos contra a respectiva liquidação.

iv.

47. Outro dos custos que foi posto em causa pela AT por o ter considerado não indispensável à actividade da Requerente respeita a encargos suportados com cuidados de saúde prestados a reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães S.A. [pessoal dos Pessoal dos Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade da Câmara Municipal do Porto (“SMGE”)].

48. A Caixa Cristiano Magalhães era uma caixa de socorros mútuos, pertencia à Câmara Municipal do Porto e era a entidade que prestava serviços na área da saúde e na de reformas aos empregados dos serviços municipalizados de gás e electricidade do Porto.

49. A Caixa Cristiano Magalhães, tinha os seus reformados, a quem pagava complementos e acompanhava nalguns aspectos de saúde, disponibilizando a Câmara do Porto todos os meses determinadas verbas em função das despesas da Caixa para pagar aos seus reformados e questões na área da saúde.

50. Do contrato de concessão de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão celebrado entre a EDP e a Câmara Municipal do Porto, em concreto, dos respectivos artigos 45º e 47º, resulta que a responsabilidade da EDP Distribuição para com os beneficiários da Caixa Cristiano Magalhães decorre das obrigações assumidas por esta empresa, designadamente a contribuição para sistemas privativos de Segurança Social e encargos com serviços médicos, em consequência da incorporação na sua esfera, em 1992, da actividade de distribuição de energia eléctrica no Município do Porto, tendo sido absorvidos os serviços administrativos e comerciais dos SMGE na parte respeitante àquela actividade.

51. Aquando da integração da actividade de distribuição da electricidade na cidade do Porto na EDP os então trabalhadores dos SMEG passaram a ser trabalhadores da EDP de pleno direito nos termos prescritos no artigo 47.º do Contrato de Concessão celebrado com a Câmara Municipal do Porto e deixaram de ter qualquer relação com a Caixa Cristiano Magalhães, a qual actualmente só se mantém enquanto existirem pensionistas e reformados que já o eram aquando daquela integração.

52. A ……………. é uma empresa do Grupo EDP vocacionada para prestar cuidados de saúde aos trabalhadores do grupo e seus reformados.

53. O custo em causa no ponto 47 supra, respeita a serviços de medicina assistencial facturados pela ……………….., (“…………..”) e prestados aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães em 2004, da responsabilidade da EDP Distribuição.

54. No acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 30 de Setembro de 2003, proferido no processo n.º 47778, afirmou-se que: o “contrato de concessão entre a Câmara Municipal do Porto e a EDP, que transfere para esta última «os direitos e obrigações derivados dos actos ou contratos celebrados pela CMP – SMGE que digam respeito à distribuição concedida» engloba a transmissão das obrigações contributivas de financiamento da Caixa Cristiano de Magalhães, segundo os estatutos desta e as normas em vigor à data da concessão, que antes eram obrigações da CMP – SMGE”.

55. Em sede de procedimento inspectivo verificou a AT, quanto aos documentos de suporte apresentados pelo sujeito passivo, como prova dos registos contabilísticos de contas de custos, selecionados no decurso da acção de inspecção, que existiam documentos externos emitidos em nome de terceiros, sendo com base nesses documentos que a requerente pretendia justificar o custo, pelo que considerou a AT que representando o documento, o instrumento formal de suporte ao registo contabilístico, se está emitido em nome de outrem deixa de justificar o custo, motivo pelo qual procedeu à respectiva correcção.

56. Tal correcção no montante de 593.012,59 €, no qual se inclui o montante questionado de 582.669,70 €, foi expressamente mantida em sede de reclamação graciosa.

57. Em 10 de Abril de 2013, no âmbito da instrução do recurso hierárquico em causa no presente processo arbitral, e que nessa data se encontrava pendente, a Divisão de Administração da Direcção de Serviços do IRC solicitou que lhe fosse enviado “cópias da Factura da ……………… em nome de Caixa Cristiano Magalhães, no valor de 582.669,70€ (valor corrigido pelos Serviços de Inspecção Tributária como — Despesas com suporte documental em nome de terceiros) e respectivos meios de pagamento”.

58. Em resposta a este pedido a Requerente apresentou um requerimento no qual juntou como doc. nº 2 cópia da factura nº 6344003277 emitida pela …………. à Caixa Cristiano Magalhães, com o valor de 582.669,70€, datada de 31.12.2004, com um quantitativo identificado como “Janeiro a Dezembro de 2004”, e não contendo qualquer descritivo sobre o tipo de serviço prestado, e como doc. nº 3 cópia de um registo contabilístico referente ao pagamento de tal factura.

59. Face aos elementos juntos pela então Recorrente, ora Requerente, a AT indeferiu a aceitação como custo do montante de 582.669,70 €, com base no seguinte fundamento:

“Ora, conforme se refere nos autos, correspondendo o montante em questão a verbas pagas pela EDP para satisfazer os compromissos dos SMGE, porque razão é que uma factura que devia justificar um custo para a EDP, é emitida por uma empresa pertencente ao seu grupo?
De referir que solicitados à Requerente os meios de pagamento correspondentes a esta situação foi-nos enviada resposta através de carta onde se requer a junção aos autos de: “Evidência do pagamento efectuado pela Caixa Cristiano Magalhães SA (conforme documento n.º 3 em anexo).
Ora, se o documento em questão pretende justificar um custo, como se pode referir que seja um pagamento efectuado pela Caixa Cristiano.
Não se encontrando devidamente justificada esta situação, mostra-se bem efectuada a correcção efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária”.

60. A …………… prestou serviços de medicina assistencial aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães no exercício de 2004 e em resultado dos serviços prestados emitiu a competente factura, a qual foi dirigida à Caixa Cristiano Magalhães.

61. Os serviços de saúde prestados pela ………….. aos reformados e pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães reflectidos na factura em apreço, no valor de € 582.669,70, foram pagos pela EDP Distribuição àquela primeira sociedade.

v.

62. No âmbito da acção inspectiva que conduziu à liquidação de imposto e juros compensatórios aqui impugnada, a AT classificou como despesas não documentadas despesas registadas pela B… no montante global de 1.671.196,52€, e despesas incorridas pela EDP Distribuição em valor agregado de 505.187,97€, entendendo que as referidas despesas não se encontram suportadas por qualquer documento externo que demonstre a veracidade dos lançamentos contabilísticos correspondentes, pelo que considerou que estes não são dedutíveis para efeitos fiscais, estando ainda sujeitos a tributação autónoma à taxa de 50%, nos termos do artigo 81.º, nº 1, do Código do IRC.

63. No decorrer da inspecção realizada, foi o sujeito passivo notificado para apresentar os documentos externos de suporte aos registos contabilísticos.

64. O Sujeito Passivo procedeu à entrega faseada e parcial dos documentos solicitados, em sede do direito de audição e reclamação graciosa, sendo que, à data da elaboração do RIT, ainda se encontravam em falta documentos justificativos do montante de 1.671.196,52 €.

65. No seguimento da aludida acção inspectiva e igualmente no âmbito da reclamação graciosa apresentada, parte dessas correcções foram anuladas pelos serviços competentes, mantendo-se a negação da dedutibilidade de despesas em montante de 867.699,47€ relativamente à EDP Distribuição e de 57.238,25€ relativamente à EDP Produção.

66. Em sede de recurso hierárquico, a AT manteve in totum esta correcção de despesas não documentadas, no valor de 924.937,72 €.

67. Daquelas despesas, o montante de 752.675,87 €, reporta-se a um acerto feito pela EDP Distribuição reportado a prémios de seguros de acidentes pessoais.

68. Em 2004, a Requerente constatou que, no que respeita aos prémios de seguro de acidentes pessoais atinentes aos trabalhadores da EDP Distribuição relativamente aos exercícios de 2001, de 2002 e de 2003, estavam a ser tidas em conta taxas de prémio de seguro inferiores às que tinham sido negociadas pelo Grupo de sociedades do qual a Requerente é a sociedade dominante e se encontravam, de facto, a ser aplicadas pelos correctores de seguros contratados.

69. Apesar de o Grupo EDP ter negociado e estar a proceder ao pagamento de prémios de seguro de acidentes pessoais em determinado valor para os trabalhadores do Grupo, não era esse o montante que, na respectiva quota-parte, se encontrava a ser registado pela B… relativamente aos seguros dos seus trabalhadores.

70. A negociação e as ordens de pagamento eram sempre feitas centralmente pela Requerente, sendo de seguida imputadas as relevantes quotas-partes às empresas do Grupo.

71. A taxa negociada para os seguros de acidentes de trabalho do Grupo pela Requerente era aplicada ao capital seguro, o qual estava directamente relacionado com a massa salarial do Grupo.

72. Para a determinação interna de quanto é que cada sociedade do Grupo devia suportar e pagar era feita incidir a mesma taxa (a que era negociada anualmente) sobre o capital seguro — massa salarial — de cada uma delas.

73. Assim, aquando da imputação inicialmente feita à EDP Distribuição dos prémios de seguro de acidentes pessoais dos respectivos trabalhadores, registou-se:

i. em 2002 o valor de 341.622,96 € em vez do montante de 505.095,87 €, realmente pago ao corrector de seguros pelo Grupo EDP com referência à quota-parte da EDP Distribuição;

ii. em 2003 o valor de 344.543,56 € em vez do montante de 516.134,73 €, verdadeiramente pago ao corrector de seguros pelo Grupo EDP com referência à quota parte da EDP Distribuição.

74. Assim, nos anos de 2002 e 2003, os valores de 163.472,91 € e de 171.591,56 €, respectivamente, foram efectivamente suportados pelo Grupo EDP com seguros de acidentes pessoais dos trabalhadores da EDP Distribuição não foram registados na contabilidade das empresas do Grupo a qualquer título.

75. A Requerente apenas registou na sua contabilidade e deduziu os custos com os prémios de seguro dos seus trabalhadores, tendo redebitado os restantes valores às respectivas sociedades; porém esse redébito não foi correcta e atempadamente registado na EDP Distribuição, pelo que o respectivo valor não foi fiscalmente considerado nem pela Requerente, nem pela EDP Distribuição.

76. Tendo sido, em 2004, detectada a situação, a Requerente procedeu à sua rectificação contabilística e, em consequência, à dedução fiscal daqueles custos, que valorizou, incluindo 417.611,40€ reportados ao ano de 2001, num total de 752.675,87 €, para feitos de apuramento da matéria colectável da EDP Distribuição.

77. Quanto ao custo de 26.700,32 € igualmente tido por não documentado pela AT, reporta-se a encargos atinentes ao serviço “GALP Frota”, alocados a um dos centros de custos da EDP Distribuição.

78. A Requerente, enquanto sociedade dominante do Grupo, negociou este serviço com o respectivo fornecedor, in casu a “Galp”, para todas as sociedades do Grupo, acordando um valor por litro, sendo que, no final do ano, o custo foi facturado a cada uma daquelas pela Requerente de acordo com os respectivos consumos de combustível.

79. A referida facturação era feita mediante a emissão de uma factura (nota de débito) pela Requerente individualmente em nome das várias sociedades que integravam o seu Grupo, sendo o valor facturado calculado pela soma do valor dos consumos de combustível imputados aos centros de custos, i.e., aos departamentos das ditas sociedades.

vi.

80. A AT acresceu à matéria tributável do exercício de 2004, o montante de 7.312.195,94 €, contabilizado pela EDP Produção na rubrica “662 - Amortizações de Imobilizado Corpóreo”, por ter considerado que esta empresa efectuou reintegrações excessivas de bens do activo imobilizado corpóreo, que resultaram da aplicação de taxas de reintegração superiores às taxas máximas permitidas, constantes das tabelas anexas à Portaria nº 737/81, de 29 de Agosto e ao Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, sendo que, notificada que foi a Requerente, no âmbito do procedimento inspectivo, para justificar a aplicação de taxas utilizadas, não apresentou à A.T. elementos que legitimassem as reintegrações em questão.

81. O referido montante reporta-se a amortizações realizadas e ajustamentos efectuados pela EDP ao abrigo de projectos desenvolvidos em parceria com o INAG, fruto da celebração de protocolos com aquele instituto público, em representação do Estado Português.

82. Os bens que suscitaram as reintegrações no montante de 7.307.115,60 €, daqueles 7.312.195,94 €, resultaram de investimentos efectuados ao abrigo de diversos protocolos celebrados entre a EDP e o Estado Português, nos anos de 1979 a 1985, tendo em vista a realização de aproveitamentos hidráulicos de fins múltiplos (i.e. de fins não exclusivos à produção de electricidade) no denominado sistema Mondego – constituído pelas infraestruturas das barragens da Aguieira, Raiva e Fronhas - e, bem assim, de obras preliminares e infra-estruturas no Alqueva. e intervenções referentes à navegabilidade do Douro.

83. Em 3 de Maio de 1979 foi celebrado entre a Requerente (à data EDP, Electricidade de Portugal, Empresa Pública) e o Estado Português, representado pela Direcção Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos (“DGRAH”), o “Protocolo para a Realização de Aproveitamentos Hidráulicos de Fins Múltiplos” (“protocolo quadro”) que pretendeu aglutinar numa iniciativa conjunta os interesses da primeira — estritamente associados à produção de energia eléctrica — e os interesses próprios do Estado, como sejam a contenção de cheias, a regularização de caudais, a defesa do ambiente, o abastecimento de água para gastos domésticos ou industriais, entre outros.

84. De acordo com a cláusula nº 2 do referido “protocolo quadro”, cada aproveitamento de fins múltiplos seria objecto de um contrato especial, que deveria conter a especificação das condições técnicas e as disposições económico-financeiras do aproveitamento, as regras respeitantes ao suporte e repartição de custos, a definição do regime de propriedade e as normas a que deveriam obedecer os planos anuais de exploração.

85. Do preâmbulo e das cláusulas 4.ª a 6.ª do referido protocolo celebrado com o Estado português, consta, quanto à repartição de custos, o seguinte:

a. “Os custos deverão ser repartidos na mesma proporção dos benefícios”;
b. “Dos custos totais de cada aproveitamento a EDP suportará a importância correspondente ao custo da mais favorável alternativa que adoptaria na hipótese de não se associar na sua realização; o Estado suportará o remanescente”;
c. “A repartição definitiva dos custos será objecto de acordo obtido com base nos preços em vigor à data do início da produção de energia eléctrica, salvo para investimentos já realizados em que serão considerados os preços históricos, actualizados àquela data”;
d. “A repartição de custos relativos a cada aproveitamento será provisoriamente fixada por percentagem no respectivo contrato, tendo em conta os custos orçamentados e a valia eléctrica do aproveitamento estimada com base nos preços praticados na data do contrato”.

86. Os aproveitamentos abrangidos pelo “protocolo quadro” viriam a ser objecto de protocolos individuais, nos seguintes termos:

i. Em Junho de 1984, foi celebrado entre a EDP e a DGRAH, o “Protocolo para a realização do Canal Navegável do Rio Douro”, o qual visou estabelecer as condições de participação da EDP nas obras de construção do canal navegável do rio Douro;
ii. Em Julho de 1985, foi celebrado entre a EDP e o Estado o “Protocolo para o Aproveitamento de Fins Múltiplos do Alqueva”, o qual visou estabelecer os direitos e obrigações das partes relativamente ao aproveitamento de fins múltiplos do Alqueva durante a fase da construção e, bem assim, definir o princípio geral a adoptar na repartição dos custos para o conjunto dos aproveitamentos a construir na cascata do Guadiana.

87. Os contratos especiais a que se refere a cláusula 2.ª do “protocolo quadro” nunca foram realizados, pelo que nunca foram especificadas as condições técnicas e as disposições económico-financeiras de cada aproveitamento de fins múltiplos, bem como as regras respeitantes ao suporte e repartição de custos, a definição do regime de propriedade, com especificação das componentes a excluir do património da EDP, e as normas a que deveriam obedecer os planos anuais de exploração.

88. Dado que as partes envolvidas nos protocolos em questão não celebraram os contratos especiais a que o “protocolo quadro” faz menção, não foi fixada qualquer percentagem de repartição provisória de benefícios e encargos, tal como não foi previamente definida a titularidade do património envolvido.

89. Perante a necessidade legal de registar nas suas demonstrações financeiras os investimentos que estavam a ser realizados e a reintegração dos mesmos, na parte afecta à produção de energia eléctrica, a Requerente definiu uma percentagem de repartição provisória, que fixou em 50%.

90. O investimento realizado - com excepção do aproveitamento das Fronhas, classificado como prestação de serviços da EDP ao INAG ao invés de aproveitamento conjunto – foi sendo evidenciado nas demonstrações financeiras da EDP, que considerou 50% do mesmo afecto à produção de energia eléctrica e os restantes 50% como activos não afectos àquela finalidade

91. Até ser celebrado um protocolo de acerto de contas com o INAG, apenas a percentagem do valor dos activos imobilizados considerados afectos à produção de energia eléctrica (i.e. 50%) foi sendo objecto de amortização, de acordo com as taxas de amortização legais em vigor.

92. O Estado Português entregou à EDP, à medida que os projectos foram sendo desenvolvidos, contribuições cujo montante líquido ascendeu a 10.427.334,00 € (dos quais 8.931.521,10€ estão associados aos bens que geraram a correcção ora em causa) e que foram relevados na rubrica contabilística do balanço designada de “Outros Devedores e Credores — Participação do Estado para Aproveitamentos de Fins Múltiplos”.

93. Em 1995 foi constituído um grupo de trabalho que incluiu representantes da EDP e do INAG, com o objectivo de proceder à avaliação dos encargos e das contribuições das partes relativas aos investimentos conjuntos efectuados nos aproveitamentos hidráulicos de Alqueva, Aguieira/Raiva e Fronhas (efectuados ao abrigo do “protocolo quadro”), e no projecto referente à navegabilidade do Douro.

94. Das reuniões do grupo de trabalho, resultou, para além do mais:

i. A definição da mais-valia eléctrica obtida pela EDP em cada um dos projectos conjuntos e, por diferença, conforme definido no “protocolo quadro”, o benefício dos referidos projectos para o INAG; e
ii. A elaboração de um relatório de conclusões, datado de Novembro de 1996.

95. As percentagens de participação em cada um dos projectos foram fixadas em:

i. 32% para o INAG e 68% para a EDP no Sistema Mondego (Aguieira- Raiva/Fronhas);
ii. 52,5% para o INAG e 47,5% para a EDP no Aproveitamento de Fins Múltiplos do Alqueva;
iii. 23,3% para o INAG e 76,7% para a EDP relativamente à Navegabilidade do Douro.

96. O relatório elaborado pelo grupo de trabalho e as conclusões aí alcançadas, designadamente as percentagens decorrentes da reavaliação de encargos acima referidas somente foram validadas pelo INAG e pela EDP em 2003, altura em que foi formalizado o “Protocolo entre o INAG e a EDP para a realização do acerto de contas entre a EDP e o Estado relativo aos aproveitamentos de fins múltiplos”.

97. Com excepção dos bens registados na EDP como investimento realizado no Aproveitamento Hidráulico do Alqueva cuja titularidade foi atribuída ao INAG por efeito do protocolo referido, os bens patrimoniais relativos aos investimentos conjuntos, permaneceram, por acordo das partes, na esfera das entidades onde foram inicialmente registados.

98. Face a este protocolo, a EDP Produção procedeu, no exercício de 2004, ao acerto das reintegrações dos bens do activo imobilizado que até então haviam sido considerados como activos não afectos à produção de energia eléctrica, no período compreendido entre a sua entrada em funcionamento até 31 de Dezembro de 2003, aplicando taxas de amortizações e reintegrações que vão de 31,53% a 38,19%.

99. Em face das dúvidas suscitadas pelo protocolo, e da complexidade da operação, que envolvia inúmeros itens de imobilizado, a regularização, quer das amortizações, quer dos subsídios, só foi possível ultimar em 2004, sendo reportada a 1 de Janeiro de 2004.

100. Naquele exercício, o acerto das amortizações não contabilizadas anteriormente, relativamente aos casos em que a percentagem dos encargos imputada à EDP se revelou superior à inicialmente estimada, resultou no custo de 7.307.115,60€.

101. Naquele mesmo exercício foi reconhecido um proveito de 4.586.315,87 €, relativo ao duodécimo das entregas efectuadas à Requerente pelo INAG/Estado no âmbito do empreendimento conjunto, correspondente ao período compreendido entre o início da exploração dos bens e 31 de Dezembro de 2004.

102. Do montante de 4.586.315,87 €, 211.306,48 € respeita ao exercício de 2004 e o remanescente, no valor de 4.375.009,39 €, ao valor do subsídio que deveria ter sido reconhecido desde o início da exploração dos bens até 31 de Dezembro de 2003.

103. Nesta última situação, o montante de 4.586.315,86 € foi reclassificado como subsídio ao investimento, transferido para a rubrica contabilística n.º 76800970000, designada por “Subsídios ao Investimento” e reconhecida como proveito à luz do disposto no artigo 22º do Código do IRC (“subsídios ou subvenções não destinados à exploração”).

104. A dedutibilidade fiscal deste acerto de amortizações, no valor de 7.307.115,60€, foi integralmente negada pela AT inclusive na parte do acerto respeitante aos bens relativamente aos quais foi reconhecido, em 2004, o proveito acima referido.

105. O custo de aquisição reavaliado dos bens que geram o acerto de amortizações em discussão, ascende a 18.167.861,46 €, sendo que o valor de aquisição dos bens associados ao processo INAG ascende a 15.577.761,51 €.

106. O valor da amortização acumulada dos bens em causa ascende a 9.158.536,83€.

107. O valor total das comparticipações associadas aos mesmos bens (excluindo os bens originários da ……….. e da …………., os quais, não apresentam quaisquer comparticipações associadas) é de 8.931.521,10€.


3. No acórdão fundamento proferido pelo TCAS no proc. nº 04403/10, constam como provados os seguintes factos:

A. No âmbito de uma acção de fiscalização efectuada à sociedade anónima "…………….., S.A." foram efectuadas correcções ao lucro tributável do exercício de 2006, e procedeu-se a liquidação adicional de IRC para aquele ano, com o nº (…), tendo-se apurado um reembolso de imposto no valor de € 1.720.287,77, o qual compreende a sujeição a tributação autónoma e juros compensatórios. – cfr "Prints informáticos" de fls 671 e 672, do P. A. apenso aos autos.

B. A liquidação mencionada supra resultou das correcções constantes das "conclusões do relatório" e encontram-se fundamentadas no Relatório elaborado pelos serviços de inspecção, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido e do qual consta, designadamente, que foram efectuadas correcções ao lucro tributável no montante de €159.828,64 dos quais:

III 1.1.1.... Relativamente à parcela de € 132.917,15, face aos documentos de suporte (facturas da casa mãe) relativa ao fornecimento de peças e equipamentos de veículos automóveis datados do 3º trimestre de 2005, face aos lançamentos contabilísticos do Anexo I, débitos em conta e pagamento das respectivas facturas, não foi respeitado o princípio da especialização dos exercícios não sendo os custos imprevisíveis ou desconhecidos no exercício sobre análise.

III 1.1.3 Custos Não aceites fiscalmente...

Rendas de imóveis para habitação..." estes custos não são aceites fiscalmente, por não serem comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto...

III 1.2 Correcções ao cálculo do imposto- Tributação Autónoma

III 1.2.2 Encargos com viaturas ligeiras de passageiros

"O s.p. procedeu à contabilização de diversos encargos relativo a bens de consumo corrente de peças de carro de competição... tendo tributado autonomamente as despesas relativas a todas as viaturas ligeiras incluindo a amortização relacionada com a viatura de competição... da análise das facturas não se estabeleceu qualquer conexão entre estes custos e a viatura de competição (não existe menção às viaturas de competição própria ou alheia - ponto IX direito de Audição)... atento os valores de despesas de conservação e reparação da frota de viaturas em comparação com as despesas de viatura de competição., conclui-se que nesta última estão registados encargos com outras viaturas ligeiras que não de competição...sujeitas a tributação autónoma..." - cfr Relatório da I.T. de fls 682 a 749, do P.A. apenso aos autos.

C. Dá-se aqui por reproduzidas as facturas emitidas pela sociedade mãe, enquanto fornecedora de peças de viaturas automóveis, de fls 97 a 669, dos autos.».

D. A recorrente vinculou-se com a casa mãe “…………….” (com sede em França) e com os colaboradores por esta enviados, a fim de lhe ser prestado apoio técnico no âmbito da actividade que desenvolve. (Doc. fls 834-856 dos autos).

E. Consta em cada uma das facturas a que alude a al.c) do probatório a seguinte menção: «………………. avisa a sua amável clientela sobre o facto de as peças destinadas à adaptação ou à preparação para a competição de veículos da marca P. apresentarem características tais que tornam interdita a circulação dos veículos que as equipem em estradas abertas à circulação pública na medida em que modificam significativamente as características descritas nos livretes sobre o ruido, poluição, velocidade máxima, dimensão dos pneumáticos, etc,». (Doc.s fls 97 a 669 dos autos).


4. No acórdão fundamento proferido pelo STA no proc. nº 0658/11, constam como provados os seguintes factos:

A. A Administração Tributária efectuou uma acção inspectiva externa, à impugnante “A…, LDA”, com o NIPC …, e sede na Av. .., …, r/ch, Nazaré, credenciada pela Ordem de Serviço nº … de 24/09/2007, inspecção que teve início em 23/10/2007 e conclusão em 28/03/2008, com origem no “PNAIT - 221.04 - P. Col. - Critério de Selecção de Nível Central, inspecção essa que, proveio de uma acção promovida pela Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspecção Tributária (DSPCIT) dirigida a Sujeitos Passivos de IVA em Situação de Reporte de Crédito de IVA em períodos sucessivos em 2005 e em que o valor calculado do reporte em Dezembro de 2005 era superior a € 100.000,00;

B. A inspecção referida supra, em “A”, inicialmente teve âmbito apenas sobre o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) em 2005; e, no decorrer da mesma por ter sido entendido haver irregularidades quanto a custos considerados em IRC nos exercícios de 2004, 2005 e 2006, no dia 06/03/2008, foi comunicado à impugnante a alteração do âmbito da acção de inspecção, passando a incluir os seguintes impostos e períodos: «PNAIT- 221.39 — P. Col. — Diversos (Determinados Por Despacho do DF); IRC — 2004, 2005 e 2006», cfr. fls. 5 do relatório, no PA anexo, cujos teores dou por reproduzidos;

C. A impugnante “A…, Lda” é uma sociedade por quotas que exerce a actividade de Hotéis com Restaurante, enquadrando-se no CAE 55111; e está sujeita ao regime de contabilidade organizada, cfr. com o Plano Oficial de Contabilidade;

D. A impugnante “A…, Lda” possui diversos estabelecimentos em diferentes locais da vila da Nazaré, nomeadamente: o “Hotel B……”, estabelecimento hoteleiro de 4 estrelas, sito na Av. …, nº …; a “Residencial C…” com restaurante, sita na … nº …; e uma …., sita na Av..., cfr. fls. 5, do anexo;

E. Em sede do enquadramento fiscal, a “A…, Lda” encontra-se no regime geral do IRC e no que respeita ao IVA a encontra-se no Regime de Tributação Normal Mensal; encontrando-se a entregar com periodicidade normal as suas declarações de IVA, as Declarações Modelo 22 de IRC e respectivas Declarações Anuais;

F. A impugnante (e mandatário) foi notificada do projecto do relatório da supra referida inspecção, em 04/04/2008, cfr. cartas de 03/04/2008 e registos do CTT, juntos a fls. 31/ss, do PA anexo;

G. Por carta datada de 16/04/008, a impugnante exerceu o direito de audição, cfr. carta e peça processual de fls. 35 e 36 a 58, do Anexo, cujos teores dou por reproduzidos, peça processual de que a p.i. de fls. 1/ss constitui reprodução adaptada, da qual peça se destaca a arguição anterior ao capítulo conclusivo (fls. 16 da mesma): «Importando, ainda referir que os montantes das compras na praça para os exercícios de 2004, 2005 e 2006 foram de 85.586.50 €, 79.679.00€ e 89.478.00 €, respectivamente, e não de 85.592.45 €, 79.762.27 € e 89.569.56 € e bem assim as despesas na praça para os mesmos exercícios que foram de 23.370.52 €, 23.650.00 € e 28.865.00 € ao invés de 23.414.08 €, 23.990.08 € e 29.438.93 €»; e ainda na pág. 1: «A ora requerente limita o seu direito de audição as questões que expressamente identifica»;

H. Dou por reproduzido o documento de fls. 57vº e 59, do PA anexo, junto pela impugnante, com a designação de «Valor Imobilizado Valor a Regularizar» do qual se destaca o seguinte: «Amortizações 2004 (...) 47.648.35 € (...) Amortizações 2005 (...) 34.115,09 € (...) Amortizações 2006 (...) 116.759,76 € (...)»;

I. Dou por reproduzido o chamado “documento interno” com a designação de «HOTEL B… — Aquisições na Praça», referindo-se a Carnes (Compras), Ovos, Peixes, Frutas, Hortaliças, Mariscos, Flores (Despesas) e datado de «3/6/05», junto a fls. 61 do PA anexo;

J. Dou por reproduzido o documento de fls. 62 do PA anexo, com a designação de «ALVARÁ DE LICENÇA DE UTILIZAÇÃO TURÍSTICA - LICENCIAMENTO DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS - LICENÇA DE UTILIZAÇÃO Nº 62/07» com data de «Paços do Município, 22 de Junho de 2007», do qual se destaca o seguinte «LICENCIAMENTO DE OBRAS DE AMPLIAÇÃO Nº 142/01, de 24/07/01 - LICENCIAMENTO DE OBRAS DE ALTERAÇÃO Nº 52/07, de 19/04/07 (...) TITULAR DA LICENÇA: A……, LDA (...) NOME DO EMPREENDIMENTO: HOTEL B ... (...) Data do despacho de licenciamento: 21 de Junho de 2007 (...)»;

K. Dou por reproduzidos os documentos de fls. 63/ss do PA anexo, que consistem em «Extractos de Conta (...) OUTRAS COMPRAS (REI/REPR)», balancete razão, «Balancete Analítico» e «Mapa de Reintegrações e Amortizações»;

L. Nos exercícios de 2004, 2005 e 2006, a “A…, Lda” contabilizou, mediante “documentos internos”, valores neles constantes, correspondentes a compras que efectuou na “Praça” da Nazaré, também designada “mercado”, designadamente ovos, carne, peixe, iogurtes, hortaliças, flores, cujos documentos não identificam os seus fornecedores, cfr. relatório;

M. No exercício de 2005, a impugnante contabilizou valores de água e electricidade em cujos documentos a mesma “A…, Lda” não figura como adquirente dos respectivos consumos os quais se referem à Estrada Nacional …, Rua …, nº … e à Avenida …., na Nazaré, cfr. relatório;

N. No exercício de 2005, a “A…, Lda” contabilizou, com “documentos internos” que incluíam talões de compras que efectuou, designadamente em supermercados, e cujos talões não identificam o adquirente dos produtos em causa;

O. No exercício de 2005, a impugnante a “A…, Lda” contabilizou um recibo referente a seguro de incêndio de um estabelecimento comercial sito em S. Martinho do Porto, em nome de “D…”;

P. No exercício de 2005, a “A…, Lda” contabilizou um estorno de seguro na conta de custos;

Q. No exercício de 2005, a supra citada Inspecção verificou divergências entre os “documentos internos” (manuscritos) contabilizados e as cópias dos originais exibidos, respeitantes a vendas e serviços prestados;

R. Nos exercícios de 2004, 2005 e 2006, a “A…, Lda” contabilizou a amortização relativa a toda a empreitada, que efectuou, de ampliação do “Hotel B…” e não partes concretas deste;

S. A impugnante não evidenciou na sua contabilidade quais os critérios ou factores de ponderação que utilizou naquelas amortizações;

T. A licença de utilização turística do Hotel B…, supra referenciada, foi emitida em 21/06/2007; e antes dessa licença de utilização a impugnante utilizou espaços que foram sendo concluídos na sequência das obras do referido estabelecimento;

U. Dou por reproduzidas as demonstrações de liquidação de IRC de fls. 39 e 40;

V. Do relatório, já dado por reproduzido supra, destacam-se agora os Pontos III (especialmente sobre o IRC, fls. 13/ss, mas que também se relaciona com o IVA, fls. 6/ss, do PA Anexo), e o ponto IX, fls. 19 a 24 do mesmo, sobre o direito de audição e resposta ao mesmo, pela AF.

W. A presente impugnação deu entrada em juízo em 25/11/2008, cfr. carimbo de fls. 2.

5. Face ao disposto no artigo 25º do Dec. Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, a decisão proferida na sequência de pedido de pronúncia arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (nº 2), sendo aplicável a tal recurso, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do CPTA (nº 3).

Razão por que importa, desde logo, apreciar se existe contradição entre o acórdão arbitral recorrido e os acórdãos fundamento quanto às quatro questões fundamentais de direito que a Recorrente coloca e que se traduzem no seguinte:

1ª questão: saber se, face à desconsideração pela Administração Tributária de parte dos custos relevados com realizações de utilidade social da EDP Distribuição e da EDP Produção, deve tal correcção ser considerada ilegal, na medida em que podem ser consideradas despesas com pessoal todas as despesas que, tendo natureza genérica de remunerações, são objecto de descontos obrigatórios para a Segurança Social – questão cuja solução jurídica estará em oposição com a adoptada no acórdão do TCAS de 18/06/2015, no proc. nº 07526/14;

2ª questão: saber se a desconsideração, pela Administração Tributária, de um custo fiscal inscrito e pago no exercício de 2004, resultante de uma alegada distribuição de resultados a trabalhadores deliberada em exercício anterior, é ilegal, por tal não ofender o princípio da especialização dos exercícios – questão cuja solução jurídica estará em oposição com a adoptada no acórdão do TCAS de 3/03/16, no proc. nº 04403/10;

3ª questão: saber se, face à desconsideração pela Administração Tributária de um custo fiscal suportado pela EDP Distribuição e respeitante ao pagamento de serviços de cuidados de saúde prestados pela ………….. aos pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães, deve tal custo ser considerado como comprovado apesar da inexistência de documento externo que titule o objecto da operação em nome do adquirente, sujeito passivo que pretende deduzir o custo - questão cuja solução jurídica estará em oposição com a adoptada no acórdão do STA de 5/07/2012, no proc. nº 00658/11;

4ª questão: saber se, face à desconsideração pela Administração Tributária de custo fiscal de amortizações deduzidas em 2004 mas respeitantes a anos anteriores, deve tal custo ser admitido à luz dos princípios da justiça e da tributação pelo rendimento real - questão cuja solução jurídica estará em oposição com a adoptada no acórdão do STA de 5/07/2012, no proc. nº 00658/11.

Como é consabido, para apurar a existência de oposição é exigível que (i) se trate do mesmo fundamento de direito, (ii) que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica, e que (iii) se tenha perfilhado solução oposta nos arestos em confronto, o que, como óbvio, pressupõe a identidade de situações de facto, já que sem ela não tem sentido a discussão dos referidos pressupostos.

Daí que este tipo de recurso tenha por pressuposto necessário uma identidade dos factos subjacentes (que terão de ser essencialmente os mesmos do ponto de vista do seu significado jurídico) e uma identidade do regime jurídico aplicado, já que sem essa identidade não será possível vislumbrar a emissão de proposições jurídicas opostas que careça de uniformização jurisprudencial.

Vejamos, então, se, no caso, ocorrem os enunciados requisitos legais.

Quanto à 1ª questão

No que toca à 1ª enunciada questão, constata-se que o acórdão fundamento (proferido pelo TCAS em 18/06/2015, no proc. nº 07526/14) não transitou em julgado, como a própria Recorrente veio reconhecer depois de interpelada para o efeito – cfr. despacho da Relatora a fls. 346 e comunicação da Recorrente a fls. 351 dos autos.

Ora, tal como tem sido frisado pelo Pleno desta Secção, designadamente nos acórdãos de 3/07/2013, no proc. nº 01136/12 e de 26/02/2014, no proc. nº 01470/13, o recurso destinado a prevenir ou a solucionar conflitos de jurisprudência, como é o caso, não pode ser admitido se o acórdão invocado como fundamento não transitou em julgado. É que não pode pretender-se uniformizar jurisprudência tendo como parâmetro uma decisão ainda não definitiva e que pode nunca vir a sê-lo. «É, pois, pressuposto formal essencial do recurso previsto no art. 25º do RJAT, tal como acontece com o recurso para fixação de jurisprudência, o trânsito em julgado do acórdão fundamento.».

Não tendo transitado em julgado o citado acórdão fundamento, falece um dos pressupostos formais essenciais para o conhecimento do recurso nessa estrita parte.

Razão por que não se conhecerá da aludida questão.

Quanto à 2ª questão

Como se viu, trata-se de questão relacionada com a desconsideração de custo fiscal contabilizado e pago no exercício de 2004, decorrente de uma alegada distribuição de resultados a trabalhadores (que o acórdão arbitral qualificou como gratificações), deliberada em exercício anterior; questão cuja solução jurídica estaria, na óptica da Recorrente, em oposição com a adoptada no acórdão do TCAS de 3/03/16, no proc. nº 04403/10.

Como referido no acórdão arbitral, da situação fáctica nele fixada resulta que «a Requerente e uma sua participada, no ano de 2003, decidiram atribuir aos seus trabalhadores, a título de gratificação pelos resultados de 2002, determinados montantes que inscreveu como variação patrimonial negativa deste último ano. Subsequentemente, não tendo, durante o ano de 2003, pago na íntegra os valores que haviam decidido atribuir aos seus trabalhadores, os sujeitos passivos aplicaram o disposto, à data, no nº 5 do artigo 24.º do CIRC, e liquidaram o IRC que havia deixado de ser liquidado, por força da dedução ao lucro tributável dos montantes não pagos (…). Por fim, tendo acabado por pagar aos seus trabalhadores os montantes em falta no ano de 2004, inscreveram-nos nesse ano, enquanto variações patrimoniais negativas, concorrentes, negativamente, para a formação do lucro tributável.».

Neste contexto, decidiu-se que «ao terem sido anuladas no exercício de 2003 as gratificações pagas no exercício de 2004, deixaram tais gratificações de ter a natureza de participação nos resultados de 2002, na medida em que os resultados deste ano foram repostos pela correcção operada em 2003.». (…)». «Deste modo, por conta dos resultados de 2002 da Requerente e sua participada apenas foram distribuídos os montantes efectivamente pagos em 2003, já que os montantes que não o foram, por força da operação então prescrita pelo nº 5 do artigo 24.º do CIRC, deixaram de afectar os resultados de 2002 e, consequentemente, de serem atribuídos por conta dos mesmos.
Por outro lado, os sujeitos passivos não estão proibidos de, pelas razões empresariais que lhes são próprias, conceder gratificações a quem, no âmbito das respectivas decisões de gestão, considerem adequado, desde que cumpram os pressupostos genéricos do artigo 23.º do CIRC. (…) // Por outro lado, não deixa de ser evidente e notório que, num caso como o presente, a atribuição de gratificações aos trabalhadores tem uma finalidade motivacional e, como tal, empresarial.
Não obsta, por fim, ao que vem de se dizer, o princípio da especialização de exercícios, consubstanciado no artigo 18.º do CIRC, e independentemente se estar, ou não, aflorado no artigo 24.º do mesmo Código. Com efeito, nada nos autos permite afirmar que na esfera jurídica da Requerente e da sua participada nasceu uma obrigação de pagamento aos seus trabalhadores no ano de 2002. É que, à falta de elementos noutro sentido, a deliberação de gratificação por conta dos resultados de 2002, mais não será que uma promessa de doação. (…)».

Já no acórdão fundamento, os custos objecto de correcção pela Administração Tributária (relativos ao exercício de 2006) diziam respeito a doze facturas relativas ao fornecimento de peças e equipamentos de veículos automóveis, todas datadas do 3º trimestre do exercício de 2005 e nesse mesmo exercício pagas, invocando a Recorrente que, apesar de emitidas e pagas em 2005, tais facturas não haviam sido, até ao final desse exercício, conferidas e reconhecidas para efeitos definição do seu montante, pelo que, na sua óptica, este podia ser, como foi, contabilizado como custo do exercício seguinte, dada a imprevisibilidade e desconhecimento do montante do encargo.

Foi neste concreto e específico contexto factual que se decidiu pela violação do princípio da especialização de exercícios, consubstanciado no art.º 18º do CIRC, porquanto «a recorrente não logrou fazer a prova, que lhe competia, de que, na data de encerramento das contas do exercício de 2005 (a que tais custos deveriam ser imputados), eles eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos. Daí que não seja legalmente possível a sua imputação ao exercício de 2006, por não se enquadrarem na regra excepcional prevenida no nº 2 do artigo 18º do CIRC.».

Donde resulta, de forma clara, que as situações fácticas subjacentes a estes dois arestos nada têm de idêntico. Com efeito, enquanto no acórdão arbitral recorrido se encontravam em equação custos com gratificações pagas aos trabalhadores no exercício de 2004 e nesse mesmo exercício deduzidas para efeitos fiscais, as quais não se encontravam reflectidas em quaisquer facturas de anos anteriores, já no acórdão fundamento o contribuinte deduzira em 2006 custos com facturas emitidas em 2005 e que neste mesmo exercício haviam sido pagas.

Por conseguinte, a diversidade das soluções jurídicas encontrada nos arestos em confronto não resulta de entendimento inconciliável quanto à mesma questão fundamental de direito, mas, antes, do enfrentamento de realidades fácticas distintas.

Não há, pois, oposição susceptível de ser dirimida mediante recurso para uniformização de jurisprudência.

Quanto à 3ª questão

Relativamente à terceira invocada questão, relacionada com a desconsideração como custo fiscal de encargo suportado pela EDP Distribuição com o pagamento de serviços de cuidados de saúde prestados pela ……….. aos pensionistas da Caixa Cristiano Magalhães, é igualmente evidente que não existe qualquer contradição entre o acórdão arbitral e o acórdão proferido pelo STA em 5/07/2012, no proc. nº 0658/11.

Com efeito, na situação subjacente ao acórdão arbitral, a EDP Distribuição deduziu um custo documentado em factura emitida por um terceiro, ou seja, suportado em documento externo, estando, pois, apenas e eventualmente em causa, a insuficiência dos elementos constantes desse documento externo, o qual foi, porém, complementado por outros elementos de prova, a saber, outros documentos externos e prova testemunhal.

Diferentemente, no caso do acórdão fundamento, o contribuinte não juntara qualquer documento externo que permitisse suportar os custos que deduzira, limitando-se a disponibilizar documentos internos por si elaborados e sem que tenha apresentando quaisquer elementos de prova adicionais.

Deste modo, a questão apreciada na decisão recorrida, ou seja, a de saber se um custo comprovado por documento externo (em concreto uma factura que continha erro de identificação, mas cujo conteúdo fora complementado com recurso a outros meios de prova) é susceptível de se ter por documentado e dedutível, é bem distinta da analisada no acórdão fundamento, no qual se analisou a questão de saber se encargos suportados por meros documentos internos insuficientes e sem que tenham sido apresentados outros elementos de prova, podem ser considerados documentados.

Este distinto quadro factual justifica que a posição de direito assumida no acórdão recorrido e a assumida no acórdão fundamento não se mostrem contrárias, sendo até coincidentes. E tanto assim é que este acórdão do STA foi citado na decisão arbitral para alicerçar a posição nele assumida quanto à necessidade de documentação dos custos.

Razão por que, também relativamente a esta questão, não se mostram preenchidos os requisitos para que se considere existir oposição entre os arestos em confronto sobre a mesma questão fundamental de direito, o que obsta a que a mesma seja dirimida mediante recurso para uniformização de jurisprudência

Quanto à 4ª questão

No que respeita à quarta questão, constata-se que a posição adoptada no acórdão arbitral recorrido quanto à possibilidade de deduzir em 2004 amortizações de anos anteriores (perante o princípio da especialização de exercícios e os princípios da justiça e da tributação pelo lucro real) mostra-se consentânea com a adoptada no acórdão fundamento (proferido pelo STA em 5/07/2012, no proc. nº 0658/11), inexistindo qualquer antagonismo.

Com efeito, no acórdão fundamento, o contribuinte, em violação do disposto no art.º 28º, nº 3, do CIRC e no art.º 1º do Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, e, como tal, do princípio da especialização dos exercícios que justifica tais normas, contabilizou a amortização relativa a toda uma empreitada no período de três exercícios, sem distinção das partes concretas da empreitada que foram amortizadas, e sem evidenciar os critérios ou factores de ponderação que utilizou nas amortizações. Razão por, que nesse acórdão, se conclui que «o interesse público da prevenção e combate da evasão fiscal, subjacente à prevenção da manipulação do princípio da especialização dos exercícios, deve prevalecer sobre os princípios da justiça e da tributação pelo rendimento real».

Já no acórdão arbitral julgou-se que a consideração, no exercício de 2004, de amortizações respeitantes a anos anteriores se ficou a dever ao facto de estar em causa uma situação factual complexa, que determinou que apenas nesse exercício tivesse sido possível considerar a amortização, por só aí terem ficados esclarecidos os termos da repartição entre a EDP Produção e o Estado, não havendo qualquer risco ou indício de aplicação de um qualquer plano alternativo e à margem da lei no que toca às regras de amortização e reintegração.

Isto é, julgou-se que, perante a realidade fáctica fixada, inexistia qualquer suspeita de que, em concreto, se pretendesse diferir no tempo os lucros, fraccionar os lucros, distribuindo-os por exercícios diferentes com o objectivo de evitar, num imposto de taxas progressivas, a tributação por taxas mais elevadas, ou qualquer suspeita de que se pretendesse concentrar o lucro em exercício onde pudessem efectivar-se deduções mais avultadas, razão por que se impunha concluir, na esteira da posição sufragada no acórdão fundamento, que «o interesse público da prevenção e combate da evasão fiscal não é afectado pela violação das normas relativas ao regime das amortizações», pelo que «não deverão as normas do regime em apreço, enquanto expressão do princípio da especialização de exercícios, prevalecer sobre os princípios da justiça e da tributação pelo rendimento real».

Foi, portanto, e tão-somente, a circunstância de a realidade factual ser muito distinta que permitiu alcançar, no acórdão recorrido, uma solução jurídica diversa da adoptada no acórdão fundamento.

Pelo exposto, não se verificam os requisitos do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art.º 152º do CPTA, dada a inexistência de contradição de julgados sobre a mesma questão fundamental de direito entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, o que obsta ao conhecimento do presente recurso.

5. Termos em que acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do presente recurso.

Custas pela recorrente, com a requerida dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo impulso processual, à luz do disposto no nº 7 do art.º 6º do RCP, atento o seu elevadíssimo montante perante o valor do recurso (6.012.903,81 €) e a menor complexidade da causa face à decisão adoptada.


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Comunique-se ao CAAD.


Lisboa, 20 de Dezembro de 2017. – Dulce Manuel da Conceição Neto (relatora) – José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Pedro Manuel Dias Delgado – Ana Paula da Fonseca Lobo - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Isabel Cristina Mota Marques da Silva - António José Pimpão – Joaquim Casimiro Gonçalves.