Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0776/21.1BELSB
Data do Acordão:05/05/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
EXCLUSÃO DE PROPOSTAS
Sumário:Não é de admitir a revista se a questão suscitada desmerece tanto por não se divisar a necessidade de uma melhor aplicação do direito, como por, face aos contornos particulares do caso concreto, ela não ter vocação «universalista».
Nº Convencional:JSTA000P29380
Nº do Documento:SA1202205050776/21
Data de Entrada:04/26/2022
Recorrente:A........, S.A.
Recorrido 1:CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL, E.P.E.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. A…………, S.A. - autora desta «acção do contencioso pré-contratual» - vem, invocando o artigo 150º do CPTA, pedir revista do acórdão do TCAS de 17.02.2022, que negou provimento à apelação que interpôs da sentença do TAC de Lisboa - de 28.09.2021 - e, por isso mesmo, manteve o «julgamento de improcedência» do seu pedido de anulação da adjudicação dos lotes 2 [Hospital dos Capuchos] e 5 [Hospital Curry Cabral] à contra-interessada B…….., determinada pelo CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DE LISBOA CENTRAL, E.P.E. - no âmbito do concurso público nº1-0-0005/2021, para «celebração de contrato de prestação de serviço de limpezas às instalações do CHULC durante o período de Abril a Dezembro de 2021», sendo que fora impugnada, também, a adjudicação dos lotes 1, 3, 4 e 6.

Alega que o «recurso de revista» deve ser admitido em nome da «necessidade de uma melhor aplicação do direito» e em nome da «relevância jurídica e social da questão».

Não foram apresentadas contra-alegações.

2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

3. O tribunal de apelação - TCAS - manteve a decisão da 1ª instância na parte em que a mesma fora objecto do recurso jurisdicional, ou seja, relativamente ao julgamento de improcedência do pedido de «declaração de nulidade ou anulação» da deliberação pela qual o Conselho de Administração da entidade demandada - CHULC - adjudicara os lotes 2 [Hospital dos Capuchos] e 5 [Hospital Curry Cabral] à contra-interessada B………., e proferida no âmbito de concurso público para celebração de contrato de prestação de serviços de limpezas às instalações do CHULC durante o período de Abril a Dezembro de 2021.

Para tal, o tribunal de apelação negou provimento ao recurso por julgar improcedentes os dois erros de julgamento apontados à sentença da 1ª instância - TAC de Lisboa - isto é, o erro de julgamento acerca da alegada violação do artigo 6º, nº1, alínea e), subalínea b), do Programa do Procedimento, e o erro de julgamento sobre a invocada «causa de exclusão da proposta da B…….. com base no disposto no artigo 70º, nº2, alínea b), do CCP - aplicável ex vi artigo 146º, nº2, alínea o), do mesmo código.

Neste último julgamento estava em causa saber da «relevância excludente ou não» da proposta da B…………. - com base no disposto no artigo 70º, nº2 alínea b), ex vi 146º, nº2 alínea o), ambos do CCP - pelo facto de ser integrada por um documento onde as exigidas «cores dos panos de limpeza» eram cumpridas, e outro em que o mesmo não acontecia, sendo que essa distribuição de cores, conforme as áreas de limpeza, surgia como condição a cumprir na execução do dito contrato de prestação de serviços de limpeza - de acordo com o Anexo IV do caderno de encargos, nas áreas administrativas deve ser utilizado o pano de cor azul, sendo o pano de cor verde apenas susceptível de ser utilizado em copas e refeitórios.

As instâncias - mormente acórdão recorrido - entenderam que a referência feita no documento discordante à utilização de panos de cor verde em áreas administrativas e comuns era meramente acidental, não exprimindo a real vinculação da concorrente, até porque ela aceitou, sem reservas, o conteúdo do caderno de encargos, obrigando-se a executar o contrato de harmonia com as condições nele previstas. Salientaram que cláusula 2ª do caderno de encargos determina que o contrato é conformado pelo que nele se prevê e pela proposta adjudicada, prevalecendo aquele sobre esta, em caso de divergência, e que, tudo bem visto, o teor da proposta não denota que a contra-interessada B……… utilizará, na fase de execução do contrato, panos de cores diferentes das previstas no código de cores definido no caderno de encargos para as diferentes zonas de limpeza. E, nesta base, fazendo apelo ao princípio do favor participationis, sucumbiu o invocado erro de julgamento.

A A………..- autora e apelante - não se conforma apenas com essa última decisão, e dela pede revista, alegando que o acórdão recorrido ao manter o decidido pela 1ª instância errou no seu julgamento de direito na medida em que o «princípio da legalidade» - aqui consubstanciado no estrito cumprimento do disposto no artigo 70º, nº2 alínea b), ex vi 146º, nº2 alínea o), do CCP - e bem assim os «princípios da igualdade, concorrência e transparência» impunham uma decisão diversa.

Compulsados os autos, importa apreciar «preliminar e sumariamente», como compete a esta Formação, se estão verificados os «pressupostos» de admissibilidade do recurso de revista - referidos no citado artigo 150º do CPTA - ou seja, se está em causa uma questão que «pela sua relevância jurídica ou social» assume «importância fundamental», ou se a sua apreciação por este Supremo Tribunal é «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Ora, cumprirá ressaltar, e à cabeça, que as duas instâncias foram unânimes em «julgar improcedente» o referido vício - 1ª instância - e o erro de julgamento sobre o mesmo - 2ª instância - assentando essas decisões num lógico e bem estruturado arrazoado de direito, com uma aceitável interpretação e aplicação das normas jurídicas, chamadas a intervir, e o apelo - face a dúvidas remanescentes - ao princípio jurídico do favor participationis. Por isso, e no âmbito da apreciação que nos é pedida, entendemos que a admissão desta revista não se impõe em nome da clara necessidade de melhor aplicação do direito.

Além disso, a questão que a recorrente continua a litigar não se mostra complexa, e no presente caso perfila-se com contornos factuais que não serão facilmente repetíveis, o que arreda, também, a relevância jurídica e/ou social da questão como justificativa da admissão da revista, pois não se lhe divisa uma importância fundamental.

Admitir este recurso de revista seria abrir uma 3ª instância, o que não é permitido pela lei.

Importa, pois, manter a regra da excepcionalidade dos recursos de revista, e recusar a admissão do aqui interposto pela A………….., S.A..

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em não admitir a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 5 de Maio de 2022. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Carlos Carvalho.