Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0273/14
Data do Acordão:04/21/2016
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:VÍTOR GOMES
Descritores:MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
PROCURADOR DA REPÚBLICA
CLASSIFICAÇÃO DE SERVIÇO
MAGISTRADO COORDENADOR
CURSO DE FORMAÇÃO
Sumário:A última classificação de serviço exigida pela al. b) do n.º 2 do art.º 99.º da LOSJ como requisito de nomeação para o cargo de magistrado do Ministério Público coordenador na comarca e, concordantemente, estabelecida no aviso do concurso para frequência do curso a que se refere o art.º 102º da LOSJ, é aquela que respeite ao serviço prestado na categoria de procurador da República.
Nº Convencional:JSTA00069668
Nº do Documento:SAP201604210273
Data de Entrada:07/01/2015
Recorrente:CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A.......
Votação:MAIORIA COM 3 VOT VENC
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:AC STA DE 2015/04/22
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR ADM GER - FUNÇÃO PUBL ESTATUTÁRIO.
Legislação Nacional:LOSJ ART99 ART102 ART92 ART101.
EMP ART112 ART122 ART117 ART116 ART63 ART65.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO
1.1. A……….., Procurador da República, intentou ação administrativa especial contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO [CSMP], pedindo que: (i) fosse declarada nula, ou apenas anulada, a deliberação do Plenário desse Conselho, datada de 03.12.2013, que indeferindo a reclamação por si apresentada, manteve a sua exclusão da lista dos concorrentes selecionados ao curso de formação para o cargo de Coordenador do Ministério Público aberto por aviso n.º 11642/2013 [publicado no DR II Série, n.º 179, de 17.09.2013] e (ii) a condenado aquele CSMP a “praticar o ato de admissão do autor ao curso de formação”.

1.2. Pelo acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 22.04.2015, a ação foi julgada procedente e condenado “o CSMP no pedido” [cfr. fls. 87/95].

1.3. O CSMP veio interpor recurso desse acórdão para o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, oferecendo alegações que culminaram com o seguinte quadro conclusivo [cfr. fls. 105 e segs.]:

1.ª O douto acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento por incorreta interpretação da norma do artigo 99.º, n.º 2, al. b) da LOSJ e por condenação à prática do ato devido em desconformidade com o disposto nos artigos 3.º e 71.º do CPTA;
2.ª Contrariamente ao entendimento adotado no douto acórdão recorrido, a norma do artigo 99.º n.º 2, al. b) da LOSJ deve ser interpretada no sentido de que, ao exigir que os procuradores da República tenham a última classificação de serviço de Muito bom, reporta-se à classificação na categoria;
3.ª A relevância da classificação de serviço na categoria anterior prevista no artigo 4.º alínea f) do RMMMP, segundo o qual «não havendo classificação de serviço atende-se, nos pedidos de transferência, à classificação anterior ainda que em categoria hierárquica inferior...», apenas tem aplicação para efeitos de pedido de transferência, e não para quaisquer outros efeitos estatutários;
4.ª E também não é por via LOSJ que se pode considerar, para efeitos de escolha de procuradores da República para o cargo de coordenador das novas comarcas, que é de atender à última classificação na categoria anterior de procurador-adjunto, desde logo porque o EMP é lei especial em relação à LOSJ e a lei geral não revoga a lei especial, sendo certo que não resulta, nem expressa, nem inequivocamente da LOSJ que o legislador pretendesse revogar as normas do EMP, ou fazer prevalecer sobre estas as normas da LOSJ em matéria de classificação do mérito profissional;
5.ª De qualquer modo, o sentido da lei mais consentâneo conduz à interpretação adotada pelo CSMP, no sentido de que se exige a classificação de Muito Bom na categoria de procurador da República, para acesso ao cargo de magistrado coordenador das novas comarcas, desde logo porque é manifesta a preocupação do legislador em que o magistrado do Ministério Público coordenador da comarca seja escolhido de entre os magistrados melhor habilitados;
6.ª Ao que acresce que esta interpretação colhe apoio na diferente terminologia utilizada pelo legislador relativamente a procuradores-gerais adjuntos na alínea a) do n.º 2 do artigo 99.º da LOSJ, onde se exige classificação de Muito bom em anterior classificação de serviço e na alínea b) relativa a procuradores da República, onde se exige a última classificação de serviço de Muito bom (sublinhados nossos);
7.ª Pois embora por razões bem diferentes - no caso dos procuradores-gerais adjuntos por não estarem sujeitos a classificação de serviço e nos casos dos procuradores da República por ainda não terem sido classificados na categoria - acaba por resultar uma situação idêntica de inexistência de classificação de serviço na categoria, e existência de classificação de serviço na categoria anterior;
8.ª E por isso, é mais curial interpretar as duas normas conjugadas no sentido de que o legislador ao dizer para os procuradores-gerais adjuntos que era a «anterior classificação» bem sabia que era na categoria anterior, e se para os procuradores da República disse, de outro modo, que era a «última classificação», foi porque estava a referir-se à classificação na categoria;
9.ª O argumento da existência de atrasos nas inspeções não resolve para efeitos de interpretação da lei, porque sempre ficaria por resolver o caso dos procuradores da República promovidos há menos de quatro anos, pois neste caso não têm classificação na categoria nem existe o incumprimento da periodicidade quadrienal das inspeções;
10.ª Assim, a norma do artigo 99.º n.º 2, al. b) da LOSJ deve ser interpretada no sentido de que a exigência de que os procuradores da República tenham a classificação de Muito Bom é na própria categoria e não na categoria anterior;
11.ª Sem prejuízo, e sem conceder, mesmo tendo o Tribunal considerado que a lei deve ser interpretada no sentido de permitir aos procuradores da República sem classificação na categoria mas com ultima classificação de Muito Bom como procuradores adjuntos que frequentem o curso, a condenação à prática do ato devido não poderia ir além de impor ao CSMP a aceitação dessas candidaturas, não estando nos poderes do Tribunal impor ao CSMP que selecionasse o Autor de entre os candidatos admitidos ao concurso de seleção;
12.ª Pois, sendo um procedimento de seleção, o Autor mesmo sendo admitido, podia ou não ser selecionado, porque tinha que passar pela triagem dos critérios de seleção estabelecidos na deliberação do CSMP de 2 de outubro de 2013 e publicitados no Aviso do concurso, como é o exemplo do critério definido no ponto 9: «Constituem fatores de preferência para a seleção dos candidatos ao curso, por ordem decrescente, a categoria e a antiguidade na categoria»;
13.ª A nomeação dos magistrados da comarca coordenadores é um ato de gestão de recursos humanos, no exercício de um poder discricionário, que apenas está balizado pela observância dos requisitos estabelecidos no artigo 99.º n.º 2 da LOSJ, entendidos como requisitos mínimos, e a norma não confere o direito a todos os magistrados que possuam os requisitos mínimos aí estabelecidos de frequentarem o curso, pois se assim fosse nem seria preciso nenhum procedimento de seleção;
14.ª E por força do disposto no artigo 71.º n.º 1 do CPTA, neste caso em que o ato devido envolve o exercício de poderes discricionários, mesmo que houvesse de prevalecer a interpretação do artigo 99.º n.º 2, alínea b) da LOSJ adotada no douto acórdão o CSMP deveria aceitar a candidatura do Autor, mas depois podia selecioná-lo ou não, no âmbito da apreciação de todas as candidaturas, com observância dos princípios que devem nortear a atuação da Administração Pública, mas no uso dos seus poderes discricionários e em função do número de candidatos a selecionar;
15.ª Assim, no caso dos autos, a vinculação seria admitir ao concurso de seleção o Autor (bem como todos os demais procuradores da Republica, igualmente com mais de 15 anos de serviço e classificação Muito Bom na categoria anterior) e não selecionar necessariamente o Autor;
16.ª Por isso, ao condenar nos termos pedidos pelo Autor, impondo ao CSMP admissão do Autor ao curso de formação, o Tribunal acabou por se substituir ao CSMP nessa operação de seleção, que se move no domínio da discricionariedade, excedendo os limites decorrentes do princípio da separação de poderes (artigo 3.º do CPTA);
17.ª No douto acórdão recorrido foram violadas as normas dos artigos 99.º n.º 2, alínea b) da LOSJ, 3.º e 71.º do CPTA …”.
Termina pugnando pelo provimento do recurso e, consequente, revogação do acórdão recorrido “mantendo-se o ato administrativo impugnado na ordem jurídica”, ou, caso assim se não entenda, então que seja o mesmo seja “condenado apenas a aceitar a candidatura do A. para passar à fase seguinte do procedimento, de apreciação das candidaturas e seleção dos candidatos”.

1.4. O Autor, aqui recorrido, contra-alegou, formulando o seguinte quadro conclusivo [cfr. fls. 127 e segs.]:

a) deve manter-se anulada a deliberação de 3 de dezembro transato do Conselho Superior do Ministério Público que indeferiu a identificada pretensão do recorrido;
b) deve manter-se a condenação na prática do ato de admissão do recorrido ao curso de formação;
c) o acórdão que constitui o objeto da ação não viola o art. 99.º do LOSJ;
d) o acórdão recorrido de modo nenhum incumpre o princípio de separação de poderes definido nos arts. 3.º e 71.º do CPTA;
d) deverá assim o recurso ser julgado improcedente …”.

1.5. Cumpre apreciar e decidir.

2. DAS QUESTÕES A DECIDIR

O R./Recorrente impugna a decisão judicial recorrida assacando-lhe, em suma, erros de julgamento, por incorreta interpretação das normas legais ínsitas no art. 99.º da Lei n.º 62/2013, de 26.08 [«Lei da Organização do Sistema Judiciário» - LOSJ] [no segmento em que julgou ocorrer a ilegalidade assacada à deliberação impugnada e procedeu o pedido de anulação da mesma] e nos arts. 03.º e 71.º, ambos do CPTA [na parte em que procedeu o pedido de condenação do R. a praticar ato de admissão do A. ao curso em referência] [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. DE FACTO

O acórdão recorrido considerou provados os factos seguintes:

I) O A. é Magistrado do MP, tem mais de 15 anos de serviço nos Tribunais, é Procurador da República desde 2002 e, atualmente, exerce funções na Jurisdição Criminal do Porto.
II) A sua última classificação de serviço foi de “Muito Bom” e foi obtida enquanto Procurador Adjunto.
III) O A. não tem qualquer classificação de serviço enquanto Procurador.
IV) Em 10.09.2013 o «CSMP» deliberou abrir um concurso para seleção de 50 Magistrados que iriam frequentar o curso de formação de Magistrados do MP Coordenadores a que alude o art. 102.º da Lei n.º 62/2013 - vd. fls. 19 destes autos que se considera reproduzida.
V) Tendo o Aviso desse concurso sido publicado na 2.ª Série do DR, de 17.09.2013 - vd. fls. 20 destes autos que se considera reproduzida.
VI) Nele se lê:

2 - Ao referido curso poderão concorrer os magistrados que reúnam as condições previstas no n.º 2 do art. 99.º da mesma lei:
a) Magistrados que exerçam funções efetivas como Procurador-Geral Adjunto e possuam classificação de serviço de Muito Bom em anterior classificação de serviço, ou
b) Magistrados que exerçam funções efetivas como Procurador da República, possuam 15 anos de serviço nos Tribunais e última classificação de serviço de Muito Bom.
3 - Constituem fatores de preferência para seleção dos candidatos ao curso, por ordem decrescente, a categoria e a antiguidade na categoria.
4 - A seleção será realizada pelo CSMP de forma a assegurar o preenchimento do lugar de Magistrado do MP Coordenador em todas as 23 futuras comarcas...”.
VII) O A. apresentou candidatura a esse concurso.
VIII) O «CSMP», apesar do que constava do aviso referido no anterior ponto V), reuniu-se em 02.10.2013, para definir os critérios que iria adotar na seleção dos candidatos ao curso de formação e para o cargo de Coordenadores tendo deliberado - por maioria de 08 contra 02 dos seus membros, com 03 abstenções - que só poderiam frequentar o dito curso e ser nomeados para o cargo de Magistrado Coordenador:
a) Procuradores Gerais Adjuntos que tiveram como última classificação de serviço na categoria de Procurador da República a notação de “Muito Bom”;
b) Procuradores da República, com mais de 15 anos de serviço nos Tribunais e que tenham como última classificação de serviço na categoria de Procurador da República, notação de “Muito Bom - vd. fls. 22 a 28 destes autos que se consideram reproduzidas.
IX) No Plenário do «CSMP» de 15.10.2013 foi aprovada a lista dos Magistrados admitidos ao referido curso de formação, não constando o A. dessa lista - vd. fls. 35 a 45 do processo instrutor que se dão por integradas.
X) Inconformado com a sua exclusão o A. dirigiu, em 18.10.2013, reclamação ao «CSMP» sustentando que reunia os requisitos que lhe permitiam frequentar o mencionado curso de formação visto ser Procurador da República desde 2002, ter mais de 15 anos de serviço nos Tribunais e ter a classificação de “Muito Bom”, e nunca ter sido inspecionado como Procurador - vd. fls. 33 e 34, que consideram reproduzidas.
XI) Reclamação que foi indeferida pelo ato impugnado com o fundamento de que a classificação de “Muito Bom” do A. tinha sido obtida enquanto Procurador Adjunto e que só poderiam ser aceites as candidaturas de Magistrados que obtivessem aquela notação enquanto Procuradores - vd. fls. 35 a 38 destes autos que se consideram integradas.


3.2. DE DIREITO

I. Estipula-se no art. 99.º da «LOSJ», sob a epígrafe de “Magistrado do Ministério Público coordenador”, no que releva, que “[e]m cada comarca existe um magistrado do Ministério Público coordenador que dirige os serviços do Ministério Público” [n.º 1] e que “[o] magistrado do Ministério Público coordenador é nomeado pelo Conselho Superior do Ministério Público, em comissão de serviço por três anos, por escolha de entre magistrados do Ministério Público que cumpram os seguintes requisitos: a) Exerçam funções efetivas como procurador-geral-adjunto e possuam classificação de Muito bom em anterior classificação de serviço; ou b) Exerçam funções efetivas como procurador da República, possuam 15 anos de serviço nos tribunais e última classificação de serviço de Muito bom” [n.º 2], derivando, ainda, do art. 102.º do mesmo diploma que “[o] exercício de funções de magistrado do Ministério Público coordenador implica a aprovação em curso de formação específico”.

II. A questão central do litígio respeita à interpretação a dar à al. b), do n.º 2, do art. 99.º da LOSJ, ou seja, definir se é legal a exigência feita pelo CSMP, como requisito de admissão ao concurso em referência, de que os candidatos procuradores da República tivessem a classificação de serviço de “Muito Bom”, obtida já naquela categoria.

III. O acórdão sob impugnação adoptou entendimento diverso daquele que o CSMP havia acolhido e com base no qual não admitira o Autor à frequência do curso a que se refere o art.º 102.º da LOSJ, considerando que a letra e o espírito do preceito legal, bem como a sua concatenação com o próprio Estatuto do Ministério Público [arts. 109.º e 112.º do «EMP»] não permitem a interpretação que foi adoptada na deliberação impugnada, relevando sempre a última classificação obtida, ainda que o tenha sido na categoria de procurador-adjunto.

IV. Deve começar por afirmar-se que, contrariamente ao que está subjacente ao entendimento seguido pela Secção, a letra da lei não fornece apoio decisivo num ou noutro sentido, sendo prematura a conclusão de que a referência a “última classificação de serviço” aponta decisivamente para a última classificação obtida pelo interessado, independentemente de o ter sido na categoria de procurador ou na categoria de procurador-adjunto. Na verdade, face ao texto do preceito fica apenas a saber-se que a lei exige que essa seja a última classificação que o magistrado tenha obtido, mas na sua literalidade a expressão nada diz acerca da categoria em que essa classificação deva ter sido atingida. Pelo que o sentido do inciso normativo em análise não pode deixar de ser predominantemente determinado pelo influxo que for dado pelos demais elementos de interpretação da lei.

V. O mais que o texto da lei pode dar no sentido do acórdão recorrido é o resultante da interrogação acerca da utilidade do qualificativo “última”. Objectar-se-á que, para designar a classificação de serviço obtida na categoria actual do candidato, esse termo seria desnecessário porque a classificação de serviço estatutariamente relevante é sempre a última, visto que essa desactualiza as anteriores (art.º 112.º do EMP). Porém, esse subsídio interpretativo é bem modesto e rapidamente se desvanece face ao próprio contexto da terminologia do mesmo diploma legal.

VI. Com efeito, deve notar-se que o n.º 2 do art.º 99.º tem redacção simétrica à do n.º 2 do art.º 92.º da mesma LOSJ. A observância do paralelismo de regulação e identidade de redacção dos preceitos é evidente. A base de recrutamento para o cargo de presidente do tribunal de comarca é constituída pelos magistrados judiciais com a categoria de juiz desembargador com “classificação de muito bom em anterior classificação de serviço”, ou com a categoria de juiz de direito com “15 anos de serviço nos tribunais e última classificação de serviço de Muito bom” [grifado agora]. A base de recrutamento para o cargo de magistrado do Ministério Público coordenador de comarca são os magistrados com a categoria de procurador-geral-adjunto com “classificação de muito bom em anterior classificação de serviço” ou a categoria de procurador da República com “15 anos de serviço nos tribunais e última classificação de serviço de Muito bom”.

A razão da referência nos dois preceitos à “anterior classificação de serviço” torna-se imediatamente evidente pelo facto de em nenhuma dessas categorias (desembargador e procurador-geral-adjunto) haver normalmente classificação de serviço, de modo que o termo ” anterior” permite cobrir a hipótese normal de a última classificação de serviço do candidato ter ocorrido na categoria profissional anterior à categoria de recrutamento (i.e., como juiz de direito ou procurador da república, em que o serviço dos magistrados é sujeito a inspecção e classificação regular e periódica).

Mas já o mesmo não sucede quanto à “última” classificação de serviço, que a lei tanto usa na enunciação dos requisitos exigidos ao “juiz de direito” como ao “procurador da República”. Ora, é indiscutível que no primeiro dos preceitos em que utiliza a expressão [art. 92.º, n.º2, b)] o legislador não pretende referir a classificação obtida em categoria profissional anterior à de “ juiz de direito” pela elementar razão de que a não há para os magistrados judiciais. Assim, para estes a última classificação de serviço só pode ter sido obtida na categoria actual do candidato. Reproduzindo o art.º 99.º, n.º 2, b) ipsis verbis aquela expressão, é de presumir que o legislador não quis dizer aqui coisa diversa do que com ela pretendera significar no lugar paralelo onde a introduziu. Pelo que, sem cuidar de lhe determinar imediatamente o sentido útil, não é razoável admitir que esse seja o de abranger a classificação obtida em categoria anterior da carreira.

VII. Ainda neste plano de compreensão do sentido do preceito legal em causa com recurso a factores hermenêuticos de ordem formal, importa notar que quando pretendeu conferir relevância a classificação de serviço do magistrado obtida em categoria diversa da actual (i.e., diversa daquela que é requisito da progressão, promoção, acesso ou efeito considerado) o legislador o disse expressamente. É o que sucede no art.º 122.º, n.º1, al. d) do Estatuto do Ministério Público, em que para a colocação de procuradores da República nos departamentos de investigação e acção penal se permite que releve a classificação de mérito nessa categoria ou “na última classificação como procurador-adjunto”. O mesmo sucedia, embora ao nível regulamentar, para preferência nas transferências de procuradores da República com o art.º 4.º, al. f) do Regulamento dos Movimentos dos Magistrados do Ministério Público, aprovado por deliberação publicada no Diário da República, 2ª Série, de 13/3/2009.

VIII. Por outro lado, quando para qualquer fim se estabelece como requisito a classificação de serviço (p. ex., art.º 117.º do EMP) deve entender-se que essa classificação é a que respeita ao serviço prestado naquela categoria que o interessado deva deter para aceder à categoria ou cargo ou, de modo geral, obter o efeito pretendido. Efectivamente, nos sistemas de carreira – aliás, esse é um dos aspectos teoricamente distintivos entre os chamados “sistemas de carreira” e os “sistemas de emprego” -, é a qualidade do serviço ou o mérito profissional demonstrado no exercício das funções correspondentes a certo nível de responsabilidade actual, traduzido na categoria profissional do interessado, que justifica a progressão, promoção ou atribuição de responsabilidades de nível superior.

IX. Admite-se que com o que antecede não fique definitivamente arredada a interpretação adoptada pelo acórdão recorrido. Mas fica abalada a força do argumento literal, pelo que importa procurar o fundamento material da exigência legal do requisito de classificação de serviço e a congruência interna do regime legal nas interpretações em contraposição.

Ora, efectivamente, a interpretação defendida pelo CSMP é a que confere congruência às exigências definidas na al. a) e na al. b) do n.º 2 do artº 99.º da LOSJ. Repare-se que um magistrado do Ministério Público da categoria mais elevada da respectiva carreira (procurador-geral-adjunto), não detém, por esse simples facto, as condições de nomeação como coordenador. Exige-se-lhe ainda, entre o mais, que tenha anterior classificação de serviço de Muito bom. Isto significa que, salvo alguma situação particular na categoria máxima, o procurador-geral-adjunto que foi promovido a essa categoria com uma classificação de serviço, enquanto procurador da República, de Bom com distinção (notação mínima de acesso àquela categoria – art.ºs 116.º, n.º3 e 117.º, n.º2, do EMP) não preenche os requisitos para aquela nomeação. Vale por dizer, o candidato da categoria máxima terá de possuir classificação de serviço de Muito bom enquanto procurador da República. Ora, seria dificilmente compreensível, por incongruente com os objectivos de qualidade visados com os requisitos estabelecidos para o preenchimento do lugar de magistrado do Ministério Público coordenador na comarca, que fosse desnecessário para recrutar entre procuradores da República o que é requisito para recrutar entre procuradores-gerais-adjuntos, normalmente magistrados com mais experiência de carreira.

Na interpretação da lei que o acórdão recorrido acolheu, um procurador da República sem qualquer avaliação de mérito profissional nas funções específicas e grau de responsabilidade inerente a essa categoria poderia desempenhar o cargo de magistrado coordenador de comarca, nunca podendo ser a isso admitido um procurador-geral-adjunto que tivesse sido avaliado com última classificação de serviço na carreira de Bom com distinção, que é classificação de mérito. Ainda que, por hipótese, no seu tempo de procurador-adjunto também esse procurador-geral-adjunto tivesse obtido Muito bom como última classificação de serviço nessa outra categoria.

X. Por outro lado, que a categoria em que se obteve a classificação de serviço tenha sido a de procurador-adjunto ou a de procurador da República não é facto destituído de significado material enquanto requisito de habilitação para o lugar de magistrado coordenador, de modo que possa dizer-se que para o fim em vista é indiferente ou é pouco relevante a categoria a que respeita a classificação, sendo indício suficiente de revelação ou prognose legislativa de tal aptidão o mero atingimento do grau máximo de classificação na última avaliação do serviço do magistrado a que foi submetido, mesmo que na categoria inferior da carreira.

Com efeito, a descrição das competências na categoria de procurador da República – e a correspondente avaliação do desempenho e mérito profissional que a classificação de serviço deve traduzir – envolve conteúdos funcionais e nível de responsabilidade diversos daqueles que respeitam à categoria de procurador-adjunto (cfr. art.º 63.º, n.º1 e 3, e art.º 65.º, do EMP, respectivamente). E são precisamente aquelas competências que diferenciam as duas categorias (cfr., as previstas nas als. b), c) e f) do n.º 1 do art.º 63, que estarão sempre presentes, mesmo que se não trate de magistrado que exerça as competências previstas no n.º 2 do mesmo art.º 63.º, em que a diferença é flagrante) aquelas cuja avaliação de desempenho, sobretudo numa magistratura hierarquizada, é mais idónea a um juízo abstracto de aptidão previsível para o exercício das tarefas que a lei comete ao magistrado do Ministério Público Coordenador (art.º 101.º da LOSJ).

Também por esta via se encontra justificação material para que o nível de desempenho do magistrado que o legislador considerou requisito para acesso ao cargo de coordenador seja revelado no exercício das funções correspondentes à categoria de procurador onde se faz o recrutamento e não à categoria anterior de procurador-adjunto.

XI. Em síntese, a última classificação de serviço exigida pela al. b) do n.º 2 do art.º 99.º da LOSJ como requisito de nomeação para o cargo de magistrado do Ministério Público coordenador na comarca e, concordantemente, estabelecida no aviso do concurso para frequência do curso a que se refere o art.º 102º da LOSJ, é aquela que respeite ao serviço prestado na categoria de procurador da República.

XII. E, retomando a resposta deixada em suspenso (considerando n.º V) à objecção prevista de que assim seria redundante o qualificativo “última” naquele preceito, parece possível afirmar-lhe um sentido útil que consiste em que o legislador entendeu não exigir que essa classificação esteja actualizada desde que seja a última que foi obtida por serviço prestado na categoria. Com o reforço de ser igualmente válido para o simétrico inciso da al. b) do n.º 2 do art.º 92, para que, de outro modo se não veria qualquer sentido.

XIII. Não se nega que mereçam reflexão as considerações do acórdão recorrido acerca das consequências desvantajosas que, nesta interpretação do regime legal, as disfunções relativas ao sistema de inspecções e à periodicidade das classificações podem projectar sobre os magistrados do Ministério Público que não tenham sido, devendo sê-lo, sujeitos a avaliação do mérito profissional na categoria de procurador da República. Mas, além de que o remédio proposto excederia o mal detectado (previsivelmente, nem todos os procuradores com 15 anos de serviço efectivo, sem classificação nessa categoria e com classificação de serviço de Muito bom na categoria de base da carreira estarão na situação do recorrente quanto à aparente inobservância da periodicidade das classificações, bastando pensar em procuradores com menos de 4 anos de antiguidade na categoria), as incongruências sistemáticas referidas e a razão de ser da imposição deste requisito para provimento no cargo de coordenador, tendo em atenção as respectivas competências e a sua relevância no novo sistema de organização judiciária, constituem um obstáculo intransponível à aceitação daquelas ponderações na interpretação do preceito. As regras de provimento nos cargos – e repare-se que aqui nem sequer está propriamente em causa um lugar de progressão ou promoção na carreira - são antes de mais função das exigências do serviço público de administração da justiça e só em segundo plano dos interesses de carreira dos particulares que nele servem.

XIV. Em conclusão, a interpretação adoptada pelo CSMP no acto impugnado e agora acolhida ainda tem cabimento na letra da lei e é a que mais equilibradamente satisfaz a presunção de que o legislador soube encontrar as soluções mais adequadas ao fim visado, pelo que a anulação de tal acto pelo acórdão recorrido não pode manter-se.

3.3.
Face às razões de improcedência total da acção a que esta interpretação conduz, fica prejudicada a apreciação das demais questões que o CSMP suscita no presente recurso.

4. Decisão
Pelo exposto, decide-se, conceder provimento ao presente recurso e, revogando o acórdão recorrido,
a) Julgar improcedente a acção administrativa especial, absolvendo o Conselho Superior do Ministério Público do pedido;
b)Condenar o Autor nas custas (da acção e do recurso).
Lisboa, 21 de Abril de 2016. – Vítor Manuel Gonçalves Gomes (relator) – Alberto Augusto Andrade de OliveiraJorge Artur Madeira dos Santos – Teresa Maria Sena Ferreira de SousaJosé Francisco Fonseca da Paz Maria do Céu Dias Rosa das NevesCarlos Luís Medeiros de Carvalho (vencido conforme voto que anexo) – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano (vencida, remetendo para o essencial do voto do Conselheiro Carlos Carvalho) – Ana Paula Soares Leite Martins Portela (vencida nos termos do voto supra junto).

Vencido, não acompanhando o entendimento que logrou obter vencimento, porquanto quanto ao fundamento objeto de apreciação não daria provimento ao recurso jurisdicional, pelas razões expostas no projeto de acórdão que, enquanto relator, elaborei e que são, no essencial, as seguintes:

I. Do regime inserto nas als. a) e b), do n.º 2, do art. 99.º da «LOSJ», não se pode extrair a leitura propugnada pelo Recorrente «CSMP», isto é, de que a classificação de serviço exigida ao candidato ao concurso o seja sempre e por referência à “categoria” em que a mesma foi obtida.

II. Afigura-se-me que do facto de, de harmonia com o disposto no art. 109.º do «EMP», os procuradores-gerais-adjuntos [doravante «PGA’s»] não verem o serviço que prestam ser alvo de inspeções e notação por parte do «CSMP», já que estas recaem apenas sobre o serviço prestado por procuradores da República e procuradores adjuntos, não deriva que a referência à “última classificação de serviço” dos magistrados do MP que exerçam funções efetivas como procuradores da República constante da al. b), do n.º 2, do art. 99.º da «LOSJ» se tenha de considerar como respeitante única e exclusivamente à notação/classificação daqueles magistrados na categoria de procurador da República.

III. No entendimento defendido a utilização por parte do legislador, no n.º 2 do art. 99.º, de diversas expressões como “anterior classificação de serviço” e “última classificação de serviço” não indicia ou aponta inequivocamente para que esta última expressão traga como seu único acréscimo significativo o de ter de se atender apenas e só como última classificação a obtida na categoria de procurador da República a ponto de se ter querido excluir da previsão da norma todos os magistrados do MP que, à data, exerciam funções efetivas como procurador da República mas cuja última classificação de Muito Bomapenas foi obtida ainda na categoria de procuradores-adjuntos, quando nunca o foram na categoria atualmente detida e sem que lhes seja imputável uma ausência de classificação de serviço na mesma.

IV. Estando os magistrados do MP referidos na al. b) ainda sujeitos a classificação de serviço por parte do «CSMP» [cfr. arts. 109.º e 112.º ambos do «EMP»] a exigência de nota de Muito Bomobtida na “última classificação de serviço” prende-se, na interpretação que defendi no projeto, com uma ideia da mais atualizada notação obtida ou detida pelo magistrado candidato e que seria, assim, a expressão mais próxima e atual daquilo que é o mérito profissional daquele para o desempenho do cargo.

V. É que poderia dar-se o caso do magistrado, podendo ter tido anteriores classificações de Muito Bome incluindo na categoria já de procurador da República, ter visto, entretanto, a sua última classificação de serviço obtida ser notada em grau inferior àquele, o que é indiciador dum nível de desempenho profissional que não corresponderia ao padrão exigido legalmente para o cargo em questão e que o afastaria, necessariamente, da possibilidade de se poder apresentar ao concurso já que não reunia ou não preenchia, naquele momento, os requisitos cumulativos previstos no preceito em referência.

VI. Não se nos afigura de admitir como possível que magistrados do MP com a categoria de procurador da República com menor antiguidade que outros na mesma categoria possam vir a ser selecionados e, ulteriormente, providos nas funções de Coordenador na Comarca, realizado o curso de formação no CEJ, apenas pelo simples facto de, ao invés daqueles, terem visto já o seu serviço na categoria alvo de classificação homologada pelo «CSMP» e, como tal, poderem ter apresentado a sua candidatura ao concurso.

VII. Não pode aceitar-se que determinado magistrado do MP, provido como procurador da República e com maior antiguidade nessa mesma categoria, que exerce efetivamente tais funções e possui, igualmente, 15 anos de serviço nos tribunais, não possa candidatar-se ao concurso ou veja a candidatura ao mesmo ser rejeitada automaticamente pelo simples facto de, no momento da abertura do concurso e da apresentação da candidatura, não ter ainda sido alvo de inspeção classificativa na categoria detida [quer por a mesma nunca ter tido lugar, quer pelo facto da mesma simplesmente se haver atrasado e isto sem que ao magistrado seja imputável qualquer responsabilidade na demora], quando, como exige o preceito, possui como “última classificação de serviço” a nota ali exigida ainda que a notação tenha sido pelo serviço prestado em categoria inferior.

VIII. Note-se, aliás, que nos termos do preceito em crise não consta ou se exige um qualquer período mínimo de desempenho de funções na categoria de procurador da República como requisito de apresentação da candidatura, para que daí se pudesse inferir que a classificação de serviço a considerar tivesse necessária e unicamente de ser obtida no e pelo desempenho do magistrado do MP naquela categoria.

IX. É certo que quanto aos magistrados do MP que exerçam funções efetivas como «PGA», por efeito da ausência da possibilidade de existência duma qualquer notação ou classificação às funções prestadas naquela categoria [cfr. «EMP», mormente, seu art. 109.º], a referência à “anterior” classificação de serviço de “Muito bom”, inserta na al. a) do preceito, terá de se justificar por referência à notação de serviço obtida na anterior categoria, ou seja, enquanto procurador da República. E é pelo facto de na categoria detida pelo magistrado do MP, enquanto «PGA», nunca o mesmo pode vir a ser alvo de classificação de serviço que o apelo à anterior classificação de serviço terá de ser, necessariamente, encontrada na notação obtida na categoria anterior, pois não faria qualquer sentido estar a apelar-se aqui à “última classificação de serviço” porquanto esta expressão pressupõe um serviço que seja e possa ser alvo de classificação ou notação e que o possa ser ou ter sido ou venha a ser por diversas vezes.

X. Constata-se, também, que o uso de uma tal terminologia e exigência mostra-se feita em termos idênticos para os juízes desembargadores candidatos no âmbito de procedimento de escolha pelo «CSM» do presidente do tribunal de comarca [cfr. arts. 92.º, n.º 2, al. a), da «LOSJ», 33.º, 35.º, 36.º e 37.º-A, todos do «EMJ»] e isso apesar de não existir uma total similitude de regimes e de categorias entre as magistraturas.

XI. Mas duma tal similitude na terminologia empregue entre os arts. 92.º e 99.º da «LOSJ» não deriva ou resulta, no entendimento defendido, uma grande valia e relevância interpretativa já que não são equiparáveis as situações, porquanto e quanto aos juízes desembargadores a mesma não é inteiramente assimilável à dos «PGA’s», visto o serviço por estes prestado não é alvo nunca de notação enquanto o daqueles, ainda que excecionalmente [cfr. art. 37.º-A do «EMJ»], pode ser objeto de classificação e, inclusive, com uma notação inferior à anteriormente detida.

XII. E inexiste também um “paralelismo” de regime que aponte para inequívocas similitudes interpretativas entre os referidos preceitos quanto à situação dos juízes e dos procuradores da República, enquanto candidatos aos referidos procedimentos [arts. 92.º, n.º 2, al. b), e 99.º, n.º 2, al. b), da «LOSJ»], porquanto na magistratura do MP, ao invés da judicatura, existem duas categorias de magistrados em funções juntos dos tribunais de 1.ª instância [as de procurador adjunto e de procurador da República], não se podendo daí extrair que a última notação de serviço haja de se entender como sendo, necessária e unicamente, a obtida na categoria detida de procurador da República.

XIII. Atente-se que estão necessariamente afastados da possibilidade de apresentação duma candidatura a um concurso, como o em questão, os magistrados do MP que, exercendo funções efetivas como «PGA», possuam anterior classificação de serviço que seja inferior a “Muito Bom”, situação que poderá ocorrer pelo simples facto das promoções por mérito terem lugar não apenas com aquela nota mas também com “Bom com distinção” [cfr. arts. 116.º e 117.º ambos do «EMP»]. E o mesmo se passa com os juízes desembargadores com idêntica anterior classificação de “Bom com distinção” [esta ou já obtida naquela categoria na sequência de notação ao serviço prestado na mesma ou que derive de notação anterior ainda enquanto juiz de direito - cfr. arts. 33.º e 37.º-A, 46.º a 48.º, todos do «EMJ»].

XIV. O uso na citada al. b) daquela expressão possui um outro alcance, amplitude e conteúdo já que, para evitar os inconvenientes, as incongruências, os potenciais prejuízos e desigualdades, atrás aludidos, e que pudessem derivar, como vimos, nomeadamente de falhas/atrasos de planeamento e execução nos procedimentos inspetivos de notação de serviço dos magistrados do MP detentores da categoria de procurador da República, fez-se, então, apelo àquilo que era a “última classificação de serviço” detida por cada magistrado do MP com tal categoria e isso independentemente da notação respeitar a serviço prestado em particular naquela categoria ou noutra.

XV. O que releva e importa ser considerado no contexto da previsão é a mais atualizada das classificações detidas pelo candidato magistrado do MP com a categoria de procurador da República, visto ser a mesma aquela que melhor pode espelhar aquilo que é o último desempenho alvo de notação e que importa atentar no confronto ou comparação entre os candidatos, sem envolver riscos de desigualdades entre estes decorrentes da existência e/ou da tramitação de processo inspetivo de classificação ao serviço prestado ao longo da carreira.

XVI. O legislador ciente e conhecedor certamente das dificuldades sentidas pelo «CSMP» na implementação e total execução dos procedimentos inspetivos para classificação dos magistrados do MP ao longo da sua carreira, daquilo que são os atrasos, das questões e dos conflitos havidos neste domínio e que se têm colocado amiúde, optou por instituir um regime em matéria de definição dos requisitos para a nomeação para cargo de magistrado do MP coordenador na Comarca, sua comprovação/verificação, que permitiria evitar ou pelo menos minorar em muito tais problemas.

XVII. E tal solução passa pela interpretação que se mostra feita pelo acórdão recorrido, já que a mesma permite que, sem quaisquer constrangimentos, limitações ou desigualdades, se apresentassem ao concurso aberto pelo «CSMP» todos os magistrados do MP, com 15 anos de serviço nos tribunais, em exercício efetivo na categoria de procurador da República e que tivessem como última classificação de serviço “Muito Bom”, cabendo depois ao mesmo Conselho proceder, em função do número de vagas que definiu e à luz dos critérios e fatores que fez constar do aviso de abertura do procedimento, à seleção de entre o universo dos candidatos aqueles que iriam realizar o curso de formação no CEJ e que depois, uma vez aprovados, à definição daqueles que figurariam numa lista final que os habilitaria a serem escolhidos para o cargo de magistrado do MP Coordenador de qualquer das novas Comarcas, uma vez realizados os demais procedimentos definidos e aprovados na deliberação do «CSMP» de 02.10.2013 [cfr. n.º VIII) da factualidade apurada e fls. 22/30 do «PA» apenso].

XVIII. De notar que, tal como expressamente veio a ser reconhecido no próprio aviso de abertura do concurso [cfr. n.º VI) da factualidade apurada], existe uma preferência da categoria de «PGA» face à de procurador da República no provimento dos cargos de Magistrado do MP Coordenador entre aquilo que é o âmbito definido dos potenciais candidatos e, nessa medida, os candidatos de cada uma destas categorias acabam por nunca estarem em efetiva e verdadeira “concorrência” entre si, pelo que não colhe uma argumentação que radique ou procure encontrar pontos de equiparação nas notações exigidas justificadores do sentido interpretativo defendido pelo «CSMP», na certeza de que, enquanto requisito de habilitação para aquele cargo, uma exigência da notação/classificação de serviço na categoria só poderia relevar se entre os potenciais procuradores da República candidatos não existissem as apontadas desigualdades ou riscos das mesmas quanto à existência e/ou à tramitação de processos inspetivos de notação ao serviço prestado na categoria.

XIX. A referência à “última classificação de serviço” nos termos em que se mostra prevista na alínea em análise não resulta, pois, condicionada pela classificação do desempenho do magistrado do MP em função e por referência à categoria detida pelo mesmo, sendo que se essa fosse a intenção do legislador então o mesmo teria de ter redigido o comando normativo em moldes muito similares aos que vieram a utilizados pelo «CSMP» nas suas deliberações de 02.10.2013, 15.10.2013 e 03.12.2013 [cfr. n.ºs VIII), IX) e XI) dos factos apurados] e não o fez.

XX. Inexistindo neste âmbito uma incorreta interpretação e aplicação do quadro normativo em crise improcederia o erro de julgamento assacado ao acórdão recorrido.
Carlos Luís Medeiros de Carvalho.