Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0299/10.4BECTB
Data do Acordão:10/06/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:COLIGAÇÃO
OPOSIÇÃO
NULIDADE
Sumário:I - Nos termos do disposto no artigo 36º do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável ao processo judicial tributário, é permitida a coligação de Oponentes quando seja a mesma e única a causa de pedir, quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência, ou quando a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito.
II - Se a única questão decidida na sentença foi a excepção de ilegal coligação de Oponentes e nela não foram fixados quaisquer factos que permitam ao Tribunal ad quem aferir da verificação dos pressupostos enunciados no citado artigo 36.º do Código de Processo Civil, há que declarar a sua nulidade, por falta de especificação dos fundamentos de facto, nos termos do artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Nº Convencional:JSTA000P28212
Nº do Documento:SA2202110060299/10
Data de Entrada:01/26/2021
Recorrente:A............. E OUTROS
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. A…………, B………….. e C………….., inconformados com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco - que julgando procedente a excepção de coligação ilegal, absolveu da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira na Oposição à Execução Fiscal nº 1724200601007610, originariamente instaurada contra «D…………., Lda.», contra todos revertida, por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Ponte de Sor, para cobrança coerciva de dívidas relativas a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), Imposto sobre o Rendimento Singular (IRS), Imposto sobre as pessoas Colectivas (IRC) e coimas fiscais, no montante global de €146.647,95 - recorreram para o Tribunal Central Administrativo Sul.

1.2. Admitido o recurso, os Recorrentes apresentaram as suas alegações, que finalizaram nos termos que seguem:

«1) Conforme consta dos autos, os Recorrentes apresentaram a sua Petição Inicial, nos termos do disposto nos artigos 204° e seguintes do CPPT, alegando o que acima se transcreveu;

2) Citada, a Fazenda Pública apresentou a sua contestação;

3) Os Oponentes apresentaram alegações escritas, nas quais reafirmaram o entendimento vertido na sua p.i.;

4) Foi emitido parecer pelo Digníssimo Magistrado do M.P;

5) Por Sentença de fls., a Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo” decidiu o acima transcrito;

6) Entendem os Oponentes que a coligação dos Oponentes é legal, pois, as partes são as mesmas, os impostos são os mesmos e o período das alegadas dívidas são as mesmas;

7) Deve ser revogada a decisão recorrida, com todas as consequências legais daí resultantes, o que, desde já, e aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes;

8) Mesmo que a Meritíssima Juiz entendesse que não estavam verificados os requisitos da coligação, não poderia mesmo assim decidir como decidiu, nomeadamente decidir pela absolvição da instância;

9) Nos termos do art° 31°-A do CPC, se a coligação não puder ocorrer de acordo com o art° 30°, deve o juiz notificar os autores para, no prazo fixado, indicarem por acordo qual o pedido que pretendem ver apreciado no processo, sob cominação de, não o fazendo, o réu ser absolvido da instância quanto a todos eles. Vide, neste sentido, Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e Processo Tributário anotado e comentado, 6ª ed. 2011, III volume. pag. 542- 543;

10) “Embora não haja norma legal que preveja a coligação de oponentes, não haverá obstáculo a que ela ocorra, se, se verificarem os requisitos em que a coligação é admitida pelo CPC, que é de aplicação subsidiária, nos termos do art. 2°, alínea c), do CPPT.

11) Tratando-se de preenchimento de uma lacuna num processo de execução fiscal, parece ser aplicável preferencialmente o regime do CPC e não o do CPTA, pois este último diploma está vocacionado pare o contencioso administrativo.

12) No entanto, a aplicação dos requisitos da coligação previstos no art 12.° do CPTA coincide essencialmente, nos seus resultados, com a aplicação dos previstos no art° 30° do CPC;

13) O STA, no acórdão de 8-10-2006, processo n.° 232/06, apreciou a possibilidade de coligação de oponentes à face, cumulativamente, dos referidos arts. 12.° do CPTA 30° do CPC, mas, no acórdão de 30-11-2004, processo n° 1093/04, entendeu que essa possibilidade devia ser apreciada à face do CPC, não sendo aplicável o regime do art. 38° da LPTA (previsto para o recurso contencioso);

14) Aplicando o regime do art. 30° do CPC, adaptado ao processo de oposição à execução fiscal, será admissível a coligação de oponentes quando a causa de pedir (factos jurídicos de que emerge o pedido de extinção ou suspensão da execução fiscal) seja a mesma e única e quando, sendo embora diferente a causa de pedir a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos;

15) Ocorrendo coligação sem que entre os pedidos exista a conexão exigida pelo art. 30.°, o juiz notificará os oponentes para, no prazo fixado, indicarem, por acordo, qual o pedido que pretende ver apreciado no processo, sob cominação de, não o fazendo, o exequente ser absolvido da instância quanto a todos eles, conforme resulta do art. 31°-A, n°s 1 e 2, do CPC;

16) Feita a indicação do pedido a ser apreciado no processo, o juiz absolve a Fazenda Pública da instância relativamente aos outros pedidos (n.° 3 do mesmo artigo);

17) A letra do n° 2 do art. 31.°-A do CPC é compatível com a possibilidade de todos os autores acordarem no prosseguimento do processo apenas quanto ao pedido formulado por um deles, terminando, assim, a coligação;

18) As razões de economia processual que estão subjacentes à possibilidade de suprimento apontam, decerto, no sentido de, nos casos em que não seja possível manter a coligação, ela termine, aproveitando-se o processo na medida do possível, em vez de o inutilizar por completo;

19) A possibilidade de os autores concordarem com o prosseguimento do processo relativamente ao pedido de um deles não é irrealista, pois a coligação normalmente assenta numa relação de alguma cordialidade judiciária entre os autores;

20) O tribunal a quo não fez esta notificação, pois não notificou os Oponentes para virem indicar, por acordo, qual o pedido que pretendem ver apreciados no processo, sob cominação de, não o fazendo, a exequente ser absolvida da instância quanto a todos eles;

21) Deve ser revogada a Sentença a fim de ser efectuada a notificação a que se refere o art° 31-A do CPC, o que, desde já e aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes;

22) A sentença recorrida não está fundamentada tanto de facto como de direito como exige a Lei;

23) A Decisão que deu causa a este recurso, não está fundamentada como exigem as normas referidas, tendo por esse facto de ser Revogada, nulidade, esta, que aqui, mais uma vez, se requer, daí dúvidas não existirem de que terá de ser revogada a decisão recorrida, aliás, conforme acima já se referiu;

24) O (Venerando Tribunal) com a decisão recorrida, não assegurou a defesa dos direitos do Alegante, ao não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e nem se quer aplicar as normas legais aplicáveis ao caso em concreto;

25) O Tribunal a quo limitou-se a emitir uma decisão onde apenas de uma forma simples e sintética foram apreciadas algumas das questões, deficientemente e sem qualquer cabimento, conforme acima já se alegou e explicou;

26) Deixando o Venerando Juiz do Tribunal a quo de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas;

27) Cometeu, pois, uma nulidade;

28) A Sentença recorrida viola:

a) Artigos 30°, 31°-A, 154°, 615°, b), c) e d) do NCPC;

b) Artigos 12° CPTA;

e) Artigos 13°, 20°, 204°, 205°, 266°, n.° 3 do 268°, da C.R.P.».

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. Por decisão sumária da Excelentíssima Desembargadora a quem os autos foram atribuídos no Tribunal Central Administrativo Sul, foi proferida decisão de declaração de a incompetência em razão da hierarquia.

1.5. Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto emitido parecer no sentido de total improcedência do recurso. Em síntese, por, quanto à questão de nulidade de omissão de pronúncia, por não terem sido identificadas quais as questões cujo conhecimento tenha sido omitido; relativamente à questão da nulidade por falta de fundamentação de facto e de direito, por, não obstante a decisão recorrida não ter dado destacado isoladamente os factos em que se suportou, dela constam todos os elementos de facto que a determinaram bem como as razões de direito que conduziram à sua decisão; quanto ao erro de julgamento, não existir dever do Tribunal notificar os Oponentes coligados para eventualmente a causa prosseguir para conhecimento de uma única causa de pedir, por a tal obstar o n.º 1 do artigo 30.º do CPC, que exige não só que a causa seja única como, também, que seja comum a todos os Oponentes.

1.6. Não se verificando qualquer circunstância que obste à apreciação do mérito do recurso, procede-se, agora, ao seu julgamento.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a parte Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), desta forma impedindo que voltem a ser reapreciadas por este Tribunal de recurso. Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso concreto, tendo por referência as conclusões formuladas e a delimitação da nossa competência, são três as questões a decidir: (i) nulidade da decisão recorrida por não ter conhecido de questões que os Oponentes suscitam na sua petição em violação do preceituado no artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT); (ii) nulidade da decisão recorrida por não ter fundamentado, nem de facto nem de direito o julgamento que realizou, violando o mesmo preceito legal em último citado; (iii) erro de julgamento por a coligação, no caso, ser legalmente admissível, uma vez que as partes são as mesmas, bem como os impostos e o período a que as alegadas dívidas respeitam e, de todo o modo, mesmo que assim se não entenda, sempre se imporia que o Tribunal tivesse convidado os Recorrentes a optarem por um dos pedidos formulados, em conformidade com o preceituado, conjugadamente, nos artigos 30.º e 1.º-A, n.º 1 e 2 do CPC e 12.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicáveis ex vi artigo 2.º do CPPT.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. A sentença recorrida tem o seguinte teor integral:

«A………………., NIF …………, B……………, NIF ………. e C………….., NIF …………., vieram deduzir oposição no PEF n.º1724200601007610 e apensos, que corre termos no serviço de Finanças de Ponte Sôr, na qualidade de revertidos da sociedade D……………, Lda, peticionando, a final, a anulação do despacho de reversão.

Como fundamentos da presente oposição:

- Invocam a falta de excussão do património da executada originária e a falta de culpa na insuficiência dos bens daquela sociedade para fazer face às dívidas tributárias.

- Alegam ainda que nunca geriram, de facto, a sociedade devedora originária, invocando que nunca praticaram actos de disposição ou administração em nome e interesse da sociedade.

- Opõem-se ainda, e em concreto, quanto às dívidas provenientes de decisões de aplicação de coimas, aplicada à D……………, Lda..

- Mais invocam que o PEF é nulo, pois no ano a que se referem as dívidas não teve qualquer actividade.

- Falta de fundamentação do despacho de reversão e nulidade;

- Violação dos artigos 45.º, 46.º e 59.º do CPPT, e dos artigos 8.º, 55.º, 56.º, 58.º, 59.º e 60 da LGT

Arrolaram testemunhas e juntaram documentos.

Notificada a RFP para contestar, veio fazê-lo, pugnando pela improcedência da oposição.

A testemunha apresentada foi inquirida, conforme acta de fls. 415 (numeração SITAF), logo sendo as partes notificadas para alegações, o que apenas foi aproveitado pelo oponente, que reiterou o já alegado na sua PI.

O Digníssimo Magistrado do M.P. emitiu douto parecer no sentido da improcedência da presente oposição, onde além do mais, escreveu “[c]oncordando-se com a fundamentada posição do sr. RFP em contestação, ademais ressaltando as efectivas contradições e incongruências em que laboram os Oponentes, e a testemunha ouvida em nada invalidando aquela, deverá ser desatendida a pretensão da oponente e improceder o pedido da presente oposição.”

II. Pressupostos Processuais

O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria, da hierarquia, e do território.

O processo é o próprio, e não enferma de nulidades insupríveis.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias.

Da ilegal coligação dos oponentes.

Vem a presente oposição, intentada por três oponentes.

Sucede porém que, de acordo com a informação oficial que consta a fls. 5 dos autos, “[…] em face do Auto de Diligências junto aos autos datado de 16/03/2010, conforme Documentos Anexos [3], por despacho do CF de 17103/2010, procedeu-se à citação pessoal dos executados por reversão, os contribuintes E………………, F………….., C………….., B………….. e A………….., tendo a citação referente ao revertido B…………. sido concretizada em 24/03/2010 e a do revertido E…………. em 25/03/2010. As citações relativas aos outros contribuintes foram devolvidas pelos CTT com anotação de "objecto não reclamado" em relação a C……………. e a F………….., e em relação a A……………… a anotação dos CTT foi "mudou-se";

Entretanto, em 20/04/2010, o contribuinte E…………….. efectuou um pagamento em reversão da dívida de sua responsabilidade, no valor de € 527, sendo extinta a reversão contra si, bem como contra o revertido F…………….

Ainda em 20/04/2010, deu entrada neste Serviço por correio electrónico uma oposição à execução fiscal em nome dos revertidos A………………., NIF …….…., B................., NIF ……….., e C………………., NIF ………….., a que foi atribuído o processo n.º 1724201009000011, tendo sido efectuado o respectivo pagamento da Taxa de Justiça;

Os contribuintes constituíram mandatário o Dr. ……………., com escritório no …………., Av. ……….., n.º …… - …….. …., 2410-…… Leiria.

Não tendo os contribuintes A……….. e C………… sido citados da reversão, presume-se que a sua inclusão na oposição ora deduzida se deve ao facto de terem sido alertados pelo outro contribuinte revertido e citado, Sr. B……………, tendo assim conhecimento do Despacho de Reversão contra eles;

Entretanto, e dado que na petição de oposição entregue neste Serviço de Finanças indicava uma morada diferente daquela que consta no cadastro da DGCI, foi remetida nova citação em reversão para os contribuintes A……………. e C……….

O contribuinte A…………… foi então citado a 29/04/2010, contudo, mais uma vez, veio devolvida a citação do contribuinte C………….. (19/05/2010)”(sublinhado nosso);

Por sua vez, na petição inicial, em lado algum se vislumbra que os oponentes A…………….. e C…………………, tenham sido citados à data da apresentação da presente oposição, o que aliás se concluí, pela junção do ofício de citação apenas referente ao oponente B………………..

Para mais, acresce o facto do aqui oponente A……………, após concretização da citação, a 29/04/2010, ter vindo a intentar oposição à execução, que correm termos neste TAF de Castelo Branco com o n.º378/10.8BECTB, na qual já foi proferida sentença, não transitada em julgado, referente ao PEF em apreciação nos presentes autos.

Ora, considerando que a oposição à execução fiscal se apresenta, em termos legislativos e doutrinários, como uma contra-acção deduzida contra a acção executiva, a parte passiva da acção executiva, é o executado ou seu substituto legal, tendo por esta via a legitimidade processual para deduzir oposição.

Contudo, tal estatuto de executado ou responsável/substituto legal, só se concretiza com o acto de citação, na medida em que só a partir dessa data, o sujeito passivo, tem conhecimento que contra ele foi intentada uma determinada execução fiscal, com eficácia processual, o que no caso em apreço apenas sucedeu com dois dos oponentes, no caso B……………, e A……………, não constando informação nos presentes autos da concretização da citação ao oponente C…………………

Ora, não obstante os oponentes A………………… e C……………… não terem sido citados no processo executivo ao tempo da propositura desta oposição, certo é que vieram coligar-se ao oponente B…………………, único citado à data da propositura da presente oposição.

Não dispondo o CPPT especificamente sobre a coligação de oponentes na oposição à execução, há que lançar mão do que dispõe o CPC, uma vez que a norma vertida no artigo 104.º do CPPT se destina a regular a coligação relativamente ao processo de impugnação.

Assim sendo, e com fundamento no artigo 2.º alínea e) do CPPT olhemos o regime geral da coligação vertido no artigo 30.º do CPC que rezava, à data da propositura da oposição:

“1 - É permitida a coligação de autores contra um ou vários réus e é permitido a um autor demandar conjuntamente vários réus, por pedidos diferentes, quando a causa de pedir seja a mesma e única ou quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência

2 - É igualmente lícita a coligação quando, sendo embora diferente a causa de pedir, a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas

(…)”.

Mais esclarece o recente acórdão do STA, proc.º 755/14, datado de 08-02-2017, em sumário, que :

“I- Nos termos do disposto no art. 36º do CPC, subsidiariamente aplicável, é permitida a coligação de oponentes quando seja a mesma e única a causa de pedir, quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência, ou quando a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito.

II - Não se verificando qualquer dos referidos requisitos, a coligação de oponentes constitui excepção dilatória, nos termos da al. f) do art. 577º do CPC, pelo que o juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância [al. e) do nº 1 do art. 278º do Código de Processo Civil]”.

Atente-se que, no caso concreto, como já referimos verifica-se que os oponentes estão em diferentes circunstâncias processuais, relativamente ao PEF e apensos aos quais se vêm opor, que desaconselham qualquer coligação, na medida em que apenas o oponente B………………. se encontra citado para a presente oposição, e o oponente A………………, apresentou individualmente oposição, após citação ocorrida em data posterior à data da entrada da presente oposição.

Para mais, nos fundamentos da presente oposição, não existe coincidência na causa de pedir trazida aos autos pelos três oponentes, não resultando tampouco que o pedido de um se encontre prejudicado pelos pedidos dos outros, ou destes tenham dependência.

E também não resulta da PI que nos presentes autos a procedência dos pedidos dependa da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de Direito, pois se é verdade que todos os oponentes os mesmos fundamentos, o certo é que os períodos de gerência não são os mesmos, nas diversas datas da constituição das dívidas.

Face ao exposto, não obstante os autos se encontrarem já em fase de sentença, só agora foi possível aferir da ilegalidade da coligação, e da existência de razões de facto que a impedem, verificando-se a existência de excepção dilatória de coligação ilegal nos termos da alínea f) do nº 2 do artigo 577.º do CPC, o que determina absolvição da instância, nos termos da alínea e) do n.º1 do artigo 278.º do mesmo Código.

Note-se que a presente absolvição da instância, não deixa desprotegida a defesa de qualquer dos oponentes – muito pelo contrário, protege a tutela jurisdicional de cada um relativamente à sua concreta posição processual no processo de execução fiscal – podendo os mesmos, em concretização do princípio pro actione e de acordo com o artigo 37.º, n.º 5, do CPC, deduzir oposições autónomas contra a execução em causa nos presentes autos, no prazo de 30 dias, prazo, esse consagrado no citado normativo, mais lhe sendo lícito lançarem mão dos mecanismos de economia processual e aproveitamento de actos, de tudo o quanto se tenha processado, nos termos previstos no n.º3 do artigo 279.º do CPC, todos aplicáveis ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.

III. Dispositivo

Por todo o exposto, julga-se verificada a excepção dilatória de coligação ilegal nos termos da alínea f) do nº 2 do artigo 577.º do CPC, o que determina absolvição da instância, nos termos da alínea e) do n.º1 do artigo 278.º, sem prejuízo do disposto artigo 37.º, n.º 5, e artigo 279.º, todos do CPC, aplicáveis ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT».

3.2. Fundamentação de direito

3.2.1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença que julgou verificada a excepção de coligação ilegal dos Oponentes e absolveu a Fazenda Pública da instância.

3.2.2. Para assim decidir, a sentença recorrida, sem fixar autónoma ou formalmente quaisquer factos como apurados face aos elementos constantes dos autos (articulados e documentos), decidiu que a referida excepção de ilegal coligação se verificava, uma vez que dois dos Oponentes se tinham apresentado Oposição coligados com um terceiro sem terem sido regularmente citados na qualidade de revertidos; não existir coincidência na causa de pedir trazida aos autos pelos três Oponentes; não resultar dos autos que o pedido de um se encontre prejudicado pelos pedidos dos outros, ou destes tenham dependência; nem, por fim, que a procedência dos diversos pedidos estivesse dependente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de Direito e, por fim, porque embora os fundamentos invocados por todos os Oponentes sejam idênticos, os períodos de gerência não eram os mesmos e eram diversas as datas da constituição das dívidas.

3.2.3. Adiantamos, desde já, que a sentença recorrida não pode subsistir na ordem jurídica.

3.2.4. Explicitemos, então, porque assim o entendemos, sublinhando que a conclusão de revogação do julgado não tem por fundamento a alegada nulidade por omissão de pronúncia que os Recorrentes lhe assacam.

3.2.5. Na verdade, como este Supremo Tribunal Administrativo há muito vem explicitando, a nulidade por omissão de pronúncia, prevista no artigo 125.º do CPPT, está directamente conexionada com a omissão de questões que tenham sido colocadas pelas partes e que, por isso, o Tribunal delas deve conhecer e decidir, ou com a apreciação de questões que lhe cumpra oficiosamente conhecer, e desde que, umas e outras, não se mostrem prejudicadas por decisões quanto a outras questões que anteriormente hajam sido conhecidas.

3.2.6. Ora, no caso concreto, como salienta o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, os Recorrentes não identificaram, nem nas suas alegações nem nas conclusões deste recurso, as questões cujo conhecimento terá sido omitido, o que coloca, desde logo, sérias dificuldades na apreciação da nulidade invocada.

3.2.7. Porém, mais relevante de que essa falta de identificação das questões, é o facto de o Tribunal a quo não ter apreciado o mérito da Oposição, quedando-se, como se vê do teor da sentença que curamos de transcrever, pela apreciação dos pressupostos processuais e, julgando ilegal a coligação dos Oponentes, decidido absolver a Fazenda Pública da instância.

3.2.8. Donde, mesmo que partíssemos do pressuposto de que as questões cujo conhecimento fora omitido eram todas as questões suscitadas na petição de Oposição, é manifesto que essa nulidade se não verifica por, face ao teor da sentença recorrida, qualquer apreciação quanto ao mérito dessas questões ficou inevitavelmente prejudicado.

3.2.9. Todavia, a idêntica conclusão não logramos chegar quando enfrentamos a invocada nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto, total ausência crítica da prova e fundamentação da sua convicção, igualmente prevista no artigo 125.º do CPPT.

3.2.10. Para o que ora releva, importa realçar que, por força do preceituado no artigo 607.º do CPC, encerrada a audiência final, o processo é concluso ao juiz para ser proferida sentença, que, após identificar as partes, o objecto do litígio enunciar as questões que ao Tribunal cumpre solucionar e antes de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas que suportarão a decisão final, deve descrever a matéria de facto, ou seja, discriminar os factos que considera provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.

3.2.11. Ora, no caso concreto, e nesta parte afastamo-nos do entendimento avançado pelo Exmo. Procurador no seu douto parecer, a questão não é apenas de não observância da regra enunciada. Dito de outro modo, no caso, não se trata apenas de um menor rigor na elaboração formal da sentença. Antes, de uma total ausência de factos já que o julgamento assentou em meras conclusões que a Meritíssima Juiz extraiu e “partilhou” com os demais intervenientes processuais.

3.2.11. Sublinhe-se que o julgamento de direito que sindicamos, tanto quanto coerentemente pode ser apreciado face ao quadro jurídico convocado e que se esgota na invocação de normativos atinentes às circunstâncias em que a coligação de Oponentes é admissível (que nada tem a ver com a legitimidade para deduzir, por si só ou conjuntamente uma acção para que nos remete a alegada falta ou irregularidade de citação de algum dos Oponentes ou com a questão da litispendência que aparentemente se verificará quanto a um deles), se alicerçou na conclusão de que não existe coincidência «na causa de pedir trazida aos autos pelos três oponentes, não resultando tampouco que o pedido de um se encontre prejudicado pelos pedidos dos outros, ou destes tenham dependência ou que a procedência dos pedidos dependa da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de Direito, pois se é verdade que todos os oponentes os mesmos fundamentos, o certo é que os períodos de gerência não são os mesmos, nas diversas datas da constituição das dívidas».

3.2.12. Ora, como está bem de ver, tais conclusões tinham obrigatoriamente que resultar de factos que tivessem sido descriminados, designadamente de factos que revelassem quais as causas de pedir que cada um dos Oponentes invocara, que períodos de tempo “de gerência” estavam em causa e que pedido cada um dos Oponentes havia formulado, de que resultava a tal conclusão de prejudicialidade ou dependência. Bem como, de factos que confirmassem que a apreciação desses pedidos (a haver vários) estavam efectivamente dependentes na sua apreciação da aplicação de distintas regras de direito.

3.2.13. Ora, não só tal discriminação não ocorreu como, em bom rigor, na mesma decisão, agora na parte do seu relatório, a Meritíssima Juíza, ao descrever os fundamentos imputou-os a todos os Oponentes em conjunto e identificou apenas um pedido de anulação.

3.2.14. Em suma, não é a mera aplicação de uma técnica jurídica menos rigorosa nem uma simples deficiência que enfrentamos no caso, mas uma total omissão de fundamentação dos factos que determinaram a decisão, tendo-se o Tribunal a quo limitado a exteriorizar as conclusões que extraiu de elementos que relevou no seu discurso, sem, também neste, aduzir factos que nos permitam compreender o raciocínio empreendido e que conduziu a essas mesmas conclusões. Note-se, de resto, o que não podemos deixar de sublinhar, que a Meritíssima Juíza convocou em abono da sua decisão um sumário de acórdão proferido em recurso jurisdicional dirigido a este Supremo Tribunal, de cuja leitura se conclui (tal como da sentença disponível no sitaf na sua integralidade) que a sentença objecto desse recurso fixara autonomamente os factos de que partira para extrair as conclusões de facto e de direito que suportaram essa mesma decisão, o que permitiu ao Tribunal ad quem sindicar esse mesmo julgamento (acórdão proferido no processo n.º 755/14, de 8-2-2017, integralmente disponível em www.dgsi.pt).

3.2.15. Como a doutrina vem realçando sucessivamente, é de extrema relevância que na sentença haja enunciação de factos, que seja realizado uma apreciação crítica dos elementos de prova em que se louvam e que a descrição imposta pelo artigo 607.º do CPC seja realizada de forma “fluente e harmoniosa”, sendo de afastar a que resulte de uma técnica de mera transcrição, referência ou meras conclusões. Ou seja, é imprescindível que o Juiz enuncie os factos provados e os factos não provados e use uma metodologia que permita perceber facilmente a realidade que considerou demonstrada e porque assim o considerou, de forma linear, lógica e cronológica, que seja, sem qualquer dúvida, apta a ser submetida às normas jurídicas aplicáveis e determinar o resultado da acção.

3.2.16. Daí que, sendo evidente que da sentença não constam as dívidas que estão em causa, que períodos a que elas se referem, que fundamentos foram invocados de modo distinto por cada um dos Oponentes (se é que foram), nem de que modo a causa de pedir de cada um se afasta da dos demais ou que permita compreender de que forma os pedidos se mostram prejudicados ou convocam quadros jurídicos distintos para a decisão individual, e não cabendo a este Supremo Tribunal Administrativo seleccionar e fixar a matéria de facto pertinente para a decisão (nem, aliás, e/ou previamente facultar aos Oponentes que se pronunciem sobre a questão da ilegalidade de coligação que o Tribunal a quo apenas no momento da elaboração esteve em condições de aferir dessa excepção e a decidir) há que anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos para, em conformidade com o exposto, ser fixada a factualidade relevante e proferida nova sentença.

3.2.17. Face ao que ficou decidido, julga-se prejudicada a apreciação do erro de julgamento de direito invocado pelos Recorrentes.

4. DECISÃO:

Termos em que, acordam os Juízes que integram a secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, concedendo provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos para os efeitos consignados no ponto 3. do presente acórdão.

Sem custas.

Registe e notifique.

Lisboa, 6 de Outubro de 2021 - Anabela Ferreira Alves e Russo (Relatora, que consigna e atesta, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, que têm voto de conformidade com o presente acórdão os Conselheiros integrantes da formação de julgamento – José Gomes Correia e Aníbal Augusto Ruivo Ferraz).