Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01563/14
Data do Acordão:04/15/2015
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:DECISÃO ARBITRAL
RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Sumário:O recurso para o STA de decisão arbitral pressupõe que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cfr. o n.º 2 do artigo 25.º RJAT), não devendo, ainda, o recurso ser admitido – ou sendo-o, não devendo prosseguir para conhecimento do respectivo mérito – se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. o n.º 3 do artigo 152.º do CPTA, aplicável “ex vi” do disposto no n.º 3 do artigo 25.º do RJAT)
Nº Convencional:JSTA000P18845
Nº do Documento:SAP2015041501563
Data de Entrada:01/07/2015
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira, vem, nos termos do n.º 2 do artigo 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para este Supremo Tribunal da decisão arbitral proferida em 24 de Novembro de 2014 no processo n.º 429/2014, por alegada contradição com o decidido no Acórdão deste STA de 18 de Junho de 2014, proferido no recurso n.º 1689/13, transitado em julgado.
A recorrente termina a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões:
A – Vem o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência, interposto da decisão arbitral proferida no processo n.º 429/2014 – T CAAD, que correu termos no Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, na parte que aqui nos interessa, ao fazer uma interpretação extensiva do disposto na verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA.
B – Com efeito, a decisão arbitral recorrida colide frontalmente com o Acórdão, já transitado em julgado, do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 18.06.2014, no âmbito do processo n.º 01689/13 (Acórdão fundamento), encontrando-se irremediavelmente inquinado do ponto de vista jurídico, por errada interpretação da referida norma.
C – Na decisão recorrida, o Tribunal Arbitral sufragou a interpretação de que as peças que compõem as próteses dentárias devem ser consideradas como estando previstas no teor da citada verba.
D) Sobre esta questão pronuncia-se o Acórdão fundamento em sentido totalmente oposto, ao concluir, no caso, que os bens previstos nas diferentes verbas da Lista I não são passíveis de interpretação extensiva.
E) Demonstrada está uma evidente contradição entre a decisão recorrida e o Acórdão fundamento, quanto à interpretação a dar ao teor da verba 2.6 da Lista I, ou seja, existe uma manifesta contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e, consequentemente, anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo Acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida (n.º 6 do artigo 152.º do CPTA).
F – A infracção a que se refere o n.º 2 do artigo 152.º do CPTA, consiste num erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal arbitral adoptou uma interpretação da referida norma em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente.
G – Tal interpretação encontra sustentação jurídica, no entender do Tribunal arbitral, no facto de “(…) todos os elementos de interpretação das normas fiscais convocáveis para o efeito, bem como as características do IVA e a interpretação que das mesmas o TJUE tem vindo a fazer, nos levam a concluir que, no caso presente, se deverá aplicar a taxa reduzida do IVA prevista na verba 2.6 da lista I anexa ao CIVA à transmissão de implantes, coroas e pilares ora sob análise (…)”
H – Decidindo assim que a comercialização de peças componentes das próteses dentárias, ainda que não estejam já na fase de substituição do órgão humano com deficiência, deve ser tributada à taxa reduzida.
I – Todavia, ficou devidamente demonstrado que a linha de raciocínio adoptada pelo colectivo de árbitros do Tribunal Arbitral, é ilegal.
J) Com efeito, a Lista I anexa ao Código do IVA tem natureza pautal e, como lista taxativa que é, não deixa ao critério do intérprete o preenchimento do conceito por forma a nele abranger todos os produtos que, de algum modo, participem da natureza do conceito “principal”.
K) Neste sentido aponta o Acórdão fundamento, ao considerar que « (…) ficaria ao critério do intérprete preencher o conceito e ser ele a determinar a taxa que como se sabe nos impostos é reserva de lei cfr artigo 103/2 da CRP. O que contraria a tipologia do Direito Fiscal. Frustrando-se também a directiva comunitária que como se sabe é obrigatória para todos os Estados Membros. Pelo que com o MºPº se concorda que a Lista I do CIVA tem natureza pautal, é uma lista taxativa. (…)”.
L) Assim sendo, o entendimento de que aquelas peças, componentes da prótese dentária, devem ser tributados à taxa reduzida, na fase de comercialização em que a A………… intervém, só a erro de julgamento pode ser imputado.

Termos em que deve o presente recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.

2 – Contra-alegou a recorrida A…………, Lda, concluindo nos seguintes termos:
A. O recurso para uniformização de jurisprudência do acórdão do Tribunal arbitral proferido no processo n.º 429/2014 – T do Centro de Arbitragem Administrativa (“acórdão recorrido”), por alegada contradição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no recurso n.º 01689/13 (“acórdão fundamento”), não deve ser admitido porquanto não estão verificados os requisitos substanciais de que depende a sua admissão.
B. Está consolidada a jurisprudência sobre quais são, em geral, os requisitos substanciais de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, e que, em consonância com o artigo 152.º do CPTA (ex vi o disposto no artigo 25.º do RJAT) exigem que (i) exista contradição entre um acórdão do TCA e/ou do STA e a decisão arbitral do CAAD; (ii) que essa contradição se verifique relativamente à mesma questão fundamental de direito; (iii) que a orientação perfilhada pelo acórdão impugnado não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA. (neste sentido cfr. Acórdão do Pleno do STA de 4 de junho de 2014, Processo n.º 01447/13, em que foi relator o Conselheiro Francisco Rothes).
C. Como vem sendo uniformemente entendido pelo Pleno do STA, mantêm-se válidos os critérios jurisprudenciais firmados ainda no domínio da LPTA que consideram ainda imprescindível à caracterização da “questão fundamental” sobre a qual deverá existir contradição referida no parágrafo anterior em (ii): (a) uma identidade substancial das situações de facto sobre que recaíram as decisões em confronto; (b) que a oposição resulte de decisões expressas, e não apenas de julgamentos implícitos; (c) que a oposição se verifique entre decisões e não entre a decisão de um e os fundamentos ou argumentos de outro.
D. A AT apresenta como estando em oposição dois acórdãos cujas situações não têm qualquer semelhança, sendo que o acórdão fundamento envolve dois produtos alimentares (“tofu” e “seitan”) e o acórdão recorrido trata de próteses por implantes dentários, sendo que, nos dois casos, as normas legais convocadas são também distintas.
E. A AT identifica a contradição quanto à questão fundamental de direito numa suposta “interpretação extensiva” feita pelo CAAD da norma apontada, quando a decisão em nenhum momento faz apelo a este critério hermenêutico, bem pelo contrário.
F. A AT – cfr. parágrafo 21 das alegações – conclui que existe “identidade de situações de facto, na medida em que em ambos os casos, é apreciada a questão da eventual sujeição a taxa reduzida de bens (não) especificados na Lista I anexa ao Código do IVA”, sendo esta conclusão totalmente desprovida de fundamento.
G. Os bens em causa no acórdão recorrido estão especificados na lista I anexa ao Código do IVA, ao contrário dos bens identificados no Acórdão fundamento. Os produtos e as normas legais são distintas. No acórdão recorrido estão em causa próteses por implantes dentários e a interpretação da norma constante da verba 2.6 da Lista de bens e serviços. No acórdão fundamento estão em causa produtos alimentares e a interpretação das normas constantes das verbas 1.1 e 1.4 da Lista de bens e serviços.
H. Como bem sustenta o Conselheiro Lopes de Sousa a “identidade substancial das situações fácticas deve ser entendida, no mínimo, como uma subsunção às mesmas normas legais”, pelo que, se a diferença entre as respetivas decisões decorre da diversidade das situações de facto (incluindo as normas legais a que respeitam), como sucede no caso vertente, não deve o recurso para uniformização de jurisprudência ser admitido, como se decidiu corretamente no Acórdão do Pleno do STA de 4 de Junho a propósito de uma situação que envolvia benefícios fiscais.
I. Em suma, sendo certo que ambos os arestos em confronto decidiram questões relativas ao IVA e à subsunção de produtos à lista anexa ao CIVA, não decidiram a mesma questão nem se debruçaram sobre situações de facto idênticas, pelo que não pode afirmar-se que entre eles existe oposição motivada por divergência de entendimentos jurídicos que possa servir de fundamento ao recurso para uniformização de jurisprudência.
J. ao contrário do que alega a AT, em nenhum momento o CAAD e o acórdão recorrido sustentam a decisão tomada na interpretação extensiva do preceito em causa, bem pelo contrário. O acórdão recorrido dedica vários parágrafos à questão da interpretação das normas fiscais, afirmando expressamente que o “sentido e alcance da taxa reduzida a aplicar neste domínio deverá ter em consideração as boas regras da hermenêutica, tendo em conta não só o elemento gramatical, como o respectivo contexto, a razão de ser e finalidades prosseguidas pela verba 2.6, devendo resultar numa interpretação declarativa (e não restritiva, ao contrário do que sustenta a AT)”
K. Como vem sendo jurisprudência pacífica do STA, “para ocorrer a aventada oposição é indispensável pois que sejam idênticos os factos neles tidos em conta e que em ambos os arestos a decisão haja assumido forma expressa, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a simples invocação de decisões implícitas”. Não há, pois, qualquer oposição ou sequer fricção entre as decisões invocadas. Não é necessário uniformizar algo que não está em desacordo, nem sequer implícito, pelo que também neste ponto se não verifica o requisito exigido para a apreciação do recurso.
L. Não existe qualquer oposição entre as decisões: ambas convocam os elementos de interpretação fiscal correctos, fazem uma boa aplicação das normas do CIVA, mas com resultados diversos, dada a falta de identidade dos factos.
M. A decisão recorrida está em perfeita sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, em particular com a seguida no processo n.º 065/13, onde estava em causa a aplicação da taxa reduzida às massas alimentícias secas e recheadas.
N. Por último, a título subsidiário, refira-se apenas que o Acórdão recorrido procedeu a uma correcta interpretação e aplicação do Direito à situação fáctica apurada, não merecendo qualquer censura ou reparo o itinerário cognoscitivo e valorativo, pelo que, se qualquer contradição existisse entre decisões, nenhuma dúvida poderia restar de que a solução harmonizada passaria pela adoção do sentido e fundamentos gizados pelo acórdão impugnado.
Nestes termos, e nos melhores de Direito:
a) Deve o recurso ser recusado, por não estarem verificados os respetivos pressupostos substanciais de admissibilidade, com as devidas consequências legais;
Subsidiariamente e caso o mesmo seja admitido,
b) Deve ser negado provimento ao mesmo, confirmando-se o acórdão recorrido e fixando-se jurisprudência que acompanhe o sentido do acórdão impugnado, tal como superiormente interpretado por V. Exas.


3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA emitiu o douto parecer de fls. 88 a 90 dos autos, oportunamente notificado às partes (fls. 91/92 dos autos), concluindo no sentido de que não se verificam os requisitos para prosseguimento do presente recurso para uniformização de jurisprudência.


4 – Cumprido o estipulado no n.º 2 do artigo 92.º do CPTA, cumpre decidir em conferência no Pleno da Secção.
- Fundamentação –

5 – Questões a decidir
Importa decidir previamente da verificação dos pressupostos substantivos dos quais depende o prosseguimento para conhecimento do mérito do presente recurso para uniformização de jurisprudência, a saber a existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão invocado como fundamento relativamente à mesma questão fundamental de direito e bem assim a de que a decisão arbitral recorrida não se encontre em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada da Secção.
Verificados aqueles pressupostos, haverá que conhecer do mérito do recurso, julgando se bem andou a decisão arbitral recorrida ao julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, anulando, com fundamento na violação da verba 2.6 da Lista I anexa ao CIVA, as liquidações de IVA e juros compensatórios sindicadas.

6 – Matéria de facto
6.1 É do seguinte teor o probatório fixado na decisão arbitral recorrida:
a. A Requerente A………… Lda, (doravante abreviadamente designada A………… ou SP), é uma sociedade unipessoal por quotas, com o seguinte objecto; “Industria e comércio de materiais dentários e representação de material e produtos relacionados com medicina dentária e odontologia, próprios e/ou de terceiros, incluindo importação e exportação daqueles produtos, bem como a actividade de investigação e desenvolvimento na área dentária e odontologia”.
b. Para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado, a empresa é sujeito passivo nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA e enquadrado no regime normal mensal nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIVA;
c. A coberto de quatro ordens de inspecção externas – OI201203084, OI201203085, OI201203086 e 201303297 – foram efectuadas correcções em sede de IVA e IRC, das quais a Recorrente foi notificada em 06.12.2013;
d. Em sede de IVA, a Autoridade Tributária e Aduaneira constatou que a Requerente, aquando da importação de mercadorias, suporta IVA à taxa normal, na alfândega, havendo nos termos dos artigos 19.º e 20.º do CIVA, o direito à dedução do mesmo, e a jusante, ou seja nas suas vendas, a Requerente liquidava IVA à taxa reduzida, em todos os materiais que fazem parte integrante do implante dentário, aplicando a taxa normal, apenas às mercadorias, que são utilizadas como utensílios pelos dentistas, para colocação e montagem de outros materiais, como é o caso por exemplo, das brocas e dos kits cirúrgicos;
e. A Requerente solicitou uma informação vinculativa à Direcção de Serviços do IVA, que teve o n.º 1371 e que foi proferida a 12.03.2009, onde foi informado que “os aparelhos comercializados pela Requerente não são aparelhos completos, não tendo enquadramento na verba 2.6 da Lista I anexa ao CIVA, estando tais materiais sujeitos à taxa normal”;
f. No ponto 5 da referida informação vinculativa informa-se que “(…) somente os aparelhos completos beneficiam de taxa reduzida de 5%, ficando a transmissão dos diversos componentes avulso, portes e peças, sujeito a IVA pela taxa normal.”;
g. Aplicando o entendimento da referida Informação Vinculativa, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções de IVA que vieram a dar origem às seguintes liquidações de IVA e juros compensatórios:
(listagem das 82 liquidações a fls. 37 a 43 dos autos, aqui dada por reproduzida)
h. O termo do prazo de pagamento voluntário das liquidações ocorreu em 31-03-2014;
i. A implantologia repõe dentes perdidos através de implantes dentários de titânio e coroas (Relatório da Inspecção Tributária fls. 12)
j. Os clientes da Requerente são médicos dentistas ou clinicas médico-dentárias que trabalham em implantologia (Relatório da Inspecção Tributária fls. 12)
k. O implante dentário é material de prótese que serve para substituir um dente natural (depoimento da testemunha B…………);
l. A prótese dentária por implante dentário é constituída por três elementos: implante, pilar e coroa (depoimento da testemunha B…………);
m. O implante é um parafuso de titânio que serve para substituir a raiz de um dente natural que, por qualquer motivo, foi extraído e para suportar um pilar de fixação e uma coroa dentária (depoimento da testemunha B…………);
n. Os implantes comercializados pela Requerente em Portugal podem assumir diversas designações comerciais, dependendo das características próprias de cada produto (material com que são feitos, dimensão, etc.) (depoimento das testemunhas B………… e C…………);
o. Os pilares comercializados pela Impugnante em Portugal podem assumir diversas designações comerciais, dependendo das características próprias de cada produto (material com que são feitos, dimensão, etc.) (depoimento das testemunhas B………… e C…………);
p. A coroa é normalmente elaborada por laboratórios de prótese dentária e necessita de se ajustar às características de dentição do paciente, pelo que é especificamente produzida para cada caso (depoimento das testemunhas B………… e C…………);
q. O procedimento cirúrgico de colocação de uma prótese dentária envolve três etapas e pode ter mais do que um interveniente, dado que envolve trabalho de cirurgia que tem de ser feito por um médico e trabalho de elaboração de prótese que tem de ser feito por um técnico de prótese, neste caso um protésico (depoimento da testemunha B…………);
r. A primeira etapa consiste no enterro cirúrgico do implante dentário nivelado com o osso, mas dentro da gengiva (depoimento da testemunha B…………);
s. Após a colocação do implante dentário tem início o processo de união do implante dentário ao osso, a chamada “osseointegração” (depoimento da testemunha B…………);
t. No final do processo de “osseointegração”, o implante dentário precisa de ser exposto através da remoção da gengiva sobrejacente (depoimento da testemunha B…………);
u. Numa segunda etapa, o cirurgião verifica o implante para confirmar se a osseointegração foi bem sucedida e, em caso afirmativo, colocar o pilar de fixação que penetra na gengiva (depoimento da testemunha B…………);
v. Numa terceira etapa, findo o processo de cicatrização que delimita o espaço a ocupar pelo implante, é fabricada e colocada a coroa dentária (dente artificial em porcelana) sobre o implante dentário osseointegrado (depoimento da testemunha B…………);
w. As três peças básicas com que é constituído o implante não têm qualquer outra utilização que não seja para fazer os implantes (depoimentos das testemunhas B………… e C…………);
x. Existem no mercado dezenas de modelos de cada uma destas três peças básicas com que é constituído o implante (depoimentos das testemunhas B………… e C………… e documentos n.ºs 84 e 85 juntos com a petição inicial, cujos teores se dão como reproduzidos);
y. A Requerente prestou garantia bancária para suspender o processo executivo n.º 3301201401107232, do Serviço de Finanças de Lisboa 4, instaurado para cobrança das quantias a que se reportam as liquidações atrás indicadas, tendo despendido até à data €9.773,38 (documento junto pela Requerente em 01-09-2014, cujo teor se dá como reproduzido);
z. Em 16-06-2014, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

6.2 Por sua vez, é do seguinte teor o probatório fixado no Acórdão fundamento:
1.º Em acção de fiscalização efectuada à impugnante foram realizadas correcções além do mais em relação aos exercícios de 2005 e 2006 por o sujeito passivo ter liquidado IVA à taxa reduzida de 5% sobre as vendas dos produtos acabados “tofu” e “seitan” (folhas 5 verso e 10 verso do relatório cujo conteúdo se dá por reproduzido).
2.º O tofu é feito a partir do feijão de soja o qual é posto de molho para expandir sendo-lhe extraído o leite e natas através do moinho. Este leite vai a uma determinada temperatura, depois é coalhado com magnésio/cloreto de magnésio, prensado com pesos para se obter o queijo (relatório folhas 5 verso cujo conteúdo se dá por reproduzido.).
3.º O “Seitan” é feito com farinha de trigo, amassado de forma igual ao pão, é extraído uma grande parte de amido amassado em bolas que vão para a panela cozer em água (relatório de folhas 5 vs cujo conteúdo se dá por reproduzido).
4.º Contra as liquidações foi apresentada reclamação graciosa nos termos constantes de fls. 3 e segs do apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido.).
5.º A qual foi indeferida por despacho de 11 06 2008 (folhas 27 do apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido.).


7 – Decidindo
7.1. Da verificação dos pressupostos substantivos do recurso
Dispõe o n.º 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT), ao abrigo da qual foi o presente recurso interposto, que: A decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é ainda susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Por sua vez, dispõe o n.º 3 do mesmo preceito legal que: Ao recurso previsto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral.
Importa, pois, em primeiro lugar, apreciar se existe oposição entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão deste STA invocado como fundamento quanto à mesma questão fundamental de direito e, após - caso seja de reconhecer a existência de tal oposição -, se a orientação perfilhada na decisão arbitral recorrida está ou não de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, pois que apenas no caso de o não estar haverá que admitir o recurso, ex vi do n.º 3 do artigo 152.º do CPTA (aplicável por remissão do n.º 3 do artigo 25.º do RJAT).
Como se deixou consignado no acórdão do Pleno desta secção do STA de 4 de Junho de 2014, rec. n.º 01763/13, para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento é exigível «que se trate do mesmo fundamento de direito, que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica e que se tenha perfilhado solução oposta nos dois arestos: o que, como parece óbvio, pressupõe a identidade de situações de facto, já que sem ela não tem sentido a discussão dos referidos pressupostos. Sendo que a oposição também deverá decorrer de decisões expressas, que não apenas implícitas. (Cfr., neste sentido, os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 25/3/2009, rec. nº 598/08 e do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo, de 22/10/2009, rec. nº 557/08; bem como Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2010, pp. 1004 e ss.; e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 44 ao art. 279º pp. 400/403.)».
Vejamos se tais pressupostos se verificam no caso dos autos.
Na decisão arbitral recorrida, a questão decidenda era a de saber se a transmissão “individualizada” das coroas, implantes e pilares poderá ser tributada à taxa reduzida de 6% por se subsumir no âmbito do disposto na verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), tendo o tribunal arbitral concluído, depois de profícua fundamentação, que quer apenas por recurso às regras comunitárias quer por aplicação simples das boas regras da hermenêutica jurídica, o resultado é o mesmo – só poderá concluir-se que na verba 2.6 da Lista I anexa ao CIVA se incluem quer os implantes constituídos por uma peça única quer os implantes compostos (…), pelo que se deverá aplicar a taxa reduzida do IVA prevista na verba 2.6 da Lista I anexa ao CIVA à transmissão dos implantes, coroas e pilares ora sob análise, sendo que, em consequência, decidiu que as liquidações de IVA impugnadas enfermam de erro sobre os pressupostos de direito, por errada interpretação desta verba 2.6 da Lista I ao CIVA, o que determinou a procedência do pedido de pronúncia arbitral e a anulação das liquidações sindicadas.
Por sua vez, no Acórdão fundamento – Acórdão deste STA de 18 de Junho de 2014, proferido no recurso n.º 01689/13 -, a questão decidenda era a de decidir se o produto “Tofu” deveria ter sido qualificado como produto alimentar e a sua transacção sujeita à taxa reduzida de 5% de acordo com a Lista I do CIVA, alegando a recorrente que, à semelhança do que a 1.ª instância decidira em relação ao “Seitan”, se devia considerar o “Tofu” na linha 1.6, já que a soja é uma leguminosa, ou, face ao seu processo de produção e acabamento como produto similar ao queijo que está inserido na linha 1.4.4.. O STA negou provimento ao recurso interposto, confirmado o entendimento firmado em 1.ª instância no sentido da não sujeição do “tofu” à taxa reduzida de IVA, porquanto, à data dos factos, se tratava de produto não expressamente contemplado de forma inequívoca na Lista I, sendo, aliás, nesse entendimento que se compreende a posterior introdução nessa lista como produtos alimentares o seitan e o tofu pois de outra forma não havia necessidade alguma de expressamente os incluir nela deixando-se ao intérprete o preenchimento do conceito numa correcta interpretação do mesmo.
Parece, pois, manifesto, que estando em causa em ambos os arestos questão relativa à aplicação da taxa reduzida de IVA (Lista I anexa ao Código do IVA), não são idênticos nem os factos que lhes subjazem (desde logo porque em causa estão produtos de natureza e finalidade diversa), nem as concretas normas jurídicas interpretandas (porquanto a decisão recorrida procedeu concretamente à interpretação da verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA, não sendo essa norma interpretada ou sequer referida no Acórdão fundamento, pois que o não tinha de ser).
Acrescente-se, ainda, que não é verdade que a decisão arbitral recorrida tenha procedido a uma interpretação extensiva da verba 2.6 da Lista I anexa ao CIVA, como alegado pela recorrente (cfr. conclusões C) e D) das suas alegações de recurso). A decisão arbitral rejeitou, sim, a interpretação restritiva dessa norma propugnada pela Administração fiscal, procedendo a uma interpretação declarativa desta, de acordo com os bons princípios da hermenêutica jurídica e tendo em conta as características do IVA e a interpretação que das mesmas o TJUE tem vindo a fazer.

Conclui-se, pois, não haver entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão invocado como fundamento oposição quanto à mesma questão fundamental de direito, razão pela qual não deve o presente recurso prosseguir.

- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do recurso.

Custas pela recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, pois que o presente recurso findou sem conhecimento do mérito da pretensão da recorrente daí que se tenha revestido de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes a tal não obsta.

Comunique-se ao CAAD.

Lisboa, 15 de Abril de 2015. - Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) - Dulce Manuel da Conceição Neto - Joaquim Casimiro GonçalvesJosé da Ascensão Nunes Lopes - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Pedro Manuel Dias DelgadoAna Paula da Fonseca LoboJosé Maria da Fonseca Carvalho.