Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0277/11
Data do Acordão:01/25/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JORGE DE SOUSA
Descritores:IRC
MÉTODOS INDIRECTOS
CORRECÇÃO TÉCNICA
REVISÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL
INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
DOCUMENTO
ACORDO
REMISSÃO
CAUSA DE PEDIR
CONVITE A CORRECÇÃO DA PETIÇÃO
FALTA
Sumário:I - Do art. 86.º, n.º 4, da LGT e do art. 117.º, n.º 1, do CPPT retira-se a regra de que não pode ser invocada na impugnação do acto de liquidação ilegalidade da fixação da matéria tributável resultante de acordo obtido no procedimento de revisão, previsto nos arts. 91.º e 92.º da mesma Lei, quer quanto às operações de quantificação através de métodos indirectos, quer relativamente à decisão de os utilizar.
II - No entanto, essa regra não tem valor absoluto, podendo, designadamente, ser questionada em processo de impugnação judicial a legalidade do procedimento em que foi obtido o acordo, o abuso de poderes de representação pelo representante do contribuinte e a violação de competências legais.
III - Como resulta do teor expresso daquele n.º 14 do art. 91.º da LGT, as correcções meramente aritméticas da matéria tributável resultantes de imposição legal estão fora do âmbito do procedimento de revisão e, por isso, o acordo que quanto a elas se formar no procedimento de revisão implica violação de competências legais, na terminologia do art. 62.º, n.º 1, do CPPT.
IV - No que concerne ao que no procedimento de revisão for acordado sobre as correcções meramente aritméticas não vale a restrição à impugnabilidade que se estabelece no n.º 4 do art. 86.º da LGT, pois ela abrange apenas as situações em «que a matéria tributável tenha sido determinada com base em avaliação indirecta».
V - Se na petição inicial de impugnação judicial o impugnante remete para documento junto quanto à descrição de factos em que se baseia a impugnação, não se está perante de ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir, mas sim perante uma deficiência na indicação da causa de pedir, pois a exposição «dos factos que factos e as razões de direito que fundamentam o pedido» deve constar da própria petição, como impõe o n.º 1 do art. 108.º do CPPT.
VI - Havendo deficiências da petição, o Tribunal deve convidar o impugnante a supri-las, no prazo que designar, como lhe impõe o n.º 2 do art. 110.º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00067367
Nº do Documento:SA2201201250277
Data de Entrada:03/24/2011
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF COIMBRA PER SALTUM
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC
DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:LGT98 ART48 ART49 ART86 N4 ART91 ART92 ART16 N1
CPPTRIB99 ART2 E ART117 N1 ART125 ART62 N1 ART98 N1 ART108 ART110 N2
CPC96 ART193 ART660 N2
CCJ96 ART2 N1 G
CCIV66 ART258 N1 ART1178 N1
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC656/04 DE 2004/11/23; AC STA PROC62/10 DE 2010/09/15; AC STA PROC657/04 DE 2004/11/23
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A……, LDA, impugnou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra liquidações de IRC relativas aos anos de 2001 e 2002 e juros compensatórios, bem como os actos que determinaram a utilização de métodos indirectos e correcções técnicas.
A Recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões:
1.º
O recorrente Impugnou o IRC dos anos de 2001 e 2002 e respectivos juros compensatórios nos montantes de 85.547,82€ e 72.173,51€, no valor global de 157.721,33€.
2.º
As liquidações de tributos de IRC de 2001 e 2002, atento o decurso de tempo já se operou a prescrição e era de conhecimento oficioso.
3.º
O acordo obtido pelo perito da impugnante sem autorização não preclude o direito á impugnação judicial dos tributos por métodos indirectos.
4.º
A senhora juiz ao não aceitar a reprodução na petição de factualidade alegada em documento deveria ter mandado aperfeiçoar a petição.
6.º
Na Lei de 2001 e 2002 o contribuinte tem de ser notificado para exercer o direito de audição antes do recurso aos métodos indirectos
7.º
No que às correcções técnicas diz respeito decide, que por falta de alegação de factos que a petição é inepta
8.º
A senhora juíza deveria ter ouvido a testemunha arrolada pela impugnante.
9.º
A senhora juíza faz omissão de pronúncia quando não conhece outros vícios do procedimento inspectivo
10.º
Esta decisão simplista com colagem ao parecer do EMMP, denega objectivamente a justiça
11.º
Foram violadas as seguintes regras artigos 48º, 60º da LGT, 668º, 496º, 508, 156º e 158º todos do CPC.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre muito douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento, revogando-se a decisão recorrida por nulidade, substituindo-se por outra que mande ampliar a matéria de facto ou que declare a nulidade ou anulabilidade das liquidações.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Ministério Público não emitiu parecer, no prazo legal.
A Meritíssima Juíza que proferiu a sentença recorrida entende que não ocorre a invocada nulidade por omissão de pronúncia, por o conhecimento das questões cuja omissão a Recorrente refere ter ficado prejudicado pela decisão dada à excepção invocada pela Fazenda Pública.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
1 - A impugnante foi alvo de uma acção inspectiva, relativa aos exercícios de 2001 e 2002 e que incidiu sobre os impostos de IVA e de IRC - Relatório de Inspecção de fls. 176 e seguintes do PA, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais
2 - Da acção de inspecção, referida no parágrafo antecedente, resultaram para os exercícios de 2001 e 2002, quanto ao IRC, correcções aritméticas à matéria tributável e correcções baseadas na aplicação de métodos indirectos, de acordo com a tabela infra: - citado Relatório de Inspecção.

3 - Em consequência do referido no parágrafo antecedente, foram fixados os seguintes rendimentos líquidos apurados por métodos indirectos:
IRC ano de 2001: €230.303,41
IRC ano de 2002: € 300.286,29 - ofício de fls. 173 do PA e que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
4 - No âmbito da acção de inspecção, supra referida, foi a impugnante devidamente notificada para querendo, exercer o seu direito de audição, ao abrigo do artigo 60.º da LGT antes da conclusão do relatório - notificação e registo dos correios de fls. 3 e fls. 4 do PA e projecto de Relatório de fls. 5 e seguintes do PA que aqui se dão por reproduzidos.
5 - Não se conformando com a fixação da matéria tributável, efectuada através de métodos indirectos, com os fundamentos que constam do Relatório de Inspecção (cujo conteúdo já foi dado como reproduzido) e que foi regularmente notificado à impugnante, esta deduziu pedido de revisão da matéria tributável, de acordo com o disposto nos artigos 86.º e 91.º da LGT - notificação e registo do correio de fls. 174 e seguintes do PA e articulado do pedido de revisão de fls. 206 e seguintes do PA, que aqui se dão por reproduzidos.
6 - No procedimento de revisão referido no parágrafo antecedente, efectuado a solicitação da impugnante, foi designado perito por esta, que interveio em sua representação, nas reuniões agendadas para dias 16 e 28 de Janeiro e 2 e 9 de Fevereiro de 2004 - Actas de fls. 216 e seguintes do PA e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
7 - No processo de revisão da matéria tributável efectuado segundo o regime previsto nos artigos 91.º e segs. da LGT foi obtido acordo, tendo sido fixados como lucros tributáveis, quanto ao IRC para os exercícios de 2001 e 2002 os montantes respectivamente de € 208.856,52 e € 199.583,28 - Acta n.º 03C/LGT junta de fls. 219 e segs. do PA e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
8 - Em 04/08/2004 foram efectuadas as liquidações adicionais de IRC e respectivos juros compensatórios, ora em crise, as quais tiveram por base o acordo obtido no processo de revisão da matéria tributável efectuado, segundo o regime previsto na LGT e as correcções efectuadas à matéria tributável, por métodos directos, referidos em 4.2.2. - documentos de cobrança de fls. 8 a fls. 13 dos autos e que aqui se dão por reproduzidos, Relatório de Inspecção de fls. 176 e segs. do PA e Acta n.º 03C/LGT, de fls. 219 e segs. do PA, cujos conteúdos se dão aqui por integralmente reproduzidos.
3 – A Recorrente suscita a questão prévia da prescrição do direito de cobrança do IRC liquidado relativamente aos anos de 2001 e 2002.
A prescrição do direito de cobrança dos tributos que são objecto de actos de liquidação é viável em processo de impugnação judicial, embora não tenha a ver com a legalidade desses actos, por permitir concluir pela inutilidade da lide.
Porém, a apreciação da prescrição das dívidas tributárias não depende só do decurso do prazo geral de prescrição, previsto no art. 48.º da LGT, pois há causas interruptivas e suspensivas, previstas no art. 49.º.
Por isso, o reconhecimento da ocorrência da prescrição em processo de impugnação judicial, como causa de inutilidade da lide, apenas pode ser efectuado quando o Tribunal dispõe de todos os elementos necessários para afirmar que não ocorreram causas de interrupção e suspensão para além das que constem do próprio processo de impugnação, designadamente as que podem advir da eventual pendência de processo de execução fiscal e sua paragem (art. 49.º, n.ºs 1 e 3, nas redacções iniciais).
Assim, apenas com base no presente processo não é viável apreciar se ocorreu ou não a prescrição.
Por isso, improcede a questão prévia suscitada que, pelo que se disse, é a da inutilidade da lide.
4 – O Recorrente imputa à sentença recorrida nulidade por omissão de pronúncia, por não se terem apreciado os vícios do procedimento inspectivo.
A nulidade de sentença por omissão de pronúncia, prevista no art. 125.º do CPPT) verifica-se quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre questões sobre as quais deveria ter-se pronunciado.
Esta nulidade está conexionada com os deveres de cognição do Tribunal, previstos no art. 660.º, n.º 2, do CPC, em que se estabelece que o juiz tem o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
No caso em apreço na sentença recorrida decidiu-se que não é contenciosamente impugnável a fixação da matéria tributável efectuada no procedimento de revisão, por ter sido efectuada por acordo e que ocorre ineptidão da petição quanto às correcções aritméticas subjacentes à liquidação do IRC de 2001.
Isto é, entendeu-se que havia obstáculos ao conhecimento do mérito da impugnação quer quanto à quantificação da matéria tributável operada por métodos indirectos no âmbito do procedimento de revisão, quer quanto às correcções técnicas.
Por isso, o conhecimento das questões atinentes ao mérito da impugnação ficou prejudicado pela solução dada às referidas questões prévias.
Consequentemente, tendo em conta a parte final do n.º 2 do art. 660.º do CPC, o não conhecimento do mérito não envolve omissão de pronúncia.
5 – A Recorrente defende que o acordo obtido pelo perito da impugnante sem autorização não preclude o direito à impugnação judicial dos tributos por métodos indirectos.
O procedimento de revisão da matéria tributável está previsto nos arts. 91.º e 92.º da LGT.
O art. 91.º, n.º 14, limita o âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, estabelecendo que «as correcções meramente aritméticas da matéria tributável resultantes de imposição legal e as questões de direito, salvo quando referidas aos pressupostos de determinação indirecta da matéria tributável, não estão abrangidas pelo disposto neste artigo».
O art. 92.º da LGT, estabelece nos seus n.ºs 3 a 5, o seguinte:
3. Havendo acordo entre os peritos nos termos da presente subsecção o tributo será liquidado com base na matéria tributável acordada.
4. O acordo deverá, em caso de alteração da matéria inicialmente fixada, fundamentar a nova matéria tributável encontrada.
5. Em caso de acordo, a administração tributária não pode alterar a matéria tributável acordada, salvo em caso de trânsito em julgado de crime de fraude fiscal envolvendo os elementos que serviram de base à sua quantificação, considerando-se então suspenso o prazo de caducidade no período entre o acordo e a decisão judicial.
Relativamente à impugnação judicial de actos de fixação da matéria tributável por métodos indirectos, o n.º 4 do art. 86.º da LGT estabelece que «na impugnação do acto tributário de liquidação em que a matéria tributável tenha sido determinada com base em avaliação indirecta, pode ser invocada qualquer ilegalidade desta, salvo quando a liquidação tiver por base o acordo obtido no processo de revisão da matéria tributável regulado no presente capítulo».
Na sentença recorrida entendeu-se que resulta deste art. 86.º, n.º 4, da LGT que o contribuinte que tenha chegado a acordo com a Administração Tributária no âmbito da Comissão de Revisão não pode impugnar a fixação da matéria tributável.
É inequívoco, à face da parte final desta norma, que se afasta a possibilidade de impugnação judicial da fixação da matéria tributável quando a liquidação se tenha baseado no acordado no procedimento de revisão, previsto nos arts. 91.º e 92.º da LGT.
A estatuição no sentido de não poder ser invocada na impugnação do acto de liquidação a matéria tributável resultante de acordo obtido no procedimento de revisão tem o alcance de expressar que não é admitida quer a impugnação autónoma quer a impugnação do acordado.
Por outro lado, o procedimento de revisão abrange não só as operações de quantificação através de métodos indirectos, mas também a decisão de os utilizar, como evidencia o art. 117.º, n.º 1, do CPPT, ao estabelecer a regra de que «a impugnação dos actos tributários com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos depende de prévia apresentação do pedido de revisão da matéria tributável». Na verdade, se a impugnação dos actos tributários com base em erro nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos depende de prévia apresentação do pedido de revisão da matéria tributável, é forçoso concluir que este procedimento abrange a decisão de utilização de métodos indirectos.
Por isso, o acordo a que se referem os n.ºs 3 a 5 do art. 92.º da LGT, que, pondo termo ao procedimento, abrange necessariamente tudo o que nele pode ser questionado, implica concordância não só sobre a forma como foram aplicados os métodos indirectos, mas também sobre a existência de uma situação em que eles podem ser utilizados.
Assim, é de concluir que o regime que resulta da lei ordinária é o de que o acordo no procedimento de revisão da matéria tributável abrange tanto a decisão de utilização de métodos indirectos como a forma como foram utilizados para quantificar a matéria tributável e que se proíbe, quanto a esses pontos, a impugnação da liquidação que for efectuada com base no acordo.
Mas, isto não significa que seja proibida, em absoluto, a impugnação da liquidação efectuada com base no acordo, pois este regime pressupõe, naturalmente, a validade do acordo e a sua oponibilidade ao contribuinte.
Ficará aberta, assim, a possibilidade de impugnação da liquidação efectuada com base no acordo invocando ilegalidade procedimental que afecte a sua validade. (Neste sentido, podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de 23-11-2004, processo n.º 656/04, e de 15-9-2010, processo n.º 62/10.)
O art. 62.º, n.º 1, do CPPT confirma esta interpretação no sentido do carácter não absoluto da proibição de impugnação da liquidação efectuada com base no acordo, ao estabelecer que «em caso de a fixação ou a revisão da matéria tributável dever ter lugar por procedimento próprio, a liquidação efectua-se de acordo com a decisão do referido procedimento, salvo em caso de esta violar manifestamente competências legais», o que supõe que o contribuinte possa questionar a validade do acordo, pois estabelece-se que «a declaração da violação das referidas competências legais pode ser requerida pelo contribuinte» (n.º 2 deste art. 62.º).
Por outro lado, assentando o acordo na intervenção de um representante do contribuinte, será aplicável o regime próprio da representação, quanto à vinculação do sujeito passivo pela actuação deste perito, da mesma forma que tal vinculação existe no domínio do direito civil (arts. 1178.º, n.º 1, e 258.º do Código Civil), o que tem suporte explícito no art. 16.º, n.º 1, da LGT que, com carácter geral, estabelece que «os actos em matéria tributária praticados pelo representante em nome do representado produzem efeitos na esfera jurídica deste, nos limites dos poderes de representação que lhe forem conferidos por lei ou por mandato». (Neste sentido, pode ver-se o acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 23-11-2004, processo n.º 657/04.)
No caso em apreço, a Impugnante não alegou na petição inicial factos que permitam concluir que o seu representante excedeu os poderes que lhe foram conferidos, pelo que não pode, por este motivo, admitir-se a impugnação do acordado, quanto ao que é objecto do procedimento de revisão.
Mas, o mesmo não sucede relativamente às correcções meramente aritméticas.
Na verdade, no caso em apreço, a matéria tributável acordada no procedimento de revisão para os anos de 2001 e 2002 apenas assenta na aplicação de métodos indirectos quanto aos meses de Dezembro de 2001 e Janeiro a Novembro de 2002, «tendo os valores corrigidos nos restantes meses daqueles exercícios sido considerados como correcções de natureza meramente aritmética», como se refere na nota a) do ponto 4.º da acta que pôs termo ao procedimento de revisão (a fls. 24).
Ora, como resulta do teor expresso daquele n.º 14 do art. 91.º da LGT, as correcções meramente aritméticas da matéria tributável resultantes de imposição legal estão fora do âmbito do procedimento de revisão e, por isso, o acordo quanto a elas implica violação de competências legais, na terminologia do referido art. 62.º, n.º 1, do CPPT.
De qualquer modo, quanto ao acordado sobre as correcções meramente aritméticas, não vale a restrição à impugnabilidade que se estabelece no n.º 4 do art. 86.º da LGT, pois ela abrange apenas as situações em «que a matéria tributável tenha sido determinada com base em avaliação indirecta».
Ora, no caso em apreço, a Recorrente censura a aplicação das correcções técnicas (artigos 16.º e 17.º da petição) e, nesta parte, o acordado, que está para além do âmbito do procedimento de revisão, pode ser impugnado, pois não vale quanto a tal matéria a restrição à impugnabilidade que resulta daquele n.º 4 do art. 86.º.
Assim, conclui-se que o Recorrente tem razão quanto à questão da possibilidade de impugnar o acordado, quanto às correcções meramente aritméticas efectuadas, inclusivamente quanto à questão da natureza dessas correcções.
6 – Na sentença recorrida, entendeu-se que a petição inicial é inepta, «na parte das liquidações que têm subjacente correcções aritméticas», por em suma, não ser admissível que a alegação de factos seja efectuada através de remissão para outra petição, respeitante a um procedimento administrativo e relativa a outro imposto, o que tem como corolário que a petição, nessa parte, careça de causa de pedir.
O art. 98.º, n.º 1, do CPPT estabelece que é nulidade insanável do processo de impugnação judicial a ineptidão da petição inicial.
Na falta de normas do CPPT que esclareçam quando é que a petição inicial se deve considerar inepta, é necessário fazer apelo ao art. 193.º do CPC, ao abrigo da alínea e) do art. 2.º do CPPT.
Este artigo 193.º, no que aqui interessa, estabelece o seguinte:
(...)
2. Diz-se inepta a petição:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
(...)
No caso em apreço, não se está propriamente perante uma situação de falta de causa de pedir, pois ela é detectável no documento junto com a petição inicial.
O que há é deficiência na indicação da causa de pedir, pois a exposição «dos factos que factos e as razões de direito que fundamentam o pedido» deve constar da própria petição, como resulta do n.º 1 do art. 108.º do CPPT.
Mas, havendo deficiências da petição, o Tribunal deve convidar o impugnante a supri-las, no prazo que designar, como impõe o n.º 2 do art. 110.º do CPPT e pretende a Recorrente.
Por isso, também nesta parte o recurso merece provimento.
Termos em que acordam em conceder provimento ao recurso, em revogar a sentença recorrida e ordenar que o processo baixa ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, a fim de ser formulado convite à Impugnante para correcção da referida deficiência da petição inicial, seguindo-se os ulteriores termos do processo, se a tal nada obstar.
Sem custas, por a Fazenda Pública não ter contra-alegado [art. 2.º, n.º 1, alínea g), do CCJ].
Lisboa, 25 de Janeiro de 2012. – Jorge Manuel Lopes de Sousa (relator) – Valente Torrão – Dulce Neto.