Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0183/15
Data do Acordão:04/08/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:ACTO DE PROCESSAMENTO DE VENCIMENTOS
REPOSIÇÃO DE QUANTIAS
REVOGAÇÃO DE ACTO INVÁLIDO
Sumário:É de admitir revista estando em discussão a conjugação do disposto no artigo 141.º do CPA com o regime de reposição de quantias estabelecido no artigo 40.º do DL 155/92, de 28.7.
Nº Convencional:JSTA000P18808
Nº do Documento:SA1201504080183
Data de Entrada:02/20/2015
Recorrente:MEC
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1.1. A…………. intentou acção administrativa especial contra o Ministério da Educação, pedindo a anulação do Despacho n.º 3/2008, do Presidente do Conselho Directivo da Escola Secundária ………………., de 17/03/2008, que alegadamente revogou a sua progressão ao 6.º escalão da antiga carreira docente, progressão com efeitos a 01/09/2006, e determinou que se procedesse ao acerto de contas, ao abrigo do artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28/07, com devolução aos cofres do Estado dos montantes auferidos indevidamente.
O autor requereu, ainda, a condenação do réu a posicioná-lo «no actual 3.º escalão da nova estrutura da carreira docente, com efeitos a partir de 01/01/2008 e a definir a data da próxima progressão, com todas as consequências legais».

1.2. O TAF de Aveiro, por acórdão de 31/01/2013 (fls. 268/279), julgou a acção procedente.

1.3. O Ministério da Educação e Ciência recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte que, por acórdão de 25/09/2014 (fls. 3704/388), negou provimento ao recurso.

1.4. É desse acórdão que o mesmo Ministério vem interpor recurso, com invocação do artigo 150.º do CPTA.
Alega que «a questão controvertida reveste-se de importância fundamental atenta a sua relevância jurídica e social, sendo a aceitação do recurso visivelmente essencial para uma melhor aplicação do direito».
Defende que apreciação das questões pelo acórdão sob censura não segue a jurisprudência proferida por este Supremo Tribunal, no que toca ao regime de devolução aos cofres do Estado, nos termos do artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28/07, dos montantes indevidamente auferidos.

1.5. O recorrido sustenta a não admissão da revista.

Cumpre apreciar e decidir.

2.1. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada no acórdão recorrido.

2.2. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».
A jurisprudência deste STA, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. Trata-se, efectivamente, não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

2.3. A problemática que o recorrente pretende ver apreciada no recurso de revista é a de saber se o prazo prescricional previsto no artigo 40.º, n.ºs 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28/06, Regime da Administração Financeira do Estado, na redacção introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30/12/2004, é aplicado ao caso vertente, como defende, e não o regime previsto no artigo 141.º do CPA.
Segundo o recorrente, o acórdão recorrido, ao confirmar o acórdão proferido na 1.ª instância, julgando procedente a presente acção, afasta-se da jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal acerca da reposição nos cofres do Estado de quantias indevidamente recebidas.
Diga-se que o acórdão recorrido não desconheceu, nomeadamente, o acórdão do Pleno, de 05/06/2008, no Processo n.º 01212/06, que fixou a jurisprudência de que «O despacho que ordena a reposição nos cofres do Estado de quantias indevidamente recebidas, dentro dos cinco anos posteriores ao seu recebimento, ao abrigo do art. 40º, nº 1 do DL nº 155/92, de 28 de Julho, não viola o art. 141º do Código do Procedimento Administrativo, atento o disposto no nº 3 do DL nº 155/92, de 28 de Julho, preceito de natureza interpretativa introduzido pelo art. 77º da Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro».
Porém, entendeu que não se aplicava esse entendimento em situações em que tivesse havido definição de determinada progressão de escalão, sem revogação ou impugnação no prazo de um ano.
No caso dos autos, o recorrido, ao concluir um mestrado solicitou a bonificação do tempo de serviço (quatro anos), previsto no artigo 54.º do Estatuto da Carreira Docente. Esta bonificação foi-lhe outorgada, por despacho de 10/12/2004, tendo sido posicionado no 5.º escalão/índice 188, com efeitos a 01/11/2004 e, simultaneamente, foi definida a sua transição para o 6.º escalão/índice 205, com efeitos a partir de 01/09/2006, «se até lá não tiver tempo a descontar nos termos do artigo 37.º do Estatuto da Carreira Docente» (fls.37).
E partir dessa data, de 2006, começou a ser processado pelo 6.º escalão.
O Despacho n.º 3/2008 (acto impugnado) considerou que não se poderia ter verificado a progressão ao 6.º escalão, por ser contrária ao disposto na Lei n.º 43/2005, de 29/08, a qual procedeu ao congelamento das progressões dos funcionários, agentes e outros trabalhadores da administração pública central, regional e local e pelos demais servidores do Estado.
O acórdão não chegou a discutir a questão da legalidade da progressão, atento o entendimento que perfilhou quanto à impossibilidade de se determinar a reposição, por desrespeito do regime do artigo 141.º do CPA.
Os autos podem, desde logo, levantar a questão de saber se houve efectivamente acto determinador de progressão ao 6.º escalão.
Mas, independentemente dessa matéria de interpretação sobre os factos assentes, a verdade é que é relevante saber da efectiva compatibilidade do acórdão com o entendimento jurisprudencial uniformizador, e no fim de contas, com o regime legal.
Sendo a matéria complexa e podendo repetir-se, justifica-se a admissão da revista.

3. Pelo exposto, admite-se a revista.

Lisboa, 8 de Abril de 2015. – Alberto Augusto Oliveira (relator) – Vítor Gomes – São Pedro.