Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0992/06
Data do Acordão:12/20/2006
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:BAETA DE QUEIROZ
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL.
RECURSO JUDICIAL.
CONTAGEM DE PRAZO.
Sumário:O prazo para recorrer da decisão administrativa que aplica coima por uma infracção contra-ordenacional fiscal é de 20 dias a contar da sua notificação, suspendendo-se aos sábados, domingos e feriados.
Nº Convencional:JSTA00063740
Nº do Documento:SA2200612200992
Data de Entrada:10/06/2006
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF PONTA DELGADA.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA ORDENAÇÃO TRIB.
Legislação Nacional:RGIT01 ART80 N1.
DL 433/82 DE 1982/10/27 NA REDACÇÃO DO DL 244/95 DE 1995/09/14 ART60.
Aditamento:
Texto Integral: 1.1. A…, com sede em Ponta Delgada, recorre da sentença de 20 de Julho de 2006 do Mmº. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada que julgou intempestivo o recurso deduzido contra decisão administrativa aplicadora de coima por infracção fiscal.
Formula as seguintes conclusões:
«A.
A recorrente não discorda da matéria de direito invocada pelo Juiz a quo, mormente, do preceito legitimador de interposição do recurso judicial da decisão de aplicação de coima;
B.
Porém, discorda da forma de contagem do prazo constante no artigo 80° do RGLT;
C.
O Meritíssimo Juiz a quo deveria, em face da presença da lacuna legal, ter-se socorrido do direito subsidiário contra-ordenacional, in casu, o RGCO;
D.
De acordo com o artigo 60° do RGCO "o prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa suspende-se aos sábados, domingos e feriados";
E.
Conforme transcrições devidamente enunciadas/citadas no presente articulado, é Doutrina assente que a contagem do prazo dos 20 dias se materializa com a suspensão aos Sábados, Domingos e Feriados;
F.
É, outrossim, Jurisprudência unânime do Tribunal Central Administrativo e do Supremo Tribunal Administrativo que a contagem do prazo dos 20 dias se consolide e consubstancie no artigo 60° do RGCO;
G.
De resto, a própria Administração Tributária nos seus ensinamentos, propugna essa regra de contagem do prazo legal de interposição do recurso judicial de aplicação de coima;
H.
Assim, tendo a notificação ocorrido a 16 de Maio de 2006, e o recurso sido expedido por via postal registada em 12 de Junho de 2006, tal dimana axiomaticaniente que o recurso foi interposto dentro do prazo legal.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida e proferida nova decisão de mérito, favorável ao recorrente, que declare tempestivo o Recurso Legalmente Interposto».
1.2. A Fazenda Pública contra-alega, sem se referir à sentença impugnada nem defender a sua manutenção ou revogação, concluindo deste modo:
«Constata-se que a instauração do processo de contra ordenação decorreu dentro da legalidade, que face ao descrito e uma vez que a recorrente não apresentou a declaração, nem entregou atempadamente o imposto nos cofres do estado, a coima era devida e a decisão da fixação da coima, resultou da conjugação de todos os elementos que deram lugar à prática da infracção, bem como a aplicação da lei em vigor para a referida infracção».
1.3. O Exmº. Procurador-Geral Adjunto é de parecer que o recurso merece provimento, pelas razões aduzidas pela recorrente, que «faz a melhor interpretação das disposições combinadas dos artºs. 80º nº 1 e 3º al. b) RGIT e 60º nº 1 e 2 do DL nº 433/82, de 27.10 (alterado pelo DL nº 356/89, de 17.10, que também o republica)».
1.4. O processo tem os vistos dos Exmºs. Adjuntos.
***
2. A decisão recorrida é do seguinte teor:
«Compulsados os presentes autos de recurso de decisão de aplicação de coimas em que figura como arguida e recorrente a sociedade “A…”, com sede na Avenida …, n.° …-…, …, em Ponta Delgada, constato que os mesmos foram deduzidos fora do respectivo prazo legal de interposição. Senão, vejamos:
Em 15 de Setembro de 2005 foi instaurado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada o processo de contra-ordenação fiscal n.° … contra essa arguida, por ter a mesma apresentado fora de prazo a sua declaração periódica de IVA, relativa a Setembro de 2003 — deveria tê-la apresentado até 17 de Novembro de 2003 e fê-lo apenas em 24 de Maio de 2004 —, juntando com ela o respectivo meio de pagamento do imposto no montante de 26.436,63 (vinte e seis mil, quatrocentos e trinta e seis euros e sessenta e três cêntimos), conforme o documento de fls. 2 e o auto de notícia que ora constitui fls. 3, cujos teores aqui dou por integralmente reproduzidos.
Em 17 de Fevereiro de 2006 foi a mesma notificada para apresentar a sua defesa (vidé o documento de fls. 4, o aviso de recepção de fls. 5 e a informação de fls. 69 dos autos).
Defesa essa que apresentou no Serviço de Finanças de Oeiras, em 27 de Fevereiro de 2006, nos termos do documento de fls. 6 a 12 dos autos (vidé ainda o carimbo de entrada nele aposto).
E em 24 de Abril de 2006 foi a arguida condenada por aqueles factos na coima de 6.200,00 (seis mil e duzentos euros), por se ter entendido que praticara uma contra-ordenação prevista nos artigos 26.°, n.° 1 e 40.°, n.° 1, alínea b) do CIVA (Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado) e punida pelos artigos 114.°, n.° 2 e 26.°, n.° 4 do RGIT (Regime Geral das Infracções Tributárias) — (vidé o douto despacho de fls. 29 a 30 dos autos, aqui igualmente dado por reproduzido na íntegra).
A arguida foi notificada dessa decisão pelo oficio n.° 2378, de 09 de Maio de 2006 e assinou o respectivo aviso de recepção em 16 de Maio seguinte (vidé o documento de fls. 31, o aviso de recepção de fls. 32 e a informação de fls. 69 dos autos).
E apresentou o presente recurso em 12 de Junho de 2006, conforme a data de remessa dos CTT aposta no envelope de fls. 34 e aquela mesma informação de fls. 69 dos autos.
Pagando a respectiva taxa de justiça inicial em 09 de Junho de 2006 (vidé o comprovativo de fls. 62 dos autos).
Ora, nos termos do n.° 1 do artigo 80.° do mencionado Regime Geral das Infracções Tributárias, as decisões de aplicação das coimas e sanções acessórias podem ser objecto de recurso para o tribunal tributário de 1ª instância, no prazo de 20 dias após a sua notificação, a apresentar no serviço tributário onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação (anteriormente, segundo o artigo 213.°, n.° 1 do Código de Processo Tributário, esse prazo era de 15 dias).
Trata-se de um prazo peremptório (cujo decurso sem que o direito seja exercido acarreta a sua extinção), de caducidade (quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, a ausência desse exercício determina a caducidade do direito, segundo o que estatui o n.° 2 do artigo 298.° do Código Civil) e até de conhecimento oficioso, por versar direitos indisponíveis para a Fazenda Pública (artigo 333.°, n.° 1 deste mesmo Código).
No caso “sub judicio”, a ora recorrente foi notificada da decisão que lhe aplicou a coima no dia 16 de Maio de 2006 (vidé o documento de fls. 31, o aviso de recepção de fls. 32 e a informação de fls. 69 dos autos). Destarte:
O termo inicial do prazo de vinte dias para interpor o recurso foi, portanto, o dia 17 de Maio de 2006, segundo as regras da alínea b) do artigo 279.° do Código Civil.
E o seu termo final ocorreu precisamente no dia 5 de Junho de 2006 (uma 2.ª feira, dia útil de trabalho), data até à qual a interessada poderia ter recorrido.
Porém, compulsados os autos, verifica-se que o presente recurso judicial apenas foi remetido 7 dias depois, em 12 de Junho de 2006 — correspondente à data de remessa dos CTT aposta no envelope de fls. 34 dos autos —, pelo que o foi naturalmente fora de prazo (sendo que dessa situação só pode a recorrente queixar-se de si própria, pois da decisão que lhe aplicou a coima já constava expressamente esse prazo de 20 dias para interpor recurso judicial).
Ora, a caducidade é uma excepção de carácter peremptório que importa a absolvição do pedido, nos termos dos artigos 487.°, nºs. 1 e 2, “in fine” e 493.°, nºs. 1 e 3 do Código de Processo Civil, aqui aplicável ‘ex vi’ do artigo 2.°, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
E o que se decidirá já a seguir.
Assim, face a tudo o que se deixa exposto, julgo intempestivo o presente recurso e, em consequência, absolvo a Fazenda Pública do pedido (mantendo-se, naturalmente, o despacho recorrido)».
***
3. São subsidiariamente aplicáveis às contra-ordenações e seu processamento as normas do regime geral do ilícito de mera ordenação social, por força do disposto no artigo 3º alínea b) do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) aprovado pela lei nº 15/2001 de 5 de Junho.
De acordo com o nº 1 do artigo 80º do mesmo RGIT o recurso judicial das decisões administrativas que aplicam coimas é interposto «no prazo de 20 dias após a sua notificação, a apresentar no serviço tributário onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação».
O artigo 60º do decreto-lei nº 433/82, de 27 de Outubro, na redacção que lhe foi dada pelo decreto-lei nº 244/95, de 14 de Setembro (é lapso a indicação que consta do parecer do Ministério Público ao decreto-lei nº 356/89, de 17 de Outubro, pois este diploma deixou intocado aquele artigo 60º), dispõe que este prazo se suspende aos sábados, domingos e feriados, e que, caindo o seu termo «em dia durante o qual não for possível, durante o período normal, a apresentação do recurso», se transfere para o primeiro dia útil seguinte.
Vem fixado pela sentença recorrida que a decisão que aplicou a coima à recorrente lhe foi notificada em 16 de Maio de 2006.
O termo final do prazo caiu, consequentemente, em 13 de Junho seguinte, já que dias 20, 21, 27 e 28 de Maio e 3,4, 10 e 11 de Junho foram sábados e/ou domingos.
Vindo, também, provado que o recurso judicial deu entrada em 12 de Junho de 2006, era tempestivo, à luz das apontadas normas.
Procedem, pelo exposto, as conclusões das alegações do recurso.
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4. Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em, concedendo provimento ao recurso, revogar a decisão impugnada, para ser substituída por outra que, nada mais obstando, aprecie o recurso da arguida.
Sem custas.
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Lisboa, 20 de Dezembro de 2006. – Baeta de Queiroz (relator) – António Calhau – Pimenta do Vale.