Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0126/14.3BELLE
Data do Acordão:01/25/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
SISTEMA MULTIMUNICIPAL
SANEAMENTO
PRESCRIÇÃO
Sumário:É de admitir a revista do acórdão confirmativo da sentença que julgara prescrito o direito da concessionária dum sistema multimunicipal de saneamento de receber dos réus – município e empresa municipal – o preço dos serviços por ela prestados no ano de 2011 se as instâncias invocaram um prazo prescricional de seis meses, cuja aplicabilidade a casos do género se revela controversa.
Nº Convencional:JSTA000P24132
Nº do Documento:SA1201901250126/14
Data de Entrada:12/04/2018
Recorrente:ÁGUAS DO ALGARVE, SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE TAVIRA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
Águas do Algarve, SA, interpôs esta revista do acórdão do TCA Sul confirmativo da sentença do TAF de Loulé que – na acção movida pela recorrente contra o Município de Tavira e Taviraverde - Empresa Municipal de Ambiente, EM, a fim de obter a condenação dos réus a pagar-lhe os valores correspondentes a serviços de saneamento prestados pela autora – considerou verificada a prescrição do direito da recorrente e proferiu uma sentença absolutória do pedido.

A recorrente pugna pelo recebimento da revista porque o aresto «sub specie» terá decidido mal «quaestiones juris» relevantes. Ela também afirma que o aresto é nulo, mas não levou essa arguição às conclusões do recurso.
A Taviraverde contra-alegou, considerando a revista inadmissível – desde logo, por ocorrer a chamada «dupla conforme».

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
E tornaremos já claro que a regra da «dupla conforme» (art. 671º, n.º 3, do CPC) não opera nas revistas interpostas no contencioso administrativo – como flui do art. 150º do CPTA, «supra» citado.
A ora recorrente, que é concessionária do sistema multimunicipal de saneamento do Algarve, accionou no TAF de Loulé o Município de Tavira e a contra-alegante pedindo a condenação solidária dos réus no pagamento da quantia de € 776.029,38 e respectivos juros desde a citação, importância essa que corresponde ao valor dos serviços prestados pela autora no ano de 2011, e cuja exigibilidade radica num contrato que ela inicialmente celebrou com o réu município – depois transmissor da sua posição contratual para a ré empresa municipal.
O TAF julgou a acção improcedente por prescrição do direito da autora, porquanto ele estaria sujeito a um prazo prescricional de seis meses, nos termos da Lei n.º 23/96, de 26/7.
E o TCA confirmou a sentença; tendo ainda acrescentado que, se tal prazo não fosse aplicável, sempre se haveria de convocar o prazo de dois anos previsto na Base XXIX, n.º 3, anexa ao DL n.º 379/93, de 5/11 (na redacção do DL n.º 195/2009, de 20/9) – o que continuaria a trazer a prescrição do direito.
Na presente revista, a recorrente, para além de defender a nulidade do acórdão – fazendo-o, no entanto, fora das conclusões do recurso – recusa a aplicabilidade do sobredito prazo de seis meses e a atendibilidade do prazo de dois anos – de que a 1.ª instância não conheceu. Refere, ainda, que há factos demonstrativos de um reconhecimento do direito pelos réus, pelo que o prazo prescricional deveras se interrompera. E, subsidiariamente, solicita a convolação da revista num recurso para uniformização de jurisprudência.
Ora, a decisão de se considerar aplicável ao direito exercitado pela autora o prazo prescricional de seis meses é altamente controversa – como o próprio TCA admitiu sem, todavia, se demarcar com clareza da solução. E este simples pormenor induz logo ao recebimento do recurso.
Por outro lado, a fundamental «quaestio juris» de índole substantiva é susceptível de repetição, nesse e noutros contratos de concessão do género, reclamando um esclarecimento por parte do STA.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Porto, 25 de Janeiro de 2019. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.