Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:07/09.2BELRS 010/18
Data do Acordão:10/28/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:ERRO NA FORMA DE PROCESSO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO
EFICÁCIA
VALIDADE
NOTIFICAÇÃO
CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - Preceituando o artigo 1º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) que as suas normas se aplicam “sem prejuízo do disposto no direito comunitário, noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna, na lei tributária ou legislação especial incluindo as normas que regulam a liquidação e cobrança dos tributos parafiscais«, há que concluir que a Lei Geral Tributária (LGT), limitando o alcance de todas as disposições do CPPT, não consente a interpretação de que a alínea e) do nº 1 do artigo 204 do CPPT revogou o nº 1 do artigo 45 da LGT na parte em que este atribui à falta de notificação tempestiva eficácia invalidante.
II – Por força da redacção da alínea e) do nº 1 do artigo 204 do CPPT a ilegalidade da falta de notificação da liquidação no prazo da caducidade (4 anos contados nos termos do nº 4 do artigo 45 da LGT) constitui ilegalidade não só invalidante do acto de liquidação mas também fundamento de oposição determinante da inexigibilidade da dívida decorrente desse acto.
III – Embora o acto de notificação seja distinto do acto de liquidação e seja, por tal razão, requisito da sua eficácia, o certo é que esta ilegalidade pode também ser apreciada no processo de execução fiscal, como sucede com outros caso de ilegalidade de que padeça a dívida exequenda desde que enquadrado nas alíneas a) g) e h) do nº 1 do artigo 204 do CPPT.
IV – Porém, o facto da intempestividade da notificação da liquidação em qualquer caso, incluindo a falta da sua notificação ao contribuinte no prazo da caducidade, poder ser fundamento de oposição, não significa que, por tal razão, que quando essa falta for determinante da caducidade do direito de liquidação não possa, por força do preceituado no artigo 45.º, n.º 1 da LGT, ser ilegalidade invalidante desse acto e, como tal, fundamento de impugnação judicial.
V – Estando apurado, e não sendo discutido neste recurso, que os únicos elementos que a Administração Tributária apresentou para prova da notificação da liquidação ao sujeito passivo foram exclusivamente colhidos do seu sistema interno, carece de fundamento, face ao preceituado, conjugadamente, nos artigos 38.º, n.º 1 e 3, 39.º, n.ºs 3, 4, 5 e 6 e 41.º do CPPT, a alegação de que a sentença, que julgou não verificada a notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade e verificada esta, padece de erro de julgamento de direito.
Nº Convencional:JSTA000P26557
Nº do Documento:SA22020102807/09
Data de Entrada:01/10/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.................. E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa - que julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido relativo à liquidação de IRC de 1997 e, no mais a impugnação procedente – interpôs recurso jurisdicional para este Supremo Tribunal Administrativo.

1.2. Tendo o recurso sido admitido, a Recorrente apresentou alegações, onde conclui nos seguintes termos:

«I – Como se colhe do teor da douta sentença proferida pelo Tribunal ad quo, decisão que submetemos a nova apreciação jurisdicional no que concerne à questão a decidir, a mesma consiste em apreciar se as liquidações objecto mediato dos presentes autos são ilegais, por caducidade e por falta de atividade da sociedade B………….

II - Refere a decisão recorrida: “A………… e C…………, contribuintes vieram deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, tendo por objeto o indeferimento tácito das reclamações graciosas relativas às liquidações oficiosas de IRC, respeitantes aos exercícios de 1997, 2000, 2001 e 2002 da sociedade B…………, Lda, contribuinte n.º ……….

Para o efeito, alegaram, em síntese que: a sociedade cessou a actividade de facto em 31.12.1997, data em que se processou o abandono das instalações; a sociedade fechou em 1997 com um prejuízo de 3.845.587$00; as liquidações não foram notificadas à sociedade devedora originária dentro do prazo de caducidade; não foi provada a culpa dos impugnantes em sede de reversão; o despacho de reversão não se encontra fundamentado; a reversão não pode abranger as coimas; - (…)

No tocante ao facto não provado, cumpre salientar que, sendo certo que, dos constam impressões do sistema informático da AT, com indicação de números de registo postal - cfr. Fls. 132, 136, 140 e 144, do processo administrativo -, não consta dos mesmos qualquer elemento que permita associar a informação constante do sistema informático às liquidações em causa nem qualquer comprovativo da entrega efectiva ou de não ter sido reclamada a correspondência – designadamente avisos de recepção ou comprovativos emitidos pelo operador de serviços postais CTT (sendo que tais elementos foram solicitados à FP que assumiu não dispor dos mesmos – cfr. fls. 214). A impressão do sistema informático sendo da própria AT, não constitui prova bastante, provando meramente um registo feito em tal sistema.

III - Decidiu o TT que o pedido principal de uma impugnação judicial é o de anulação do acto impugnado ou declaração da sua nulidade ou inexistência (cfr. Art.º 99.º, CPPT), prevendo-se específicas situações no art.º 97.º, n.º 1, als. a) a g), do CPPT. É pois o meio adequado para reagir contra a ilegalidade de uma liquidação ou de um ato de fixação da matéria tributável, entre outros. No mesmo sentido, ao nível gracioso, dispõe o art.º 70.º n.º 1, do CPPT, que os fundamentos da reclamação graciosa devem ser os mesmos da impugnação. Por outro lado, a oposição à execução fiscal é o meio processual adequado para reagir contra uma execução fiscal, nos termos e com os fundamentos enunciados no art.º 204.º, do CPPT. De entre os fundamentos da oposição, consta, designadamente, a ilegitimidade da pessoa citada (cfr. aI. b), do n.º 1 do art.º 204 CPPT), no qual se inclui a ilegitimidade do revertido.

IV – Como consta do probatório, a sociedade nunca foi notificada, nos termos do artigo 38°, n.º 1 do CPPT, tendo apenas ocorrido uma citação edital em 01/02/2007, pois como se sabe, o impugnante refere que na qualidade de senhorio da sociedade lhe remeteu carta para efeitos de entrega das instalações até fevereiro de 1998 (cfr. pág. 4 da sentença), ou seja, posteriormente à deliberação de dissolução e liquidação realizada em assembleia geral da sociedade, data a partir descurou as suas obrigações fiscais.

V - A impugnante assaca na petição inicial que a impugnação tem como fundamento a falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade (art.º 6.º da p.i.), pese embora a posição da AT analisada pelo TT em matéria de excepção.

VII - Sem conceder, no tocante ao facto de tal falta de notificação lhe ser imputável, a ele impugnante e gerente da devedora principal, cumpre salientar que, autos dos constam impressões do sistema informático da AT, com indicação de números de registo postal - cfr. Fls. 132, 136, 140 e 144, do processo administrativo.

VIII - Acerca desta questão e da impropriedade do meio utilizado pelo impugnante, por facilidade de exposição e, por um melhor entendimento, passamos de imediato a citar o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no Processo 0251/12, datado de 26-09-2012 e disponível em www.dgsi.pt:

“Como esclarece a doutrina (Código de Procedimento e Processo Tributário anotado de Jorge Lopes de Sousa, vol. III, pag. 485) a inclusão desta alínea e) entre os fundamentos de oposição à execução fiscal aponta no sentido de se ter entendido no CPPT que a falta de notificação afecta a eficácia do acto de liquidação e não a sua validade, pelo que será na oposição que, em princípio, deve ser invocada essa falta de notificação, solução esta que tem o mérito de assegurar a congruência do regime da relevância da intempestividade da notificação da liquidação, limitando-a à eficácia do acto notificado e não contendendo com a sua legalidade.

A redacção desta alínea e) deu origem a alguma controvérsia jurisprudencial neste Supremo Tribunal Administrativo (em que se inserem os Acórdãos 26722 e 84/02, citados pela recorrente) hoje superada com a prolação dos acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 20 de Janeiro de 2010 (rec. n.º 832/08) e de 7 de Julho de 2010, rec. n.º 545/09, sendo hoje reiterado e uniforme o entendimento de que a falta de notificação do acto de liquidação antes de decorrido o prazo de caducidade é fundamento de oposição à execução fiscal enquadrável na al. e) do nº 1 do artº 204º do Código de Procedimento e Processo Tributário. E que nos casos em que não foi efectuada notificação da liquidação e foi instaurada execução fiscal, se está perante uma situação de ineficácia do acto de liquidação, que constitui fundamento de oposição enquadrável na al. i) do nº 1 do artº 204º do Código de Procedimento e Processo Tributário (cf. neste sentido, por mais recentes, os acórdãos 02.02.2011, recurso 803/10, de 28/09/2011, recurso 473/11, e de 20.06.2012, recurso 378/12, todos in www.dgsi.pt).

Todas estas situações em que não houve qualquer notificação da liquidação, antes da instauração da execução fiscal enquadravam-se na alínea h) do n.º 1 do art. 286.º, pois abrangem-se aí «quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título». E, actualmente, à face do CPPT, todas estas situações em que não houve qualquer notificação, são susceptíveis de enquadramento na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º, que tem teor idêntico àquela alínea h) do n.º 1 do art. 286.º do CPT, se não for de entender que a situação se enquadre noutra das alíneas do mesmo número, designadamente na nova alínea e).

De qualquer modo, seja na alínea i) seja na alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT tem de concluir-se com segurança que em todos os casos em que não foi efectuada uma notificação da liquidação antes da instauração da execução está-se perante uma situação de ineficácia do acto que é fundamento de oposição à execução fiscal. Para retirar esta conclusão é absolutamente irrelevante que o acto de liquidação tenha ou não sido praticado dentro do prazo de caducidade, pois para a eficácia da liquidação o que importa é a notificação, e, naturalmente, a eventualidade de o acto de liquidação ser ilegal, por ter sido praticado depois do prazo de caducidade, não o torna eficaz sem notificação. (…) Assim, estando fora do âmbito daquela alínea e) as situações em que não ocorreu notificação, o sentido da expressão «falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade» é, necessariamente, o de referenciar situações em que ocorreu notificação, mas esta foi efectuada fora do prazo de caducidade.

Isto é, com o CPPT repôs-se a coerência do sistema global de meios de defesa dos contribuintes em matéria tributária, ao tornar a notificação intempestiva da liquidação fundamento de inexigibilidade da obrigação tributária em vez de ilegalidade da liquidação notificada. (…) Assim, é agora claro que tanto a falta de notificação como a falta de uma notificação tempestiva afectam a eficácia do acto de liquidação e não a sua validade, pelo que é na oposição que devem ser invocadas tanto a inexistência de qualquer notificação como a intempestividade da notificação que tenha sido efectuada».

IX - Termos em que a decisão recorrida não pode ser mantida na ordem jurídica, por erro de direito».

1.3. A…………, doravante Recorrido, notificado da interposição do recurso formulou nas contra-alegações que apresentou as seguintes conclusões:

«1) Pretende a AT que existiu um erro de direito no âmbito da Douta Sentença do Tribunal a quo, que foi favorável ao impugnante (aliás como aconteceu com os seus sócios C………… e D…………, nos processos nºs 710/10.4BELRS -3ª Unidade Orgânica e 9/09.9BELRS-2ª Unidade Orgânica, já transitados em julgado), considerando que a notificação fora do período de caducidade é um motivo para a não exigibilidade em sede de execução mas não põe em causa a validade da liquidação mas apenas a sua eficácia, não podendo ser apreciada em sede de impugnação.

2) A questão da caducidade do direito à liquidação que na impugnação da liquidação pode ser suscitada, porque se trata do vício de um acto não destacável, inserido no procedimento que culmina com a liquidação. O princípio da impugnação unitária impõe que todos os vícios ocorridos ao longo do procedimento sejam denunciados na impugnação do seu acto terminal, salvo quando a lei destacar como autonomamente sindicável um acto intermédio.

3) Assim na fase da impugnação, pelo menos oficiosamente, deve ser sindicável a eventual caducidade do direito de liquidação, pois não faria qualquer sentido avançar com a apreciação contenciosa de uma liquidação cuja originária obrigação tributária se encontra prescrita ou caducada, conduzindo claramente à inutilidade superveniente da lide, conforme Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul no Processo nº 00901/03 de 29/6/2004.

4) Muito embora a prescrição ou caducidade da obrigação tributária não constitua vício invalidante do acto de liquidação e não seja fundamento da respectiva impugnação, isso não deve impedir que o Tribunal no processo de impugnação não considere a prescrição ou caducidade do direito de liquidação para concluir pela inutilidade superveniente da lide, pois que prescrita a obrigação ou caducado o direito à liquidação se torna inútil a decisão sobre a legalidade do acto de liquidação, conforme Acórdão no Processo nº 00001/99-Mirandela do Tribunal Central Administrativo do Norte de 29/1/2015.

5) Em sede de impugnação judicial pois, a prescrição ou a caducidade do direito de liquidação são apreciados apenas para aferir se deve a instância prosseguir ou deve ser declarada a inutilidade superveniente da lide, com base nos artigos 287º e) do CPC e 203º nº 5 do CPPT.

6) O que está em causa não é o imediato conhecimento oficioso da prescrição ou caducidade do direito de liquidação, mas sim o problema do conhecimento oficioso das causas de inutilidade da lide. Tais causas são de conhecimento oficioso.

7) No mesmo sentido, Jorge de Sousa em Código do Procedimento e Processo Tributário anotado.

8) Tendo em conta o exposto, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo verificou a inutilidade superveniente da lide e desse modo já nem se preocupou com a questão da legalidade das liquidações, situação prejudicada pela anterior.

9) Sem prescindir, devemos referir que a AT só releva minudências formais, não apresentando uma única prova, no que concerne à realidade substancial. Com efeito, ficou provado durante a audiência de julgamento que a sociedade aqui Contra- Alegante não teve qualquer actividade real a partir de 1998, que foi encerrada em sede de IVA pela própria AT no decorrer de 2001, não se vislumbrando qual o fundamento e principalmente quais os indícios ou provas que levaram à AT a emitir liquidações oficiosas de valor considerável, pretendendo através de ficção cobrar impostos, o que contraria a CRP e a Lei Geral Tributária que definem claramente que ninguém pode pagar impostos sem exercer a actividade real, conforme prescreve o artº 104º nº 2 da CRP e em caso de dúvida o art 100º nº 1 do CPPT.

Nestes termos e tendo em consideração que:

a) O aqui Contra-Alegante não foi gerente de facto e apenas de direito durante algum tempo.

b) Que caducou a liquidação dos tributos por parte da AT, por falta de notificação atempada dos mesmos.

c) Inexistiu de facto actividade real da empresa a partir de 1998, conforme foi provado nas audiências de julgamento de todos os sócios.

d) Que os outros sócios, de facto e de direito, foram julgados nos processos nºs 710/10.4BELRS-3ª Unidade Orgânica e 9/09.9BELRS-2ª Unidade Orgânica tendo sido procedentes as suas impugnações judiciais, conforme decisões já transitadas em julgado;

Deve ser julgado improcedente o presente Recurso com as inerentes consequências legais, fazendo-se assim a COSTUMADA JUSTIÇA!

1.4. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, concluindo nos termos que se transcrevem:

«Tudo ponderado, o Ministério Público emite parecer no sentido de que deverá ser julgado procedente o recurso interposto pela A. T., revogando-se a sentença em crise e ordenando-se a baixa dos autos ao Tribunal Tributário de Lisboa, a fim de conhecer dos fundamentos próprios da impugnação judicial cuja análise foi aí considerada prejudicada.

Nos termos do elucidativo sumário deste douto aresto, “I - A falta de notificação do ato de liquidação antes de decorrido o prazo de caducidade constitui fundamento de oposição à execução fiscal enquadrável na alínea e) do n.º 1 do artigo 204.° do CPPT.

II - A caducidade do direito à liquidação, tanto do imposto como dos juros compensatórios, constitui um vício gerador de ilegalidade do ato, na medida em que consubstancia a prática de ato tributário ferido de vício de violação de lei.

III - Esse vício gera mera anulabilidade e não a nulidade do ato, pelo que não é de conhecimento oficioso, devendo, antes, ser invocada pelo contribuinte”.

1.5 Cumpre, agora, decidir.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, na sua vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou, se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), situação em que não podem ser reapreciadas pelo Tribunal ad quem. Na sua vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Considerando o que ficou exposto, concluímos que a única questão a decidir é a de saber se o Tribunal a quo errou ao julgar que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade também pode constituir fundamento de Impugnação.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

A sentença efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«Com interesse para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

1) A sociedade B…………, Lda (doravante B…………), com o NIPC ………, teve início de atividade, para efeitos tributários, a 01.10.1990 (cfr. fls. 20 a 23, do PEF apenso).

2) Aproximadamente em 1997, a sociedade referida em 1) começou a ter graves dificuldades em termos de obtenção de trabalhos.

3) O impugnante A…………, na qualidade de senhorio da sociedade referida em 1), remeteu-lhe ofício para efeitos de entrega das instalações até fevereiro de 1998 (cfr. fls. 27).

4) A partir de 01.01.1998, o Município de Almada deixou de trabalhar com a sociedade referida em 1) - cfr. fls. 28.

5) A sociedade mencionada em 1) preencheu declarações da entidade empregadora, relativas a …………, …………, ………… e …………, datadas de 31.12.1997, das quais consta a cessação do contrato de trabalho destes com aquela, motivada pelo encerramento da atividade da sociedade (cfr. fls. 30 a 35).

6) A sociedade referida em 1) apurou, em 1997, resultado líquido do exercício de (3.845.587$40) - cfr. fls. 45.

7) Foi realizada assembleia geral da sociedade mencionada em 1), a 28.12.1997, na qual se deliberou a sua eventual dissolução e liquidação (cfr. fls. 47 e 48).

8) A sociedade mencionada em 1), nos seus elementos contabilísticos relativos aos exercícios compreendidos entre 1998 e 2002, apenas tinha registados valores relativos aos capitais próprios e passivo (cfr. fls. 49 a 68).

9) A atividade da sociedade mencionada em 1) foi encerrada, para efeitos de IVA, a 31.12.2001 (fls. 30, do PEF apenso).

10) A atividade da sociedade mencionada em 1) foi encerrada oficiosamente, para efeitos de IRC, a 31.12.2006 (fls. 30, do PEF apenso).

11) A sociedade mencionada em 1) não apresentou declarações de rendimentos modelo 22, de IRC, relativas aos exercícios de 1997, 2000, 2001 e 2002 (facto não controvertido).

12) Foram emitidas, em nome da sociedade mencionada em 1), pela administração tributária (AT), as seguintes liquidações oficiosas de IRC e respetivos juros compensatórios:

(cfr. fls. 128, 131, 134, 138 e 142, do processo administrativo).

13) Foi instaurado, no SF de Lisboa 1, contra a sociedade B…………, o PEF n.º 3069200001030558 relativo a dívidas de IVA (cfr. fls. 128 e 129, do PEF apenso).

14) Ao PEF n.º 3069200001030558 foram apensados, entre outros, o PEF n.º 3069200501084054, relativo a IRC do exercício de 2001, no valor de 43.007,37 Eur., referente à liquidação daquele exercício mencionada em 12) - cfr. fls. 130, 168, 169, 270, 271, do PEF apenso.

15) No âmbito do processo de execução fiscal n.º 3069200001030558 e apensos, foram proferidos, a 15.10.2007, despachos de reversão contra os impugnantes (cfr. fls. 168 e 170, do PEF apenso).

16) Na sequência do mencionado em 15), foram remetidos, via correio postal registado com aviso de receção, pelos serviços da AT, ofícios, designados de “Citação (reversão)”, dirigidos aos impugnantes (cfr. fls. 171, 172, 175 e 176, do PEF apenso).

17) Nos avisos de receção mencionados em 16) foi aposta assinatura, no campo para preenchimento no destino, a data 19.10.2007, no aviso relativo a C…………, e carimbo com a data 23.10.2007, no aviso relativo a A………… (cfr. fls. 171, 172, 175, 176 e 196, do PEF apenso).

18) Foi instaurado, no SF de Lisboa 1, contra a sociedade B…………, o PEF n.º 3069199801018990 relativo a dívidas de IVA (cfr. fls. 1 a 3, do PEF apenso).

19) Ao PEF n.º 3069199801018990 foram apensados, entre outros, os seguintes PEF:

a) N.º 3069200301001361, relativo a IRC e juros compensatórios do exercício de 1997, no valor de 46.347,23 Eur.;

b) N.º 3069200501009028, relativo a IRC e juros compensatórios do exercício de 2000, no valor de 43.007,37 Eur.;

c) N.º 3069200501092006, relativo a IRC e juros compensatórios do exercício de 2002, no valor de 39.724,98 Eur., referentes às liquidações daqueles exercícios mencionadas em 12) - cfr. fls. 24, dos autos, fls. 149, do processo administrativo, e fls. 16, 50, 106, 107, 108, 109, 113 e 114, do PEF apenso).

20) No âmbito do processo de execução fiscal n.º 3069199801018990 e apensos, foram proferidos, a 04.10.2007, despachos de reversão contra os impugnantes, abrangendo, em parte, IRC dos exercícios de 1997, 2000 e 2002, no valor total, no tocante ao IRC, de 132.361,97 Eur. (cfr. fls. 51 a 54, do PEF apenso).

21) Na sequência do mencionado em 20), foram remetidos, via correio postal registado com aviso de receção, pelos serviços da AT, ofícios, designados de “Citação (reversão)”, dirigidos aos impugnantes (cfr. fls. 58 a 64, do PEF apenso).

22) Nos avisos de receção mencionados em 21) foi aposta assinatura, no campo para preenchimento no destino, a data 19.10.2007, no aviso relativo a C…………, e carimbo com a data 12.10.2007, no aviso relativo a A………… (cfr. fls. 58 a 64, do PEF apenso).

23) Foi proferido, a 06.11.2009, despacho, pela chefe do SF de Lisboa 1, reconhecendo a prescrição do IRC relativo ao exercício de 1997 desde 07.02.2007 e extinguindo o PEF n.º 3069200301001361 por esse motivo (cfr. fls. 94, do PEF apenso).

24) Através de documentos que deram entrada no SF de Lisboa 1, a 17.01.2008, os impugnantes apresentaram reclamações graciosas das liquidações mencionadas em 12) (cfr. fls. 14 a 17 e 19 a 22, dos autos, fls. 3 a 6, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000358, e fls. 3 a 6, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000340).

25) No seguimento do referido em 24), foram autuados os procedimentos de reclamação graciosa n.ºs 3069200804000358 e 3069200804000340 (cfr. fls. 1, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000358 – e fls. 1, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000340).

26) Deu entrada, no SF de Lisboa 1, a presente impugnação em agosto de 2008 (cfr. fls. 3 a 6).

27) No âmbito dos procedimentos mencionados em 25), foram elaboradas informações, na divisão de justiça contenciosa, da direção de finanças de Lisboa, no sentido da tempestividade das reclamações, inidoneidade do meio para efeitos de apreciação da falta de notificação dentro do prazo de caducidade, prescrição e pressupostos da reversão e do indeferimento quanto ao demais (cfr. fls. 56 a 61, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000358 – e fls. 53 a 58, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000340).

28) Sobre as informações mencionadas em 27) e após pareceres de concordância foram proferidos, a 17.10.2008, despachos de indeferimento das reclamações mencionadas em 24) - cfr. fls. 56 a 61, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000358 – e fls. 53 a 58, do processo administrativo – reclamação graciosa n.º 3069200804000340.

29) A presente impugnação foi remetida a este tribunal pelo SF de Lisboa 1, tendo dado entrada a 05.01.2009 (cfr. fls. 2).

3.1. Mais ficou provado que, com

DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Com interesse para a decisão, considera-se não provado o seguinte facto:

A) Foram enviadas à sociedade B………… e por esta recebidas, diretamente ou através de terceiros, ou não reclamadas as notificações relativas às liquidações mencionadas em 12).


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MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou, desde logo, na prova documental junta aos autos, conforme indicado em cada um desses factos.

Quanto ao facto 2), a convicção do tribunal fundou-se no depoimento da testemunha E…………, que trabalhou com a sociedade B………… entre 1993-1995 e que mantinha contacto com o impugnante C…………, que acompanhou as dificuldades com que a sociedade se deparou, tendo, aliás, tido conhecimento que o impugnante A………… falou com o seu irmão em 1997/1998, para arrendamento do espaço onde funcionara a mencionada sociedade.

No tocante ao facto não provado, cumpre salientar que, sendo certo que, dos autos, constam impressões do sistema informático da AT, com indicação de números de registo postal – cfr. fls. 132, 136, 140 e 144, do processo administrativo –, não consta dos mesmos qualquer elemento que permita associar a informação constante do sistema informático às liquidações em causa nem qualquer comprovativo da efetiva entrega ou de não ter sido reclamada a correspondência – designadamente avisos de receção ou comprovativos emitidos pelo operador de serviços postais CTT (sendo que tais elementos foram solicitados à FP, que assumiu não dispor dos mesmos – cfr. fls. 214). A impressão do sistema informático, sendo da própria AT, não constitui prova bastante, provando meramente um registo feito em tal sistema.».

3.2. Fundamentação de direito

Conforme resulta das conclusões de recurso, e do confronto destas com as alegações, a Recorrente, pese embora a forma algo confusa como aí se expressou, apenas pretende que este Supremo Tribunal sindique o erro de julgamento de direito que, em seu entender, o julgado padece na parte em que decidiu que estava verificada a caducidade do direito a liquidar.

Invoca a Recorrente, tal como já o havia dito na sua contestação, que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade não constitui fundamento de Impugnação, antes, e exclusivamente, de Oposição à Execução fiscal, nos termos do preceituado no artigo 204.º, n.º 1 al. e) do Código de procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Pelo que, ao conhecer desse fundamento invocado, em vez de julgar verificado o erro na forma do processo, e ao julgar, em consequência da sua procedência, inútil a apreciação das demais questões suscitadas, o Tribunal a quo errou de direito.

No mesmo sentido veio o parecer da Exma. Procuradora Geral Adjunta neste Supremo Tribunal Administrativo.

Adiantamos, desde já, que não lhes assiste razão.

Antes, porém, importa salientar que o Impugnante invocou na petição inicial, como fundamento do pedido de anulação que formulou, a ilegalidade do despacho de reversão, a prescrição, a caducidade do direito de liquidação por falta de notificação das liquidações impugnadas dentro do prazo legal e a ilegalidade das liquidações por falta de actividade da sociedade “B………… Lda.”.

A Meritíssima Juíza, após ter identificado todas as questões, começou o seu julgamento apreciando a susceptibilidade de existência de erro na forma de processo.

Nesse sentido, e a coberto do um rigoroso enquadramento legal, efectuou uma distinção entre os fundamentos e pedidos próprios da Impugnação, meio processual em quês e movia, e fundamentos e pedido próprio da Oposição à Execução Fiscal, como nos é revelado pelo excerto da sentença que, na parte pertinente para este recurso se transcreve:

«O pedido principal de uma impugnação judicial é o de anulação do ato impugnado ou declaração da sua nulidade ou inexistência (cfr. art.º 99.º, do CPPT), prevendo-se específicas situações no art.º 97.º, n.º 1, als. a) a g), do CPPT. É pois o meio adequado para reagir contra a ilegalidade de uma liquidação ou de um ato de fixação da matéria tributável, entre outros. No mesmo sentido, ao nível gracioso, dispõe o art.º 70.º, n.º 1, do CPPT, que os fundamentos da reclamação graciosa devem ser os mesmos da impugnação.

Por outro lado, a oposição à execução fiscal é o meio processual adequado para reagir contra uma execução fiscal, nos termos e com os fundamentos enunciados no art.º 204.º, do CPPT. De entre os fundamentos a oposição, consta, designadamente, a ilegitimidade da pessoa citada (cfr. al. b), do n.º 1 do art.º 204.º, do CPPT), no qual se inclui a ilegitimidade do revertido.

In casu, os impugnantes vêm impugnar o indeferimento das reclamações graciosas atinentes a quatro liquidações oficiosas de IRC, pelo que com o pedido de provimento globalmente formulado o meio é o próprio.

A única questão in casu é que as consequências do provimento do pedido formulado pelos impugnantes não são as por si extraídas, em parte, uma vez que em sede de impugnação não é possível anular os despachos de reversão nem extintas as penhoras. Do mesmo modo, o alegado quanto a eventuais ilegalidades da reversão não pode ser apreciado nesta sede.

Quanto à prescrição, não sendo a mesma fundamento de impugnação, é pacífica a possibilidade de apreciação em sede de impugnação, por poder redundar em inutilidade superveniente da lide.

Quanto à caducidade, a falta de notificação dentro do respetivo prazo, sendo fundamento de oposição à execução fiscal, é igualmente suscetível de apreciação em sede de impugnação, porquanto, atendendo ao teor do art.º 45.º, n.º 1, da LGT, esta disposição legal “… atribui à falta de notificação tempestiva eficácia invalidante” (cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado, Vol. III, 6.ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 488 e 489). Assim, esta eficácia invalidante contende com a legalidade das liquidações.

Como tal, o presente meio é o próprio de reação, porquanto está em causa a legalidade de liquidações, sem prejuízo do que foi referido quanto à extensão dos poderes de cognição deste tribunal.

Logo, o meio é o próprio».

É, pois, contra esta decisão que a Fazenda Pública se insurge.

Diga-se, de novo, que sem razão.

Na verdade, contrariamente ao que vem afirmado, não obstante a matéria de que ora nos ocupámos tenha sido muito discutida na doutrina e na jurisprudência, a posição perfilhada na sentença ora recorrida é, desde há muito, a posição deste Supremo Tribunal Administrativo, deixando-se aqui também transcrito um dos últimos e recentes arestos publicados sobre a matéria:

«A única questão a decidir é se pelo facto de no CPPT a falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade constituir fundamento de oposição à execução fiscal por tal falta determinar a inexigibilidade da dívida, o facto de a liquidação ter sido efectuada dentro do período de 4 anos nos termos do artigo 45 da LGT, mas tendo a sua notificação sido efectuada para além desse prazo, esta preterição contende ou não com a validade do acto tributário da liquidação ou o torna apenas ineficaz dado a notificação ser um acto externo a este.

Sob a epígrafe caducidade do direito à liquidação preceitua o artigo 45 da LGT:

1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.

E o nº 4:

4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. (Redação dada pela Lei 55-B/2004,de 30 de dezembro)

A doutrina e a jurisprudência não questionando o facto de serem distintos o acto tributário da liquidação e o acto da notificação, já antes da vigência do CPT e do artigo 45 da LGT divergiam na consideração da notificação configurar requisito de perfeição desse acto tributário.

Alberto Xavier defendia que a notificação constituía requisito da validade do acto da liquidação in Conceito e Natureza do Acto Tributário a pag 240 na consideração de o acto tributário ser um acto receptício.

Já para o STA designadamente no acórdão do Pleno de 13 04 1983 in AD 262 p1205 a notificação era acto externo não sendo por isso requisito de validade do acto notificando.

Com a vigência do CPT e mais concreta do artigo 45 da LGT a notificação do acto da liquidação foi considerada como requisito da perfeição do acto já que só ele torna dívida decorrente da liquidação certa e exigível.

Como se sabe o termo liquidação na LGT é empregue com um duplo sentido: o de procedimento e o de acto administrativo que culmina o procedimento e quer num sentido quer noutro a sua função consiste em fixar o “an e o quantum” da obrigação tributária e exigi-la ao obrigado tributário

A liquidação contém, assim, uma manifestação unilateral, da Administração Tributária sobre o montante da prestação que fixa de modo exacto indicando para tanto ao obrigado tributário o prazo e o órgão onde efectuar o pagamento bem como os meios de defesa quer administrativos quer contenciosos que pode utilizar.

E só com a notificação válida do acto da liquidação é que se pode considerar totalmente encerrado o procedimento de liquidação.

Neste sentido entre outros autores Juan Marin Queralt Carmelo lozano Serrano, Gabriel Casado Ollero e José m. Tejerizo López in Curso De Derecho Financiero y Tributário tecnos p377.

Neste entendimento há que convir que embora quer conceptualmente quer materialmente distintos o acto administrativo da liquidação e o acto que o notifica, a notificação não deixa de integrar o procedimento de liquidação e embora não seja pressuposto da legalidade do acto da liquidação na medida em que a notificação é sempre um acto posterior é contudo pressuposto da sua eficácia donde o prazo de caducidade continuar a correr enquanto não ocorrer a notificação válida do acto que o interrompa.

E dado que neste caso e em todo o direito público a notificação adquire a relevância de principio essencial no procedimento administrativo, como direito e garantia dos administrados ex vi do disposto no artigo 268 do CRP, o artigo 45 da LGT explicitando essa relevância e exigência constitucional, integrando a exigência de notificação da liquidação no prazo de caducidade do direito à liquidação faz decorrer a interrupção do prazo da caducidade do direito de liquidar pela AT não do momento em que pratica o acto de liquidação mas do momento da sua notificação ao sujeito passivo desse acto.

E decorrido o prazo de caducidade da liquidação sem que a sua notificação válida tenha ocorrido tal acto ainda que praticado dentro do prazo não deixa por força do artigo 45 da LGT de estar ferido de ilegalidade.

E não é pelo facto de o legislador no CPPT, no artigo 204 do CPPT ter consagrado a falta de notificação do tributo no prazo da caducidade como fundamento de oposição à execução fiscal que, como refere o Mº juiz “a quo” se pode considerar que com tal facto a notificação deixa de ser requisito de validade do acto tributário e que por tal razão se manteria na ordem jurídica.

Acompanhando o Mº P, escudado na doutrina de Jorge Lopes de Sousa in CPPT anotado vol III 6ª edição pp488 e segs consideramos também que preceituando o artigo 1º do CPPT que as normas do CPPT se aplicam “sem prejuízo do disposto no direito comunitário, noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna, na lei tributária ou legislação especial incluindo as normas que regulam a liquidação e cobrança dos tributos parafiscais podemos concluir que a LGT limitando o alcance de todas as disposições do CPPT não consente que o intérprete possa concluir que a alínea e) do nº 1 do artigo 204 do CPPT revogou o nº 1 do artigo 45 da LGT na parte em que atribui à falta de notificação tempestiva eficácia invalidante.

O que sucede é que com a redacção da alínea e) do nº 1 do artigo 204 do CPPT a ilegalidade da falta de notificação da liquidação no prazo da caducidade (4 anos contados nos termos do nº 4 do artigo 45 da LGT) constitui ilegalidade não só invalidante do acto de liquidação mas também fundamento de oposição determinante da inexigibilidade da dívida decorrente desse acto.

Como se refere no acórdão deste STA de 28 09 2011 in processo 0473/11 onde expressamente se assume ser o acto de notificação distinto do acto de liquidação e ser por tal razão requisito da sua eficácia o certo é que esta ilegalidade pode também ser apreciada no processo de execução fiscal, como sucede com outros caso de ilegalidade de que padeça a dívida exequenda desde que enquadrado nas alíneas a) g) e h) do nº 1 do artigo 204 do CPPT.

Mas o facto da intempestividade da notificação da liquidação em qualquer caso, incluindo a falta da sua notificação ao contribuinte no prazo da caducidade poder ser fundamento de oposição não significa nem implica que por tal razão que quando essa falta for determinante da caducidade do direito de liquidação não possa ex. vi do preceituado no artigo 45/1 da LGT ser ilegalidade invalidante desse acto e como tal fundamento de impugnação judicial.» - Acórdão da Secção de Contencioso Tributário de 4-10-2017, proferido no processo n.º 660/15, integralmente disponível em www.dgsi.pt, com sublinhado de nossa autoria.

Temos, pois, por seguro, face a tudo quanto ficou exposto, e sem que acrescidas considerações se julguem necessárias, que a sentença recorrida, que perfilhou no seu julgamento, nesta parte, idêntico entendimento ao por nós perfilhado, não é merecedora da censura que lhe vem dirigida.

Porém, como se constata das alegações e conclusões de recurso, mais concretamente do ponto VII destas, a Recorrente, sem prescindir da questão do erro na forma de processo, vem insistir que a sentença padece de erro de julgamento porque, constando dos autos impressões do seu sistema informático com indicação do número de registo postal, se devia ter julgado que a notificação fora realizada dentro do prazo de caducidade.

Em suma, se bem vemos, a Recorrente não discute o julgamento de facto, não discute que não possui outros elementos ou que facultou outros elementos ao Tribunal e que estes não foram devidamente valorados (o que bem se compreende porque o Tribunal a quo aquando da instrução dos autos solicitou acrescidos elementos documentais e a Administração Tributária expressamente respondeu que os não possuía). Tudo quanto a Recorrente pretende discutir neste recurso é se o Tribunal a quo, face aos que elementos por si apresentados, cuja existência a sentença recorrida não afastou, devia ter julgado válida a notificação e improcedente a caducidade do direito à liquidação.

Na sentença recorrida, após uma longa excursão sobre os requisitos das notificações e se ter concluído que in casu a notificação tinha obrigatoriamente que ser realizada carta registada com aviso de recepção, por força, conjugadamente, do preceituado nos artigos 38.º, 39.º e 41.ºdo CPPT e 45.º e 46.º da LGT, veio a responder-se negativamente à questão colocada.

Adiantamos, sem mais, que esse julgamento não merece censura.

Na verdade, constitui jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores que a prova deste tipo de notificação não pode ser feita exclusivamente com base em elementos internos da Administração. Isto é, é pacífico que, na ausência absoluta de qualquer outro elemento que permita associar a informação constante do sistema informático às notificações em causa, sem que haja qualquer comprovativo de entrega ou de não ter sido reclamada a correspondência, não é possível extrair-se a conclusão de uma notificação válida e, consequentemente, de notificação que obste à caducidade do direito de liquidação.

E, assim sendo, falece também com este fundamento a pretensão da Recorrente de que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito quanto à validade da notificação e à caducidade do direito de liquidação.

E, nessa medida, há que julgar improcedentes as alegações de recurso jurisdicional e, em conformidade, que manter o julgado na ordem jurídica

4. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Fazenda Pública.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 28 de Outubro de 2020. - Anabela Russo (relatora) – José Gomes Correia – Aníbal Ferraz.