Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0934/09
Data do Acordão:12/09/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO CALHAU
Descritores:BENEFÍCIOS FISCAIS
ISENÇÃO
UTILIDADE TURÍSTICA
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Sumário:I - Os benefícios fiscais previstos no n.º 1 do artigo 20.º do DL 423/83, de 5/12, não foram revogados pelo DL 485/88, de 30/12, pois o âmbito da revogação operada pelo artigo 3.º, n.º 22 deste último diploma restringe-se apenas aos benefícios fiscais atribuídos em sede de contribuição industrial e imposto complementar.
II - Tais benefícios fiscais são de aplicação automática desde que verificadas as condições previstas nesse mesmo preceito: que a aquisição do imóvel se destine à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.
III - Atenta a natureza dos benefícios em causa não é condição que os mesmos constem do despacho de atribuição da utilidade turística.
IV - Pagos IMT e imposto de selo, relativos a aquisição de imóvel que gozava daqueles benefícios, tem o contribuinte direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43.º da LGT.
Nº Convencional:JSTA000P11247
Nº do Documento:SA2200912090934
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I – A…, residente no Porto, não se conformando com a sentença do Mmo. Juiz do TAF de Loulé que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações de Imposto Municipal sobre Transmissão de Bens Imóveis (IMT) e de Imposto de Selo (IS), e correspondentes juros compensatórios, incidentes sobre a aquisição de um prédio urbano, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões:
a) Tendo sido atribuída a utilidade turística ao Aldeamento Turístico B…, previamente à aquisição do bem imóvel pelo Recorrente, a essa transmissão são aplicáveis os benefícios fiscais previstos no DL 423/83, de 05/12, mais concretamente os constantes do seu art.º 20.º, n.º 1 – isenção de IMT e redução a um quinto (1/5) do Imposto de Selo;
b) Os benefícios fiscais previstos no artigo 20.º, n.º 1 do DL 423/83 não foram revogados pelo DL 485/88, de 30 de Dezembro, pois o âmbito da revogação prevista no art.º 3.º, n.º 22 deste diploma se restringe aos benefícios fiscais atribuídos em sede de contribuição industrial e imposto complementar (impostos revogados em 1 de Janeiro de 1989);
c) É isso que resulta da introdução no final deste preceito da expressão “na parte que com aqueles estejam correlacionados”;
d) Este foi o entendimento, também, do Grupo que, a pedido do Ministro de Estado e das Finanças, produziu o Relatório de Reavaliação dos Benefícios Fiscais – cf. págs. 289 e seguintes do Caderno de Ciência e Técnica Fiscal n.º 198 – e do Professor Guilherme de Oliveira Martins na obra citada (“Os benefícios Fiscais: Sistema e Regime”, Cadernos IDEFF, n.º 6, Dezembro de 2006, páginas 189 e 190);
e) Sendo que a própria Administração Fiscal perfilha este entendimento, ao esclarecer, em 14 de Junho de 1991 (alguns anos depois do DL 485/88), com a publicação do Ofício Circular D-1, quais os casos em que se podia beneficiar de isenção de sisa ao abrigo do DL 423/83;
f) Estando os benefícios revogados, que necessidade teria a Administração Fiscal de regular a sua aplicação?
g) Os benefícios fiscais constantes do referido art.º 20.º, n.º 1, do DL 423/83 são de aplicação automática, estando verificadas as condições previstas nesse mesmo preceito;
h) As condições aí estabelecidas para que os benefícios sejam aplicados directa e automaticamente são apenas duas, a saber:
- (i) A fracção adquirida se destine à instalação de empreendimentos turísticos;
- (ii) Que esses empreendimentos turísticos tenham sido qualificados de utilidade turística, mesmo que essa qualificação tenha sido atribuída a título prévio;
i) A condição referida em h) - (i) está verificada, conforme reconheceu o Meritíssimo Juiz de 1.ª instância;
j) Não havendo igualmente dúvidas quanto à segunda condição h) - (ii) supra, em face do despacho proferido pelo Secretário de Estado do Turismo de 10 de Outubro de 2006, anteriormente à outorga da escritura pública de compra e venda;
k) Não é condição de aplicação dos benefícios constantes do Decreto-Lei 423/83 que os mesmos tenham que constar deste despacho de atribuição de utilidade turística;
l) Tal resulta clara e inequivocamente da actual redacção do n.º 4 do art.º 16.º do DL 423/83, com a redacção que lhe foi dada pelo DL 38/94, de 8 de Fevereiro;
m) De acordo com a qual o despacho de atribuição de utilidade turística apenas terá que estabelecer a medida e o prazo dos benefícios a conceder, para efeitos da alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo 16.º;
n) Na medida em que a natureza e o prazo deste benefício pode variar, o legislador não especificou nem quantificou o benefício a conceder, antes conferindo à entidade responsável pela atribuição de utilidade turística competência para definir se o benefício era a isenção total ou uma simples redução de taxa e qual o prazo máximo para a sua aplicação;
o) A favor desta tese joga ainda o elemento sistemático, pois se a intenção do legislador fosse a de os benefícios fiscais constantes do artigo 20.º, n.º 1, do DL 423/83 constarem do despacho de atribuição de utilidade turística, então tê-lo-ia referido expressamente neste preceito (como o fez para os benefícios do art.º 16.º) ou através da inclusão, no próprio Decreto (imediatamente após elencar os diversos benefícios fiscais ali previstos), de uma regra geral de obrigatoriedade de todos os benefícios constarem do despacho de utilidade turística;
p) Também a jurisprudência considera que os benefícios fiscais constantes do art.º 20.º, n.º 1 do DL 423/83 são de aplicação automática;
q) Apenas fazendo depender essa automaticidade da declaração de utilidade turística anteriormente ao nascimento da obrigação de liquidação de IMT e de Imposto de Selo;
r) Neste sentido são claros os Acórdãos do STA supra referidos (Acórdão de 2 de Outubro de 1991 – Rec. 13016 e Acórdão de 21 de Janeiro de 1987 – Recurso 3873);
s) O legislador define benefícios fiscais automáticos, no artigo 5.º do EBF, como aqueles que resultam directa e imediatamente da lei, pelo que tendo sido reconhecida a utilidade turística ao empreendimento onde se situa o prédio adquirido pelo Recorrente a sua transmissão está isenta de IMT e beneficia da redução a um quinto do IS;
t) No que se refere ao entendimento da não revogação dos benefícios constantes do art.º 20.º do DL 423/83 e à desnecessidade de os mesmos virem expressamente referidos no despacho de atribuição de utilidade turística é de salientar o parecer emitido pela Digna Procuradora da República, onde perfilhou e concordou com as posições e argumentos apresentados pelo Recorrente;
u) Não sendo devidos os impostos liquidados pela Administração Fiscal – IMT e IS – não podem, obviamente, ser devidos os juros compensatórios igualmente liquidados pela Fazenda Nacional;
v) Ainda assim, deve ser dito que o retardamento na liquidação dos impostos considerados – indevidamente – devidos pela Administração Fiscal não pode, de forma alguma, ser imputável ao ora Recorrente;
w) O duplo controlo a que a foi sujeita a incidência, ou não, de tributação da aquisição do prédio pelo Recorrente – primeiro pelo Notário interveniente na escritura pública de compra e venda e depois pelo Conservador do Registo Predial – constitui causa de exclusão da ilicitude;
x) Na verdade, se a entidade que, obrigada ao controlo e profunda conhecedora da lei, declara e averba expressamente, de forma fundamentada, na escritura pública de compra e venda, que as isenções previstas no art.º 20.º, n.º 1, do DL 423/83 são aplicáveis, seria, ainda assim, exigível ao Recorrente que procedesse à liquidação dos impostos?
y) A resposta a esta questão só pode ser uma – NÃO. A actuação do Recorrente não revestiu, pois, de qualquer culpa, dolosa ou negligente.
z) Neste sentido, aliás, se tem pronunciado, em situações muito semelhantes, a jurisprudência (cf. Acórdão do STA, 2.ª Secção, de 21-7-1976 e Acórdão do STA, 2.ª Secção, de 19-11-1975 – Rec. n.º 443), ao excluir a culpa dos sujeitos passivos, quando, tendo havido intervenção de Notário na transmissão de bens imóveis, estes tenham expressamente declarado ainda que erradamente – o que não é, diga-se, o caso presente – que essa transmissão estava isenta de Sisa (agora IMT):
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exmo. Magistrado do MP junto deste Tribunal emite parecer no sentido de que o recurso merece provimento.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II – Mostra-se assente a seguinte factualidade:
A) — Em 08/06/2007, por escritura pública foi celebrado o contrato de compra e venda, que constitui fls. 25 a 29 dos presentes autos, entre a C…, S.A, na qualidade de 1.º outorgante e proprietária da fracção imobiliária n.º 20, designada pela letra “U”, do prédio urbano, denominado “Aldeamento Turístico B…”, sito no lote AL 10, Quinta do Lago, freguesia de Almancil, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob a ficha número novecentos e sessenta e cinco da dita freguesia, e o Impugnante na qualidade de segundo outorgante.
B) — Declarou a Primeira Outorgante que vende ao Segundo, a fracção imobiliária, a que se refere a alínea anterior, pelo preço de € 336.689,00, que para a sua representada declara já recebido.
C) — Declarou o Segundo Outorgante que aceita a venda nos termos exarados.
D) — Ficou mencionado na escritura pública a que se refere a alínea A) o seguinte:
«A presente transmissão está isenta de IMT, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 20.° do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, em virtude da fracção adquirida se destinar à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística, conforme despacho proferido pelo Secretário de Estado do Turismo, em 25/08/2006, publicado em Aviso no Diário da República II Série, n.º 195, de 10 de Outubro de 2006 (Parte Especial), e a sua exploração turística se encontrar assegurada por contrato de exploração turística celebrado com a empresa exploradora em 21/09/2003, cuja cópia se arquiva.».
E) — Entre o Impugnante e D…, S.A., foi celebrado o contrato-promessa de fls. 31 e segs. dos autos, nos termos do qual o primeiro promete ceder à segunda a exploração turística da fracção n.º 20, para habitação tipo T2B, sita no Aldeamento Turístico B…, na Quinta do Lago, freguesia de Almancil, concelho de Loulé.
F) — Nos termos da cláusula segunda do contrato a que se refere a alínea anterior o contrato converter-se-á em contrato definitivo, devendo a partir dessa data considerar-se como não escritas todas as referências a promessas nele constantes.
G) — Em 30/01/2008, o Impugnante efectuou o pagamento do IMT liquidado nos termos seguintes (fls. 23 destes autos):
IMPORTÂNCIA DO IMT€ 30.249,00
Juros compensatórios€ 0,00
Abatimentos€ 0,00
TOTAL€ 30.249,00

H) — Na mesma data procedeu ao pagamento do Imposto do Selo liquidado nos termos seguintes (fls. 22 destes autos):

ZONACÓDIGOIMPORTÂNCIA €
Continente301 – IS – Aquisição onerosa ou doação3.238,40

I) — Em 29/04/2008, o Impugnante apresentou a reclamação graciosa que constitui fls. 2 a 11 do processo administrativo apenso.
J) — A reclamação graciosa a que se refere a alínea anterior foi prestada a seguinte informação (fls. 42 do processo administrativo apenso):
«Pela petição de fls. três a treze dos autos, interposta nos termos do art.° 68.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, (CPPT), devidamente identificado A…, NIF …, representado por E…, NIF …, com escritório na Rua …, Lisboa vem reclamar da liquidação de Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), no valor de € 30.249,00 e de Imposto do Selo no valor de € 3.238,40, cuja notificação lhe foi efectuada pelo ofício n.º 9.092 de 2007-08-10, alegando em resumo que a aquisição foi efectuada ao abrigo do disposto nos n.°s 1 e 2 do art.° 20.° do DL 423/83 de 5 de Dezembro, em virtude da fracção adquirida se destinar à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística e por isso isenta de IMT.
O pedido é legal, legítimo e interposto em tempo.
1 — Que por escritura pública de compra e venda celebrada no dia oito de Junho do ano de dois mil e sete, no terceiro andar, lado esquerdo do número cento e dezassete da Rua Marquês de Fronteira, no Cartório Notarial de Lisboa, perante a notária F… em substituição do Notário G…, o reclamante adquiriu a fracção autónoma designada pela letra “U”, fracção imobiliária n.º 20, do prédio urbano denominado “Aldeamento Turístico B…”, sito no Lote AL 10, Quinta do Lago, freguesia de Almancil, inscrita na respectiva matriz predial sob o artigo 11086, para a qual foi reconhecida indevidamente, pelo notário a isenção do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.° 20º do DL 423/83, de 5/12 (Utilidade Turística) (doc. de fls. 13 a 18).
2- Que pelo ofício n.° 9092 de 10-08-2007, da Direcção de Finanças de Faro (Divisão da Inspecção Tributária III), foi o reclamante notificado para efectuar o pagamento voluntário do IMT no prazo de 15 dias.
3 — Aos 30 de Janeiro do ano de 2008 foi entregue em nome do reclamante a declaração modelo 1 a que se refere o art.° 19. do Código do Imposto Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, para a liquidação do IMT devido pela compra efectuada, tendo sido atribuído o n.° 2008/27123. Com base nesta declaração foi liquidado o IMT na importância de € 30.249,00, pago em 2008-01-30, pelo documento n.° 160.108.002.480.803, na secção de cobrança do serviço local de finanças do Porto 3 (doc. a fls l2).
4 — Na mesma data e local o reclamante efectuou ainda o pagamento da importância de € 3.238,40, de Imposto de Selo, cobrado nos termos da verba 1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, dado ter havido redução a um quinto nos termos do disposto no art.º. 20.° n.° 1 do DL n.° 423/83, de 5 de Dezembro, pago pelo documento n.º 80159430801 (doc. a fls. 11).
5 — Porque a reclamante apresentou fora do prazo legal a declaração modelo 1 para a liquidação do IMT que se mostrasse devido, foi liquidada a coima no montante de € 1.017,17, e cujo pagamento foi efectuado em 28-12-2007 (doc. de fls. 14).
6 — O despacho publicado no Diário da República, 2. Série — N.º 195, de 10 de Outubro de 2006, do Exmo. Senhor Secretário de Estado do Turismo de 25 de Agosto de 2006, confirmando a utilidade turística atribuída a título prévio ao Aldeamento Turístico B…, com a classificação de 4 estrelas, sito na Quinta do lago, lote AL 10, r/c 1.° Almancil, respeita à empresa proprietária do estabelecimento ou seja a sociedade C…, NIPC … (doc. a fls. 19).
Assim, pelo exposto, e uma vez que a liquidação se encontra correctamente efectuada, sou de parecer que a presente reclamação deve ser indeferida.
Porém V. Exa. superiormente melhor resolverá
Remetam-se os autos ao Ex.mo. Senhor Director de Finanças de Faro.
Loulé, 16 de Maio de 2008»
L) — Por despacho de 30/05/2008, foi indeferida a reclamação graciosa nos termos seguintes (fls. 45 a 47 do processo administrativo apenso):
Aos 2008/04/30, foi apresentada no Serviço de Finanças de Loulé 1, a reclamação graciosa constante de fls. 3 a 11, dos autos, deduzida nos termos do art.° 68.° e 55.º do CPPT, em que é reclamante A… NIF …, residente na Rua …, Porto, aqui representado por E…, advogado, NIF …, com domicilio profissional em Rua …, Lisboa.
A presente reclamação graciosa é o meio próprio, foi apresentada tempestivamente (art.° 70.° n.°1 e 102.° n.° 1 CPPT) e a reclamante é parte legitima (art.° 65.° LGT e 9.° n.°1 CPPT).
Analisados os documentos juntos ao processo, bem como proposta de fls. 42 e 43, elaborada nos termos do n.° 2 do art.° 73.º do CPPT, pelo órgão periférico local, conclui-se o seguinte:
Aos 2007/06/08, por escritura pública de compra e venda, celebrada no Cartório Notarial de Lisboa, sito no 3.º andar esquerdo do n.º 117 da Rua Marquês de Fronteira, perante a notária F…, foi adquirido, pelo reclamante a C…, SA, NIPC …, a fracção “U”, fracção imobiliária 20 (vinte), do prédio urbano sito em B… - Quinta do Lago, freguesia de Almancil, concelho de Loulé, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 11086, tendo-lhes sido reconhecida, pela notária, a isenção de IMT ao abrigo do art.° 20.º do DL 423/83, de 5/12 (cfr. fls. 14 a 18).
Em 2007/08/10, o reclamante foi notificado, pelo ofício n.° 9092, pelo Serviço de Inspecção Tributária III da Direcção Finanças Faro, para efectuar, no prazo de 15 (quinze) dias, o pagamento voluntário do IMT devido, pela aquisição acima referenciada, e, pela qual foi, erroneamente, reconhecida a isenção.
Aos 2008/01/30, foi entregue a declaração modelo 1 de IMT, e, com base nesta, liquidado e pago o imposto no montante de € 30.249,60, através do DUC 160.108.002.480.803, n.º registo 27123, tendo, ainda, sido pago o valor de € 3.238,40, de Imposto de Selo, reduzido a um quinto, conforme disposto no art.° 20.°, n.°1 do DL 423/83, de 5/12 (cfr. fls. 11 e 12).
Em 2006/10/10, foi publicado no DR - 2.ª Série, o Aviso de que por despacho do Secretário de Estado do Turismo de 2006/08/25, foi confirmada a utilidade turística, atribuída a título prévio, ao Aldeamento Turístico B…, com a classificação de 4 estrelas, sito na Quinta do Lago, lote AL 10, Almancil, Loulé de que é requerente C…, SA (cfr. fls. 19).
Conforme dispõe o art.° 20.° do Decreto Lei n.° 423/83, de 05/12,”são isentas de sisa (agora IMT) ... as aquisições de prédios ou fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação, seja atribuída a titulo prévio”, pelo que, ficam, assim, excluídos os empreendimentos qualificados de utilidade turística já instalados que não sejam objecto de remodelação ou ampliação, sendo nesta exclusão que se enquadra a fracção adquirida por A… a C… SA, pelo que não pode, o adquirente, beneficiar da isenção de imposto, conforme previsto no decreto, acima referido.
Assim, e, sendo que a liquidação foi correctamente efectuada, não assiste razão ao reclamante na sua pretensão.
Pelo exposto, no uso da competência que me foi conferida pelo n.° 1 do art.° 75.° do CPPT, INDEFIRO O PEDIDO, não concedendo, ao reclamante a restituição dos valores, devidamente, pagos.
Notifique-se.
Cumpra-se.
Direcção de Finanças Faro, 08/05/30».
M) — O despacho a que se refere a alínea anterior foi notificado ao Impugnante em 09/06/2008 - cfr. fls. 48 a 50 do processo administrativo apenso.
N) — A petição inicial da presente impugnação foi apresentada em 24/06/2008 - cfr. fls. 40 dos presentes autos.
O) — É do seguinte teor o Aviso de 27/09/2006 da Comissão de Utilidade Turística:
«MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DA INOVAÇÃO
Direcção-Geral do Turismo
Comissão de Utilidade Turística
Sector de Utilidade Turística
Aviso
Por despacho do Secretário de Estado do Turismo de 25 de Agosto de 2006, foi confirmada a utilidade turística, atribuída a título prévio, ao Aldeamento Turístico B…, com a classificação de 4 estrelas, sito na Quinta do Lago, lote AL 10, Almancil, concelho de Loulé, distrito de Faro, de que é requerente C…, SA.
A referida utilidade turística é concedida nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, n.º 1, alínea a) (com a redacção dada pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 38/94, de 8 de Fevereiro), 5.º, n.º 1, alínea a), 7.º, n.ºs 1 e 3, e 11.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, valendo pelo prazo de sete anos contado a partir da data da emissão da licença de utilização turística pela Câmara Municipal em 21 de Novembro de 2005, ficando, nos termos do disposto no artigo 8.º do referido decreto-lei, dependente do cumprimento dos seguintes condicionamentos:
a) O estabelecimento deverá manter as exigências legais para a classificação definitiva atribuída: aldeamento turístico de 4 estrelas; b) A empresa não poderá realizar sem prévia autorização da Direcção-Geral do Turismo e conhecimento da Comissão de Utilidade Turística quaisquer obras que impliquem alteração do projecto aprovado ou das características arquitectónicas dos edifícios respectivos.
De acordo com o n.º 4 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro (com a redacção introduzida pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 38/94, de 8 de Fevereiro), conjugado com o disposto no artigo 22.º daquele diploma, a Comissão é de parecer que a empresa proprietária e exploradora do empreendimento fique isenta, relativamente à propriedade e exploração do mesmo, das taxas devidas ao Governo Civil e à Inspecção-Geral das Actividades Culturais desde a data da emissão da licença de utilização turística por um prazo correspondente ao legalmente estabelecido para efeitos de isenção do imposto municipal sobre imóveis (IMI) - sete anos - de acordo com o artigo 43.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, conjugado com o n.º 6 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, isto é, de 21 de Novembro de 2005 até 21 de Novembro de 2012.
27 de Setembro de 2006. - Pela Comissão de Utilidade Turística, H…».
P) — A fracção adquirida pelo Impugnante continua afecta à exploração turística.
III – Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Mmo. Juiz do TAF de Loulé que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pelo ora recorrente contra a liquidação de Imposto Municipal sobre a Transmissão de Bens Imóveis (IMT) e de Imposto do Selo (IS), e correspondentes juros compensatórios, incidentes sobre a aquisição de um prédio urbano.
Alega o recorrente que, tendo-lhe sido atribuída a utilidade turística previamente à aquisição do referido imóvel, a essa transmissão lhe são aplicáveis os benefícios fiscais previstos no artigo 20.º do DL 423/83, de 5/12, mais concretamente a isenção de IMT e a redução a um quinto do IS.
Entendeu o Mmo. Juiz “a quo”, porém, que tais benefícios, além de não constarem do respectivo despacho de atribuição de utilidade turística, foram revogados pelo DL 485/88, de 30/12, pelo que não só os impostos liquidados, e ora impugnados, se mostram devidos como é imputável ao recorrente o retardamento da sua liquidação, o que fundamenta a liquidação dos juros compensatórios efectuada.
Vejamos. Considera o Mmo. Juiz “a quo na sentença recorrida, desde logo, que os benefícios previstos nos artigos 16.º a 24.º do DL 423/83, de 5/12, entre os quais se integram os aqui em causa previstos no artigo 20.º - isenção total de IMT e redução a 1/5 do IS - terão sido revogados pelo DL 455/88, de 30/12.
Dispõe o artigo 3.º deste diploma legal que são revogados, a partir da sua entrada em vigor, sem prejuízo da manutenção dos já concedidos e dos regimes de caducidade previstos na legislação ao abrigo da qual estão a ser usufruídos, os benefícios fiscais constantes da legislação a seguir indicada, designadamente as alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 16.º, no que respeita à contribuição industrial e ao imposto complementar – secções A e B, o artigo 19.º e, bem assim, os constantes dos artigos 16.º a 27.º do DL 423/83, de 5/12, diploma que estabelece benefícios susceptíveis de serem concedidos no âmbito da atribuição de utilidade turística, na parte que com aqueles estejam correlacionados (n.º 22 do citado artigo).
Ora, contrariamente ao entendido pelo Mmo. Juiz “a quo”, a expressão utilizada na última parte do preceito em análise «na parte que com aqueles estejam correlacionados» só pode ter como objectivo o de limitar a revogação dos benefícios fiscais àqueles que tenham uma relação com os tributos que são referidos nesse mesmo n.º 22 e que são a contribuição industrial e o imposto complementar – secções A e B.
A interpretação que defenda que desta disposição resultou a revogação de todos os benefícios fiscais constantes dos artigos 16.º a 27.º do DL 423/83 é destituída de qualquer fundamentação.
Se assim fosse, de facto, como salienta o recorrente nas suas alegações, como se compreenderia que no seu Ofício-Circular D-1/91, de 14 de Junho, mais concretamente no seu ponto n.º 4, a Administração Fiscal viesse dispor que «Nestes termos, esclarece-se que só podem beneficiar de isenção de sisa (actual IMT), ao abrigo do Decreto-Lei 423/83, de 5 de Dezembro, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos já qualificados de utilidade turística, ainda que a título prévio, na data de transmissão daqueles bens».
Na verdade, se tal benefício fiscal tivesse sido revogado em 1988 não haveria necessidade de, em 1991, estar a AF a regular a sua aplicação.
Aliás, este foi também o entendimento do Grupo que, a pedido do Ministro de Estado e das Finanças, produziu o Relatório de Reavaliação dos Benefícios Fiscais, publicado no Caderno de Ciência e Técnica Fiscal n.º 198, onde a páginas 289 e seguintes se afirma «Posteriormente, no âmbito das acções legislativas de preparação da reforma fiscal de 1988 e da aprovação de vários sistemas de incentivos financeiros, o n.º 22 do artigo 3.º do Decreto-Lei 485/88, de 30 de Dezembro, revogou algumas das normas de benefícios fiscais do citado Decreto-Lei 423/83. Embora a técnica de redacção da norma confirma alguma margem de incerteza, é consensual, e resulta, aliás, do processo subsequente de aplicação da norma e de sucessivas intervenções do legislador, que o mencionado diploma de 1988 visou apenas a revogação, sem prejuízo das situações já constituídas à data da respectiva entrada em vigor, da isenção de contribuição industrial e de imposto complementar, compreendendo a redução para metade dos prazos de reintegração e amortização, não tendo sido visados pela revogação os benefícios em sede de contribuição predial, sisa e selo».
No mesmo sentido, veja-se, ainda, Guilherme de Oliveira Martins, in “Os Benefícios Fiscais: Sistema e Regime”, publicada nos Cadernos IDEFF, n.º 6, de Dezembro de 2006, onde no conjunto de medidas de incremento ao investimento em sede de IMT referidas a páginas 189 e seguintes se inclui o DL 423/83, de 5 de Dezembro.
Daí que, não obstante a redacção menos feliz da disposição em apreço, se não possa concluir, como se fez na sentença recorrida, que os benefícios constantes do artigo 20.º, n.º 1 do DL 423/83, de 5/12, tenham sido revogados pelo artigo 3.º, n.º 22, do DL 485/88, de 30 de Dezembro.
Por outro lado, também se não acompanha a decisão recorrida no segmento em que esta considera que tais benefícios fiscais dependiam de um reconhecimento prévio por parte da entidade que concedeu o estatuto de utilidade turística, ou seja, que essa isenção deveria ter constado do despacho proferido pelo Secretário de Estado do Turismo.
Com efeito, da análise do DL 423/83 resulta que em nenhuma das suas normas se condiciona a atribuição da isenção de IMT ou de redução de IS, estas sim expressamente previstas no n.º 1 do artigo 20.º, à sua expressa referência e previsão no próprio despacho de atribuição de utilidade turística.
Os únicos benefícios fiscais sobre os quais este despacho se deve pronunciar são apenas aqueles que estão previstos no artigo 16.º, cujo n.º 4, na redacção introduzida pelo DL 38/94, de 8/2, estabelece que «para os efeitos da alínea b) do n.º 1 (isenção ou redução das taxas devidas, por licenças, aos governos civis e à Direcção-Geral dos espectáculos), o despacho de atribuição da utilidade turística definirá, sob proposta da Comissão de Utilidade Turística, a medida e o prazo dos benefícios a conceder».
E se fosse outra a intenção do legislador é evidente que a teria consagrado.
E, assim sendo, os benefícios fiscais aqui em causa resultam imediata e directamente da lei (n.º 1 do artigo 20.º do DL 423/83, de 5/12), ou seja, são automáticos, verificados que estejam os pressupostos de aplicação que não compreendam actos de reconhecimento a não ser a qualificação de utilidade turística, ainda que atribuída a título prévio.
Neste sentido, veja-se o acórdão deste STA de 2/10/1991, proferido no recurso n.º 13016, no qual se conclui que as isenções previstas no n.º 1 do artigo 20.º do DL 423/83 se apresentam com a natureza de automáticas e vinculadas.
Tendo tais benefícios, assim, natureza automática, é óbvio que os mesmos são de aplicação automática verificados os condicionalismos legalmente impostos.
No caso em apreço, as únicas condições que a lei impõe para a isenção total de IMT e parcial de IS são que seja declarada a utilidade turística do empreendimento anteriormente à transmissão do imóvel, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento, e que o imóvel adquirido se destine à instalação de empreendimentos turísticos.
Sendo que a verificação de tais condições nem sequer foi questionada pelo Mmo. Juiz “a quo” na decisão recorrida.
Ou seja, não prevendo o legislador que os benefícios em causa tenham que constar do despacho de atribuição de utilidade turística, ao contrário do que sucede nas situações do n.º 4 do artigo 16.º citado, declarada a utilidade turística e destinando-se o imóvel à instalação de um empreendimento turístico, é evidente que a isenção de IMT e a redução de IS operam directa e automaticamente.
Razão por que as liquidações efectuadas não têm fundamento legal.
E, consequentemente, não sendo devidos os impostos impugnados, não poderá haver lugar à correspondente liquidação de juros compensatórios.
Por último, mostrando-se efectuado o pagamento dos impostos liquidados (v. alíneas G) e H) do probatório), cabe apreciar se serão, ou não, devidos juros indemnizatórios, como vem requerido.
O direito a juros indemnizatórios está consagrado no artigo 43.º da LGT, no qual se estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Como se concluiu no acórdão desta Secção de 12/11/2009, proferido no recurso n.º 681/09, «Havendo um erro de direito na liquidação e sendo ela efectuada pelos serviços, é à administração tributária que é imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte.
Por outro lado, esta imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa de qualquer dos seus funcionários ao efectuar liquidação afectada por erro.
Na verdade, a letra da lei, ao referir a imputabilidade do erro aos serviços, aponta manifestamente no sentido de poder servir de base à responsabilidade por juros indemnizatórios a falta do próprio serviço, globalmente considerado, como aliás, é admitido em geral. (Neste sentido, pode ver-se FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, volume III, página 503). A administração tributária está genericamente obrigada a actuar em conformidade com a lei [arts. 266.°, n.° 1, da C.R.P., 17.°, alínea a), do C.P.T. e 55.° da L.G.T.], pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços.».
Ora, no caso dos autos, verifica-se claramente um erro de direito por parte da AT na medida em que procedeu a uma liquidação de impostos e juros compensatórios quando a lei concedia benefícios fiscais ao contribuinte, obrigando este a pagar uma quantia indevidamente.
Deste modo, em face do citado artigo 43.º da LGT, impõe-se a condenação da entidade liquidadora a pagar juros indemnizatórios ao impugnante, ora recorrente, contados desde a data do pagamento dos impostos liquidados até à data da emissão da respectiva nota de crédito a favor do mesmo (artigo 61.º, n.º 3 do CPPT).
Neste mesmo sentido, veja-se também o acórdão desta Secção de 2/12/2009, proferido no recurso n.º 783/09.
A sentença recorrida que assim não entendeu não pode, por isso, manter-se.
IV – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA em:
- conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida, e julgar procedente a impugnação judicial, anulando-se, em consequência, as liquidações respectivas efectuadas.
- condenar a Administração Fiscal a pagar juros indemnizatórios ao impugnante, ora recorrente, contados desde a data do pagamento dos impostos liquidados até à data da emissão da respectiva nota de crédito a favor daquele.
Custas pela Fazenda Pública, apenas na 1.ª instância, fixando-se a procuradoria em 1/8.
Lisboa 9 de Dezembro de 2009. – António Calhau (relator) – Miranda de Pacheco – Lúcio Barbosa.