Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0212/05
Data do Acordão:11/30/2005
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PIMENTA DO VALE
Descritores:REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA.
ISENÇÃO DE MULTA.
MULTA PROCESSUAL.
PRÁTICA DO ACTO PROCESSUAL COM MULTA.
MANDATÁRIO JUDICIAL.
NOTIFICAÇÃO.
NOTIFICAÇÃO ENTRE MANDATÁRIOS.
Sumário:I – A Fazenda Pública pode usar da faculdade prevista no artº 145º, nº 5 do CPC sem sujeição à multa aí cominada.
II – O representante da Fazenda Pública não deve ser considerado mandatário judicial para efeito da aplicação do disposto no artº 229º-A do CPC.
Nº Convencional:JSTA00062699
Nº do Documento:SA2200511300212
Data de Entrada:02/16/2005
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF BRAGA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - INPUGN JUDICIAL.
Área Temática 2:DIR PROC CIV.
Legislação Nacional:CPC96 ART145 N5 N6 ART229-A N1 N2.
CCIV66 ART8 N3.
RCPT98 ART3.
CPTA02 ART189.
CCJ03 ART2.
CPPTRIB99 ART9 N1 N4 ART15.
LOFTJ99 ART114 ART115.
EOADV05 ART61 N3 ART62 N1.
ESOL99 ART99.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC195/05 DE 2005/05/25.; AC STAPLENO PROC30742 DE 1995/05/02.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A Fazenda Pública, não se conformando com a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que ordenou que se cumprisse em relação à mesma o disposto no artº 145º, nº 6 do CPC, uma vez que apresentou a sua contestação para além do prazo legal, no processo de impugnação judicial deduzido por A..., contra o acto de liquidação de IRS, relativo ao ano de 1997, no valor de € 4.671,67 e que ordenou, ainda, que as partes se notificassem mutuamente, nos termos do artº 229º-A do CPC, dela vem interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões:
A. A Fazenda Pública não se conforma com as duas vertentes do despacho de 05.11.04, que ordenou a liquidação de multa, nos termos do art. 145°, n° 6 do CPC, relativamente à apresentação tardia da sua contestação, ao abrigo do disposto no art. 145°, n° 5 do mesmo Código, com a cominação de que o não pagamento da multa implicaria a não validação do acto tardio; advertindo ainda, que na qualidade de parte, deveria proceder, sendo caso disso, à notificação da parte contrária, nos termos do art. 229°-A do CPC.
B. No que concerne à primeira parte do despacho recorrido, a natureza judicial do processo de impugnação, impõe em sede das regras de contagem de prazos para a prática de actos no processo tributário, o recurso, nos termos do art. 20°, n° 2 do CPPT, à contagem de acordo com as regras do CPC.
C. Aplicando, as disposições dos art. 144° e 145° daquele Código, o prazo de 90 dias que se iniciou no dia seguinte ao dia em que foi notificada a Fazenda Pública por termo lavrado nos autos, com data de 26 de Setembro de 2002, suspendeu-se entre 22 de Dezembro de 2002 e 3 de Janeiro de 2003, em virtude das férias judiciais de Natal, ao abrigo das disposições conjugadas do art. 144°, n° 1 do CPC e art. 12° LOFTJ, vindo a verificar-se o seu terminus em 7 de Janeiro de 2003.
D. Por sua vez, o nº 3 do art. 145° do CPC dispõe que o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto a que se reporta, vindo contudo a ser admitida a prática de acto processual, independentemente de justo impedimento, nos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, podendo esta ser utilizada pelo representante da Fazenda Pública, sem invocação de justo impedimento e sem que seja exigível multa para a validação da prática do acto.
E. Pelo que a apresentação da contestação pela Fazenda Pública em 10.01.2003, com requerimento de que o acto fosse considerado acto praticado nos 3 primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, de harmonia com o previsto no n° 5 do art. 145° do CPC, deve ser considerada válida sem que seja exigível a multa liquidada nos termos do n° 6.
F. No que concerne à parte final do despacho recorrido, haverá a ter em consideração que a Representação da Fazenda Pública não integra o âmbito subjectivo do artigo 229°-A do CPC.
G. Ainda que a Fazenda Pública integrasse o âmbito subjectivo desta disposição, as alegações de recurso em processo judicial tributário não integram o âmbito material do artigo 229°-A do CPC.
H. O douto despacho recorrido violou o disposto no art. 20° nº 2 do CPPT e art. 145° do CPC e artigo 229°-A do CPC.
O impugnante não contra-alegou.
O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, conforme jurisprudência desta Secção do STA, que cita.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – As questões suscitadas no presente recurso foram já objecto de decisão nesta Secção do STA, no acórdão de 25/5/05, rec. nº 195/05, tirado num caso em tudo idêntico, sendo as conclusões das alegações as mesmas e o mesmo o recorrente.
Sendo assim e atento o disposto no artº 8º, nº 3 do CC, vamos aqui seguir de perto o referido aresto, já que não vemos motivo para alterar a jurisprudência nele fixada.
Diz-se, então, no citado aresto que “o nº 5 do art. 145º do CPC, permite ao interessado praticar o acto para além do prazo legal (até aos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo), mediante uma multa, que é agravada, caso o acto seja praticado nesse prazo suplementar, mas sem o pagamento imediato daquela multa (nº 6 do citado artigo).
No dizer do acórdão do Pleno da Secção Administrativa deste STA de 2/5/95 (rec. nº. 30.742), “o fim visado pelo legislador foi prescindir da prova do justo impedimento, em certos casos, por este muitas vezes se mostrar difícil, presumindo-se que se o acto praticado inicialmente nos três dias úteis seguintes ao termo do prazo, que não tinha sido praticado atempadamente por justo impedimento, mas faz-se depender a sua validade do pagamento de uma multa e isto, por um lado porque a multa tem a finalidade moralizadora de evitar abusos, de evitar que o recurso a este preceito se transforme num mau hábito e, por outro lado, porque se o interessado recorresse ao incidente previsto no art. 146º também ficaria sujeito a custas”.
De qualquer modo, o certo é que parece inquestionável que o preceito em causa tem íntima conexão com as custas do processo, como se vê claramente do articulado do citado nº 5 do art. 145º do CPC.
Ora, a FP estava então isenta de custas, como inequivocamente decorre do art. 3º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários (Dec-Lei n. 29/98, de 11/2).
Ora, e porque estava isenta de custas, está isenta de multa.
É certo que a situação hoje se alterou, devendo o Estado pagar custas – vide artºs. 189º do CPTA e art. 2º do CCJ.
Mas estas disposições não têm aplicação ao caso concreto.
É pois por esta razão (que colhe também assentimento naquele referido acórdão) que as disposições citadas (artº 145º, nºs. 5 e 6 do CPC) não se aplicam ao representante da Fazenda Pública.
Procede assim o recurso neste segmento”.
Quanto à segunda questão, dispõe o art. 229º-A do CPC, no seu nº 1, que “nos processos em que as partes tenham constituído mandatário judicial, todos os articulados e requerimentos autónomos que sejam apresentados após a notificação ao autor da contestação do réu, serão notificados pelo mandatário judicial do apresentante ao mandatário judicial da contraparte, no respectivo domicílio, nos termos do artº. 260º-A”.
E no seu nº 2 estabelece que “o mandatário judicial que só assuma o patrocínio na pendência do processo, indicará o seu domicílio profissional ao mandatário judicial da contraparte”.
“Como logo se vê, até pelos termos literais do nº 1, complementado pelo nº 2 da ora citada disposição legal, tais notificações ocorrem apenas entre mandatários judiciais. E só entre estes.
Assim só haverá lugar a tal notificação se o representante da FP for considerado mandatário judicial.
E é óbvio que não é.
Na verdade, mandatários judiciais são apenas os advogados e os solicitadores – vide artºs. 114º e 115º da LOTJ, 61º, 3, e 62º, 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados e 99º, 1, do Estatuto da Câmara dos Solicitadores.
E, nas “causas judiciais” tributárias, mandatários judiciais são os advogados – art. 6º, nº 1, do CPPT.
O Representante da Fazenda Pública tem uma norma especial – art. 9º, nº 4, aí se dizendo que tem legitimidade no processo judicial tributário.
E a sua competência, nos tribunais tributários está inscrita no art. 15º do CPPT.
Como bem refere o recorrente, a Fazenda Pública faz parte do Estado-Administração, representando-o em juízo no processo judicial tributário, sendo tal representação diversa da representação legal ou da representação voluntária.
Entendemos assim que o disposto no art. 229º-A do CPC é inaplicável ao Representante da Fazenda Pública no processo judicial tributário, pelo que procede também o recurso neste específico segmento” (aresto citado).
3 – Nestes termos, acorda-se em conceder provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido.
Sem custas.
Lisboa, 30 de Novembro de 2005. – Pimenta do Vale (relator) – Lúcio Barbosa – Vítor Meira.