Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:024/21.4BESNT
Data do Acordão:09/09/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS
MEIO PROCESSUAL ADEQUADO
Sumário:Se o acórdão recorrido aparentemente decidiu bem a questão da inidoneidade do meio processual, com recurso a uma fundamentação plausível, no juízo sumário e perfunctório que esta apreciação preliminar comporta, não deve ser admitido o recurso de revista até por a questão não assumir especial relevância jurídica, nem se afigurar necessária uma melhor aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P28125
Nº do Documento:SA120210909024/21
Data de Entrada:07/20/2021
Recorrente:A.........
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar


Acordam no Supremo Tribunal Administrativo


1. Relatório

A………… interpôs no TAF de Sintra contra o Ministério da Justiça, Intimação para Protecção de Direitos, Liberdades e Garantias, nos termos do art. 109º, nº 1 do CPTA, por lhe ter sido aplicada, por decisão do Conselho do Notariado no âmbito de processo disciplinar a sanção de multa no montante de €5.000,00, “e ainda o dever de entregar de imediato à Senhora Notária…, todo o arquivo que se encontrava até então à sua guarda”, decisão da qual foi notificado em 05.12.2018.
Por sentença do TAF de Sintra, datada de 18.01.2021, foi julgada verificada a excepção de caso julgado, rejeitando-se liminarmente a petição inicial.
Por acórdão de 06.05.2021 o TCA Sul manteve aquela sentença com diferente fundamentação.

É deste acórdão que o Autor interpõe o presente recurso de revista invocando o disposto no art. 150º, nº 1 do CPTA para a admissão da revista.

Em contra-alegações defende-se que o recurso deve ser rejeitado ou improceder.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

Na presente revista o Recorrente invoca que o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia (art. 615º, nº 1, al. d) do CPC), por não ter conhecido da incompetência do tribunal.
Invoca ainda que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento já que o Recorrente não pode ser sujeito à aplicação de penas disciplinares, pela Administração sem prévio – material e definitivo – escrutínio judicial, nos termos dos arts. 20º, nº 4 e 268º, da CRP, e do nº 1 do art. 77º e nº 1 do art. 88º do EN e do art. 628º do CPC. Não dispondo o Recorrente de outro meio para garantir a concretização do seu direito fundamental.

Mas, a argumentação do Recorrente não convence.

O TAF de Sintra indeferiu liminarmente a petição inicial por ter julgado verificada a excepção de caso julgado que suscitara oficiosamente, e face ao decidido no processo cautelar nº 8/19BELSB-A, por sentença de 02.12.2020, transitada em julgado.

O acórdão recorrido considerou, porém, que a presente acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias “…não era o meio adequado, nos termos do art. 109, nº 2 do CPTA, já que sempre seria possível o recurso à tutela cautelar (vide art. 109º do CPTA), uma vez que, segundo o Recorrente, está em causa a “paralisação de efeitos de decisão disciplinar”, respondendo o sistema judicial através do recurso à aludida tutela cautelar e não da intimação.
Daí o erro do Tribunal a quo ao reconhecer, para efeitos de verificação da excepção de caso julgado, ao abrigo do disposto nos arts. 580.º e 581.º do CPC, implicitamente que o pedido (cautelar) formulado na presente intimação poderia ser apreciado, quando tal não seria viável.
Porquanto, o recurso ao presente meio processual para os efeitos pretendidos pelo ora intimante só poderá vir a ser usado, nas condições específicas que foram relatadas no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15.12.2016, no Proc. nº 1668/16.1BELSB, …
(…)
Donde, sempre estaria vedado ao Recorrente, em face da improcedência, e não insuficiência da tutela cautelar, usar da presente intimação para sustar os efeitos derivados duma decisão disciplinar já impugnada em sede de acção principal, a correr os seus termos.
(…)
Se o Recorrente discordava com o decidido no Proc. nº 8/19.2BELSB-A deveria ter interposto o respectivo recurso jurisdicional e, se de facto a sentença padecesse de “ilegalidades e erro” que ora invoca, caberia ao Tribunal superior apreciar e decidir em conformidade.
O que não fez, permitindo o trânsito em julgado da aludida sentença, com as legais consequências. (…)
Há assim que concluir que presente meio processual de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é inidóneo para o fim visado pelo intimante, de paralisação dos efeitos da decisão punitiva, daí o erro do Tribunal.
O que conduz ao indeferimento liminar em conformidade com o artigo 110º, nº 1, 1ª parte do CPTA, conjugado com o artigo 590.º do CPC, aplicável ex vi do n.º 9 do artigo 87.º do CPTA.”
Assim, o TCA julgou o recurso improcedente, embora com fundamentação diferente da vertida em 1ª instância.


Ora, quanto à nulidade por omissão de pronúncia imputada ao acórdão recorrido (art. 615º, nº 1, al. d) do CPC) pelo Recorrente, não parece que se verifique, como se afirma no acórdão complementar de 17.06.2021 em que se apreciou a arguição de tal nulidade, no qual se diz que a questão da competência [do Juízo Social do TAF de Sintra por contraposição ao Juízo Comum incompetente para conhecer do presente litígio] não foi atacada pelo meio próprio – o recurso jurisdicional, não justificando a sua arguição a admissão da revista.
Quanto à inidoneidade do meio processual o acórdão recorrido aparentemente terá decidido bem, com recurso a uma fundamentação plausível, no juízo sumário e perfunctório que esta apreciação preliminar comporta, pelo que não deve ser admitido o recurso, por não se justificar postergar a regra da excepcionalidade da revista, uma vez que a questão não assume especial relevância jurídica, nem se afigura necessária a uma melhor aplicação do direito.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em não admitir a revista.
Sem custas.

Nos termos e para os efeitos do art. 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13/3, a relatora atesta que os Exmos Juízes Adjuntos - Conselheiro Carlos Carvalho e José Veloso -, têm voto de conformidade.

Lisboa, 9 de Setembro de 2021
Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa