Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0590/11
Data do Acordão:11/23/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
ISENÇÃO
BENEFÍCIOS FISCAIS
DOMICÍLIO FISCAL
REVOGAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO
Sumário:I - O acto administrativo que reconheça indevidamente um benefício fiscal só pode ser revogado, com efeitos ex tunc, dentro do prazo previsto no artigo 141º do CPA, ou seja, dentro de um ano após a sua prática.
II - O facto dos sujeitos passivos não terem comunicado a mudança de domicílio para o prédio relativamente ao qual pediram a isenção de IMI, por si só, não indicia que não têm habitação própria e permanente nesse prédio.
III - A morada em certo lugar, a habitatio, pode demonstrar-se através “factos justificativos” de que o beneficiado fixou no prédio o centro da sua vida pessoal.
Nº Convencional:JSTA00067265
Nº do Documento:SA2201111230590
Data de Entrada:06/14/2011
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A... E OUTRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA PER SALTUM
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IMI
DIR PROC ADM GRAC - PRINCIPIOS GERAIS
Legislação Nacional:EBFISC89 ART9 ART12 N1 N2 N4 ART14 N4 ART42 ART46
LGT98 ART14 ART19 N1 N6 ART59
CPA91 ART141
CPTA02 ART58 N2 A
CCIV66 ART82
CONST97 ART65 N2 C
CPPTRIB99 ART65 N8
Referência a Doutrina:PIRES DE LIMA E OUTRO CÓDIGO CIVIL ANOTADO VI PAG98
LUIS CARVALHO FERNANDES TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL VI PAG380 PAG381.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1.1. A Fazenda Pública interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a impugnação instaurada por A…… e mulher, B……, com os demais sinais nos autos, contra o despacho da Chefe dos Serviços de Finanças da Marinha Grande, datado de 16/11/2007, que revogou o benefício de isenção fiscal de Imposto Municipal de Imóveis (IMI) que lhes havia sido em 2003 e que liquidou o IMI dos anos 2003 a 2008.
Para tal, nas alegações, conclui o seguinte:
A) Os autores deduziram impugnação judicial contra a cessação do Benefício Fiscal que consistia na isenção de Contribuição Autárquica/IMI relativa ao prédio urbano inscrito na respectiva matriz da freguesia de Vieira de Leiria, concelho de Marinha Grande, distrito de Leiria sob o art. 5038.
B) O pedido de isenção foi efectuado em 2003-02-07, pelo que, apesar de se ter indicado o início da habitação em 2002-12-22, o fim da isenção ocorreria em 2011, tendo os contribuintes perdido, em função do atraso no pedido, um ano de isenção.
C) Posteriormente, por se ter verificado que os contribuintes não procederam à alteração do seu domicílio fiscal para o prédio, objecto da isenção, foi a mesma retirada com base no art. 19° e n° 4 do art. 14° da LGT e ainda do n° 2 do artigo 12º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
D) A douta Sentença recorrida decidiu pela procedência da impugnação por entender que a falta de comunicação da alteração do domicílio fiscal dos beneficiários da isenção não seria relevante, não dando lugar à cessação do benefício.
E) Entende Sua Exa o Meritíssimo Juiz “a quo”, e com isto motivando a sua decisão que Decisivo é que a não comunicação não é fundamento de revogação do benefício”.
F) A Fazenda Pública considera, em contrário, que a decisão da douta sentença faz tábua rasa de todo o espírito que preside à concessão dos benefícios fiscais e que viola frontalmente os artigos anteriormente referidos, a saber, o n° 4 do art. 14° e o art. 19° da LGT e do então n° 1 e 2 do artigo 12º Estatuto dos Benefícios Fiscais.
1.1. Não houve contra-alegações
1.2. O digno Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
2. A sentença deu por assente os seguintes factos;
a) Em 07/02/2003, os impugnantes, A…… e B……, com residência indicada na Rua …… nº ……, Vieira de Leiria, 2430-……., Marinha Grande, requereram à Administração Tributária (AT), ao abrigo do artigo 42-1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), a isenção de contribuição autárquica relativamente a fracção autónoma designada pela letra N do artigo matricial urbano n.° 5038, da freguesia de Vieira de Leiria - cfr. fls. 103 e fls. 2 do PA anexo;
b) Por despacho de 07/10/2003, a AT concedeu a isenção acabada de referir, pelo período de 2002 a 2011, considerando que o prédio foi efectivamente utilizado como habitação própria e permanente em 02/12/2002 - cfr. fls. 103 e fls. 2 do PA anexo;
c) Em 2007, a AT verificou que a morada dos impugnantes, acima referida, constante da base de dados de ambos, não coincidia com a morada do prédio isento, referido em “A”;
d) A AT remeteu aos impugnantes o ofício n° 6477, de 12/10/2007 sobre o projecto de decisão de cessão da isenção, considerando haver falta dos requisitos do beneficio - cfr. fls. 103 e fls. 2 do PA anexo;
e) Em 16/11/2007, a AT proferiu o despacho, ora impugnando, a fls. 103, e fls. 2 do PA anexo, onde determinou a caducidade do benefício fiscal requerido, desde o ano de 2002, do qual destaco o seguinte: «a) Por habitar, residir ou viver, frequentar, entende-se a utilização de um local onde se confeccionam refeições, se recebem e se confraterniza com amigos, onde se praticam actos de higiene, e se dorme, tudo com alguma regularidade; b) A morada em cadastro dos contribuintes é diferente do local da situação do prédio. c) Logo, não lhes aproveita a isenção requerida. d) E, verifica-se a extinção do beneficio requerido, nos precisos termos da parte final do n° 2 do artigo 12° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (.. . )».
f) A morada sita na Rua ……. nº ……, Vieira de Leiria, 2430-……, Marinha Grande, indicada no requerimento de isenção, supra referido, é a morada dos pais do impugnante, C…… e D……., onde, em 2007, eram residentes há mais de 40 anos - cfr. atestado da Junta de Freguesia de Vieira de Leiria, de fls. 15;
g) No início da vida de casados, os impugnantes viveram na morada dos pais do impugnante, acabada de referir em “G”;
h) Os impugnantes desde o início da isenção concedida tiveram como residência habitual, própria e permanente, a fracção autónoma designada pela letra N do artigo matricial urbano nº 5038, da freguesia de Vieira de Leiria, que corresponde ao ……., n° ……., 2430-…… Vieira de Leiria, Marinha Grande, desde Dezembro de 2002 - (cfr. atestado da Junta de Freguesia de Vieira de Leiria, de fls. 16, documentos da EDP de fls. 17 a 57, documentos de água e saneamento do Município da Marinha Grande, de fls. 58 a 91).
i) Dou por reproduzida a informação de fls. 197 e 245, dos SE da Marinha Grande, de 29/05/2009, da qual destaco o seguinte «INFORMO de que em nome de B……, NIF: …… nunca existiram quaisquer prédios urbanos nem rústicos desde o ano de 2001. MAIS INFORMO, de que em nome de A……., NIF: …….. no ano de 2001 existiu o artigo rústico n° 1172 da freguesia de Vieira de Leiria. No ano de 2002 o referido artigo foi eliminado, tendo dado origem ao artigo urbano n° 5038, de que se junta certidão de teor).
j) Dou por reproduzido o “fax” da AT, de fls. 120, que se reporta à entrega de Recurso Hierárquico em 21/11/2007, ao «Processo de isenção de Contribuição Autárquica n°. 97/2003», ao ofício n° 663 de 16/01/2008, bem como os documentos de fls. 121 a 125, e ainda o “fax” e ofício 2642, de 25/03/2008, de fls. 245, que se reporta ao PEF 1392200801006134, e ainda os documentos de fls. 249 a 255 (moradas).
3. A situação de facto resume-se no seguinte: por despacho de 7/10/2003 a administração tributária concedeu aos ora recorridos a isenção da contribuição autárquica (actual IMI) pelo período de 2002 a 2011; os recorridos, desde o início da isenção, tiveram residência habitual, própria e permanente, no imóvel isento, mas não actualizaram essa morada nos serviços de finanças; em 2007, a administração tributária verificou que a morada dos recorridos constante da base de dados não coincidia com a morada do prédio isento; por esse facto, através do acto impugnado, revogaram a isenção concedida em 2003 e liquidaram o IMI dos anos de 2003 a 2008.
A sentença recorrida considerou que «o artigo 12º, nº 4 do EBF proíbe a revogação do acto de isenção fora das circunstâncias ali talhadas» e que «a não actualização da morada correspondente ao novo prédio (urbano, após a construção da fracção no terreno rústico comprado) não tem relevância para a extinção do benefício. É uma questão secundária, que não figura como condição do referido benefício».
Diferente é o entendimento da recorrente, para quem: (i) um dos pressupostos para a concessão da isenção para habitação própria e permanente de um contribuinte é que a sua morada fiscal corresponda ao prédio onde supostamente habita; (ii) como a morada fiscal dos recorridos não corresponde ao prédio para o qual pediram a isenção, nem os recorridos comunicaram qualquer mudança de domicílio, o nº 4 do artigo 14º da LGT e o nº 2 do art. 12º do EBF impõem a perda da isenção.
Antes de mais, vejamos o que diz o artigo 42º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), preceito vigente à data da concessão da isenção do IMI, e que, após a republicação do mesmo pelo DL nº 108/2008 de 26/6, corresponde ao actual artigo 46º:
Ficam isentos de imposto municipal sobre imóveis, nos termos da tabela a que se refere o n.º 5, os prédios ou parte de prédios urbanos habitacionais construídos, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso, destinados à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, e que sejam efectivamente afectos a tal fim, no prazo de seis meses após a aquisição ou a conclusão da construção, da ampliação ou dos melhoramentos, salvo por motivo não imputável ao beneficiário, devendo o pedido de isenção ser apresentado pelos sujeitos passivos até ao termo dos 60 dias subsequentes àquele prazo”.
Esta norma estabelece na sua previsão as condições de verificação da isenção do IMI: (i) um prédio ou fracção de prédio urbano destinado à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar; (ii) um prédio que seja efectivamente afecto a tal fim no prazo de seis meses após a aquisição, conclusão da construção, ampliação ou melhoramentos; (iii) que o pedido de isenção seja apresentado até ao termo de 60 dias subsequentes àquele prazo de seis meses.
Verificados que estejam estes pressupostos, nasce para o sujeito passivo, o proprietário do prédio, o direito ao benefício fiscal na forma de isenção total e temporária do imposto municipal sobre imóveis. Ainda que dependente de reconhecimento declarativo pela administração tributária, o direito à isenção constitui-se por referência à data da verificação daqueles pressupostos. Assim o diz o actual artigo 12º do EBF: «o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada, salvo quando a lei dispuser de outro modo».
O despacho de 07/10/2003 (alínea b) dos factos assentes) consubstancia o acto de reconhecimento do direito dos recorridos ao benefício fiscal. Através desse acto administrativo, praticado no exercício de poderes vinculados, a administração tributária reconhece e declara que estão verificados os pressupostos de facto fixados na norma que atribui o benefício fiscal. Significa isto que, bem ou mal, em 2003 a administração tributária reconheceu o facto constitutivo do direito à isenção do imposto, ou seja, que os recorridos tinham “habitação própria e permanente” no imóvel para que solicitaram isenção de IMI.
A admitir-se, como defende a recorrente, que a fixação do “domicílio fiscal” no imóvel é o facto gerador da relação jurídica de benefício fiscal, então, o acto de reconhecimento da isenção padecia de ilegalidade por erro nos pressupostos de facto, uma vez que o recorrido solicitou a isenção indicando como domicílio fiscal a morada dos seus pais, onde residia com o seu cônjuge.
E o acto impugnado, nos respectivos fundamentos, assim considerou, acabando por determinar a “caducidade” do pedido de isenção. Fê-lo, porém, de modo impróprio, uma vez que a caducidade apenas ocorre pelo decurso do prazo pelo qual o benefício foi concedido e, quando condicionado, pela verificação dos pressupostos da respectiva condição resolutiva ou pela inobservância imputável ao beneficiário das obrigações nele impostas.
Ora, se a ilegalidade estava localizada nos pressupostos de facto do acto de reconhecimento, a forma de a remediar só poderia ser a revogação anulatória, com fundamento nessa ilegalidade.
Para esta forma de extinção dos benefícios fiscais estabelece o nº 4 do artigo 14º do EBF que «o acto administrativo que conceda um benefício fiscal não é revogável, nem pode rescindir-se o respectivo acordo de concessão, ou ainda diminuir-se, por acto unilateral da administração tributária, os direitos adquiridos, salvo se houver inobservância imputável ao beneficiário das obrigações impostas, ou se o benefício tiver sido indevidamente concedido, caso em que aquele acto pode ser revogado».
As duas excepções à irrevogabilidade dos benefícios fiscais previstas na última parte desta norma só podem operar dentro do prazo pelo qual os actos constitutivos de direitos podem ser revogados. Nos termos do art. 141º do CPA esse prazo é o prazo de acção de impugnação que terminar em último lugar, ou seja, segundo o art. 58º, nº 2, alínea a) do CPTA, o prazo de um ano previsto para o MP interpor acção de impugnação de um acto administrativo.
Dito isto, só poderíamos concluir que o acto impugnado, ao destruir ex tunc os efeitos do acto que concedeu a isenção de IMI, é ilegal por violação do artigo 141º do CPA, pois fê-lo muito para além do prazo que a ilegalidade poderia ser eliminada através de revogação.
Vejamos, contudo, os argumentos da recorrente.
Considera ela que o facto material «habitação própria e permanente» compreendido na previsão normativa do artigo 46º do EBF coincide com a noção jurídica de domicílio fiscal. A fixação do domicílio fiscal no local do prédio urbano habitacional é o pressuposto que condiciona a isenção do IMI, uma vez que o critério legal para determinar o domicílio fiscal das pessoas singulares é o «local da residência habitual» (art. 19º nº 1 da LGT).
É evidente que, sendo a residência habitual o local onde a pessoa normalmente vive e tem o seu centro de vida, não medeiam grandes diferenças entre o «domicílio fiscal» e a «habitação permanente»: há entre as duas figuras uma relação íntima, que se traduz em ambas pressuporem um lugar com o qual certa pessoa está em ligação, o local onde tem a sua existência organizada e que, como tal, lhe serve de base de vida.
Mas, no plano conceitual, nem a residência habitual se identifica com a residência permanente, nem o domicílio coincide com a morada, ou seja, o local onde a pessoa tem a sua habitação, tal como se pode inferir dos dois números do artigo 82º do CCiv (cfr. Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, Vol. I, pág. 98 e Luís Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. I, pág. 380 e 381).
O pressuposto «habitação própria e permanente» é a situação de facto que condiciona a isenção do IMI. O requisito da permanência na “habitação” (a lei não utiliza o termo “residência”), deve ser entendido no sentido de habitualidade e normalidade e não propriamente no sentido cronológico absoluto de estadia sem qualquer solução de continuidade. Para se assegurar a finalidade subjacente à atribuição do benefício fiscal, que consiste em estimular e incentivar o acesso à habitação própria (cfr. al. c) do nº 2 do art. 65º da CRP), basta que o beneficiado organize no prédio as condições da sua vida normal e do seu agregado familiar, de tal modo que se veja nele o local da sua habitação.
Para este efeito, os actos ou factos que demonstram a ligação do beneficiado ao prédio isento de IMI não se esgotam na ligação à circunscrição fiscal onde se situa o prédio ou na correspondência da habitação com o domicílio fiscal registado nos serviços de finanças. É certo que estes elementos são indícios de que o beneficiado pretende fixar ou fixou a sua morada real e efectiva no prédio incidente do IMI. Todavia, a morada em certo lugar, a habitatio, deve demonstrar-se através “factos justificativos” de que o beneficiado fixou no prédio o centro da sua vida pessoal.
Ora, sendo essencial apenas a habitação no prédio objecto da isenção do imposto, a ligação do beneficiado ao prédio concretiza-se necessariamente através de certas condições físicas (casa, mobília, etc.), jurídicas (contratos, declarações, inscrições em registos, etc.) e sociais (integração no meio, conhecimentos dos e pelos vizinhos, etc.). Naturalmente que, coincidindo a isenção do IMI com o início da morada no prédio, não é de exigir qualquer limite mínimo de duração da habitação, pois a morada constitui-se com a deslocação física do beneficiado e do seu agregado familiar para o prédio.
Mas, após o acto de reconhecimento do benefício fiscal, é preciso que o beneficiado mantenha a sua habitação no prédio durante o período pelo qual o benefício foi concedido. O requisito da «permanência» efectiva no prédio objecto da isenção tem sobretudo a ver com o período que se segue ao reconhecimento da isenção, pois a habitação no prédio deve durar em todo o período de isenção do IMI. Se durante esse período desaparecerem os pressupostos em que se baseava o benefício, caso em que o beneficiado está obrigado a comunicar tal situação à Administração Fiscal (cfr. artigo 9º do EBF), o benefício extingue-se. Por isso, a única obrigação que o artigo 46º do EBF impõe ao beneficiado com a isenção do IMI é que habite, de forma real e efectiva, o seu prédio.
Durante o período de duração da isenção, a administração tributária deve controlar se o beneficiado mantém a sua habitação nesse prédio. O nº 5 do artigo 65º do CPPT estabelece que «sem prejuízo das sanções contra-ordenacionais aplicáveis, a manutenção dos efeitos de reconhecimento do benefício dependem de o contribuinte facultar à administração fiscal todos os elementos necessários ao controlo dos pressupostos de que esta não disponha». No caso da isenção do IMI, os elementos necessários são todos aqueles que provem que o beneficiado mantém a sua morada normal no prédio isento desse imposto. São os factos justificativos de que o centro da sua vida pessoal está localizado em tal prédio.
Curiosamente, o acto impugnado refere-se a um certo número dessas condições, ao referir que «por habitar, residir ou viver, frequentar, entende-se a utilização de um local onde se confeccionam refeições, se recebem e se confraterniza com amigos, onde se praticam actos de higiene, e se dorme, tudo com alguma regularidade» (alínea e) dos factos provados). Todavia, não disse que tais condições pessoais não se verificavam, ficando-se apenas pelo facto da «morada em cadastro dos contribuintes ser diferente do local da situação do prédio».
Ora, não se pode dizer que o controlo da manutenção dos pressupostos da concessão do benefício fiscal foi o mais adequado. A circunstância de no registo de contribuintes a morada dos recorridos não ter sido actualizada, a seu pedido ou oficiosamente (cfr. 19º nº 6 da LGT), não é indício suficiente de que eles não habitavam no prédio. Se a administração tivesse investigado a situação, como se impunha, certamente que teria chegado à conclusão que os recorridos desde o início da isenção tiveram como residência habitual, própria e permanente, a fracção autónoma sobre que incidia a isenção (alínea h) dos factos provados).
O facto da morada constante do cadastro dos contribuintes ser diferente do local da situação do prédio não justificava, por si só, que os recorridos habitavam nessa outra morada. É que, com o acto de reconhecimento do benefício fiscal ocorreu necessariamente a “mudança de domicílio”, e por conseguinte, desde essa data a administração fiscal tinha ao seu dispor elementos sobre a residência habitual dos recorridos. Digamos que o pedido do reconhecimento da isenção do IMI tem inerente uma mudança de domicílio, pelo que, a administração tributária não podia continuar a considerar os recorridos residentes num domicílio que já tinham abandonado. Os procedimentos administrativos de reconhecimento e de controlo dos pressupostos do benefício fiscal poderiam conduzir a que a administração fiscal rectificasse oficiosamente o domicílio fiscal dos recorridos ou, pelo menos, em concretização do princípio da colaboração recíproca enunciado no artigo 59º da LGT, que lhes solicitasse a correcção da morada constante no registo central de contribuintes.
Tanto basta, cremo-lo bem, para justificar a improcedência do recurso.
4. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 23 de Novembro de 2011. - Lino Ribeiro(relator) - Valente Torrão - Dulce Neto.