Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01331/13
Data do Acordão:12/11/2013
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
REQUISITOS DE ADMISSÃO
Sumário:I – O recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após a entrada em vigor do ETAF de 2002 depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.
II – Verifica-se o 1.º requisito se os acórdãos em confronto assentam em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais e está em causa o mesmo fundamento de direito, não tendo havido alteração substancial da regulamentação jurídica pertinente e tendo sido perfilhada solução oposta, por decisões expressas e antagónicas.
III – Não se verifica, porém, o 2.º requisito se a orientação perfilhada no acórdão impugnado é plenamente conforme com a que este Supremo Tribunal vem mais recentemente assumindo de forma reiterada, pacífica e unânime, havendo uma sequência ininterrupta de decisões no mesmo sentido desde 2010, todas elas obtidas por unanimidade e na qual tiveram intervenção todos os actuais Juízes Conselheiros em exercício na secção.
Nº Convencional:JSTA000P16730
Nº do Documento:SAP2013121101331
Data de Entrada:07/30/2013
Recorrente:A............ E OUTRO
Recorrido 1:CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, SA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A………… e B…………, com os sinais dos autos, não se conformando com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19 de Março de 2013 (fls. 185 a 194 dos autos), que negou provimento ao recurso por eles interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, de 16 de Setembro de 2012, que julgara procedente o incidente de anulação da venda executiva dos imóveis penhorados no processo de execução fiscal n.º 2194200301001523, dele interpõem recurso para este Supremo Tribunal, invocando oposição com os Acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Março de 2007, proferido no recurso n.º 026/07, de 3 de Outubro de 2007, rec. n.º 514/07, e de 4 de Novembro de 2009, rec. n.º 686/09 (juntos como docs. 1, 2 e 3 a fls. 206 a 238 dos autos).

Os recorrentes apresentaram (fls. 244 a 256) alegação tendente a demonstrar a alegada oposição de julgados.

Por despacho de 12 de Junho de 2013 (fls. 266/267), do Exmo. Relator no TCAS, veio o recurso a ser admitido, no entendimento de que se verifica a referida oposição de acórdãos, ordenando-se em consequência a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos do disposto no art. 282 nº 3 do CPPT.

Os recorrentes terminam as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
A) O presente recurso por oposição de acórdãos foi interposto do douto acórdão proferido pelos venerandos juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo, que negaram provimento ao recurso interposto da Douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou procedente o incidente de anulação da venda dos imóveis penhorados no âmbito do Processo de execução Fiscal 21942003010001523 que corre termos no serviço de finanças do Montijo.
B) O entendimento, da 1ª instância e confirmado pelo Tribunal Central Administrativo foi o de que, no âmbito da venda em execução Fiscal, mediante proposta em carta fechada, se aplica subsidiariamente, ex vi artigo 2.º do CPPT, as normas do Código de Processo Civil e, concretamente, o disposto no art. 886 n.º 4 do CPC no que respeita à obrigatoriedade da notificação da decisão sobre a venda, ao credor com garantia real, sobre os bens a vender.
C) Os recorrentes, não se conformam com este entendimento, uma vez que viola a letra da lei e o espírito do legislador, estando em oposição com diversos acórdãos anteriores proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo, e que firmaram jurisprudência no sentido de que os credores com garantia real não têm de ser notificados do dia e hora da venda dos bens, em processo de execução fiscal, na modalidade de venda mediante proposta em carta fechada, por se entender que o CPPT, estatui um regime especial relativamente ao que é legislado no CPC, não existindo lacuna quanto àquela modalidade de venda (i.e. proposta em carta fechada).
D) À questão jurídica controvertida cresce que não é aplicável às vendas em EXECUÇÃO FISCAL, que se pretendem ver anuladas, o regime do CPC, uma vez que não existe omissão de regulamentação no Código de Procedimento e Processo Tributário quanto à Publicidade da venda por “proposta em carta fechada”, onde aí não se exige a notificação dos credores com garantia real e reclamantes de créditos do despacho que determina a venda.
E) A matéria aí regulada encontra-se especialmente regulamentada no CPPT, nos artigos 248.º a 258.º do CPPT, onde se define o regime de venda dos bens penhorados em execução fiscal, nomeadamente, a PUBLICIDADE e as formalidades a que está sujeita (artigos 249.º e 256.º CPPT), bem como o valor base dos bens e modalidades de venda (artigo 248.º, 250.º e 252.º e 255.º do CPPT).
F) E estatui-se no artigo 252.º n.º 1 alínea a) do CPPT que a venda só será feita noutras modalidades previstas no CPC quando no dia designado para a abertura de “propostas em carta fechada” não existirem proponentes.
G) Significa isto que, quando a venda em processo de execução fiscal é feita na modalidade “regra” – proposta em carta fechada – aplica-se o CPPT onde ela aí está perfeitamente regulada.
H) O artigo 249.º do CPPT regula, também, de forma especial a “PUBLICIDADE DA VENDA”, não se prevendo a notificação dos credores hipotecários, do despacho que determina a venda, mas tão somente os detentores de DIREITO DE PREFERÊNCIA E REMISSÃO.
I) O Venerando ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 166/2010 de 28/04/2010 in Diário da República, II série, n.º 104, de 28/05/2010, pp. 29660 a 29664, invocado na douta sentença recorrida, refere-se a situações em que se encontram na fase da VENDA POR NEGOCIAÇÃO PARTICULAR, situação diversa da que estamos a tratar (venda por proposta em carta fechada), pelo que falece a fundamentação vertida na sentença recorrida relativa à aplicação deste acórdão às vendas em causa nestes autos.
J) Nesta conformidade, a douta sentença viola, entre outras disposições legais, o disposto no artigo 248.º e seguintes do CPPT, especialmente o disposto no art. 249.º do CPPT, e, como tal, deverá ser revogada.
K) Em consequência, deverá firmar-se jurisprudência relativamente à questão jurídica controvertida nestes autos, no sentido de que não é aplicável à venda em execução fiscal na modalidade de proposta em carta fechada, as normas do Código de Processo Civil, nomeadamente no que respeita ao regime da venda por proposta em carta fechada, concretamente o disposto no artigo 886.º n.º 4 do CPC, porquanto as formalidades dessa modalidade de venda estão sobejamente regulados no CPPT no que se refere ao regime da venda em execução fiscal, não existindo qualquer LACUNA no regime especial.
L) E havendo lei especial, este derroga a aplicação da lei geral.
M) Também este é o entendimento da JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE, como é exemplo o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 4/11/2009 (proc. n.º 686/09) in www.dgsi.pt, transcrevendo-se o respectivo sumário (Cfr. Doc. 3 do requerimento de interposição de Recurso):
“I - Em processo tributário, a notificação da venda executiva ao credor com garantia real é feita «mediante editais, anúncios e divulgação através da Internet», de acordo com o disposto no n.º 1 do 249.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - não havendo aplicação subsidiária dos preceitos do Código de Processo Civil, por inexistir lacuna de previsão legal em tal matéria.
II - Em processo de execução fiscal, os credores com garantia real, mormente através da Internet, terão um conhecimento imediato e eficaz sobre a venda e os seus aspectos essenciais, não ficando impossibilitados de atacar eventuais irregularidades da mesma”.
N) Assim, conforme ficou alegado, deverá revogar-se o venerando acórdão recorrido na medida em que o mesmo é contraditório com o entendimento firmado, no sentido de que não é aplicável à venda em execução fiscal na modalidade de proposta em carta fechada, as normas do Código de Processo Civil, nomeadamente no que respeita ao regime da venda por proposta em carta fechada, concretamente o disposto no artigo 886.º n.º 4 do CPC, porquanto as formalidades dessa modalidade de venda estão sobejamente regulados no CPPT no que se refere ao regime da venda em execução fiscal, não existindo qualquer LACUNA no regime especial.
O) Este entendimento foi fundamentado nos acórdãos que estão em OPOSIÇÃO com o Acórdão recorrido, cuja oposição foi devidamente demonstrada no âmbito da Alegação a que se refere o disposto no artigo 284.º n.º 3 do CPPT, para a qual se remete e cujo teor dá por reproduzido aqui, e que se identificam, sendo o entendimento perfilhado por tais Acórdãos o que cumpre a letra e o espírito do legislador:
a) Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no âmbito do processo n.º 026/07, datado de 28/03/2007, pela 2.ª Secção, subscrito pelo Sr. Relator Venerando Juiz Conselheiro Dr. Brandão de Pinho, Recurso per saltum da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, publicado em www.dgsi.pt/jsta.nsf (doc. 1 junto com o requerimento de interposição do recurso);
b) Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no âmbito do processo n.º 0514/07, datado de 03/10/2007, pela 2.ª Secção, subscrito pelo Sr. Relator Venerando Juiz Conselheiro Dr. Baeta de Queirós, Recurso per saltum da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, publicado em www.dgsi.pt/jsta.nsf (doc. 2 junto com o requerimento de interposição do recurso);
c) Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no âmbito do processo n.º 0686/09, datado de 04/11/2009, pela 2.ª Secção, subscrito pelo Sr. Relator Venerando Juiz Conselheiro Dr. Jorge Lino, Recurso per saltum da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, publicado em www.dgsi.pt/jsta.nsf (doc. 3 junto com o requerimento de interposição do recurso);
P) Nesta conformidade, a douta sentença recorrida viola, entre outras disposições legais, as do disposto nos artigos 248.º e seguintes do CPPT, especialmente o artigo 249.º do CPPT, artigo 2.º al. e) do CPPT, assim como está em oposição com a jurisprudência dominante.
TERMOS EM QUE, com o suprimento de Suas Excelências, Juízes Conselheiros do Pleno do Contencioso Tributário do Supremo tribunal administrativo, deverá revogar-se o venerando Acórdão recorrido e, por consequência, perfilhando-se a tese vertida nos Acórdãos que estão em oposição e se decida no sentido de que não é aplicável à venda em execução fiscal na modalidade de proposta em carta fechada, as normas do Código de Processo Civil, nomeadamente no que respeita ao regime da venda por proposta em carta fechada, concretamente o disposto no artigo 886.º n.º 4 do CPC, porquanto as formalidades dessa modalidade de venda estão regulados no CPPT no que se refere ao regime da venda em execução fiscal, não existindo qualquer LACUNA no regime especial.
Assim se fazendo a Conselheira Justiça!

2 – Contra-alegou a recorrida CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, nos termos de fls. 287 a 304 dos autos, sustentando que, dos três Acórdãos indicados como Acórdãos fundamento pelos recorrentes apenas um tem por base situação fáctica semelhante à subjacente ao Acórdão recorrido – o Acórdão de 3/10/2007, proferido no processo n.º 0514/07 (porquanto nos outros dois estavam em causa vendas executivas realizadas por “negociação particular” e não por “proposta em carta fechada”) – e que este não se encontra em sintonia com a jurisprudência dominante mais recente nesta matéria, pugnando por que seja negado provimento ao recurso e mantido o acórdão recorrido nos seus precisos termos.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal emitiu o parecer de fls. 314 a 317 dos autos, sustentando que inexiste identidade de situação de facto entre os acórdãos invocados como fundamento e o acórdão recorrido e que, caso assim não se entenda, deve ser negado provimento ao recurso, pois a tese sustentada no acórdão recorrido merece concordância do MP.

4 - Por despacho da Relatora de 6 de Novembro de 2013 (fls. 319, verso e 320, frente, dos autos) determinou-se que, atento a que a questão decidenda é apenas uma e os recorrentes apontaram três (3) Acórdãos como fundamento - e não tendo o Relator no TCA-Sul convidado os recorrentes a escolher apenas um deles -, fossem então os recorrentes notificados para virem eleger, dos três Acórdãos indicados, aquele em relação ao qual pretendiam que a alegada oposição fosse apreciada.
Em resposta, vieram os recorrentes declarar (fls. 322) que pretendem eleger como Acórdão fundamento o Acórdão deste STA de 3 de Outubro de 2007, proferido no rec. n.º 514/07, relatado pelo Senhor Conselheiro Baeta de Queirós.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação –

5 – Questões a decidir
Importa averiguar previamente se, no caso dos autos, estão reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, cuja não verificação impede o conhecimento do presente recurso.
Concluindo-se no sentido da verificação daqueles requisitos, haverá então que conhecer do seu mérito, sendo a questão que constitui o objecto do presente recurso a de saber se, como decidido, o disposto no artigo 886.º-A n.º 6 (actual n.º 6 do artigo 812.º) do Código de Processo Civil, na parte em que manda notificar a decisão sobre a venda aos credores reclamantes com garantia real sobre os bens a vender é subsidiariamente aplicável ao processo de execução fiscal, concretamente no caso de venda executiva por “proposta em carta fechada”.

6 – Matéria de facto
É do seguinte teor o probatório fixado no Acórdão recorrido:
a) No âmbito da execução fiscal n.º 2194200301001523, instaurada no Serviço de Finanças do Montijo contra a sociedade C…………, Lda., foram penhorados os seguintes imóveis:
1 – Em 20.06.2007, a fracção autónoma designada pela letra “J”, inscrita na matriz predial urbana da freguesia de …………, concelho de Tavira, sob o artigo 1557 (cfr. fls. 28-29 e 43 do processo de execução fiscal apenso);
2 – Em 23.07.2008, a fracção autónoma designada pela letra “G”, inscrita na matriz predial urbana da freguesia de …………, concelho de Tavira, sob o artigo 1557 (cfr. fls. 77-88 do processo de execução fiscal apenso);
b) Sobre as referidas fracções autónomas e para garantia de mútuo celebrado com o executado, este havia constituído duas hipotecas, registadas em 08.02.2002, a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. (CGD) (cfr. idem);
c) Por despacho do órgão de execução fiscal de 01.10.2008, foi determinada a venda dos referidos imóveis, por propostas em carta fechada, tendo sido designado o dia 10.12.2008 para a abertura das propostas (cfr. fls. 92-93 do processo apenso);
d) As vendas foram publicitadas através de editais e anúncios publicados no “Correio da Manhã” (cfr. fls. 183-186 do processo apenso);
e) Em 10.10.2008 a CGD foi citada para, nos termos do n.º 1 do artigo 239.º, do Código de Procedimento e Processo Tributário e na qualidade de credor com garantia real sobre os imóveis penhorados, reclamar os seus créditos (cfr. fls. 20-21 dos autos);
f) Por despacho do chefe de finanças de 10.12.2008 foi adiada a abertura das propostas para o dia 26.02.2009 (cfr. fls. 199 do processo apenso);
g) Na sequência da abertura de propostas e do pagamento do preço, a fracção “J”, em 06.03.2009, foi adjudicada ao proponente A………… pelo valor de €62.550,00, pago na totalidade em 04.03.2009 (cfr. fls. 214, 218, 222, 224 e 226 do processo apenso),
h) A fracção “G” foi adjudicada, em 16.03.2009, ao proponente B………… pelo valor de €51.325,00, pago em 11.03.2009 (cfr. fls. 213, 224, 226 e 229 do processo apenso);
i) Em 22.10.2008, relativamente à fracção “G”, e 24.11.2008, relativamente à fracção “J”, a CGD apresentou junto do Serviço de Finanças do Montijo requerimentos de reclamação de créditos, na qualidade de credor com garantia real sobre os bens penhorados (cfr. fls. 26 dos autos);
j) Em 12.03.2009 a CGD tomou conhecimento da venda das fracções por parte do escritório dos seus advogados (cfr. depoimento testemunhal e fls. 234 do processo apenso);
k) A presente acção foi proposta em 18.03.2009 (cfr. fls. 2 dos autos).
l) O valor patrimonial tributário – VPT – da fracção G é de €63.028,13 – fls. 78 do PEF.
m) O valor patrimonial tributário – VPT – da fracção J é de €84.441,00 – fls. 91 do PEF.

Por sua vez, é do seguinte teor o probatório fixado no Acórdão fundamento:
- Foi penhorado em 16/4/02 um prédio em alvenaria destinado à habitação, inscrito na matriz urbana de ………… sob o art. 3205° e descrito na respectiva conservatória sob o n° 1122;
- A penhora foi registada em 18/10/02;
- Por despacho de 2/6/04 foi determinada a venda por meio de proposta em carta fechada no dia 21/7/04, procedendo-se aos respectivos anúncios e à convocação de credores e venda judicial por edital;
- Na data da venda não surgiram propostas e ordenou-se a venda por negociação particular dela foi notificada a executada e fiel depositário, sendo publicitada a venda no DIÁRIO das BEIRAS em 16/11/04 e 17/11/04;
- Por requerimento de 9/5/05, a CGD dirigiu ao Chefe da Repartição de finanças onde corre a execução, veio lembrar que havia reclamado créditos em 20/5/04 relativamente aos executados ... e marido ...;
- O chefe da respectiva repartição respondeu por ofício de 13/9/05 informando que dada a inexistência de propostas em carta fechada no dia 22/7/04 se encontra agora em fase da venda por negociação particular ao mesmo tempo que foram feitas penhoras nos vencimentos dos executados;
- No seguimento de tal informação a CGD, em 23/9/05, veio requerer a anulação da venda que por despacho do Tribunal de 5/2/07, foi o processo convolado para recurso do art. 276° do CPPT».

7 – Apreciando.
7.1 Dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos
O presente recurso por oposição de acórdãos vem limitado à parte em que o acórdão recorrido, apreciando do alegado erro de julgamento quanto ao direito aplicável alegadamente cometido pela sentença recorrida, negou provimento ao recurso interposto pelos recorrentes, confirmando a sentença que anulou a venda executiva por preterição do dever de notificação dos credores reclamantes com garantias sobre os bens a vender do despacho que designou a data para abertura das propostas e venda, porquanto tal omissão se configura como nulidade processual – por violação do disposto na alínea a) do artigo 253.º do CPPT e do disposto no n.º 6 (anterior n.º 4) do artigo 886.º-A do CPC, este aplicável “ex vi” do disposto na alínea e) do artigo 2.º do CPPT –, que, porque susceptível de afectar o acto de venda, determina anulação destas.
Não obstante o Relator do acórdão recorrido ter proferido despacho em que reconhece a alegada oposição de acórdãos (fls. 266 e 267 dos autos), importa reapreciar se a mesma se verifica, já que tal decisão, como vem sendo jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal (vide, entre outros, o Acórdão de 7 de Maio de 2003, rec. n.º 1149/02), não só não faz caso julgado, como não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar (cfr. art. 685.º-C, n.º 5 do Código de Processo Civil - CPC) – cfr. também neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284.º do CPPT).
O presente processo iniciou-se no ano de 2009, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro.
Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:
- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
- que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
- a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (Acórdãos do Pleno desta Secção do STA de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).
A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (v. Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 19 de Junho de 1996 e de 18 de Maio de 2005, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente).
Por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, op. cit., p. 809 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1995, proferido no recurso n.º 87156).
Vejamos, então, se tais pressupostos se verificam.
A questão que constitui o objecto do presente recurso é a de saber se deve entender-se, por aplicação subsidiária das normas do Código de Processo Civil, que a decisão de proceder à venda do bem em processo de execução fiscal, ainda que a modalidade de venda adoptada seja a de venda por “propostas em carta fechada”, tem de ser previamente notificada aos credores reclamantes com garantias sobre os bens a vender.
A esta questão respondeu o acórdão recorrido em sentido afirmativo, confirmando a sentença recorrida que assim o julgara também, apoiando-se doutrinariamente na posição expressa por JORGE LOPES DE SOUSA (CPPT anotado, 6.º ed., Volume III, pp. 112/115), enquanto no acórdão fundamento se decidiu que o despacho que determina a venda a realizar na execução fiscal não tem de ser notificado ao credor reclamante, por força do disposto no artigo 886.º-A n.º 1 do Código de Processo Civil, norma que não é subsidiariamente aplicável naquela forma de processo, revogando a sentença recorrida que julgara verificada nulidade processual por falta de tal notificação.
Estamos, pois, perante respostas expressas divergentes à mesma questão fundamental, no quadro de uma situação de, não sendo idêntica, se apresenta como subsumível às mesmas normas legais e perante um quadro normativo de referência que não apresenta alterações significativas.

Não obstante, não pode o presente recurso prosseguir, pois que falha o segundo requisito de que depende a admissibilidade do recurso por oposição de julgados, pois o acórdão recorrido está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Tem entendido este Supremo Tribunal – cfr., paradigmaticamente o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 19 de Setembro de 2012, proferido no recurso n.º 1075/11 – que a existência de uma jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o art. 17º, nº 2, do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.
Ora, o acórdão recorrido, no segmento impugnado, adoptou, quanto à questão fundamental sobre a qual se verifica oposição de julgados, posição plenamente conforme com a que este Supremo Tribunal vem mais recentemente assumindo de forma reiterada, pacífica e unânime - e qualquer que seja a concreta modalidade de venda executiva adoptada (pois que, ao contrário do sugerido pelos recorrentes, não é a modalidade de venda adoptada que determina se deve ou não haver notificação aos credores reclamantes da decisão de venda, como aliás resulta do facto de os próprios recorrentes, no seu requerimento de interposição de recurso, terem indicado como acórdãos fundamento dois acórdãos deste STA em que a modalidade de venda adoptada não era a de “por proposta em carta fechada”) - verificando-se haver uma sequência ininterrupta de decisões no mesmo sentido, todas elas obtidas por unanimidade e na qual tiveram intervenção todos os actuais Juízes Conselheiros em exercício na secção (cujos nomes se destacam na listagem infra), como resulta da seguinte lista:
- Acórdão de 7 de Julho de 2010, rec. n.º 188/10, Relator: Casimiro Gonçalves (adjuntos: Pimenta do Vale/Miranda Pacheco);
- Acórdão de 3 de Novembro de 2010, rec. n.º 244/10, Relatora: Dulce Neto (adjuntos: Alfredo Madureira/Valente Torrão);
- Acórdão de 22/06/2011, rec. n.º 353/11, Relator: Casimiro Gonçalves (adjuntos: António Calhau/Isabel Marques da Silva);
- Acórdão de 20 de Junho de 2012, rec. n.º 161/12, Relator: Francisco Rothes (adjuntos: Fernanda Maçãs/Casimiro Gonçalves);
- Acórdão de 5 de Julho de 2012, rec. n.º 180/12, Relatora: Fernanda Maçãs (adjuntos: Casimiro Gonçalves/Lino Ribeiro);
- Acórdão de 10 de Outubro de 2012, rec. n.º 700/12, Relator: Valente Torrão (adjuntos: Ascensão Lopes/Pedro Delgado);
- Acórdão de 23 de Janeiro de 2013, rec. n.º 667A/12, Relatora: Dulce Neto (adjuntos: Isabel Marques da Silva/Lino Ribeiro);
- Acórdão de 2 de Outubro de 2013, rec. n.º 1385/13, Relatora: Dulce Neto (adjuntos: Ascensão Lopes/Pedro Delgado).

E assim sendo, necessário é julgar findo o recurso, pois que o acórdão impugnado não diverge, antes converge, com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
- Decisão -
7 – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em julgar findo o recurso.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 11 de Dezembro de 2013. - Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) – José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Pedro Manuel Dias Delgado - Dulce Manuel da Conceição Neto - João António Valente Torrão - Joaquim Casimiro Gonçalves.