Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02386/16.6BEPRT
Data do Acordão:01/13/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ADRIANO CUNHA
Descritores:ATRASO NA JUSTIÇA
HONORÁRIOS DE ADVOGADO
INDEMNIZAÇÃO
IMPOSTOS
CÁLCULO DE INDEMNIZAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO SUPLEMENTAR
Sumário:I - As despesas com os honorários de advogado estão sujeitas a um regime jurídico específico, só podendo ser compensadas através das custas de parte nos termos previstos no Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais (cfr. Acórdão deste STA, Pleno da Secção, de 5/3/2020, proc. 0284/17).
II – Nas condenações por atraso na justiça deve incluir-se o pagamento das quantias que forem exigidas ao indemnizado, a título de obrigações fiscais, pelo recebimento das indemnizações atribuídas.
III – No cálculo da indemnização por atraso na justiça, e segundo a jurisprudência do TEDH, deve contabilizar-se a duração total da causa, e não apenas o tempo excedente ao prazo tido por razoável, ainda que esse cálculo deva servir apenas como ponto de partida, sujeito a variações decorrentes das circunstâncias relevantes do caso concreto.
IV – Em caso de nova violação, na própria ação indemnizatória, do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, justifica-se a eventual atribuição, a esse título, de uma indemnização suplementar, como salientado na jurisprudência do TEDH, para obviar a que o Autor tenha de entrar num círculo vicioso de ter de voltar a demandar o Estado a cada nova violação.
Nº Convencional:JSTA00071366
Nº do Documento:SA12022011302386/16
Data de Entrada:10/06/2020
Recorrente:A...........
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECURSO DE REVISTA
Objecto:ACÓRDÃO DO TCA NORTE
Decisão:CONCEDE PARCIAL PROVIMENTO
Área Temática 1:RESPONSABILIDADE CIVIL
Legislação Estrangeira:art. 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


I – RELATÓRIO

1. A……….. veio interpor o presente recurso jurisdicional de revista do Acórdão proferido em 23/4/2021 pelo Tribunal Central Administrativo Norte, “TCAN” (cfr. fls. 578 e segs. SITAF), o qual, concedendo provimento ao recurso de apelação, veio a julgar a ação parcialmente procedente, condenando o Réu a pagar a Autora uma indemnização pelos danos morais decorrentes do atraso excessivo do processo em causa na quantia de 3.000,00€, acrescida de juros de mora à taxa legal desde o seu trânsito em julgado até efetivo pagamento.

O TCAN proferiu este seu Acórdão, de 23/4/2021, ora recorrido, na sequência da revogação do seu anterior Acórdão, de 14/2/2020 (cfr. fls. 433 e segs. SITAF) - que havia confirmado a sentença, de 2/8/2019, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, “TAF/Porto” (cfr. fls. 341 e segs. SITAF) que julgara improcedente a presente ação administrativa pela Autora intentada contra o “Estado Português”, representado pelo Ministério Público, e, em consequência, tinha absolvido o Réu do pedido indemnizatório formulado com fundamento em responsabilidade civil extracontratual do Estado por alegada violação do direito da Autora a uma decisão em prazo razoável no processo nº 990/08.5TVPRT que correu termos na 1ª Vara Cível do Porto - revogação operada pelo Acórdão deste STA de 18/2/2021, proferido em anterior recurso de revista (cfr. fls. 556 e segs. SITAF).

2. Ainda inconformada com este novo julgamento do “TCAN”, a Autora interpôs para este STA este novo (segundo) recurso de revista, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 622 e segs. SITAF):

«1. O recurso de revista é admissível.
2. O TCAN decidiu à revelia da jurisprudência do Tribunal Europeu e do STA.
3. O TCAN não se pronunciou ou não fundamentou a questão, o pedido sobre o pagamento dos honorários.
4. E quando a impostos decidiu à revelia do TEDH e da sua própria jurisprudência.
5. E quanto à lentidão do próprio processo nas instâncias disse que não era nada com ele, mas com o STA, não fixando qualquer indemnização ao contrário da jurisprudência do STA, acima citada.
6. Quanto ao montante da indemnização e forma de contabilizar os anos de indemnização o TCAN não seguiu os critérios europeus.
7. Quando aos honorários há um acórdão da formação preliminar do STA para resolver essa questão, e todas as outras aqui levantadas, o qual vai em anexo. RECURSO N.° 1045/16.4BEALM, decisão de 12/12/2019, que diz o que aqui se ajusta.
8. O TCAN não se pronunciou sobre os honorários, pelo que o acórdão é nulo, por omissão de pronúncia, ou se quisermos, concluiu pelo indeferimento sem dizer uma palavra por que motivo.
9. Quanto à fixação de honorários deve seguir-se o critério do artigo 105 do EOA.
10. Os honorários devem ser pagos pelo Estado. Doutra forma nem valia a pena demandar o poderoso Estado, representado por poderosos agentes, pois a complexidade das questões e o trabalho inerente tem de ser pago, sendo a indemnização por vezes inferior aos honorários.
11. Pelo que o/a ofendido/a perdia duas vezes.
12. Sendo-lhe, na prática, negado o direito constitucional essencial do direito à justiça em prazo razoável.
13. No caso concreto, os honorários são superiores aos 3.000 euros concedidos pelo TCAN.
14. Se autora tivesse que pagar os honorários, perdia tudo o que ganhava.
15. O que seria uma suprema injustiça e ainda um castigo para ela.
16. Outra solução seria, ostensiva e grosseiramente contra legem, contra o artigo 105 do Estatuto da Ordem dos Advogados.
17. Há diferenças entre advogado oficioso e advogado constituído.
18. Deve ser acrescentado com todo o vigor que não se pode aplicar o regulamento actual das custas processuais, porque isso violaria as regras europeias, tal como interpretadas pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
19. O Tribunal Europeu condena sempre o Estado no pagamento das despesas/honorários do advogado.
20. Diz o TEDH: Quanto às custas e despesas perante o Tribunal, um Requerente apenas pode obter o seu reembolso na medida em que estiver estabelecida a sua realidade, a sua necessidade e o caráter razoável da sua taxa. O Tribunal recorda ainda que, nos termos do artigo 60.º, § 2 do seu regulamento, os Requerentes devem quantificar as suas pretensões, nos termos do artigo 41.º, e juntar os comprovativos necessários;
21. Se os honorários não fossem pagos dessa forma, não havia interesse em recorrer aos tribunais para contestar a morosidade dos tribunais, pois se pagava em honorários mais do que se recebia de indemnização.
22. E dessa forma se esvaziaria o conteúdo do direito constitucional e convencional do direito à justiça em prazo razoável.
23. Dissuadindo as vítimas de recorrer aos tribunais.
24. Todos têm o direito constitucional de escolherem o Advogado que entendam por bem.
25. Não é demais relembrar que os tribunais têm de aplicar a ordem internacional e não a nacional.
26. O Direito Europeu prima sobre o direito nacional como diz o TEDH, ao aplicar o artigo 1º da Convenção.
27. O RCP também pode ser aplicado, quanto a honorários, pois a A. está isenta de custas por ter apoio judiciário.
28. Logo, o eventual raciocínio do STA em contrário é inaplicável.
29. O processo já leva cinco anos, quase tantos quantos aqueles de que se queixa na acção fundamento.
30. As acções por morosidade da justiça devem ser especialmente céleres como diz o TEDH e se escreveu na PI.
31. É MANIFESTO QUE ESTE PROCESSO NOS TAFS VIOLA O DIREITO À JUSTIÇA EM PRAZO RAZOÁVEL PELO QUE O ESTADO DEVE SER CONDENADO COMO NO PEDIDO.
32. ALIÁS, CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STA: Perante uma ausência do cumprimento garantístico de tal exigência, mercê da constatação de situação de atraso desrazoável naquela ação indemnizatória, e ainda que o lesado não haja feito uso dos meios e mecanismos adjetivos que o processo lhe faculta, caberá ao julgador, oficiosamente e uma vez assegurado o devido contraditório, aferir e considerar, até aquele concreto momento, do atraso e considerá-lo para efeitos do montante a fixar a título de danos não patrimoniais, arbitrando valor suplementar a esse título e que terá como limite sempre o valor que se mostre peticionado na ação. O TCAN não respeitou esta jurisprudência do STA, não tendo em conta que este processo/acção administrativa já se arrasta há mais de cinco anos, por culpa do Estado.
33. O TCAN não fixou uma indemnização suplementar por esse atraso de 5 anos.
34. Quanto ao cômputo da indemnização, o Tribunal Europeu considera que uma quantia que varia entre 1000 a 1500 Euros por ano de duração do processo (e não por ano de atraso) é o ponto de partida para o cálculo a efectuar.
35. O resultado do processo nacional (quer a parte requerente perca, ganhe ou acabe por fazer um acordo) não tem importância como tal sobre o dano moral sofrido pelo facto da duração do processo.
36. O montante global será aumentado de 2.000 EUR se o que estiver em causa for importante, nomeadamente em matéria de direito do trabalho, estado e capacidade das pessoas, pensões, processos particularmente importantes relativamente à saúde ou à vida das pessoas e acidentes de viação.
37. A autora tem direito a uma indemnização acrescida por estar em causa um acidente de viação.
38. Por outro lado, a indemnização é pela duração total do processo e não pelos anos de atraso: “O Tribunal considera que uma quantia que varia entre 1000 a 1500 Euros por ano de duração do processo (e não por ano de atraso)
39. O TCAN não respeitou os critérios do TEDH.
40. Logo, a autora tem direito a uma indemnização duplamente acrescida. Tal como vem no pedido e na PI.
41. Quanto à sanção pecuniária, o que o TCAN decidiu/escreveu nada tem a ver com o pedido. Nada a ver com incumprimento da sentença,
42. O que está em causa é cem euros por dia, por cada despacho, decisão do tribunal ou acto dos funcionários que ultrapasse os prazos legais, ou caso o processo dure mais de dois anos, incluindo liquidação de honorários.
43. Pelo que o Estado tem de ser condenado no pedido, atento o constante incumprimento dos prazos e delonga deste processo imputável ao Estado e erros dos tribunais.
44. Quanto a impostos, o TCAN já condenou nessas quantias em múltiplos acórdãos, sendo o pedido formulado da mesma forma, não se sabendo por que não o fez agora.
45. O TCAN cometeu erro de julgamento quanto aos impostos.
46. Ou seja, o TCAN tanto decide duma forma como da outra, violando o princípio da segurança jurídica, o que é intolerável num tribunal de recurso. Que muitas vezes é o tribunal de última instância, quando o STA não receba o recurso.
47. Os tribunais superiores não podem ser fonte de incerteza, como repetidamente diz o TEDH.
48. Como diz o Tribunal Europeu, as decisões dos tribunais não se podem comparar ou ser puros jogos de lotaria.
49. É função do tribunal superior uniformizar a jurisprudência. E corrigir os erros das instâncias.
50. O acórdão violou o princípio da segurança jurídica previsto no artigo 6º, nº 1, da Convenção ao decidir de forma diferente das anteriores.
51. A divergência jurisprudencial causa prejuízo à recorrente.
52. Sobre os impostos diz o TEDH: “Às despesas e honorários acrescem os impostos em causa” (sic)
53. Compreende-se porquê: O Estado não pode dar com uma mão e tirar com a outra. A indemnização sobre a qual recaíssem impostos não seria uma indemnização efectiva.
54. Se forem lidos os acórdãos contra Portugal no site do MP/PGR, verifica-se que o Estado é sempre condenado a pagar os impostos, eventualmente devidos.
55. O TCAN decidiu à revelia da jurisprudência do Tribunal Europeu e do STA.
56. O TCAN não se pronunciou ou não fundamentou a questão sobre o pagamento dos honorários.
57. E quando a impostos decidiu à revelia do TEDH e da sua própria jurisprudência.
58. E quanto à lentidão do próprio processo nas instâncias disse que não era nada com ele, mas com o STA, não fixando qualquer indemnização ao contrário da jurisprudência do STA, acima citada.
59. Quanto ao montante da indemnização e forma de contabilizar os anos de indemnização não seguiu os critérios europeus.
60. As instâncias violaram, repetidamente, a jurisprudência do TEDH, nomeadamente a respeitante ao artigo 6º, nº 1, da CEDH, que assim foi violado.
61. Que deve ser interpretado e aplicado no sentido das conclusões precedentes.
62. Deve condenar-se como consta na PI, assim se revogando o acórdão.
Justiça!».

3. O Réu/Recorrido, pronunciou-se no sentido da não verificação da arguida nulidade do Acórdão do TCAN (cfr. fls. 674 e segs. SITAF), mas não contra-alegou.

4. O TCAN, por Acórdão de 18/6/2021 (cfr. fls. 680/681) reputou a arguição de nulidade inadmissível, por ter sido invocada em requerimento avulso, dirigido ao tribunal “a quo”, fora das alegações de recurso, em violação do disposto no art. 615º nº 4 do CPC.

5. Este novo (segundo) recurso de revista foi admitido por Acórdão de 21/10/2021 (cfr. fls. 693 e segs. SITAF) proferido pela formação de apreciação preliminar deste STA, prevista no nº 6 do art. 150º do CPTA, designadamente nos seguintes termos:

«(…) 6. O TAF/PRT absolveu o R. do pedido indemnizatório contra si deduzido pela A., considerando não estarem preenchidos “in casu” os pressupostos de responsabilidade civil extracontratual [cfr. fis. 341/376].
7. Tal juízo objeto de recurso de apelação foi primeiramente decidido por acórdão do TCA/N, de 14.02.2020, no qual havia sido negado provimento ao recurso da A. [cfr. fis. 433/448], decisão essa que foi revogada pelo acórdão deste Supremo Tribunal, de 18.02.2021, e no qual foi determinada «a baixa ao TCAN para conhecimento dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Réu, que ficou prejudicado pela decisão tomada no Acórdão ora revogada».
8. Na sequência do assim julgado o TCA/N proferiu então o acórdão recorrido no qual entendeu como verificados no caso os pressupostos da responsabilidade civil, tendo condenado o R. no pagamento à A. da indemnização nos termos supra descritos, juízo este com o qual a A. se mostra inconformada.
(…) 13. (…) ressalta, desde logo, que o entendimento veiculado no acórdão recorrido quanto ao pedido de «indemnização por cada ano de duração da presente ação sobre a morosidade, após o decurso de dois anos, até ao seu termo incluindo liquidação» parece “primo conspectu” mostrar-se contrário ao que foi firmado no Ac. deste Supremo de 11.05.2017 [Proc. n.° 01004116] e quanto ao pedido relativo às «quantias que eventualmente sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estada» parece revelar-se ao arrepio da jurisprudência do TEDH [cfr., entre outros, Acs. de 10.06.2008, Martins de Castro e Alves Correia c. Portugal (Queixa n.° 33729/06), de 02.03.2010, Antunes c. Portugal (Queixa n.º 12750/07), de 13.04.2010, Ferreira Alves c. Portugal (n.º 6) (Queixas n,ºs 46436/06 e 55676/08), de 30.10.2014, Sociedade de Construções Martins & Vieira, Ld.ª e outros c. Portugal (Queixas n.ºs 56637/10, ...), de 29.10.2015, Valadas Matos das Neves c. Portugal (Queixa n.° 73798/13), de 25.02.2016, Olivieri e outros c. Itália (Queixas n.ºs 17708/12,...)], sendo que, para além disso, não só a questão da obrigação imposta ao R. de pagar despesas com honorários de advogados tem motivado o recebimento de vários recursos de revista [cfr. Acs. do STA/Formação de Admissão Preliminar de 12.04.2018 - Proc. n.º 0256/18, de 11.01.2019 - Proc. n.º 02582/09.2BELSB, de 22.03.2019 - Proc. n.º 0538/08.1BELRA, de 12.12.2019 - Proc. n.º 01045/16.4BEALM], mostrando-se complexa, como, também, carecido de reanálise o quantum fixado a título de danos não patrimoniais.
14. Flui de tudo o exposto a necessária a intervenção deste Supremo Tribunal, e daí que se justifique a admissão da revista».

6. Colhidos os vistos, o processo vem submetido à Conferência, cumprindo apreciar e decidir.

*

II - DAS QUESTÕES A DECIDIR

7. Constitui objeto do presente recurso de revista:

Como decorre do já acima exposto, a Autora, ora Recorrente, insurge-se contra o Ac.TCAN recorrido, desde logo arguindo-o de nulo por – segundo diz - não se ter pronunciado sobre o pedido de condenação em indemnização pelo pagamento de honorários (ou não ter fundamentado o indeferimento); insurge-se, depois, contra o mesmo Acórdão por alegados erros de julgamento: não deferindo o pedido de indemnização pelo pagamento de honorários; nem de pagamento, pelo Réu, dos impostos que forem devidos sobre as quantias indemnizatórias atribuídas; não fixando indemnização quanto ao alegado atraso desta própria ação administrativa; quanto ao montante indemnizatório fixado, designadamente em face dos anos de duração do processo; e não deferindo o pedido de pagamento de sanção pecuniária compulsória por atrasos nos atos processuais.

São, pois, estas as questões em causa no presente recurso de revista, como delimitadas pelas conclusões das alegações da Autora/Recorrente – cfr. conclusões (1 a 4) do seu requerimento para reforma do Acórdão por alegada nulidade do mesmo por omissão de pronúncia quanto ao pedido de indemnização pelo pagamento de honorários (fls. 602 e segs. SITAF) e, especificamente, as conclusões 3ª, 8ª e 56ª (nulidade, pela aludida por omissão de pronúncia), 7ª a 28ª e 56ª (relativos à não fixação de indemnização pelo pagamento de honorários), 4ª, 7ª a 28ª, 44ª a 55ª e 57ª (relativa à referida questão dos impostos), 5ª, 29ª a 33ª e 58ª (relativa à peticionada indemnização pelo atraso na presente ação administrativa), 6ª, 34ª a 40ª e 59ª (relativa ao montante indemnizatório, designadamente em face dos anos de duração do processo) e 41ª a 43ª (relativa à referida questão da sanção pecuniária compulsória).


*

III - FUNDAMENTAÇÃO

III. A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

8. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

«1) Em 24/10/2008 a autora propôs acção contra a “Companhia de Seguros B……….., S. A.”, por causa dum acidente de viação que tinha ocorrido em 8/11/2005, na qual a autora peticionava, a título de ressarcimento de danos o pagamento da quantia de 233.173,77 euros, acção essa que correu na 1ª Vara Cível com o n° 990/08.5TVPRT – cf. p.i. da acção;

2) Os danos sofridos vêm relatados a folhas 169 e ss; 210 e ss; 226 e ss; 238 e ss; 249 e ss; 258 e ss; 277 e ss; 299 e ss; 345 e ss; 368 e ss; 370 e ss; 375; 377 e ss; 409 e ss;

3) A folhas 278, em 14/07/2011, foi-lhe atribuída uma IPP de 40,6%;

4) Os relatórios médicos mostram, nomeadamente, que a autora por causa do acidente teve agressões ao seu pescoço que deixaram cicatrizes de 4 cm (folhas 411), diminuição da sensibilidade no braço e antebraço e no primeiro e segundo dedo;

5) A “Companhia de Seguros B……………, S. A.” contestou em 05/12/2008 – fls. 54;

6) Em 18/02/2009 foi elaborado despacho saneador – fls.106;

7) Em 02/03/2009 e 06/03/2009 foram apresentados pelas partes requerimentos de prova – fls. 118 e 125;

8) Na sequência de requerimento das partes, em 14/12/2009, foi ordenada a realização de perícia pelo INML – fls. 181;

9) A A. foi submetida a vários exames periciais, de várias especialidades, entre 28/1/2010 e 30/1/2014, com a sequência temporal seguinte:
I. A A. foi convocada para ser submetida a perícia médico-legal cível – avaliação do dano corporal para o dia 28/1/2010;
II. Para realização de perícia médico-legal de psiquiatria para o dia 2/6/2010;
III. Em 28/1/2010 o INML apresentou relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito cível, no qual vem referido, entre o mais, que a autora terá tido no ano de 2004 um acidente de viação de características semelhantes ao acidente ocorrido em 8/11/2005, tendo sido solicitado para uma avaliação mais completa da ora A., o envio de diversos registos clínicos;
IV. Em 1/6/2010 foi apresentado o relatório da perícia médico-legal de psiquiatria;
V. Por ofício de 21/6/2010, o INML voltou a solicitar os elementos clínicos da Autora existentes noutros estabelecimentos de saúde;
VI. Em 24/11/2010 foram remetidos ao INML os relatórios clínicos;
VII. Em 10/3/2011 o Tribunal solicitou ao INML informação sobre o estado do exame pericial feito à A.;
VIII. Com data de 8/4/2011 o INML enviou ao Tribunal o relatório da perícia do qual consta que, para esclarecimento de nexo de causalidade e para uma avaliação mais completa, a examinada, ora A. devia ser submetida a exame da especialidade de neurocirurgia a ter lugar em 2/6/2011;
IX. Em 7/6/2011 o INML apresentou o relatório da perícia médico-legal de neurocirurgia;
X. Em 20 de Junho de 2011 a ora A. requereu a realização de 2ª perícia e em 22 de Junho a R. requereu também a sua realização;
XI. Por despacho de 6/7/2011 foi ordenada a realização de 2ª perícia;
XII. Foi agendada para o dia 17/10/2011 a avaliação médico-legal pelo INML;
XIII. Em 16/1/2012 o Tribunal solicitou informação ao INML sobre o estado do exame efectuado à A. em 17/10/2011;
XIV. Em 8/2/2012 e 26/3/2012 o INML deu conta ao Tribunal da dificuldade de notificação de um dos peritos intervenientes na perícia e solicitou ao Tribunal a sua notificação;
XV. Em 30/4/2012 foi remetido ao Tribunal o relatório pericial do qual consta que não houve consenso entre os peritos relativamente a determinada matéria e foi sugerida a realização de perícia medico legal constituída apenas por médicos da especialidade de neurocirurgia;
XVI. A A. foi convocada para comparecer em 24/1/2013 no INML para ser submetida a perícia médico-legal constituída por médicos de neurocirurgia, tendo sido apresentado o respectivo relatório que solicita o envio de determinados exames médicos realizados pela A.;
XVII. Em 24/4/2013 o Tribunal remeteu o processo ao INML do Porto para conclusão do relatório pericial;
XVIII. Em 26/09/2013 a perícia colegial foi concluída;
XIX. Em 26/09/2013 um dos peritos não compareceu.
XX. O exame pericial foi remarcado para 17/10/2013;
XXI. Em 01/10/2013 o Tribunal ordenou a comparência dos peritos sob pena de multa;
XXII. O exame pericial foi adiado para 19/12/2013;
XXIII. O exame foi concluído a 30/01/2014 – cf. fls. 182 a 355 do processo nº 990/08.5TVPRT.

10) Em 06/02/2014 o Tribunal marcou a audiência de julgamento para 20/03/2014;

11) As partes chegaram a acordo, que foi homologado por sentença de 19/05/2014;

12) A autora instaurou no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem uma acção em 2014, que teve o n° 45969/14, que foi arquivada por não terem sido esgotadas as vias de recurso internas – doc. 1 junto com a p.i.;

13) Durante o decurso do processo nº 990/08.5TVPRT a A. sentiu ansiedade, angústia, incerteza, preocupação;

14) . . . mostrando-se incomodada, irritada, ansiosa;

15) A autora depois do acidente deixou de trabalhar;

16) A A. nasceu em 19/05/1948 – cf. doc.2 junto com a p.i.;

17) A autora está reformada e à data da instauração da presente acção auferia uma pensão mensal de 332,97 euros – cf. doc. 3 junto com a p.i.

Factos dados como não provados:

A) A A. manteve-se numa situação de incerteza durante vários anos;

B) A A. sentiu incerteza na planificação das decisões a tomar;

C) A A. não pôde organizar-se;

D) A A. por causa do processo ficou em estado depressivo;

E) A A. precisava do dinheiro para se restabelecer do acidente sofrido;

F) A autora depois do acidente deixou de ter qualquer rendimento;

G) A A. foi forçada a fazer um acordo com a seguradora para poder viver e saiu prejudicada;

H) Por causa do processo, a autora passou muito tempo a telefonar para o escritório dos advogados para saber o seu resultado.


III. B – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

9. Quanto à arguida nulidade do Ac.TCAN recorrido, por alegada omissão de pronúncia (conclusões 3ª, 8ª e 56ª)

Alega a Autora/Recorrente que, não obstante ter formulado o pedido de:
“(…) 4. Condenar-se o Estado Português a pagar os honorários a advogado neste processo nos tribunais administrativos em quantia a fixar equitativamente conforme consta desta petição inicial ou a liquidar, oportunamente, fixados de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados”,
o TCAN não se pronunciou sobre os honorários, pelo que o acórdão é nulo, por omissão de pronúncia, ou se quisermos, concluiu pelo indeferimento sem dizer uma palavra por que motivo”.

O TCAN, como já se disse supra, não respondeu a esta arguição de nulidade reputando-a de inadmissível por ter sido invocada em requerimento avulso, dirigido ao tribunal “a quo”, fora das alegações de recurso, em violação do disposto no art. 615º nº 4 do CPC (cfr. Acórdão de 18/6/2021, a fls. 680/681 SITAF).

Mas a verdade é que a Autora/Recorrente, para além de ter arguido tal nulidade através desse seu requerimento de fls. 602 e segs., fê-lo, também, nas suas alegações de recurso (cfr. fls. 622 e segs.), pelo que cumpriu, assim, por aqui, o exigido na parte final do mencionado nº 4 do art. 615º do CPC. E, em consequência, o TCAN devia ter apreciado tal arguição, conforme determinado nos arts. 617º nº 1, 641º nº 1 e 666º do CPC.

Sucede, no entanto, que a baixa do processo, para fins de apreciação da arguição da nulidade da decisão recorrida, pode não ser ordenada se o Relator do tribunal “ad quem” não a considerar indispensável (arts. 617º nº 5 e 679º do CPC). O que é, aqui, o caso, dada a manifesta simplicidade da questão e a manifesta improcedência da arguição.

É que, tal como salientado, a este respeito, na resposta do Réu/Recorrido de fls. 674 SITAF:
«(…) como o próprio recorrente o regista, o TCAN disse:
“Relativamente às demais despesas referidas em 3 e 4 o pedido improcede, pois cabia à Autora o ónus de discriminar e comprovar essas despesas, o que não fez, não existindo qualquer suporte fáctico nesse sentido.
Em suma, procedem apenas os pedidos formulados em 2. a) e c), improcedendo todos os demais, e fixando-se em 3000,00€ a indemnização por danos morais”.
Donde omissão de pronúncia não houve.
O que o recorrente pretende é impugnar aquilo que considera ser um erro de julgamento. Ora, para tal não serve a figura da arguição de nulidades».

Efetivamente, o pedido, em causa, de condenação em indemnização pelo pagamento de honorários, era o pedido formulado pela Autora/Recorrente sob o nº 4. Ora, o TCAN expressamente referiu que tal pedido improcedia, pelo que não é verdade que a questão não tenha sido tratada e decidida. E, por outro lado, também não colhe a crítica da falta total de fundamentação, já que bem se retira qual a razão da improcedência do pedido em causa: por falta de comprovação das correspondentes despesas, cujo ónus cabia ao Autor/Recorrente.

Assim sendo, pode ter havido erro de julgamento, mas não se deteta a arguida nulidade por omissão de pronúncia ou por falta de fundamentação do decidido, pelo que improcede tal arguição.

10. Quanto ao alegado erro de julgamento por não atribuição de indemnização por pagamento de honorários (conclusões 7ª a 28ª e 56ª)

Como se disse já, o Ac.TCAN recorrido indeferiu o pedido de atribuição de indemnização por honorários, “pois cabia à Autora o ónus de descriminar e comprovar essas despesas, o que não fez, não existindo qualquer suporte fáctico nesse sentido”.

Ressalta, assim, que o TCAN entendeu que as despesas com honorários de advogado são indemnizáveis (contrariamente ao julgado no Acórdão do Pleno deste STA, de 5/3/2020, proc. 0284/17, em que se julgou que as despesas com honorários dos advogados não devem configurar-se como custos indemnizáveis). E apenas por não comprovação dessas despesas por parte do Autor indeferiu o pedido.

Mas sucede que o Réu/Recorrido não impugnou o Acórdão recorrido em termos de questionar este entendimento do TCAN, sendo certo, por outro lado, que, em coerência com este entendimento ali firmado, haveria que, na invocada falta de elementos para o apuramento do montante indemnizatório, remeter tal apuramento para liquidação em execução de sentença, até porque a ação ainda decorre, o que sempre obstaria a obter-se, desde logo, um apuramento definitivo.

Esta questão configura-se, nos presentes autos, em termos semelhantes aos do proc. 01045/16, em que este STA, por Acórdão de 13/5/2021, confirmou, em recurso de revista, o Acórdão do TCA recorrido, o qual admitira haver um atraso na justiça, embora não como o delimitava a ali recorrente (designadamente, apenas admitiu algum atraso em sede de perícias médico-legais e nos serviços de secretaria, não na tramitação processual propriamente dita), que não constavam dos factos provados despesas concretas incorridas com honorários de advogado, que a quantificação do montante a título de honorários do mandatário devia ser relegada para execução de sentença, e que o montante a apurar não podia ultrapassar, tendo em conta a adequação e a proporcionalidade, os valores da tabela de honorários para apoio judiciário:

«(…) O acórdão recorrido foi prolatado em 16.04.2020, (…) num momento em que este STA já havia decidido no Pleno (…) que os honorários dos advogados não devem ser configurados como custos indemnizáveis (…). Nesse sentido, e em consonância, não haveria como não concluir pela verificação de erro de julgamento em que incorreu o acórdão recorrido, na medida em que a questão da compensação (e do montante) dos honorários dos advogados não se coloca no plano indemnizatório. Vale isto por dizer que a recorrente não teria direito a ser indemnizada a este título. Sucede que o recorrido Estado, representado pelo MP, não impugnou o acórdão recorrido em termos de questionar a solução encontrada quanto à natureza jurídica da compensação devida pelo pagamento de honorários ao mandatário judicial, pelo que transitou em julgado o segmento decisório em que se admite ou afirma a natureza indemnizatória dessa compensação.

Prosseguindo, (…) este Supremo Tribunal já teve a oportunidade de afirmar que, “Com efeito, o cálculo do valor da indemnização a atribuir pelos danos causados com o pagamento dos honorários dos mandatários judiciais não deve ter como limite máximo os valores fixados nas tabelas de honorários para apoio judiciário. Mas, a verdade é que, pelos motivos atrás expostos, também não se pode aceitar que na delimitação do dano indemnizável para este efeito caibam quaisquer valores que tenham sido livremente convencionados ou fixados entre a parte lesada e o seu mandatário judicial” (cfr. Acórdão do STA de 19.05.2016, Proc. n.º 314/13). Procede, por isso, nestes exactos termos, a alegação da recorrente. Para que não restem dúvidas, como se pode ler no sumário deste acórdão, “a tabela de honorários para apoio judiciário deve funcionar como um valor indiciário do que seja um serviço minimamente adequado para alcançar a defesa pretendida”, não podendo, no entanto, exigir-se o pagamento integral dos custos com o mandatário judicial.

Insurge-se a recorrente, de igual modo, nas alegações 22. a 24., contra a circunstância de a aplicação do RCP ao cálculo do montante devido a título de honorários de mandatário forense resultar injusta nestes processos indemnizatórios por atrasos na justiça (“22. Repare-se ainda que o Estado/MP não pagou taxas de justiça, por estar isento, pelo que o advogado nem sequer tem direito ao suplemento de custas de parte previsto no Regulamento das custas judiciais. 23. NÃO PROCEDE O ARGUMENTO DE QUE OS HONORÁRIOS SÃO PAGOS SEGUNDO O REGULAMENTO DAS CUSTAS JUDICIAIS. 24. O Regulamento das custas nem permite que o advogado receba custas de parte, fracção de honorários, pois o Estado delas está isento”. Como facilmente se compreende, a apreciação desta questão só teria razão de ser se nos presentes autos fosse possível aplicar a nova orientação jurisprudencial supra mencionada, que preconiza o reembolso à parte vencedora, a título de custas de parte, dos montantes despendidos em honorários de advogados. Ficamos, portanto, dispensados de a apreciar nos termos do artigo 608.º do CPC, aplicável ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Por último, não obstante a afirmação contida na conclusão 19. das alegações de recurso, da matéria de facto dada como provada pelo acórdão recorrido não consta, efectivamente, qualquer registo de despesas. Quer na p.i, quer no recurso para o TCAS, a ora recorrente não quantifica qualquer valor e não menciona qualquer recibo de honorários. Limita-se a fazer e a repetir uma alegação vaga sobre os honorários. Na p.i. pode ler-se: “Segundo a jurisprudência do TEDH, o Estado Português deve ainda pagar os honorários correntes e condignos, que, conforme o trabalho, não devem ser inferiores a € 9.500,00 (nove mil e quinhentos euros), se o processo acabar na 1.ª instância e daí para cima se houver recursos, mas que neste momento não se podem liquidar” (alegação 25.). Na sentença, na parte relativa à fixação da matéria de facto, pode ler-se: “Não se responde, por constituir alegação com base em juízo de valor, matéria conclusiva ou futura aos: artigo 6 al. g), h), o), artigos 7, 8, 25 da petição inicial.”. No recurso para o TCAS não houve impugnação da matéria de facto relativamente a esta questão da quantificação dos honorários, em função de um qualquer recibo. Realmente, consta de fls. 515 dos autos (paginação SITAF) recibo emitido a 23.04.2018, mas junto aos autos após a decisão do TCAS, de 04.04.2019 – e não acompanhada de qualquer pedido de ampliação da matéria de facto. Aliás, como a própria recorrente reconhece no segundo recurso apresentado para o TCAS:

“B Quatro Erros que contém este trecho
Em primeiro lugar foi emitido um recibo nº 174, de cinco mil euros de honorários mais IVA de 1150 €, num total de 6.150€ junto com anterior recurso para o STA, que está nos autos e se volta a juntar.

Diz o recibo:

Consulta e elaboração da petição inicial na acção contra o Estado por demora da justiça, com pesquisa de doutrina e inúmera jurisprudência, que deu origem ao processo 1045/16.4BEALM, tribunal administrativo de Almada (sic).” (negrito nosso).

Ora, não se pode alegar que o acórdão recorrido decidiu mal com base num documento que não constava dos autos. E a simples junção aos autos, sem mais, de novo documento quando a matéria de facto já está fixada pelas instâncias não constitui o modo processualmente adequado de proceder. Não colhe, deste modo, este argumento da recorrente.

Resta apenas sublinhar que a recorrente apenas é parte parcialmente vencedora.

Em face do decidido, ficamos dispensados de apreciar aspectos a que a recorrente alude e que não têm qualquer interesse prático-jurídico (v.g., a distinção entre advogado ‘oficioso’ e advogado contratado), na medida em que não são de molde a influenciar a fixação do montante devido».

Face ao exposto, e adotando a mesma solução deste citado Acórdão do STA, concede-se, nesta parte, parcial provimento ao recurso da Autora/Recorrente, condenando-se o Réu no montante de indemnização que, a título de despesas com o pagamento de honorários a advogado, relativamente ao presente processo indemnizatório, se vier a apurar em liquidação de sentença, mas devendo a tabela de honorários para apoio judiciário funcionar como um valor indiciário, nos termos do Acórdão deste STA de 19/5/2016 (proc. 314/13).

11. Quanto ao alegado erro de julgamento por não condenação do Réu no pagamento de quantias que forem devidos a título de impostos sobre a quantias indemnizatórias atribuídas (conclusões 4ª, 7ª a 28ª, 44ª a 55ª e 57ª)

Quanto a esta questão, julgou o Ac.TCAN recorrido que «(…) o pedido em 6 também soçobra, na medida em que a incidência subjectiva e objectiva de imposto é matéria de lei, não cabendo a este Tribunal antecipar a liquidação e inverter ou descaracterizar os critérios legais. Por outro lado, a presumível incidência desse tipo de obrigações fiscais já é implicitamente levada em conta no critério de equidade que preside à fixação do quantum indemnizatório».

A Autora/Recorrente alega que esta decisão não se pode manter pois contradiz a jurisprudência do TEDH e a sua própria jurisprudência (do TCAN).

E, efetivamente, assim é, como, aliás, desde logo se refere no Acórdão deste STA que admitiu o presente recurso de revista (cfr. fls. 693 e segs. SITAF), onde se elencam vários arestos do TEDH a determinar a sua atribuição.

É certo que, face à preocupação de não duplicação de compensação expressada pelo Ac.TCAN recorrido, não se deve incluir no valor da indemnização atribuída uma quantia correspondente à “presumível incidência desse tipo de obrigações fiscais” e, simultaneamente, libertar a Autora desse pagamento. Porém, a via mais acertada é a de condenar o Estado a satisfazer a quantia certa do que venha a ser devido em impostos pela indemnização atribuída, preferível a atribuir-se à Autora uma quantia, a tal título, por mero cálculo aproximativo.

Desta forma, concede-se provimento, nesta parte, ao recurso da Autora, condenando-se o Réu no pagamento à Autora das quantias que lhe forem exigidas a título de obrigações fiscais pelo recebimento das quantias indemnizatórias atribuídas no âmbito do presente processo.

12. Quanto ao alegado erro de julgamento por não condenação do Réu no pagamento de indemnização pelo atraso na presente ação administrativa (conclusões 5ª, 29ª a 33ª e 58ª)

O Autor/Recorrente pedia, também a título de danos morais, “uma indemnização de dois mil euros por cada ano de duração do presente processo sobre a morosidade, agora instaurado, após o decurso de dois anos, até ao seu termo, incluindo liquidações, também a título de danos morais”.

O Ac.TCAN recorrido julgou improcedente este pedido com a seguinte fundamentação:

«No que respeita ao pedido 2/b) entende-se que nem o TAF nem o TCAN estariam em condições de garantir a isenção e imparcialidade que são atributos do conceito de Tribunal, se tivessem que avaliar a ilicitude da sua própria actuação, pois ficaria sempre a pairar a desconfiança sobre a sua imparcialidade se fossem demasiado tolerantes ou, inversamente, surgiriam dúvidas sobre se não teriam sido excessivamente severos, em detrimento da Justiça e da contraparte (Estado) movidos pela vontade de exorcizar o espectro da sua parcialidade. Por as garantias da imparcialidade dos juízes (impedimentos e suspeições) serem tema tão relevante ocupam um Capítulo inteiro, desde o artigo 115º até ao artigo 129º do CPC.
E, sendo assim, por muito pragmático e económico que pareça ser o critério implícito nessa pretensão da Recorrente, este TCAN considera que não tem cabimento legal».

O Autor/Recorrente insurge-se contra este julgamento, o qual, segundo refere, é contrário à jurisprudência do TEDH e à deste STA (indica, neste caso, o Ac.STA de 11/5/2017, proc. 1004/16), reafirmando que deveria ser-lhe arbitrada uma indemnização suplementar, a título de danos morais, pelos mais de 5 anos que o presente processo já leva de duração.

Começaremos por dizer que não podemos acompanhar a fundamentação utilizada pelo Ac.TCAN recorrido para indeferir esta indemnização suplementar peticionada.

Efetivamente, quer o TEDH quer este STA já referiram a necessidade de, em determinadas circunstâncias de atraso no próprio processo indemnizatório por atraso na justiça, atribuir-se uma indemnização específica, ou suplementar, por tal atraso. E, como alega o Autor/Recorrente, o art. 611º do CPC dá cobertura legal a tal atribuição.

Como o citado Acórdão deste STA, de 11/5/2017 (proc. 01004/16), expressou:
«(…) III - À luz das exigências da «CEDH» a ação indemnizatória interna, destinada à efetivação daquela responsabilidade do Estado, deve ser decidida de forma célere e rápida.
IV - Perante uma ausência do cumprimento garantístico de tal exigência, mercê da constatação de situação de atraso desrazoável naquela ação indemnizatória, e ainda que o lesado não haja feito uso dos meios e mecanismos adjetivos que o processo lhe faculta, caberá ao julgador, oficiosamente e uma vez assegurado o devido contraditório, aferir e considerar, até aquele concreto momento, do atraso e considerá-lo para efeitos do montante a fixar a título de danos não patrimoniais, arbitrando valor suplementar a esse título e que terá como limite sempre o valor que se mostre peticionado na ação».
Diga-se, ainda, que as reservas manifestadas pelo Ac.TCAN, relativas à questão da “imparcialidade” do julgador, acaso compreensíveis, deixam, porém, de ter sentido ao considerar-se que as “ilicitudes” detetadas nos atrasos na justiça, potenciadores de compensações indemnizatórias, provêm, as mais das vezes, para não dizer na sua quase totalidade, da incapacidade de resposta do sistema judiciário, e não, propriamente, de comportamentos culposos dos operadores judiciários.

E, em todo o caso, a alternativa seria aquela que o TEDH expressamente quer evitar ao secundar este mecanismo de atribuição de uma indemnização suplementar em caso de sequentes violações do prazo razoável: «o Requerente não tem de entrar no círculo vicioso de voltar a demandar o Estado pela nova violação do prazo razoável» (Ac. Vaney c. França, de 30/11/2004, considerando 53).

E como este STA também expressou no citado Acórdão de 11/5/2017 (proc. 01004/16):

«(…) XXXV . Só assim se logrará quebrar todo um círculo vicioso de sucessivas ações de indemnização a instaurar para reparação dos atrasos havidos na ação antecedente em constante e permanente lesão da “CEDH” e do direito consagrado na mesma à administração da justiça em prazo razoável.
XXXVI. Um tal entendimento estriba-se no princípio da subsidiariedade e decorrente dever do juiz nacional de interpretar e aplicar o direito interno em conformidade com a “CEDH”».

Dito isto, verificamos que a presente ação administrativa foi instaurada, no TAF do Porto, em 7/10/2016 (cfr. fls. 1 e segs. SITAF), passou por três instâncias, tendo até ao atual momento sido produzidas várias decisões judiciais: a sentença do TAF do Porto, de 2/8/2019, que julgou a ação improcedente (cfr. fls. 341 e segs. SITAF), prolatada em 1ª instância, após sessões de audiência prévia e de audiência final de julgamento com produção de prova, designadamente audição de várias testemunhas e depoimento de parte; um primeiro Acórdão do TCAN, de 14/2/2020 (cfr. fls. 433 e segs. SITAF), que confirmou a sentença de 1ª instância, negando provimento ao recurso da Autora; um primeiro Acórdão deste STA (formação preliminar a que se refere o art. 150º nº 6 do CPTA), de 10/9/2020 (cfr. fls. 542/543) que admitiu recurso de revista daquele primeiro Acórdão do TCAN; um primeiro Acórdão da Secção de Contencioso Administrativo deste STA, de 18/2/2021 (cfr. fls. 556 e segs. SITAF) que concedeu parcial provimento ao recurso de revista, ordenando a baixa ao TCAN para prosseguimento do julgamento do recurso de apelação em conformidade; um segundo Acórdão do TCAN, de 23/4/2021 (cfr. fls. 578 e segs. SITAF) – Acórdão ora recorrido -, que concedeu parcial provimento ao recurso de apelação; um Acórdão do TCAN, de 18/6/2021 (cfr. fls. 680 e segs. SITAF), rejeitando reclamação por nulidade arguida ao seu Acórdão precedente; um segundo Acórdão deste STA (formação preliminar a que se refere o art. 150º nº 6 do CPTA), de 21/10/2021 (cfr. fls. 693 e segs. SITAF) que admitiu este segundo recurso de revista; e, finalmente (até ao momento), o presente Acórdão (segundo da Secção de Contencioso Administrativo deste STA). Em suma: uma sentença e sete Acórdãos, em três instâncias.

Toda esta tramitação teve uma duração de, aproximadamente, cinco anos e três meses, verificando-se que o período mais longo (em cada uma das instâncias) foi despendido, como sempre seria natural, na 1ª instância – isto é, até à prolação da sentença pelo TAF do Porto – 7/10/2016 a 2/8/2019 (cerca de 2 anos e 10 meses), atendendo às diligências presenciais, de audiências (prévia e final de julgamento) efetuadas.

Note-se que o provimento parcial concedido, no primeiro recurso de revista, por este STA, pelo seu Acórdão de 18/2/2021, não se deveu, como neste aresto bem se explicou, a um manifesto erro das instâncias, mas apenas a uma diferente consideração dos factos atinentes à duração do processo nº 990/08, da 1ª Vara Cível do Porto, onde a complexidade da causa e das suas particulares circunstâncias – entre o mais, a dificuldade de destrinça das consequências para a Autora do acidente sofrido relativamente às consequências de outro acidente pela mesma anteriormente sofrido, e as inerentes dificuldades de apuramento médico-legal, através de primeiras e de segundas perícias, relativas a várias especialidades médicas – tornava especialmente difícil uma concreta avaliação do “prazo razoável”. Por isso, se julgou nesse aresto que: «(…) ainda que sem a gravidade ou dimensão subjacente às alegações da Recorrente, não podemos deixar de considerar que o Réu Estado incorreu, no processamento daqueles autos nº 990/08, em violação do direito da aqui Recorrente a uma decisão judicial em “prazo razoável” – ilicitude cuja gravidade se admite atenuada pela complexidade e circunstancialismo já supra explanados».

Tudo ponderado, não entendemos que a presente ação administrativa tenha, pela sua duração, violado o direito da Autora/recorrente a uma decisão judicial em “tempo razoável”.
Tomando como referência uma duração aceitável de cerca de três anos em 1ª instância, e de até 6 anos no total, salvo casos especiais, como tem referido o TEDH (ver Isabel Celeste Fonseca, in CJA nº 72, págs. 45/46), verifica-se que, no presente caso, os autos demoraram-se no TAF do Porto, e no total, menos do que isso, sendo certo, pelo que se disse, que a especial dificuldade da avaliação, em questão, relativa à duração da ação cível nº 990/08, justifica a sua duração. E, quanto aos sucessivos tempos de permanência no TCAN e neste STA, pelo que acima se disse, menos se poderão ter como injustificados. Acresce que, em princípio, assume importância primordial a duração total da causa (e não, isoladamente, as das suas várias fases), sendo que não se pode ter por exagerado o tempo total constatado, em face da específica tramitação ocorrida nas três instâncias. Por outro lado, e como a jurisprudência do TEDH tem assinalado, para além da consideração dos tempos de duração em abstrato, devem sempre ser tidas em conta as particulares circunstâncias de cada caso (cfr. caso Frydlander c. França, proc. 30979/96, § 43) e, no presente caso, como sobejamente se explanou no Acórdão de 18/2/2021 (cfr. fls. 556 e segs. SITAF), a análise tendente ao apuramento da eventual violação do “prazo razoável” pressupôs dificuldades específicas várias.

Aliás, socorrendo-nos de julgamento anterior deste STA, através do já acima citado Acórdão de 13/5/2021 (proc. 01045/16), constata-se ter-se decidido aí, quanto à questão ora em causa (duração da própria ação administrativa indemnizatória), em situação com contornos semelhantes à presente, o seguinte:

«(…) 2.5. Por fim, pretende a aqui recorrente que o Estado seja responsabilizado pelo pretenso atraso na acção indemnizatória que se aprecia nos presentes autos e que visa os alegados atrasos em que a mesma já incorrera (“Uma indemnização de dois mil euros por cada ano de duração do presente processo, após o decurso de dois anos, até ao seu termo incluindo liquidações, também a título de danos morais”).
(… ) alegação que foi rejeitada no acórdão recorrido. Nele se afirma laconicamente que a questão “da al. b) não tem fundo jurídico-legal”. Vejamos.
A presente acção foi intentada no TAF de Almada em 25.11.2016, passou por três instâncias, até ao momento já foram prolatadas várias decisões judiciais: vejam-se a sentença do TAF de Almada; o 1.º acórdão do TCAS; na sequência da arguição de nulidade do acórdão por parte da ora recorrente temos acórdão de sustentação do TCAS; o 1.º acórdão da formação preliminar mencionada no artigo 150.º do CPTA; o acórdão do STA em sede de recurso de revista; a baixa dos autos ao TCAS; o 2.º acórdão do TCAS; o 2.º acórdão da formação preliminar mencionada no artigo 150.º do CPTA. Mas, o que mais interessa, das alegações da recorrente nada resulta em concreto que funde um pedido de responsabilidade extracontratual do Estado por atraso na justiça nos presentes autos. Pelo que, com este sentido, esta alegação, efectivamente, “não tem fundo jurídico-legal”».

Pelo exposto, nega-se provimento, nesta parte, ao recurso da Autora/Recorrente.

13. Quanto ao alegado erro de julgamento no montante da indemnização atribuída (3.000,00€) e na forma de contabilizar os anos de indemnização (conclusões 6ª, 34ª a 40ª e 59ª)

13.1. Insurge-se, também, a Autora/Recorrente, quanto ao montante da indemnização atribuída pelo Ac.TCAN recorrido (3.000,00€), em violação, segundo alega, da jurisprudência do TEDH respeitante ao art. 6º nº 1 da CEDH, defendendo que a indemnização deverá ser atribuída no montante peticionado, isto é, “nunca inferior a doze mil euros”.

Nesta parte, julgou o Ac.TCAN recorrido:

«(…) No que concerne ao cômputo da indemnização colhe-se inspiração no Ac. deste TCAN de 27/09/2019, Proc. 02114/17.9BEPRT, onde justamente se decidiu que «O quantum da indemnização a arbitrar a título de indemnização decorrente de atraso na decisão de processo judicial deve atender aos padrões usados, quer na jurisprudência nacional quer na do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), para casos semelhantes; devendo na identificação destes, usar-se a comparação do número de anos, do número de jurisdições em que os casos correram, da importância dos interesses em jogo, do comportamento das partes e das situações para um mesmo país». E onde, em função disso, se faz uma indagação jurisprudencial comparativa bastante completa.
Retira-se de útil que “é aceite o prazo de 3 anos como duração média de um processo em primeira instância – para a generalidade das matérias”.

Assim, considerando que a duração global do processo nº 990/08 foi de cerca de 5 anos e meio, há que censurar uma demora excessiva de 2 anos e meio.

Por outro lado, ainda e sempre a título meramente indicativo, têm sido arbitrados valores que oscilam entre 1000,00€ e 1500,00€ por cada ano de demora do processo.

Nas circunstâncias do caso, sempre num critério de equidade e levando em conta a complexidade pouco usual das perícias realizadas, fixa-se o valor de compensação em 1200,00€ por cada ano de demora excessiva do processo, resultando num total de 3000,00€ a título de danos morais, acrescidos dos juros de mora».

A Autora/Recorrente alega que este julgamento do Ac.TCAN é criticável à luz da jurisprudência do TEDH, pois que a indemnização referida, de cerca de 1.000€/1.500€ por ano, deve ser contabilizada relativamente aos anos de duração total do processo (no caso – processo cível nº 990/08 - cerca de 5 anos e meio) e não, como fez o TCAN, relativamente apenas aos anos de atraso (no caso, cerca de 2 anos e meio). E, por outro lado, estando em causa um tipo de processo tido, pela jurisprudência do TEDH, como “sensível” para a Autora (processo por acidente de viação), haveria por isso que aditar, ainda, uma quantia de 2.000€.

13.2. Não há dúvida que a Autora/Recorrente tem razão quando alega que a jurisprudência do TEDH afirma que, em caso de violação ao direito a uma decisão judicial em prazo razoável, a indemnização resultará da contabilização dos anos de duração da causa (e não, apenas, dos anos de duração excessiva), tendo, para o efeito, apontado para uma quantia de 1.000€/1.500€ por ano. E se estiver em questão uma causa tida por “sensível” para o Autor, justificar-se-á um aumento de 2.000€.

Mas também não pode esquecer-se que esses são marcos meramente indicativos, sujeitos a variações em consequência de variadas circunstâncias.

Ora, no caso, releva consideravelmente, no sentido da mitigação do “quantum” indemnizatório, a constatação do atenuado grau de “ilicitude” detetada relativamente à duração do processo cível nº 990/08.

Como se referiu no Acórdão de STA de 18/2/2021 (cfr. fls. 556 e segs. SITAF): «(…) ainda que sem a gravidade ou dimensão subjacente às alegações da Recorrente, não podemos deixar de considerar que o Réu Estado incorreu, no processamento daqueles autos nº 990/08, em violação do direito da aqui Recorrente a uma decisão judicial em “prazo razoável” - ilicitude cuja gravidade se admite atenuada pela complexidade e circunstancialismo já supra explanados».

Acresce que uma das circunstâncias a que a jurisprudência do TEDH manda atender é o nível do custo de vida no país em causa, nomeadamente através da consideração do correspondente PIB.

Tudo ponderado, julga-se que o recurso merece, nesta parte, parcial provimento, pois se considera diminuta a quantia de 3.000,00€ a este título atribuída pelo TCAN.

Diferentemente, ainda que adotando uma quantia anual de 750,00€/ano - considerando as circunstâncias aludidas que apontam para um abaixamento da quantia média de referência -, encontramos um total, por cinco anos e meio, de 4.125€.

Mas relevará, ainda, a circunstância de estar em causa um processo cível relativo a um acidente de viação sofrido pela Autora/Recorrente, um dos tipos processuais, portanto, que a jurisprudência do TEDH reputa de “sensível”, pelo que devemos aditar, consequentemente, mais 1.500€ como quantia suplementar em decorrência desta natureza “sensível” do processo em causa.

Julga-se, portanto, adequado, nesta parte, a atribuição de uma indemnização na quantia, já atualizada, de 5.625€.

14. Quanto ao alegado erro de julgamento por não condenação na peticionada sanção pecuniária compulsória (conclusões 41ª a 43ª)

Sobre esta questão, o Ac.TCAN julgou:

«No que respeita a sanção pecuniária compulsória trata-se de pedido manifestamente precoce e infundado, uma vez que nada nos autos permite inferir que o Estado Português não venha a cumprir com celeridade a indemnização em que seja condenado».

A Autora/Recorrente alega que a questão não se coloca relativamente a eventual incumprimento da decisão final, mas sim com os atos processuais da presente ação indemnizatória que ultrapassem os prazos legais, ou caso este mesmo processo dure mais de dois anos.

Mas, ainda assim, o recurso não merece provimento nesta parte.

Desde logo, porque, como acima concluímos, não se deteta “ilicitude” na tramitação da presente ação administrativa pela alegada violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável. E, depois, porque, o direito a uma indemnização, por danos morais, a este título, não resulta do eventual atraso em cada ato processual unitariamente considerado, mas de eventual duração excessiva da causa, globalmente considerada. E, não menos relevante, não se vê como a compensação poderia surgir pela via de uma sanção pecuniária compulsória, e não pela via indemnizatória, se a Autora/Recorrente afirma não estar em causa a preocupação com o cumprimento futuro, designadamente da decisão final (como entendeu o TCAN), isto é, se não está em causa uma “compulsão” a um comportamento futuro.

Por todas estas razões, nega-se provimento, nesta parte, ao recurso.


*


IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202º da Constituição da República Portuguesa, em:

Conceder parcial provimento ao presente recurso jurisdicional de revista deduzido pela Autora/Recorrente A............, e, em consequência, julgar a presente ação parcialmente procedente, condenando-se o Réu/Recorrido:
- a pagar à Autora a quantia de 5.625,00€, sendo devidos juros de mora à taxa legal desde a presente decisão até integral pagamento,
- bem como no pagamento à Autora das quantias que lhe forem exigidas a título de obrigações fiscais pelo recebimento das indemnizações atribuídas no âmbito da presente ação, e, ainda,
- no pagamento de indemnização que, a título de despesas com o pagamento de honorários a advogado, relativamente ao presente processo indemnizatório, se vier a apurar em liquidação de sentença, nos termos indicados no ponto 10 supra,

negando-se, no mais, provimento ao recurso.

Custas a cargo da Autora/Recorrente e do Réu/Recorrido, nas proporções dos respetivos vencimento e decaimento.

D.N.

Lisboa, 13 de janeiro de 2022 – Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha (relator) – José Augusto Araújo Veloso – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.