Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01361/13
Data do Acordão:10/23/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:ASSISTENCIA MUTUA ENTRE ESTADOS MEMBROS DA COMUNIDADE EUROPEIA
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
IMPUGNABILIDADE
ACTO DE EXECUÇÃO INDEVIDA
INEFICÁCIA
Sumário:I - Por força do disposto no nº 2 do art. 143º do CPTA, os recursos interpostos de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares têm efeito meramente devolutivo, não se encontrando legalmente consagrada a possibilidade de ser atribuído efeito suspensivo, podendo o tribunal, quanto muito e ao abrigo do disposto no n.º 4 do art. 143º do CPTA, determinar a adopção de providências adequadas a minorar os danos que possam advir da execução da sentença.
II - No contencioso tributário o critério da impugnabilidade dos actos é o da sua lesividade imediata, objectiva, actual e não meramente potencial, ao contrário do que acontece no contencioso administrativo, onde a impugnabilidade depende apenas da externalidade ou eficácia externa do acto.
III - A actuação procedimental que permite ao Estado Português a recolha de informação fiscal para ser facultada a outro Estado-Membro da União Europeia no âmbito de Assistência Mútua Internacional em Matéria Fiscal pode/deve ser realizada através de procedimento tributário de inspecção disciplinado no Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária, aprovado pelo Dec. Lei nº 413/98, de 31.12, o qual está adstrito às regras e princípios que regem esse procedimento e às normas e princípios jurídicos vigente no contencioso tributário sobre a impugnabilidade dos actos que o integram.
IV - Tendo sido utilizado esse procedimento, os respectivos actos interlocutórios, ainda que ilegais e com eficácia externa, não são, em princípio, lesivos, pelo que a sua ilegalidade só pode ser suscitada aquando da impugnação deduzida contra o acto final, excepto se se tratar de um dos seguintes actos susceptíveis de impugnação imediata: (i) actos interlocutórios cujo escrutínio imediato e autónomo se encontre expressamente previsto na lei (“actos destacáveis”); (ii) actos que, embora inseridos no procedimento e anteriores à decisão final, sejam imediatamente lesivos; (iii) actos trâmite que ponham um ponto final na relação da administração com o interessado, já que nestes casos, muito embora o acto continue a ser, na economia geral do procedimento, um acto preparatório pré-ordenado ao acto final, é para o seu destinatário o acto que define a posição da Administração e, por isso, o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legítimos.
V - O acto da administração tributária portuguesa que determina e credencia a acção inspectiva para recolha de informação fiscal a um contribuinte residente em Portugal para prestação de informação a outro Estado-Membro (Espanha) não constitui o acto final do procedimento de cooperação mútua e intercâmbio internacional de informação em matéria fiscal, pois não é ele que põe um ponto final na relação da administração fiscal portuguesa com o contribuinte inspeccionado.
VI - O acto que põe esse ponto final é o referido no nº 1 do art. 6º do Dec.Lei nº 127/90, de 17 de Abril, consubstanciado no acto (obrigatório) de notificação ao contribuinte de que vão ser facultadas a outro Estado-Membro informações fiscais a seu respeito e dado conhecimento da natureza dessas informações.
VII - A Directiva 77/799/CEE não se opõe a que seja dado conhecimento ao contribuinte da informação que sobre si vai ser prestada para que a possa contestar/impugnar, já que a fixação de regras e procedimentos a este respeito competem exclusivamente ao direito nacional (acórdão do TJUE de 22/10/2013, no Proc nº C276/12).
VIII - Quando estão em causa actos administrativos em matéria tributária cuja legalidade tem de ser apreciada em acção administrativa especial regulada pelas normas do CPTA, tem de ser permitido ao seu autor a adopção das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nessa acção. Razão por que se deve admitir, no contencioso tributário, a suspensão de eficácia desses actos administrativos que constituem o objecto da acção administrativa, através da respectiva providência cautelar prevista nos arts. 112º e segs. do CPTA, bem como a dedução, nessa providência, do incidente previsto no art. 128º do CPTA.
IX - Do art. 128º do CPTA decorre a proibição de a Administração executar um acto administrativo após ter sido interposta a providência cautelar da suspensão de eficácia, com o que se visa assegurar que, uma vez interposta a providência, a autoridade administrativa fique impedida de iniciar ou prosseguir a execução desse acto a partir do momento em que recebe o duplicado do pedido de suspensão, a menos que no prazo de 15 dias, assuma, em resolução fundamentada, que a execução é urgente porque o seu diferimento “seria gravemente prejudicial para o interesse público”.
X - Se não existir essa resolução fundamentada, o tribunal tem de declarar ineficazes os actos de execução praticados na pendência da providência cautelar.
XI - E não obsta à declaração de ineficácia de actos de execução a circunstância de a decisão da 1ª instância se ter negado a adoptar a providência e de ter sido interposto recurso jurisdicional dessa decisão, pois embora o recurso tenha efeito devolutivo, o nº 4 do art. 128º permite expressamente que a declaração de ineficácia seja requerida até ao trânsito em julgado da decisão do processo cautelar, seja ela proferida em que sentido for, pelo que só a negação definitiva da providência tem o efeito de fazer caducar a proibição de executar os actos que constituem o objecto dessa providência.
Nº Convencional:JSTA00068427
Nº do Documento:SA22013102301361
Data de Entrada:08/23/2013
Recorrente:A...., S.A
Recorrido 1:DIRGER DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - SUSPEFIC
Legislação Nacional:CPTA02 ART128 N4 ART143 N2 N4 ART113 N1 ART120 N1 A B ART51 N1 ART112
CPC96 ART692 N3 D ART687 N4
CPPTRIB99 ART279 N2 ART54 ART147 N6 ART97 N1 N2
DL 127/90 DE 1990/04/17 ART4 ART5 ART6
DL 413/98 DE 1998/12/31
DL 61/2013 DE 2013/05/10
Legislação Comunitária:DIR CONS CEE 77/799/CEE DE 1977/12/19
DIR CONS CEE 79/1070/CEE DE 1979/12/06
Jurisprudência Nacional:AC TCAS PROC00393/04 DE 2005/01/13; AC TCAN PROC00940.9BEPRT-A DE 2011/02/18; AC TCAS PROC6759/10 DE 2010/11/25
Jurisprudência Internacional:AC TJUE PROC C-276/12 DE 2013/10/22
Referência a Doutrina:AROSO DE ALMEIDA - NOVO REGIME DO PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS PAG135-136
AROSO DE ALMEIDA E CARLOS CADILHA - CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS COMENTADO PAG306 A 313 E PAG860 E SEGS
JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO - ANOTAÇÃO AO ART54
ODETE DE OLIVEIRA - O INTERCÂMBIO DE INFORMAÇÃO TRIBUTÁRIA PAG128-129
DUARTE MORAIS - MANUAL DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO PAG10
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A…….., S.A., com os demais sinais dos autos, veio interpor recurso jurisdicional da decisão proferida pelo TAF do Porto que julgou procedente a excepção da impugnabilidade dos actos que constituem o objecto da providência cautelar que intentou com vista à suspensão de eficácia do Despacho nº DI 201300003, de 4/01/2013, do Serviço de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto – que determinou e credenciou, com vista a dar cumprimento a um pedido de troca de informações fiscais formulado pelas autoridades fiscais espanholas, a realização de acção inspectiva a esta sociedade para recolha de elementos aos períodos de tributação de 2006 e 2007 –, bem como a suspensão de eficácia da Decisão da Direcção de Finanças do Porto, de 6/03/2013, de resposta desfavorável à oposição que esta sociedade deduziu à realização daquela inspecção, actos cuja anulação disse pretender pedir em acção administrativa especial a instaurar para o efeito.

Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões:
1. O presente recurso deve, desde logo, proceder porque os actos impugnados não poderão ser apreciados como interlocutórios do procedimento constante no artigo 6º do Decreto-Lei nº 127/90, 17 de Abril.

2. De facto, não se poderá olvidar que o procedimento de inspecção externo encetado à Recorrente foi desencadeado pela Administração Tributária portuguesa para dar cumprimento a um pedido de informações fiscais apresentado pela Autoridade Tributária espanhola.

3. Esta modalidade de troca de informação a “pedido” coloca, deste modo, a cargo da administração tributária requerida a tarefa de obter/recolher a informação solicitada pela administração fiscal do Estado-Requerente, que deverá proceder como se actuasse por sua conta (“principio de actuação por conta própria”/“princípio da autonomia procedimental nacional”).

4. Ora, o artigo 11º do RCPIT, aprovado pelo DL 413/98, de 31 de Dezembro, prevê expressamente que «o procedimento de inspecção tributária tem um carácter meramente preparatório ou acessório dos actos tributários ou em matéria tributária sem prejuízo do direito de impugnação das medidas cautelares adoptadas ou de quaisquer outros actos, nos termos da lei» (sublinhado nosso).

5. Deste modo, e tendo presente os contornos particulares do caso sub judice, não se poderá deixar de concluir que o acto final do procedimento encetado à Recorrente de “consulta, recolha ou cruzamento de documentos” apenas afectará, a final, a esfera jurídica da sucursal espanhola da Recorrente, pelo que, só esta terá legitimidade para, posteriormente, o poder impugnar.

6. Assim, e sob pena da Recorrente ver precludido o seu direito processual de discutir a legalidade do acto em apreço, o mesmo deverá ser susceptível de impugnação imediata e autónoma por parte da Recorrente.

7. Mal se compreende, aliás, como é que os actos impugnados podem ser considerados interlocutórios do procedimento previsto no artigo 6º do DL nº 129/09, de 17 de Abril, e a notificação prevista no nº 1 do aludido artigo como acto final susceptível de impugnação, quando essa mesma notificação apenas e tão só visa comunicar à pessoa relativamente à qual são prestadas as informações, quais as que vão ser transmitidas, a indicação da autoridade competente a que vai ser fornecida a informação e a natureza desta, além de que a mesma deveria ser “prévia” a qualquer tarefa de obtenção ou de recolha das informações solicitadas pela administração fiscal do Estado-Membro requerente.

8. Ora, a aqui Recorrente não foi notificada, nem ouvida previamente, nos termos do aludido artigo 6º, nº 1 e nº 3 do DL nº 127/90, de 17 de Abril, não lhe tendo sido, assim, permitido pronunciar-se e até submeter à Autoridade Tributária portuguesa as razões por que entende que as informações solicitadas não devem ser transmitidas, direitos esses fundamentais de garantia e da sua efectiva protecção.

9. Assim, e contrariamente ao entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo,uma vez que não houve qualquer notificação prévia do pedido solicitado antes de ser encetado pela Autoridade Tributária o acto de inspecção em apreço, o mesmo apresenta-se como imediatamente lesivo dos direitos e interesses legalmente protegidos da Recorrente, porquanto os elementos que a Autoridade Tributária portuguesa consultou, recolheu e pretende cruzar por meio do presente acto inspectivo estão irremediavelmente abrangidos pelo segredo comercial.

10. O que desde logo, nos termos do artigo 54º do CPPT, afasta o cumprimento do aludido princípio da impugnação unitária, possibilidade essa justificada por imposição constitucional, em consonância com o princípio constitucional da tutela judicial efectiva (artigos 20º nº 1 e 268º nº 4 da CRP).

11. Assim, e tendo por seguro que a inultrapassável existência de uma verdadeira tutela jurisdicional efectiva exige que seja reconhecida a possibilidade de impugnação de actos, ainda que procedimentais, sempre que estes se mostrem imediatamente lesivos, os actos suspendendos em apreço deverão ser considerados impugnáveis, devendo-lhes ser aplicada a mesma disciplina aplicável aos acto destacáveis, sob pena de a Recorrente, se assim não se entender, nunca ter forma de obter uma verdadeira tutela jurisdicional efectiva.

Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequências, revogada a douta sentença recorrida nos moldes acima referidos, sendo apreciados os fundamentos da providência cautelar intentada, julgando-se a mesma, a final, procedente por provada. Assim se fazendo JUSTIÇA!


1.2. A Entidade Recorrida (Director Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira) apresentou contra-alegações para sustentar a manutenção do julgado, que rematou com as seguintes conclusões:

I. De acordo com o artigo 143º nº 2 do CPTA, é regra geral que os recursos da não adopção de providências cautelares em matéria tributária têm efeito meramente devolutivo e não suspensivo;

II . Todavia ainda que tenha sido concedido efeito suspensivo no despacho de admissibilidade proferido pelo Tribunal “a quo”, sendo o acto inimpugnável e inexistindo objecto, salvo melhor opinião, não se verifica qualquer acto ou efeito a suspender, pelo que é inexequível o efeito pretendido;

III. Quanto à vexata quaestio, no contencioso tributário o critério subjacente de impugnabilidade dos actos é o da sua lesividade objectiva, imediata, actual e não meramente potencial.

IV. Os actos interlocutórios do procedimento não são imediatamente lesivos, razão pela qual a sua ilegalidade só pode ser suscitada aquando da eventual impugnação deduzida contra o acto final lesivo;

V. Tendo o pedido de troca de informações sido efectuado ao abrigo da Directiva nº 1977/799/CEE do Conselho, transposta para o ordenamento jurídico português pelo Decreto-Lei nº 127/90 de 17 de Abril, este determina um procedimento próprio de troca informações, impondo o artigo 6º nº 1 a notificação prévia ao contribuinte do conteúdo da informação que será expedida ao Estado Membro requerente;

VI. Deste modo, não tendo ainda ocorrido a notificação, não se poderão projectar os efeitos externos que permitam a impugnabilidade do acto.

VII. Assim, o procedimento inspectivo que deu lugar à recolha dos elementos requeridos pelo Estado Membro ao abrigo da Directiva nº 1977/799/CEE do Conselho, está na categoria dos actos inimpugnáveis, ou melhor, naquela categoria de actos cuja impugnação terá que ser deduzida a final, que no caso sub judice ocorre com a notificação.

1.3. O Ministério Público apôs o seu visto nos autos.

1.4. Na pendência deste recurso, a Recorrente suscitou, ao abrigo do disposto no art. 128º, nº 4 do CPTA, incidente de declaração de ineficácia de acto de execução indevida dos despachos cuja suspensão se pretende obter com a presente providência cautelar, invocando, em suma, que apesar da dedução da providência cautelar e do efeito suspensivo atribuído ao recurso da decisão de indeferimento da providência, a Recorrida praticou, entretanto, actos de execução daqueles despachos, pois a Direcção de Serviços de Relações Internacionais notificou-a em 9/09/2013 do seguinte:

«Assunto: Notificação

Ao abrigo do nº 1 do Artigo 6º do Decreto-Lei nº 127/90, de 17 de Abril, e de acordo com o solicitado por V. Exªs, informamos que foi recepcionada nesta Direcção de Serviços um pedido de informações apresentado pelas Autoridades Fiscais Espanholas, tendo sido solicitado informações fiscais de carácter geral sobre a vossa empresa, bem como informações e documentos referentes às transacções comerciais estabelecidas durante os anos de 2006 e 2007 entre a vossa empresa e a empresa espanhola A………, S.A., sucursal em Espanha, que foram recolhidos nos vossos registos contabilísticos pelos nossos Serviços Regionais de Inspecção.

Sem mais, apresentamos os nossos melhores cumprimentos».


1.5. Notificada a Recorrida para responder, nos termos previstos no art. 128º do CPTA, veio fazê-lo, reiterando o que já invocara em sede de contestação à providência cautelar e em sede de contra-alegações no recurso, defendendo, ainda, a inaplicabilidade do art. 128º do CPTA ao caso sub judice, por estar em causa uma medida cautelar prevista no art. 97º nº 1 al. i) do CPPT, com os efeitos previstos no art. 147º nº 6 do CPPT, o que tornaria inaplicáveis as normas contidas no CPTA e tornaria desnecessária a resolução fundamentada prevista no art. 112º do CPTA para obter a suspensão de eficácia dos actos controvertidos.

1.6. Com dispensa dos vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir em conferência.

2. Na decisão recorrida foi julgada como provada a seguinte factualidade:
1. As autoridades fiscais espanholas, através da Direcção de Serviços de Relações Internacionais (DSRI), solicitaram a colaboração da DF do Porto no sentido de fornecer informações e documentos relativos à actividade da Autora nos anos de 2006 e 2007 (fls. 24);

2. A DF do Porto determinou a realização de procedimento de inspecção à Autora com extensão aos anos de 2006 e 2007, com vista à consulta, recolha e cruzamento de elementos;

3. A Autora foi notificada para exibir no dia 11.03.2013, nas suas instalações, os livros, registos e documentos que integram a sua escrita relativamente à actividade exercida em 2006 e 2007 (fls. 26 e ss.);

4. Em 22.02.2013, a Autora deduziu oposição à realização do procedimento inspectivo (fls. 26 e ss.);

5. Por despacho de 06.03.2013 da DF do Porto foi decidido remeter à DSRI a informação sobre a oposição apresentada pela Autora, com conhecimento da Autora do teor da mesma (fls. 23 e ss.).


3. As questões que importa apreciar e decidir no presente recurso jurisdicional são as seguintes:
- questão prévia – conclusões I e II da contra-alegação do recorrido – saber se o Mmº Juiz “a quo” errou ao atribuir efeito suspensivo ao presente recurso;

- questão do mérito do recurso – conclusões da alegação da recorrente – saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento em matéria de direito ao ter julgado procedente a excepção de inimpugnabilidade dos actos que constituem o objecto da presente acção cautelar;

- questão incidental – saber se o incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida, previsto no art. 128º do CPTA, é aplicável à presente providência cautelar e, no caso afirmativo, se o mesmo merece ou não ser deferido.

3.1. Quanto à questão prévia.
O despacho de admissão do presente recurso jurisdicional é do seguinte teor: «Por ter legitimidade, estar em tempo e ser admissível, defere-se à interposição do recurso de fls. 97 e seguintes dos autos, o qual sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, nos termos conjugados das alíneas d) do nº 3 dos arts. 692º do CPC e art. 143º do CPTA.».
Uma vez que a Recorrida se insurge quanto ao efeito suspensivo atribuído ao recurso, vejamos se lhe assiste razão, tendo em conta, aliás, que o despacho que admite o recurso e fixa o regime de subida e o seu efeito não vincula o tribunal superior (nº 4 do art.º 687º do CPC).
Sob a epígrafe “Efeitos dos recursos”, prescreve o art. 143º do CPTA – aplicável ao presente recurso por força do disposto no nº 2 do art. 279º do CPPT (Segundo o qual, “Os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos.”) - o seguinte:

«1 - Salvo o disposto em lei especial, os recursos têm efeito suspensivo da decisão recorrida.

2 - Os recursos interpostos de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares têm efeito meramente devolutivo.

3 - Quando a suspensão dos efeitos da sentença seja passível de originar situações de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para a parte vencedora ou para os interesses, públicos ou privados, por ela prosseguidos, pode ser requerido ao tribunal para o qual se recorre que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo.

4 - Quando a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso possa ser causadora de danos, o tribunal pode determinar a adopção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos e impor a prestação, pelo interessado, de garantia destinada a responder pelos mesmos.

5 - A atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso é recusada quando os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição, sem que a lesão possa ser evitada ou atenuada pela adopção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos.».


Donde decorre que, por força do disposto no nº 2 do art. 143º do CPTA, os recursos interpostos de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares têm efeito meramente devolutivo, não se prevendo a possibilidade de o recorrente requerer a atribuição de efeito suspensivo.

Por outro lado, tanto a doutrina como a jurisprudência que se consolidou após a entrada em vigor do CPTA, entendem que no texto do nº 2 do art. 143º cabem todos os tipos de decisões que podem ser adoptadas em processos cautelares, quer as que concedam quer as que deneguem as providências, quer as que as declarem caducas, as alterem ou revoguem – vide, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, inComentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2007; José Carlos Vieira de Andrade, inA Justiça Administrativa”, Almedina, 7ª ed.; na jurisprudência, a título exemplificativo, o acórdão proferido em 5/03/2013 pela Secção de Contencioso Administrativo no recurso excepcional de revista nº 0553/12; os acórdãos dessa Secção proferidos em 13/09/2012, no recurso nº 0628/12 e em 24/05/2012, no recurso nº 0225/12; bem como o acórdão do Pleno dessa Secção de 5/06/2012, no recurso nº 0900/11.

Como esclarecem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, na obra citada, no que tange ao efeito devolutivo dos recursos interpostos contra decisões respeitantes à adopção de providências cautelares “(…) a solução justifica-se, antes de mais, porque, para atribuir ou recusar providências cautelares, o juiz já procede à ponderação de que o nº 5 do artigo aqui em presença faz depender a decisão de atribuir efeito meramente devolutivo ao recurso (cfr. artigo 120º nº 2) (…)“a atribuição de efeito suspensivo ao recurso jurisdicional, neste tipo de casos, teria o efeito pernicioso de favorecer a utilização abusiva do recurso contra decisões que recusassem a suspensão de eficácia de actos administrativos, no propósito de aproveitar o efeito automático que resultaria da simples interposição do recurso jurisdicional (…) assim prolongando a situação de proibição de executar o acto administrativo”.
E como se deixou frisado no acórdão do STA proferido no recurso nº 0628/12, «Não obstante a redacção desta norma [nº 2 do art. 143º do CPTA] permitir a dúvida sobre se não reservaria para a «adopção» das providências o efeito devolutivo, valendo o efeito suspensivo – que é a regra (vd. nº 1 do mesmo preceito) – para a denegação das mesmas providências, deverá entender-se que impõe a atribuição de efeito meramente devolutivo às decisões tomadas em processos cautelares, seja as que concedam seja as recusem a adopção das providências requeridas. Pois que só assim se dissuade o interessado de interpor recurso de decisão desfavorável, apenas no intuito de continuar a beneficiar da proibição de executar o acto administrativo durante a pendência do recurso (vd. art. 128/1 CPTA).».
Em suma, não se encontra legalmente consagrada a possibilidade de ser atribuído efeito suspensivo ao recurso de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares, podendo o tribunal, quanto muito e ao abrigo do disposto no n.º 4 do art. 143º do CPTA, determinar a adopção de providências adequadas a minorar os danos que eventualmente possam advir da execução da sentença, o que, no caso vertente, a Recorrente não requereu, nem o Tribunal “a quo” equacionou ou determinou.
Termos em que se impõe alterar o efeito atribuído ao recurso pelo tribunal “a quo”, atribuindo-se-lhe efeito meramente devolutivo.

3.2. Quanto ao mérito do recurso.
O presente recurso vem interposto da decisão que absolveu a Autoridade Tributária e Aduaneira da providência cautelar que a sociedade A…….., S.A., intentou com vista à suspensão da eficácia dos seguintes actos: (i) Despacho do Serviço de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto que determinou, com vista a dar cumprimento a um pedido de Troca de Informações Fiscais formulado pelas autoridades fiscais espanholas, a realização de acção inspectiva a esta sociedade para recolha de elementos relativos aos períodos de tributação dos anos de 2006 e 2007; (ii) Decisão da Direcção de Finanças do Porto de resposta negativa à oposição que essa sociedade deduziu à realização daquela inspecção. Actos cuja anulação a Requerente disse pretender pedir judicialmente em acção administrativa especial a instaurar para o efeito – cfr. pág. 1 da petição inicial.

Segundo a Requerente, estariam em causa actos administrativos em matéria tributária susceptíveis de impugnação contenciosa directa e autónoma, não obstante o despacho que determinou a realização da acção inspectiva se caracterizar como acto interlocutório ou preparatório que não é, à primeira vista directamente impugnável. É que, como elucida, o procedimento foi desencadeado pela Direcção de Serviços de Relações Internacionais, que oficiou aos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto para que estes dessem cumprimento a um pedido de obtenção de informações apresentado pelas autoridades fiscais espanholas no âmbito da chamada “Assistência Mútua Internacional em Matéria Fiscal”, com o objectivo de lhes serem fornecidas informações fiscais da Requerente relativos aos exercícios de 2006 e 2007 na senda de um eventual procedimento inspectivo à sucursal espanhola. E daí que o acto final deste procedimento apenas afectará, a final, a esfera jurídico-tributária da empresa espanhola, pelo que só ela terá legitimidade para, posteriormente, o impugnar.

Razão por que entende que, não tendo ela própria (empresa portuguesa) legitimidade para impugnar o acto tributário final (traduzido numa eventual liquidação de imposto à sucursal espanhola), deve ser-lhe dada a possibilidade de impugnar, de forma imediata e autónoma, estes actos procedimentais. Ademais, advoga que o acto de inspecção é imediatamente lesivo dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, o que afasta o cumprimento do princípio da impugnação unitária.

Na decisão recorrida, depois de se terem tecido algumas considerações teóricas sobre o princípio da impugnação unitária plasmado no art. 54º do CPPT, e de se ter afirmado que as ilegalidades relativas a actos interlocutórios do procedimento tributário, que não sejam actos destacáveis ou imediatamente lesivos, só podem ser invocadas na impugnação da decisão final do procedimento, conclui-se que, no caso vertente, o acto final impugnável é o da «notificação das informações que serão prestadas às autoridades espanholas», notificação essa «prevista no art. 6º, nº 1, do DL nº 127/09, isto é a notificação ao visado das informações que irão ser transmitidas ao requerente. O visado dispõe do prazo de 30 dias para reagir, conforme se depreende do disposto no nº 2, daquele art. 6º. Em suma, na decisão de realização da inspecção e na comunicação às autoridades espanholas da recusa da Autora não há qualquer acto lesivo, pois ainda não são conhecidas as informações que serão prestadas.».

É contra esta decisão que se insurge a ora Recorrente, insistindo na tese da impugnabilidade directa dos actos cuja eficácia pretende ver suspensa.

Pelo que a questão que se coloca no presente recurso restringe-se a saber se esses actos são ou não autonomamente impugnáveis, tendo em conta que essa eventual inimpugnabilidade obstará à sua impugnação contenciosa directa a título principal (na acção administrativa especial) e, consequentemente, à suspensão da respectiva eficácia a título cautelar, já que, como decorre do estatuído no art. 113º nº 1 do CPTA, a acção cautelar encontra-se numa situação de dependência em relação à causa principal. Com efeito, decorre do art. 120º, nº 1, alíneas a) e b) do CPTA, que o pedido cautelar é necessariamente deferido se logo for «evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal», sendo, ao invés, forçosamente indeferido perante a «manifesta a falta de fundamento» dessa pretensão «ou a existência de circunstâncias que obstem» ao conhecimento do seu mérito.

Vejamos, então.

É efectivamente verdade que no ordenamento jurídico-tributário vigora o princípio da impugnação unitária, plasmado no art. 54.º do CPPT nos seguintes termos: «1- Salvo quando forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente, não são susceptíveis de impugnação contenciosa os actos interlocutórios do procedimento, sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida.».

O que significa apenas ser possível, em princípio, impugnar o acto final do procedimento tributário, e não já os actos preparatórios, interlocutórios ou procedimentais, dado que só o acto final lesa de forma imediata a esfera jurídica do contribuinte, fixando a posição da administração tributária perante si e definido os seus direitos e obrigações. E dele resulta, ainda, que no contencioso tributário, ao contrário do que acontece actualmente no contencioso administrativo, o critério da impugnabilidade dos actos é o da sua lesividade, ou seja, é a lesividade imediata, objectiva, actual e não meramente potencial.

Na verdade, enquanto a partir da entrada em vigor do CPTA e da opção legislativa materializada no nº 1 do seu art. 51º, a lesividade imediata do acto administrativo deixou de constituir atributo da sua impugnabilidade, pois que deixou de se exigir que o acto tenha sido praticado no termo de uma sequência procedimental, passando essa impugnabilidade a depender somente da externalidade do acto, isto é, da susceptibilidade de produzir efeitos jurídicos que se projectem para fora do procedimento onde o acto se insere (lesividade potencial) (Cf. Mário Aroso de Almeida, in “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 2ª Ed., págs. 135/136 e Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in “Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Comentado”, 2ª Ed., págs. 306 a 313.), já no âmbito do contencioso tributário a impugnabilidade do acto continua a depender da sua lesividade imediata, da produção de efeitos negativos imediatos na esfera jurídica do contribuinte, pela violação imediata dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos.

E assim se compreende que, no procedimento tributário, os actos interlocutórios, sendo meramente instrumentais ou preparatórios da decisão final, ainda que ilegais, não sejam, em princípio, lesivos dos interesses do contribuinte, pois a sua situação tributária não fica com eles definida ou resolvida. Razão por que a sua ilegalidade só pode ser suscitada aquando da impugnação deduzida contra o acto final, excepto se se tratar de um dos seguintes actos susceptíveis de impugnação imediata: (i) actos interlocutórios cujo escrutínio imediato e autónomo se encontre expressamente previsto na lei (“actos destacáveis”); (ii) actos que, embora inseridos no procedimento e anteriores à decisão final, sejam imediatamente lesivos, abrindo-se então a possibilidade da sua impugnação imediata, sem prejuízo de a sua ilegalidade poder ainda ser suscitada na impugnação que venha a ser deduzida contra o acto final; (iii) actos trâmite que ponham um ponto final na relação da administração com o interessado, já que nestes casos, muito embora o acto continue a ser, na economia geral do procedimento, um acto preparatório pré-ordenado ao acto final, é para o seu destinatário o acto que define a posição da Administração e, por isso, o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legítimos.

Já se estivermos perante um procedimento de natureza estritamente administrativa, a impugnabilidade do acto depende apenas da sua externalidade, tornando-se irrelevante, para aferir da sua impugnabilidade, que ele seja definitivo ou não, lesivo ou não, bem como a sua localização no procedimento (início, meio ou termo) (Como explicitam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, págs. 258 e segs.: “são externos os actos que produzem efeitos jurídicos no âmbito das relações entre a Administração e os particulares ou que afectam a situação jurídico-administrativa de uma coisa. Ao que, hoje, se devem acrescentar os actos que se inscrevem no âmbito de relações entre entidades públicas. Por contraposição, actos internos são aqueles que se inscrevem no âmbito das relações inter-orgânicas ou das relações de hierarquia e que apenas indirectamente se poderão reflectir no ordenamento jurídico geral”.), pois o art. 51º nº 1 do CPTA permite que se impugnem os actos preparatórios ou de trâmite «com eficácia externa», bastando que eles tenham efeitos externos susceptíveis de lesarem direitos ou interesses legalmente protegidos (embora se o impugnante for um particular se exija também que o acto tenha alcance lesivo para si, conquanto isso se prenda já com o pressuposto processual da legitimidade activa para impugnar um acto com efeitos externos) (Segundo doutrina e a jurisprudência do STA, a impugnabilidade do acto, embora indissociável da questão da legitimidade para o impugnar, não se confunde com esta, situando-se num plano anterior, de cariz objectivo e não subjectivo, sendo, por isso, no âmbito da legitimidade que hoje se coloca, no contencioso administrativo, a questão da lesividade do acto, que já não enquanto atributo da sua impugnabilidade - cf. Mário Aroso de Almeida, in “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, p. 135, e o mesmo autor e Fernando Cadilhe, in “Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, p. 311, e Vieira de Andrade, in “A Justiça Administrativa”, 3ª ed., p.242/3. E na jurisprudência, entre outros, o Ac. da Secção de CA do STA de 16/12/2009, no recurso nº 0140/09.).

Pelo que se torna essencial saber, antes de mais, se os actos em causa na presente providência cautelar e cuja suspensão de eficácia se pretende, foram praticados num procedimento de natureza estritamente administrativa ou num procedimento de natureza tributária.

Ora, o que desde logo salta à vista é que os questionados actos – o Despacho nº DI 201300003 do Serviço de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto que determinou e credenciou a realização de acção inspectiva à ora Recorrente para recolha de dados fiscais relativos aos períodos de tributação de 2006 e 2007, bem como o Despacho dessa Direcção de Finanças de resposta desfavorável à oposição que aquela deduziu à realização dessa inspecção – não se inserem num procedimento instaurado com vista à declaração de direitos tributários do sujeito passivo inspeccionado e que seja susceptível de culminar num acto tributário lesivo para si (maxime de liquidação).

Pelo que não tem aqui aplicação a doutrina citada na sentença recorrida, colhida dos comentários de JORGE LOPES DE SOUSA ao artigo 54º do CPPT, segundo a qual só é impugnável o acto de liquidação que incorpore o decidido no procedimento inspectivo ou o acto de fixação da matéria tributária caso não haja lugar a acto de liquidação. Assiste, pois, razão à Recorrente quando defende que o acto final de liquidação que esta acção inspectiva porventura provocará apenas afectará, a final, após a prestação da informação, a esfera jurídico-tributária da sucursal espanhola, pelo que, só esta terá legitimidade para impugnar a eventual liquidação que daí surja.

Todavia, daí não decorre necessariamente que os actos em apreço sejam susceptíveis de impugnação imediata e autónoma por parte da Recorrente.

Com efeito, tal como ela reconhece e resulta claramente dos elementos documentais juntos aos autos e da materialidade fáctica espelhado no probatório da sentença, a acção inspectiva foi desencadeada pela Direcção de Serviços de Relações Internacionais, pois foi ela quem solicitou a colaboração dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto para poder dar cumprimento a um pedido de informações apresentado pelas autoridades fiscais espanholas no âmbito da “Assistência Mútua Internacional em Matéria Fiscal”, e que pediu a esta Direcção de Finanças, ao abrigo do disposto no art. 26º da Convenção celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, que fossem promovidas as acções tidas por convenientes junto da sociedade “A…….” para recolha das informações e dos documentos relativos aos anos de 2006 e 2007 descritos no formulário apresentado pelas autoridades espanholas.

E foi para dar cumprimento a esse pedido de intercâmbio de informação tributária que os Serviços de Inspecção Tributária determinaram a abertura de procedimento de uma inspecção tributária à “A……..”, credenciado pelo Despacho nº DI 201300003, com extensão aos anos de 2006 e 2007, tendo como única finalidade a consulta e recolha dos elementos de natureza tributária solicitados.

Daí que esse Despacho, embora inserido num procedimento administrativo mais vasto de cooperação administrativa mútua e intercâmbio de informação internacional em matéria fiscal, constitua o acto de impulso de uma forma procedimental tributária especificamente prevista no Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, cujo art. 2º refere no nº 1 que «O procedimento de inspecção tributária visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infracções tributárias», e que esclarece no nº 2 que «Para efeitos do número anterior, a inspecção tributária compreende as seguintes actuações da administração tributária: (…)
j) A cooperação, nos termos das convenções internacionais ou regulamentos comunitários, no âmbito da prevenção e repressão da evasão e fraude;
l) Quaisquer outras acções de averiguação ou investigação de que a administração tributária seja legalmente incumbida.»

Para além disso, há que atender à circunstância legal de o Estado Português integrar o grupo de Estados membros da União Europeia sujeitos à Directa nº 77/799/CEE, do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, modificada pela Directiva nº 79/1070/CEE, de 6 de Dezembro de 1979, que regula as condições em que se deve efectuar a assistência mútua entre os Estados membros para efeitos da correcta determinação dos impostos sobre o rendimento ou sobre o património e do imposto sobre o valor acrescentado (Actualmente, a Directiva que vigora nesta matéria é a Directiva nº 2011/16/EU, do Conselho, de 15 de Fevereiro de 2011, transposta para a ordem jurídica interna do Estado português pelo Dec. Lei nº 61/2013, de 10 de Maio de 2013. Mas tendo em conta a data dos factos em litígio, é aplicável ao caso sub judice a Directiva 77/799/CEE.).

Directiva que foi transposta para o ordenamento jurídico português através do Decreto Lei nº 127/90, de 17 de Abril (Com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei nº 52/93, de 26/02; pela Lei nº 39-B/94, de 27.12; pelo Dec. Lei nº 235/96, de 7.12; pela Lei nº 87-B/98, de 31.12; pela Lei nº 55-B/2004, de 30.12; pela Lei nº 60-A/2005, de 30.12.), que prevê e regula o mecanismo próprio de troca de informações (art. 3º) (Preceito onde se elucida (nº 1) que a prestação de informações pode ocorrer nas seguintes modalidades: (a) a pedido; (b) espontânea; (c) automática; e se esclarece (nº 2) que a prestação de informações a pedido ocorre sempre que solicitada pela autoridade competente de um Estado Membro.), estabelecendo os casos e situações em que nenhuma informação pode ser prestada (art. 4º) e determinando no art. 5º que «A recolha de informações é realizada nas modalidades e nos limites previstos pelas normas portuguesas relativas à determinação dos correspondentes impostos referidos no artigo 2º deste diploma, devendo, para o efeito, a autoridade portuguesa ou a autoridade a que se tenha dirigido proceder como se agisse por conta própria ou a pedido de uma autoridade nacional.».

Donde decorre a consagração do princípio da actuação por conta própria, que significa que a Administração Tributária não deve dar aos pedidos de informação de outros Estados-Membros um tratamento diferente daquele que usa nas suas próprias actuações administrativas e tributárias destinadas à obtenção de dados fiscais de que necessita para uso interno.

Como explica MARIA ODETE BATISTA DE OLIVEIRA (In “O INTERCÂMBIO DE INFORMAÇÃO TRIBUTÁRIA – Nova disciplina comunitária. Estado actual da prática administrativa. Contributos para uma maior significância deste instrumento”, Almedina 2012, pág. 128/129.), «Isso supõe não apenas que se actue com a mesma diligência mas também que as normas que aplicar sejam as mesmas». E como mais adiante esclarece, o procedimento de intercâmbio de informação fiscal a pedido (como é o caso) inicia-se «…com o pedido apresentado pela autoridade competente do Estado requerente à autoridade competente do Estado requerido (…). Na sequência, e desde que se encontrem preenchidos os requisitos exigidos, estabelecem expressamente o nº 2 do artigo 2º da Directiva 77/779/CE e o nº 3 do artigo 6º da Directiva 2011/16/EU, que a autoridade competente do Estado-Membro requerido deverá proceder como se actuasse por sua própria conta ou a pedido de uma outra autoridade do seu próprio Estado-membro (princípio da autonomia procedimental nacional)», ficando, assim, a inteiro cargo da administração fiscal do Estado requerido (no caso o Estado Português) a tarefa de obter e recolher a informação solicitada pela administração fiscal do Estado requerente (no caso o Estado Espanhol) «ou por mera consulta dos seus arquivos, tratando-se de dados que o contribuinte forneceu em momento prévio e em cumprimento das suas obrigações fiscais, ou pondo em prática acções específicas destinadas à sua obtenção» - obra citada, págs. 198 e segs.

Torna-se, assim, claro que, no que se refere à actuação que permite o acesso e a recolha de informação fiscal para efeitos de Assistência Mútua Internacional em Matéria Fiscal, o Estado Português pode e deve usar o procedimento tributário de inspecção disciplinada no Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária, aprovado pelo Dec. Lei nº 413/98, de 31.12, como efectivamente aconteceu no caso vertente.

Estamos, pois, perante um inequívoco procedimento tributário, definido como um conjunto de actos e formalidades, relativamente autónomos, organizados sequencialmente, dirigidos à produção de um determinado resultado (do qual são instrumentais), praticados por órgãos de uma administração tributária (Vide, Rui Duarte Morais, in “Manual de Procedimento e Processo Tributário”, Almedina, 2012, pág. 10.), adstrito às regras e princípios que regem esse procedimento e às normas e princípios jurídicos vigente no contencioso tributário sobre a impugnabilidade dos actos que o integram, e que, como vimos, faz depender a impugnabilidade desse actos da sua lesividade imediata e actual, e não da mera externalidade desses actos.

Neste contexto, para sabermos se o acto que determinou e credenciou a abertura deste procedimento de inspecção à A………, como inequívoco acto preparatório que é, se integra nalgum dos casos acima expostos que permitem a impugnação imediata desse tipo de actos, importa atender ao facto de o procedimento ter como finalidade satisfazer um pedido de cooperação e troca de informação fiscal formulado ao abrigo do art. 26º da referida da Convenção celebrada entre Portugal e a Espanha, e que dispõe o seguinte:

1. As autoridades competentes dos Estados Contratantes trocarão entre si as informações necessárias para aplicar as disposições desta Convenção ou das leis internas dos Estados Contratantes relativas aos impostos abrangidos por esta Convenção, na medida em que a tributação nelas prevista não seja contrária a esta Convenção. A troca de informações não é restringida pelo disposto no artigo 1º.

As informações obtidas por um Estado Contratante serão consideradas secretas, do mesmo modo que as informações obtidas com base na legislação interna desse Estado só poderão ser comunicadas às pessoas ou autoridades (incluindo tribunais e autoridades administrativas) encarregadas do lançamento ou cobrança dos impostos abrangidos por esta Convenção, ou dos procedimentos declarativos ou executivos relativos a estes impostos ou da decisão de recursos referentes a estes impostos. Essas pessoas ou autoridades utilizarão as informações assim obtidas apenas para os fins referidos. Essas informações poderão ser utilizadas no caso de audiências públicas de tribunais ou de sentença judicial.

2. O disposto no nº 1 nunca poderá ser interpretado no sentido de impor a um Estado Contratante a obrigação:

a) De tomar medidas administrativas contrárias à sua legislação e à sua prática administrativa ou às do outro Estado Contratante;

b) De fornecer informações que não possam ser obtidas com base na sua legislação ou no âmbito da sua prática administrativa normal ou das do outro Estado Contratante;

c) De transmitir informações reveladoras de segredos comerciais, industriais ou profissionais, ou processos comerciais ou informações cuja comunicação seja contrária à ordem pública.

Por outro lado, o art. 6º do citado Dec. Lei nº 127/90, de 17 de Abril, reza assim:

1. A autoridade competente portuguesa notificará a pessoa relativamente à qual são prestadas as informações da comunicação a efectuar, indicando a autoridade requerente destinatária da informação e a natureza desta.

2. Não há lugar à notificação prévia prevista no número anterior sempre que:

a) Se trate de prestação automática ou espontânea de informações, prevista nas alíneas a), b) e d) do nº 3 do art. 3º;

b) Se trate de prestação de informações a pedido, relativa à identificação fiscal do contribuinte e aos elementos que constem ou se relacionem, directa ou indirectamente, com facturas ou documentos equivalentes, dos impostos especiais sobre o consumo de óleos minerais, sobre o consumo de álcool e de bebidas alcoólicas e sobre o consumo de tabacos manufacturados;

c) A notificação possa prejudicar as investigações sobre fraude e evasão fiscais noutro Estado-Membro da União Europeia e isso for expressamente solicitado pela autoridade competente desse Estado-Membro.

3. A pessoa notificada pode submeter à autoridade competente as razões por que as informações não devem ser transmitidas.

4. Sempre que a prestação de informação pedida se deparar com obstáculos ou for recusada, deve a autoridade competente informar o requerente da natureza do impedimento ou dos fundamentos da recusa.

5. As informações não devem ser fornecidas antes de decorridos 30 dias após a notificação referida no nº 1.

Donde decorre que o acto que determina a acção inspectiva para recolha de informação fiscal não constitui o acto final do procedimento de cooperação mútua e intercâmbio internacional de informação em matéria fiscal, pois não é ele que põe um ponto final na relação da administração fiscal portuguesa com a empresa inspeccionada. O acto que põe esse ponto final é o acto referido no nº 1 daquele art. 6º, consubstanciado no acto de notificação a essa empresa da natureza da informação que vai ser facultada ao Estado Espanhol, e que pode até ter um âmbito mais restrito do que aquele que consta do pedido de informação formulado por esse Estado face aos limites e condicionalismos impostos pelo nosso ordenamento jurídico no art. 4º do DL nº 127/90 (que estabelece os casos em que pedido de informação não deve ser cumprido pelo Estado Português e indica expressamente as informações que não podem ser prestadas) e no art. 26º da Convenção celebrada entre Portugal e a Espanha.

Só esse acto define, perante o inspeccionado, a posição final e definitiva da administração portuguesa quanto ao concreto âmbito da cooperação internacional que vai concretizar, pela comunicação ao inspeccionado sobre a natureza das informações que sobre ele vai facultar, e que, por isso, constitui relativamente a ao inspeccionado, o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legítimos. E, como tal, só esse acto será impugnável.

Impugnabilidade que apesar de poder retardar ou inviabilizar em tempo útil as trocas de informação, o nosso ordenamento jurídico proporciona e que a administração e os tribunais têm de acatar.

Como esclarece MARIA ODETE BATISTA DE OLIVEIRA, na obra citada, a fls. 129, «Existem Estados que estabelecem, na sua legislação interna, a obrigação de notificar previamente o contribuinte quando se trate de informação a prestar a outro Estado, com as consequentes dilações e, amiudadas vezes, perda de eficácia na prestação de informação. É o que acontece em Portugal com a disciplina constante do Decreto-Lei nº 127/90, de 17 de Abril, que transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva nº 77/799/CEE, do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos, cujo artigo 6º estabelece: (…)». E, mais adiante, a fls. 232/233, a propósito da necessidade de evitar que sejam retardadas as efectivas trocas de informação, refere que tal acontece, designadamente, «…quando a Administração requerida, para atender aos pedidos que recebe de outros países, estabelece o cumprimento obrigatório de requisitos adicionais específicos, como é o caso da obrigatoriedade de notificação e/ou consulta do contribuinte a quem se referem os dados que vão ser facultados, dando-lhes a possibilidade de recurso (é o caso p.e. da Holanda e de Portugal). De positivo, é inegável que este procedimento salvaguardará melhor o direito dos contribuintes, poderá contribuir para evitar erros e, como tal, melhorar a eficácia da troca de informação, sendo até possível atribuir-lhe a valia de contribuir para uma maior cooperação do contribuinte objecto de notificação com as suas autoridades fiscais. Mas é inegável, também, que isso acarretará atrasos temporais que amiudadas vezes farão fracassar o êxito final das investigações realizadas pela requerente. Então, talvez se justificasse como melhor solução a de reconhecer às cessões de dados a outros países igual condição que a das cessões de dados da Administração fiscal a outras Administrações do mesmo país, para as quais, em geral, não resulta necessário cumprir o requisito de notificar/consultar o contribuinte.».

Note-se que o recentíssimo acórdão do TJUE, de 22/10/2013, prolatado no Proc. C276/12, em resposta a uma das questões (prejudiciais) que lhe foram colocadas e que consistia em saber se a Directiva 77/799 deve ser interpretada no sentido de que o contribuinte pode contestar a informação que lhe diz respeito e que vai ser transmitida à autoridade tributária do Estado Membro requerente, respondeu que «…a Diretiva 77/799 não trata do direito do contribuinte de contestar a exatidão da informação transmitida e não impõe nenhuma exigência particular quanto ao conteúdo da informação transmitida. 49 Nestas condições, a fixação de regras a este respeito compete exclusivamente aos direitos nacionais. O contribuinte pode contestar a informação que lhe diz respeito, transmitida à autoridade tributária do Estado Membro requerente, de acordo com as regras e os procedimentos aplicáveis no Estado Membro em causa.» - sublinhado nosso.

Em suma, embora o contribuinte relativamente ao qual a informação é prestada (no caso a Recorrente) não tenha de ser ouvido sobre a forma ou o modo de obter e recolher as informações e dados fiscais que a seu respeito foram solicitados pelo Estado requerente, ele tem de ser notificado, face ao nosso direito nacional (DL nº 127/90), de que vai ser facultada informação a seu respeito e informado da natureza das informações que vão ser prestadas, impondo a lei que elas não sejam fornecidas ao Estado requerente antes de decorridos 30 dias após aquela notificação, com o que se pretendeu, sem dúvida, permitir-lhe contestar/impugnar esse acto final do procedimento de Assistência Mútua Internacional em Matéria Fiscal junto do Estado requerido, e onde ele poderá invocar, designadamente, que essa informação não pode ser prestada por se enquadrar, por exemplo, no disposto no nº 2 do art. 26º da Convenção ou arts. 4º e 6º do Dec. Lei nº 127/90 (como acontece quando se trata de informações reveladoras de segredos comerciais, industriais ou profissionais, ou processos comerciais ou informações cuja comunicação seja contrária à ordem pública).

Neste enquadramento, concluímos, tal como se conclui na sentença recorrida, pela inimpugnabilidade não só do Despacho nº DI 201300003, como, também, da Decisão da Direcção de Finanças do Porto de resposta desfavorável à oposição deduzida contra a realização da inspecção, por também esta decisão constituir um acto procedimental sem lesividade imediata. O que constitui fundamento para o indeferimento da providência cautelar requerida, por inviabilidade manifesta da respectiva acção principal.

Em conclusão, não pode obter provimento o presente recurso jurisdicional, o que determina a manutenção da decisão recorrida na ordem jurídica.

3.3. Quanto à questão incidental.

Como acima se deixou relatado, a Recorrente suscitou, na pendência deste recurso jurisdicional, incidente de declaração de ineficácia de um alegado acto de execução reportado aos actos cuja suspensão de eficácia pretende com a presente providência cautelar e que foi já indeferida, ainda que sem trânsito em julgado.

Antes de mais, e porque esse incidente vem dirigido ao Juiz do Tribunal de 1ª instância, há que apurar da competência deste Supremo Tribunal para dele conhecer.

3.3.1. Como se sabe, e resulta claramente do disposto no art. 128º do CPTA, a declaração de ineficácia dos actos de execução praticados antes do trânsito em julgado da decisão jurisdicional sobre o pedido de suspensão de eficácia é proferida como um incidente do próprio pedido cautelar, destinando-se a garantir que a autoridade administrativa fique impedida de iniciar ou prosseguir a execução do acto antes do trânsito em julgado da providência cautelar, salvo se emitir resolução fundamentada nesse sentido com o conteúdo legalmente exigido. Isto é, visa garantir o interessado contra a concretização ou o alargamento dos prejuízos que legitimam o pedido de suspensão que formulou, pelo que, no âmbito de um processo que a lei caracterizou como urgente, a providência assume ainda, pelos fins visados, uma maior urgência, sob pena de se tornar inócua.

Daí que deva entender-se, como, aliás, tem entendido a jurisprudência administrativa, que o “tribunal” a que alude o nº 4 do art. 128º do CPTA é aquele em que o processo de suspensão se encontra no momento da dedução do incidente, independentemente de já ter sido proferida, ou não, decisão sobre o pedido (Cfr., entre outros, o acórdão do STA de 14/04/2004, no recurso nº 885/03, embora reportado ao análogo art. 84º da LPTA).

3.3.2. Quanto à objecção formulada pela Recorrida na resposta a este pedido incidental, no sentido da inaplicabilidade do art. 128º do CPTA ao caso sub judice, por estar em causa uma medida cautelar prevista no art. 97º nº 1 alínea i) do CPPT, com os efeitos previstos no art. 147º nº 6 do CPPT, o que tornaria inaplicáveis as normas contidas no CPTA, não lhe assiste razão.

Com efeito, além das providências cautelares a favor do contribuinte previstas no art. 147º nº 6 do CPPT, e que abrangem apenas e tão só os casos em que se esteja perante uma lesão irreparável para o requerente, o alcance da tutela judicial efectiva consagrado constitucionalmente no art. 268º da CRP exige a possibilidade de utilização de todas as medidas cautelares adequadas e idóneas para assegurar a tutela judicial efectiva dos direitos dos contribuintes, designadamente o processo de suspensão de eficácia de actos administrativos (ainda que em matéria tributária) previsto no CPTA, aplicável como meio acessório da acção administrativa especial regulada por essa lei nos arts. 112º e segs.(Sobre o assunto, e para maiores desenvolvimentos, vide JORGE LOPES DE SOUSA, in “Código de Procedimento e Processo Tributário”, 6ª Ed., II vol., anotação ao art. 147º do CPPT, pag. 596 e segs.), tendo em conta a aplicação subsidiária desse diploma legal ao contencioso tributário (art. 2º do CPPT).

Estando em causa actos administrativos em matéria tributária cuja legalidade tem de ser apreciada, por força do disposto no nº 2 do art. 97º do CPPT, em acção administrativa especial regulada pelas normas do CPTA, há que permitir ao seu autor a adopção das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nessa acção administrativa. Razão por que se deve admitir a suspensão de eficácia desses actos administrativos que sejam objecto de acção administrativa especial regulada pelas normas CPTA através da providência cautelar prevista nos arts. 112º e segs. do CPTA.

E visto que no âmbito da providência de suspensão de eficácia de acto administrativo é admissível o incidente previsto no art. 128º do CPTA - que visa garantir o interessado contra a concretização ou o alargamento dos prejuízos que legitimam o pedido de suspensão de eficácia que formulou – não pode proceder a objecção colocada.

3.3.3. Vem solicitado ao Tribunal que declare a ineficácia do seguinte acto de notificação, concretizado pela Direcção de Serviços de Relações Internacionais em 9/09/2013, que a Recorrente qualifica como constituindo um acto de execução dos actos em causa nesta providência cautelar:

«Assunto: Notificação
Ao abrigo do nº 1 do Artigo 6º do Decreto-Lei nº 127/90, de 17 de Abril, e de acordo com o solicitado por V. Exªs, informamos que foi recepcionada nesta Direcção de Serviços um pedido de informações apresentado pelas Autoridades Fiscais Espanholas, tendo sido solicitado informações fiscais de carácter geral sobre a vossa empresa, bem como informações e documentos referentes às transacções comerciais estabelecidas durante os anos de 2006 e 2007 entre a vossa empresa e a empresa espanhola A………, S.A., sucursal em Espanha, que foram recolhidos nos vossos registos contabilísticos pelos nossos Serviços Regionais de Inspecção.
Sem mais, apresentamos os nossos melhores cumprimentos».

Essa comunicação não só informa a Recorrente de que foi recepcionada, na Direcção de Serviços de Relações Internacionais da Autoridade Tributária e Aduaneira, um pedido apresentado pelas Autoridades Fiscais Espanholas a solicitar informações fiscais de carácter geral sobre si e informações e documentos referentes às transacções comerciais que estabeleceu durante os anos de 2006 e 2007 com a sucursal em Espanha A………, S.A., como a informa, ainda, que essas informações já foram colhidas nos seus registos contabilísticos pelos Serviços Regionais de Inspecção.

Pelo que, esta segunda parte, anuncia claramente ter sido consumada a acção de inspecção ordenada e credenciada pelo Despacho nº DI 201300003, de 4/01/2013, do Serviço de Inspecção Tributária, representando, nessa medida, um acto de execução para os efeitos previstos no art. 128º do CPTA (tendo em conta que actos de execução são naturalmente todos aqueles que não podiam ser praticados em virtude da pendência da providência).

Aliás, a referência que nele é feita ao nº 1 do art. 6º do Dec. Lei nº 127/90, indicia que se tratará da decisão final do procedimento de assistência mútua internacional em matéria fiscal (ainda que isso não seja claro, pois esta comunicação não refere que as informações colhidas vão ser efectivamente facultadas ao Estado requerente e qual a sua concreta natureza), pelo se impõe conhecer do pedido de declaração de ineficácia desses actos.

O artigo 128º do CPTA preceitua o seguinte:

1 - Quando seja requerida a suspensão da eficácia de um acto administrativo, a autoridade administrativa, recebido o duplicado do requerimento, não pode iniciar ou prosseguir a execução, salvo se, mediante resolução fundamentada, reconhecer, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.

2 - Sem prejuízo do previsto na parte final do número anterior, deve a autoridade que receba o duplicado impedir, com urgência, que os serviços competentes ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução do acto.

3- Considera-se indevida a execução quando falte a resolução prevista no nº 1 ou o tribunal julgue improcedentes as razões em que aquela se fundamenta.

4- O interessado pode requerer ao tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos actos de execução indevida.

5 - O incidente é processado nos autos do processo de suspensão da eficácia.

De tal normativo decorre a proibição da Administração executar um acto administrativo após ter sido interposta a providência cautelar da suspensão de eficácia. Trata-se de assegurar que, uma vez interposta a providência, a autoridade administrativa fique impedida de iniciar ou prosseguir a execução desse acto a partir do momento em que receba o duplicado da petição do pedido de suspensão, a menos que no prazo de 15 dias, assuma, em resolução fundamentada, que a execução é urgente porque o seu diferimento “seria gravemente prejudicial para o interesse público”.

Com efeito, do citado normativo resulta claramente que o autor do acto cuja eficácia foi automaticamente suspensa com a recepção do duplicado do pedido de suspensão de eficácia, tem duas alternativas: ou reconhece a grave urgência para o interesse público na imediata execução do acto e, nessa medida, profere a resolução fundamentada prevista na parte final do n.º 1 do art. 128º, podendo, a partir daí, iniciar ou prosseguir essa execução; ou, se o não fizer, tem de aguardar o trânsito em julgado da decisão do pedido de suspensão, não bastando a prolação de decisão não transitada a indeferir o pedido.

O que se compreende, na medida em que a aludida suspensão provisória visa acautelar a utilidade da suspensão de eficácia que vier eventualmente a ser decretada, pelo que enquanto persistir a possibilidade deste decretamento, isto é enquanto não transitar em julgado a decisão que indefira o pedido de suspensão de eficácia, a suspensão provisória deve manter-se e os actos de execução indevida podem ou têm de ser declarados ineficazes.

Deste modo, se tiver havido resolução fundamentada no sentido de iniciar ou prosseguir a execução do acto automaticamente suspenso, o tribunal pode declarar a ineficácia desses actos de execução se concluir que aquela resolução está viciada, mas se não houver tal resolução tem de declarar ineficazes os actos de execução praticados.

E enquanto persistir a possibilidade de interposição de recurso da decisão de indeferimento do pedido de suspensão de eficácia (ainda que para só para o Pleno da Secção do Supremo Tribunal Administrativo ou para o Tribunal Constitucional) importa conservar a garantia de que, na eventualidade de provimento do recurso e do consequente decretamento da suspensão de eficácia, a suspensão provisória tenha persistido para manter a utilidade daquela providência.

Pelo que, ainda que o pedido de suspensão de eficácia tenha sido julgado improcedente ou o juiz se tenha negado a adoptar a providência, nada obsta a que se reconheça o pedido de declaração de ineficácia dos actos controvertidos, atenta a redacção do n.º 4 do art. 128º do CPTA, donde se extrai que, ao contrário do que sucedia no domínio do art. 80º da LPTA, esse pedido pode ser formulado até ao trânsito em julgado da decisão proferida no processo, seja ela qual for.

Neste sentido, entre outros, o elucidativo acórdão do TCAS de 13/01/2005, no processo nº 00393/04. E como também se deixou muito bem explicado no acórdão do TCAN de 18/02/2011, no processo nº 00940/10.9BEPRT-A, que acolhe a posição doutrinal e jurisprudencial firmada sobre a matéria, não há que associar o destino da questão incidental do art. 128º ao destino da providência cautelar em si, «uma vez que, em face do que dispõe actualmente o nº 4 do art. 128º do CPTA, a declaração de ineficácia dos actos de execução indevida não tem como pressuposto o deferimento do pedido de suspensão de eficácia. Além de ter um domínio próprio de aplicação, valendo para os actos de execução que se praticarem entre o recebimento do “duplicado do requerimento” e a data em que se decide a providência, os critérios legais de apreciação são diferentes. Quer isto dizer que, apresar do indeferimento da suspensão de eficácia, a declaração judicial de ineficácia dos actos indevidamente executados pode ainda ocorrer até ao trânsito em julgado dessa decisão.

A possibilidade de se declarar ineficazes os actos de execução do acto suspendendo, apesar de já se ter indeferida a providência, acentua a razão de ser do pedido incidental: o que se pretende com esta espécie de “providência cautelar secundária”, como a qualifica Vieira de Andrade (cfr A Justiça Administrativa, 10ª ed. pág. 369, nota, 863), é garantir o “efeito útil” da providência principal. O indeferimento da suspensão de eficácia em primeira instância faz cessar a proibição de executar o acto e renova a autotutela executiva da autoridade administrativa, situação que se mantêm na pendência do recurso jurisdicional, uma vez que recurso não tem efeito suspensivo (art. 143º, nº 2, do CPTA)».

Por outro lado, e como também clarificam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 3ª Ed., p. 860 e segs., não obsta à declaração de ineficácia dos actos de execução indevida a circunstância de, no processo cautelar, ser proferida em 1ª instância decisão que não deu provimento à providência e contra a qual foi interposto recurso jurisdicional, pese embora este recurso não tenha efeito suspensivo. É que o nº 4 do art. 128º «permite expressamente que a declaração de ineficácia seja requerida até ao trânsito em julgado da decisão do processo cautelar, seja ela proferida em que sentido for. Fica assim reforçada a ideia de que o incidente se destina a preservar o efeito útil da providência, quando venha a ser decretada, podendo, por isso, ser suscitado em qualquer momento do processo cautelar, desde que este ainda não tenha sido dado como findo, e só deixando de ter relevo quando seja proferida decisão definitiva que, ou conceda a providência, caso em que a impossibilidade de prosseguir a execução resulta da própria decisão cautelar, ou a denegue, caso em que caduca a proibição da execução do acto. Deste modo, assegura-se ao interessado a possibilidade de reagir contra a prática de actos de execução indevida, mesmo num momento em que já tenha sido proferida uma decisão cautelar desfavorável à pretensão do requerente.»

Em síntese, só a negação definitiva da providência cautelar tem o efeito de fazer caducar a proibição de executar os actos que constituem o objecto da presente providência cautelar. Pelo que o indeferimento do pedido de suspensão de eficácia, confirmado na primeira parte deste acórdão, não prejudica o conhecimento do pedido de declaração de ineficácia do acto de alegada execução indevida.

Há, portanto, que passar a apreciar se, no caso, deve declarar-se a ineficácia do aludido acto de execução.

Como inequivocamente resulta do nº 3 do artº 128º do CPTA e a doutrina e a jurisprudência repetidamente têm afirmado, a Administração procede a uma execução indevida de acto administrativo numa das seguintes situações: 1) Quando execute o acto sem ter emitido a resolução fundamentada; 2) Quando execute o acto com base em resolução fundamentada que o tribunal venha a considerar que se fundou em razões improcedentes, por entender que o diferimento da execução não seria, no caso concreto, gravemente prejudicial para o interesse público, pelo que não havia urgência na execução do acto (Cf., a título de exemplo, o acórdão do TCAS de 25/11/2010, no proc. nº 6759/10, e na doutrina Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 3ª Ed., p. 852 e segs).

Nestes autos não há notícia de que a Entidade Requerida, ora Recorrida, tenha proferido despacho ou deliberação fundamentada invocando grave urgência para o interesse público na execução imediata. Aliás, como resulta da resposta que ofereceu a este incidente, reconhece a sua inexistência, advogando que a providência cautelar para suspensão de eficácia de acto administrativo e a prolação de resolução fundamentada prevista no CPTA não são admissíveis no contencioso tributário, o que, como já vimos, não colhe nem procede.

Não tendo sido emitida a mencionada resolução fundamentada, ocorrem os pressupostos previstos no art. 128º do CPTA para a declaração de ineficácia do aludido acto de execução, por força da suspensão automática provisória dos actos que são objecto da providência cautelar de suspensão de eficácia, sendo, por isso, de deferir o pedido incidental deduzido.


4. Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em:

- negar provimento ao recurso interposto da sentença recorrida, mantendo a decisão de não decretamento da providência cautelar requerida face à impugnabilidade dos actos que constituem o seu objecto;

- deferir o pedido incidental de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida.

Custas pela recorrente no que toca ao recurso da sentença, e custas pela recorrida no que toca ao incidente – este com taxa de justiça que se fixa em 3 U (arts. 2º e 7º nº 4 e Tabela II – Outros incidentes, do Regulamento das Custas Processuais).

Lisboa, 23 de Outubro de 2013. - Dulce Manuel Neto(relatora) - Isabel Marques da Silva - Valente Torrão (vencido nos termos da declaração que se junta adiante.)

Declaração de voto:

Não obstante o louvável esforço de fundamentação do acórdão - que, do ponto de vista formal, está muito bem conseguida -, discordo do mesmo pelas razões que se seguem:

1º) Conforme resulta do probatório da decisão de 1ª instância (nº 1), as autoridades fiscais espanholas, através da Direcção de Serviços de Relações Internacionais (DSRI), solicitaram a colaboração da DF do Porto no sentido de fornecer informações e documentos relativos à actividade da Autora nos anos de 2006 e 2007.

2º) As autoridades portuguesas, conforme doc. de fls. 28, em 02 de Fevereiro, notificaram a requerente do referido pedido de informação e para prestar as demais informações referidas no mesmo documento.

3º) A requerente opôs-se ao “procedimento de inspeção tributária externa”, - em 22.02.2013 (fls. 29 a 36) - nomeadamente por a mesma implicar “a consulta, recolha e cruzamento de elementos abrangidos pelo segredo comercial, bem como pela própria desproporção da mesma”.

4º) Na sequência do indeferimento desta oposição, instaurou a requerente a presente providência cautelar em 16.04.2013 (v. fls. 1), pedindo a suspensão de eficácia do Despacho nº DI 201300003, de 4/01/2013, do Serviço de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto - que determinou a realização de acção inspectiva para recolha de elementos aos períodos de tributação de 2006 e 2007 -, bem como a suspensão de eficácia da Decisão da Direcção de Finanças do Porto, de 6/03/2013, de resposta desfavorável à oposição que esta sociedade deduziu à realização daquela inspecção, actos cuja anulação disse pretender pedir em acção administrativa especial a instaurar para o efeito.

E pediu a requerente que se suspendesse o procedimento de inspeção em curso evitando que, no decurso da acção principal que iria ser intentada, se produzissem prejuízos irreparáveis para a requerente.

5º) Concluiu-se no acórdão - e bem (como já no mesmo sentido se havia concluído na decisão recorrida) - pelo indeferimento da providência requerida.

Nesta parte concordamos com a decisão, uma vez que a prestação das informações a que o Estado - entenda-se administração tributária portuguesa - está obrigado, implicava a recolha de informações junto da requerente para o que a notificação de 1 de fevereiro era adequada. De qualquer forma, a simples realização de uma inspeção não constitui “a priori” ato lesivo determinante de proteção judicial.

6º) A prestação das informações em causa nos autos obedece ao disposto na Diretiva 77/779/CE, transposta para o direito interno pelo DL nº 127/90, de 17 de abril.

Ora, dos nºs 1 e 3 do citado DL resulta que a autoridade competente portuguesa notificará a pessoa relativamente à qual são prestadas as informações da comunicação a efectuar, indicando a autoridade requerente destinatária da informação e a natureza desta, sendo que a pessoa notificada pode submeter à autoridade competente as razões por que as informações não devem ser transmitidas.

Isto implica desde logo que se saiba quais as informações que irão ser transmitidas. Deste modo, inexistindo ainda informação a transmitir, a oposição genérica da requerente à inspeção para informação é irrelevante e extemporânea para os efeitos do citado artº 6º. Por isso - e bem - a mesma veio a ser indeferida pela administração tributária.

Portanto, e concluindo nesta parte, entendo que não existindo ato lesivo a requerente não tinha direito a tutela judicial, como foi decidido.

7º) Diferente entendimento me merece a decisão na parte referente ao incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida.

Para se deferir este pedido, o acórdão louvou-se no documento de fls. 129, datado de 06.09.2013, do seguinte teor:

«Assunto: Notificação

Ao abrigo do nº 1 do Artigo 6º do Decreto-Lei nº 127/90, de 17 de Abril, e de acordo com o solicitado por V. Exªs, informamos que foi recepcionada nesta Direcção de Serviços um pedido de informações apresentado pelas Autoridades Fiscais Espanholas, tendo sido solicitado informações fiscais de carácter geral sobre a vossa empresa, bem como informações e documentos referentes às transacções comerciais estabelecidas durante os anos de 2006 e 2007 entre a vossa empresa e a empresa espanhola A………., SA., sucursal em Espanha, que foram recolhidos nos vossos registos contabilísticos pelos nossos Serviços Regionais de Inspecção.

Sem mais, apresentamos os nossos melhores cumprimentos».

E, relativamente a tal documento, concluiu-se: “Essa comunicação não só informa a Recorrente de que foi recepcionada, na Direcção de Serviços de Relações Internacionais da Autoridade Tributária e Aduaneira, um pedido apresentado pelas Autoridades Fiscais Espanholas a solicitar informações fiscais de carácter geral sobre si e informações e documentos referentes às transacções comerciais que estabeleceu durante os anos de 2006 e 2007 com a sucursal em Espanha A……….., S.A., como a informa, ainda, que essas informações já foram colhidas nos seus registos contabilísticos pelos Serviços Regionais de Inspecção.

Pelo que, esta segunda parte, anuncia claramente ter sido consumada a acção de inspecção ordenada e credenciada pelo Despacho nº DI 201300003, de 4/01/2013, do Serviço de Inspecção Tributária, representando, nessa medida, um acto de execução para os efeitos previstos no art. 128º do CPTA (tendo em conta que actos de execução são naturalmente todos aqueles que não podiam ser praticados em virtude da pendência da providência).

Aliás, a referência que nele é feita ao nº 1 do art. 6º do Dec. Lei nº 127/90, indicia que se tratará da decisão final do procedimento de assistência mútua internacional em matéria fiscal (ainda que isso não seja claro, pois esta comunicação não refere que as informações colhidas vão ser efectivamente facultadas ao Estado requerente e qual a sua concreta natureza), pelo se impõe conhecer do pedido de declaração de ineficácia desses actos”.

Ora, desde logo é discutível a aplicação, no caso concreto, do disposto no artº 128º do CPTA. Na verdade, o argumento da tutela judicial efetiva quando esteja em causa uma lesão irreparável, não colhe aqui, porque não estamos perante qualquer lesão não tutelada pelas normas de direito tributário.

A inspeção só por si é insuscetível de causar lesão irreparável do direito da requerente.

Por outro lado, mesmo a admitir a aplicação daquele artº 128º, o teor da notificação não permite concluir pela verificação de qualquer ato de execução na pendência do processo da providência cautelar.

Repare-se que na notificação apenas se refere “foram recolhidos nos vossos registos contabilísticos pelos nossos Serviços Regionais de Inspeção”.

Ora, por um lado, desconhecem-se as datas em que foram recolhidos tais elementos - repare-se que a providência foi instaurada em 16.04.2013 e a requerida notificada para responder em 26.04.2013 (fls. 43) - e a requerente havia sido notificada em Fevereiro e em Março da realização da inspeção e da resposta dada à sua observação sobre a mesma (v. fls. 24/29) - pelo que os elementos até poderiam ter sido recolhidos antes da instauração da providência; deste modo, é temerário concluir que a administração tributária violou a lei ao continuar com a inspeção na pendência da providência cautelar.

Assim, apenas se pode presumir - mas não concluir - que a inspeção continuou na pendência da providência cautelar.

Não posso, por isso, concluir que esteja em causa um ato de execução indevida.

Pelo que ficou dito, deveria também indeferir-se o pedido incidental da declaração de ineficácia do alegado ato de execução, ou, pelo menos, ordenar-se a baixa dos autos para ampliação da matéria de fato no sentido de se apurar a data e os termos em que se realizou a inspeção referida no doc. de fls. 129.

Valente Torrão.