Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0368/16
Data do Acordão:10/12/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
Sumário:Atenta a pequena complexidade da causa na qual não se decidiu de fundo, sendo que o acórdão seguiu outras anteriores decisões deste STA no mesmo sentido, tendo acolhido a fundamentação constante desses arestos e, resultando a condenação em custas do recorrido apenas do facto de ter apresentado contra-alegações a que o Tribunal não atendeu. E, considerando ainda a conduta processual das partes nada havendo a assinalar deve ser deferido o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça que, no caso concreto, se mostra mais conforme à efectivação do direito de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no art. 20.º da CRP.
Nº Convencional:JSTA000P20965
Nº do Documento:SA2201610120368
Data de Entrada:03/22/2016
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:TURISMO DE PORTUGAL, IP
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1 - RELATÓRIO
A……………, SA, melhor identificada nos autos, deduziu impugnação judicial contra a liquidação da contrapartida anual relativa ao ano de 2012, referente à concessão da zona de jogo da Póvoa de Varzim que lhe foi liquidado pelo Turismo de Portugal IP, no montante de € 3.780.950,02.
Por decisão de 06 de Julho de 2015, o Tribunal Tributário do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou-se incompetente em razão da matéria para conhecer do mérito do recurso.
Por acórdão de 24/05/2016 este STA decidiu:
“Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e declarar competente, em razão da matéria, para conhecer da presente impugnação judicial, o Tribunal Tributário do Porto, para onde o processo será devolvido.
Custas pela recorrida, que contra-alegou e decaiu no presente recurso”.

Vem agora o Instituto de Turismo de Portugal IP vem requerer a reforma do acórdão quanto às custas apresentando alegações com o seguinte conteúdo:

«1. Por acórdão de fls. 214 a 226, o Supremo Tribunal Administrativo decidiu dar provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, declarando competente, em razão da matéria, para conhecer da presente impugnação judicial, o Tribunal Tributário do Porto.
2. Mais condenou o recorrido nas custas, por ter contra-alegado.
3. Nos termos do disposto no artigo 2° do Código do Procedimento e de Processo Tributário, são de aplicação supletiva o Código do Processo nos Tribunais Administrativos e o Código de Processo Civil.
4. Nos termos do artigo 616° n.º 1 do Código do Processo Civil a parte pode requerer a reforma quanto a custas.
5. O Recorrido recebeu juntamente com o acórdão uma notificação da secretaria do Tribunal para pagamento do remanescente da taxa de justiça.
6. O Recorrido procedeu, aquando da apresentação da contestação e do presente recurso, ao pagamento das correspondentes taxas de justiça (€1.632,00 cada), impondo-se, nos termos da primeira parte do n.º 7 do art.° 6.º, do citado diploma e em cumprimento do disposto na anotação à Tabela I anexa ao Regulamento das Custas Processuais, o pagamento do respetivo valor remanescente.
7. A presente ação tem o valor de €3.780.950,02, sendo apenas uma de entre as mais de 100 ações que correm termos nos Tribunais Tributários, todas propostas pelas concessionárias das zonas de jogo, muitas de valor superior ao da presente ação.
8. Recentemente o Supremo Tribunal Administrativo veio a entender, nos Acórdãos proferidos nos recursos de algumas dessas ações (recursos n.ºs 862/15, de 17.02.2016, 787/15 e 1386/15), que, considerando os termos como a autora e recorrente configura a relação material controvertida, os tribunais tributários eram materialmente competentes para decidir os litígios que lhes eram colocados, uma vez que nas impugnações a concessionária não faz alusão a normas de direito administrativo, não impugna cláusulas do contrato e invoca apenas violação de normas de direito tributário.
9. Assim como no Acórdão proferido no recurso n.º 105/16, desta 2ª secção de contencioso tributário (com origem no Processo TAF do Porto UO 4, n.º 1332/15.9), se diz lapidarmente «Acresce sublinhar que, aferindo-se a competência em razão da matéria pelo pedido formulado na ação e pela natureza da relação jurídica que lhe dá corpo, tal como é configurada pelo autor, e sendo essa a questão do recurso, a deliberação tomada no despacho reclamado se enquadra, numa perspetiva lógica, nas premissas ali consideradas, não estando em causa, por ora, o julgamento do mérito da pretensão da impugnante.
Até porque, o facto de em sede de apreciação de mérito do pedido se vir, eventualmente, a afirmar entendimento diverso da impugnante/recorrente, não retira às questões por ela suscitadas, a natureza de questões fiscais».
10. As decisões do Supremo Tribunal Administrativo, incluindo a que agora se pede a reforma das custas, assentaram em decisões recentes anteriores que fizeram já jurisprudência uniforme nas secções de contencioso tributário.
11. O recorrido, inconformado, insurgiu-se contra as primeiras decisões, por entender que, sem prejuízo da manifesta competência dos tribunais tributários para decidir questões do imposto especial de jogo, os mesmos já não seriam competentes para decidir sobre a contrapartida anual, invocando para esse efeito (i) que a própria autora e recorrente havia proposto ação administrativa comum nas secções de contenciosos administrativo a pedir ao tribunal a modificação dessa contrapartida anual, ergo defendendo que não era um tributo e (ii) que as contrapartidas inicial e anual devidas nos contratos de concessão da exploração de zonas de jogo foram colocadas à concorrência nos concursos públicos que precederam as adjudicações, tendo já o Supremo Tribunal Administrativo (Secção de Contencioso Administrativo) considerado as mesmas como contraprestações contratuais.
12. Não tendo o Supremo Tribunal Administrativo, Secção de Contencioso Tributário, sido recetivo à argumentação expendida pelo recorrido e entendendo dever prevalecer, em qualquer caso, para efeitos de determinação da competência, a relação material controvertida nos termos em que a autora a configura, o recorrido aceitou essas decisões.
13.Salienta-se ainda, para efeitos de determinação das custas e da conduta processual, que as decisões até agora tomadas não são decisões de mérito, pelo que não implicaram diligências processuais, tais como a inquirição de testemunhas.
14. O recorrido adotou neste processo um comportamento processual irrepreensível de colaboração com os tribunais, tendo inclusive, como acima referido arguido nulidades nos primeiros acórdãos proferidos com os quais não se conformou, mas não dos demais, conformando-se com os termos em que o Supremo Tribunal Administrativo entendeu decidir as questões.
15.Caso o recorrido seja obrigado a pagar o remanescente da taxa de justiça, face ao elevado valor das ações e ao facto de as mesmas estarem a ser devolvidas aos tribunais tributários de primeira instância por se considerar serem estes os competentes, o recorrido será fortemente penalizado, em sede de custas judiciais, sendo os valores a pagar desproporcionados face à complexidade das decisões tomadas (sem decisões de mérito e sem que impliquem a audição de testemunhas, a análise de meios de prova extremamente complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas) e à conduta processual das partes.
16. Assim, solicita o recorrido que, face à especificidade da situação, à complexidade da causa e à conduta processual assumida pela parte, este Tribunal faça uso da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art.° 6.º do Regulamento de Custas Processuais, dispensando, assim, o recorrido do pagamento do remanescente das taxas de justiça, reformando-se, nesta parte, o acórdão quanto a custas, ao abrigo do artigo 616.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Termos em que, com os fundamentos acima expostos, se requer seja deferido o pedido de reforma quanto a custas do Acórdão proferido nestes autos, sendo o recorrido Instituto do Turismo de Portugal, I.P. dispensado do pagamento do remanescente da taxa de justiça, assim se garantindo uma tutela efetiva e o acesso à justiça.»

O Ministério Público neste STA, emitiu parecer sustentando que:
«Nada a opor à referida dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, nos termos e com os fundamentos invocados, nos quais se refere.»

2- Do Direito:
Cumpre decidir:

Dispõe o n.º 7 do artigo 6.º do RCP que: «Nas causas de valor superior a €275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».

No caso dos autos o valor da causa é muito superior àquele valor, sendo o remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso calculado nos termos da tabela I –B (1,5 UC por cada €25.000 ou fracção para além dos €275.000), o que perfaz um montante muito elevado que se nos afigura desproporcionado atenta a pequena complexidade da causa na qual não se decidiu de fundo apenas se atribuindo a competência material para a decisão da impugnação judicial deduzida contra a liquidação da contrapartida anual relativa ao ano de 2012 ao Tribunal Tributário do Porto. O acórdão de 24/05/2016 seguiu outras anteriores decisões deste STA no mesmo sentido tendo acolhido a fundamentação constante desses arestos pelo que se pode afirmar, com segurança, que se tratou de um caso em que a causa era pouco complexa ou mesmo de complexidade inferior à comum, resultando a condenação em custas do recorrido apenas do facto de ter apresentado contra-alegações a que o Tribunal não atendeu.

E, no que tange à conduta processual das partes nada há a assinalar.

Tudo ponderando entendemos dever ser deferido o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça que, no caso concreto, se mostra mais conforme à efectivação do direito de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no art. 20.º da CRP.

3 - DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em deferir o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça neste recurso.
Sem custas.

Lisboa, 12 de Outubro de 2016. – Ascensão Lopes (relator) – Aragão Seia – Casimiro Gonçalves.