Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02496/15.7BESNT
Data do Acordão:07/13/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:IRS
MAIS VALIAS
FACTO TRIBUTÁRIO
PERMUTA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário:I - O Código do IRS estabelece, de forma clara e expressa, que constituem mais-valias os ganhos obtidos com a alienação onerosa de partes sociais, e que tais ganhos se consideram obtidos no momento da alienação -artigo 10º, nº 1, al. b), e nsº 3 e 4. E sendo o ganho apurado nesse preciso momento –pela diferença entre o valor de realização e o de aquisição do bem transmitido –as mais-valias não podem deixar de reportar-se a cada ganho de per si.
II - Razão por que o facto tributário nasce e esgota-se no momento autónomo e completo da alienação e da realização das mais-valias, sendo, por isso, um facto tributário instantâneo e não um facto tributário complexo de formação sucessiva ao longo de um ano, pese embora o valor a considerar para a determinação da base tributável para efeitos de IRS seja o correspondente ao saldo anual apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano.
III - A Lei nº 15/2010, de 26 de Julho, é omissa no que toca ao estabelecimento de regras específicas quanto à sua aplicação no tempo, pois não contém qualquer norma que deponha sobre a sua aplicação temporal, limitando-se a prescrever que “A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação”. Razão por que se impõe aplicar a regra geral que rege a aplicação da lei fiscal substantiva no tempo, plasmada no artigo 12º da LGT.
IV - As mais-valias produzidas antes de 27/07/2010 com a alienação de acções detidas há mais de 12 meses continuam a seguir o regime de não sujeição que vinha determinado no nº 2 do CIRS anteriormente às alterações introduzidas pela Lei nº 15/2010 de 26 de Julho, e, como tal, não concorrem para a formação do saldo anual tributável de mais-valias a que se refere o artigo 43º do CIRS.
V - Tal entendimento também foi plasmado no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 18-05-2016, em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, n.º 0784/15, segundo o qual as alterações introduzidas ao regime tributário das mais-valias mobiliárias pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho apenas podem aplicar-se aos factos tributários ocorridos em data posterior à da sua entrada em vigor (27 de Julho de 2010 –art. 5.º da Lei n.º 15/2010).
VI – Consignando-se ainda nesse aresto uniformizador que nas mais-valias resultantes da alienação onerosa de valores mobiliários sujeitas a IRS como incrementos patrimoniais o facto tributário ocorre no momento da alienação (artigo 10.º n.º 3 do Código do IRS), sendo esse o momento relevante para efeitos de aplicação no tempo da lei nova, na ausência de disposição expressa do legislador em sentido diverso (artigos 12.º n.º 1 da LGT e do CC).
VII – Ora, o contrato de permuta de acções, ocorrida em 31.05.2010, configurando uma “alienação onerosa de partes sociais” e nessa medida as mais-valias apuradas com a celebração desse contrato são subsumíveis na alínea b) do nº1 do artigo 10º do CIRS, nos termos do estabelecido na alínea a) do nº2 do artigo 10º do CIRS, estão excluídas da tributação as mais-valias apuradas com a permuta, no caso das acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses.
Nº Convencional:JSTA000P28037
Nº do Documento:SA22021071302496/15
Data de Entrada:04/20/2021
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A ..............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pela Fazenda Pública, visando a revogação da sentença de 15-12-2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que decidiu (i) anular os atos de liquidação de IRS e os respetivos juros compensatórios, e a sua substituição por outros que excluam de tributação as partes sociais que, em 31-05-2010, eram detidas pela Impugnante há mais de 12 meses e (ii) na parte a que se refere a anulação dos atos de liquidação ora impugnados, condenar a AT a reembolsar a Impugnante das quantias indevidamente pagas, acrescidas de juros indemnizatórios, calculados à taxa de 4%, sobre essas quantias, desde 29-05-2015 até à data do processamento da respetiva nota de crédito, relativamente à impugnação deduzida por A.............., melhor identificada nos autos.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Fazenda Pública, as seguintes conclusões:

I) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que declarou parcialmente procedente a Impugnação deduzida contra os atos de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares («IRS») n.º 2015 5000006689 e n.º 2015 5000025649, e dos respetivos juros compensatórios, referentes ao ano de 2010.
II) A presente ação foi apresentada tendo por objeto uma ação inspetiva que, relativamente ao IRS, logrou levar a cabo uma correção referente a mais-valias provenientes de um negócio de permuta de ações celebrado pela Impugnante cuja exclusão de tributação de IRS prevista, à data, na alínea b) do n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS foi entendido pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) como se mostrando inaplicável face à natureza do tipo de negócio em causa, por não ter sido essa a intenção do legislador, independentemente da revogação levada a cabo dessa disposição legal pela Lei n.º 15/2010, de 26 de julho.
III) A apreciação do regime jurídico globalmente considerado (ratio) que os SIT produzem no RIT e sobre os momentos temporais da entrada em vigor das normas da alínea a), do nº 2 e 8 do art. 10º do CIRS, apelando ao elemento histórico da interpretação jurídica, e, a referida autonomização da figura da permuta no regime do art. 10º, do CIRS que nos reconduz ao elemento sistemático – em nada se relacionam com a querela jurisprudencial que se instalou a partir da entrada em vigor da Lei 15/2010 de 26 de julho – justificava que o tribunal a quo se dispensasse de citar acórdãos inaplicáveis pois que suportados em operações de transmissão decorrentes de contratos de compra e venda, o que não se verifica in casu.
IV) Merece reparo o indispensável enquadramento jurídico relativo à natureza ontológica e dogmática da exclusão tributária enquanto figura maior daquilo que é um benefício fiscal à luz do Estatuto dos Benefícios Fiscais (cfr. art 2º EBF) e, da influência que isso provoca no que concerne aos limites rigorosos à interpretação jurídica tal como é sufragada pela jurisprudência do Colendo STA que o tribunal a quo não prefigurou na sua apreciação, a qual aludindo à interpretação restrita e declarativa afasta, neste particular, a interpretação extensiva (ou a integração analógica) que sufragou na sua fundamentação por via da remissão para a norma de incidência, quando o legislador, no que respeita à permuta e estando em causa uma isenção, sempre que a pretendeu regular – fê-lo expressamente no nº 8 do art. 10º do CIRS.
V) Em termos teleológicos (na base da qual está uma maior exigência interpretativa), os fins que presidem à tributação não estão, em termos fiscais, colocados ao mesmo nível, do que os fins que justificam a sua exclusão ou isenção.
VI) A sentença recorrida limita-se a produzir uma afirmação no seio da qual entende que o nº 8 do art. 10º do Código do IRS visa apenas garantir a neutralidade fiscal das operações de permuta sem que se alcance o motivo/fundamento que a leva a concluir nesse sentido,
VII) A interpretação deve ser realizada tendo por objeto a globalidade do regime do art. 10º do CIRS e não apenas uma norma em particular sob pena de colocarmos em crise a ratio normativa do regime fiscal e sem se olvidar que estamos perante uma norma de isenção fiscal.
VIII) No entender do tribunal a quo o desejo extremo do legislador de apenas conceder a exclusão da tributação se se garantir a neutralidade fiscal das operações de permuta nos termos do nº 8 do art. 10º, do CIRS foi paradoxalmente esquecido, permitindo que, seja como for, nos termos da alínea b), do nº 2, do art. 10º do CIRS a exclusão possa ser atribuída sem essa preocupação.
IX) Basicamente…é isto, Sr. Contribuinte estando em causa mais valias resultantes de permuta de ações, para poder beneficiar da exclusão tributária tem de valorizar as referidas participações assegurando-se assim a neutralidade fiscal. Todavia, também, pode alienar mediante permuta as ações nos termos do nº 2 da alínea b) pois que, a preocupação em salvaguardar a neutralidade fiscal, afinal, já não é uma preocupação que se entenda dever ser defendida em termos fiscais.
X) O argumento não colhe. E coloca todo o regime de exclusão tributária relativa às operações de permuta em causa.
XI) A cada transmissão onerosa realizada por permuta das participações sociais, conquanto as mesmas se continuem a valorizar, assegurada a neutralidade fiscal isso vai desonerando sucessivamente os sócios da sociedade adquirida cumpridos que foram os requisitos da isenção. A cada transmissão há uma renovação do que pode constituir ou não a obtenção de uma mais valia tributada ou excluída.
XII) Trazendo à colação o enquadramento jurídico relativo aos benefícios fiscais (Art. 2º do EBF) e a orientação jurisprudencial citada, podemos, pois, concluir que a observação realizada na sentença revela de forma cristalina o menosprezo a que foi votada a autonomização do regime dos Benefícios Fiscais e a interpretação jurídica a que o mesmo está sujeito, pois que apesar de não se aludir à permuta, uma vez que para este tribunal, tributar ou isentar, assume desadequadamente semelhante dimensão – se na norma de incidência é utilizada a expressão “alienação” no que toca às operações de permuta e o mesmo sucede na norma de isenção, então, nesta última, também terá de estar contemplada a isenção para as operações de permuta.
XIII) Se o motivo pelo qual o legislador tributa é diferente e menos exigente em termos interpretativos, do motivo pelo qual isenta – não é contraditório que, à luz de um conceito geral e abstrato como é a “alienação” – certas formas jurídicas possam estar contempladas no campo previsional da norma de incidência e não figurar na previsão da norma de isenção.
XIV) O legislador, no art. 10º, do Código do IRS, sempre procurou autonomizar a permuta face ao conceito mais genérico de alienação onerosa. Isso acontece no nº 8 do art. 10º do CIRS em que há uma alusão clara ao contrato de permuta.
XV) Também por aqui podemos concluir que inexistindo alusão expressa ao contrato de permuta no disposto na alínea a), do nº 2 do art. 10º, do CIRS em virtude da expressa previsão que decorre do seu nº 8, não foi intenção do legislador aplicar aquele normativo legal às mais valias de ações detidas há mais de 12 meses resultantes de contratos de permuta. O que se compreende perante a preocupação que manifestou na norma do nº 8.
XVI) Relativamente à observação realizada pelo douto tribunal, referente ao n.º 11 do art.º 10.º do Código do IRS, o argumento é menor, não atenta á substância falecendo também face ao modo como o tribunal no lugar de se focar na natureza ontológica da norma de exclusão e da interpretação jurídica que cumpre fazer à luz da jurisprudência citada supra – se distrai relativamente à entrega de declarações acessórias que contendem com a incidência do imposto que aqui não é nem nunca foi objeto de pronúncia.
XVII) Pelo que, inexistindo vício de lei no que à interpretação jurídica foi realizada pelos SIT deixam de se mostrar verificados os pressupostos do art. 43º da LGT impondo-se que a Ré seja absolvida do pedido de juros indemnizatórios e retificada a condenação em custas processuais.
XVIII) Estão em causa os seguintes erros de julgamento:
XIX) Está em causa o erro de julgamento decorrente de insuficiente enquadramento jurídico (por não prefigurada diferenciação ontológica da exclusão tributária à luz do EBF) e de subsunção jurídica, em face, aliás, da orientação jurisprudencial citada pela Ré perante a inaplicável jurisprudência citada na sentença recorrida.
XX) Mostra-se violado o disposto nos arts. 2º do EBF; arts 10º, nº 2, alínea a) em virtude da remissão feita pela alínea a), do seu nº 1 e nº 8, todos do CIRS e 11º e 43º da LGT.
Termos em que, deverá ser considerado totalmente procedente o recurso ora apresentado, revogando-se a douta sentença recorrida, nos termos sobreditos, mantendo-se na ordem jurídica, porquanto legal, o ato de liquidação impugnado, com a devida retificação no que à condenação em juros indemnizatórios e em custas, diz respeito.
V/Exas, porém, decidindo, não deixarão de fazer habitual justiça.

A recorrida A………… veio apresentar contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos:

A. A Fazenda Pública interpôs recurso da sentença proferida pelo TAF de Sintra que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela Recorrida em sede de impugnação judicial da liquidação adicional de IRS referente a 2010, no valor de € 567.850,97, tendo determinado a anulação dos atos de liquidação de IRS e dos respetivos juros compensatórios e a sua substituição por outros que excluam de tributação as partes sociais que, em 31.05.2010, eram detidas pela Recorrida há mais de 12 meses;
B. Nenhuma censura merece a sentença recorrida, que não padece de qualquer erro de julgamento;
C. Bem andou o Tribunal a quo ao decidir que, muito embora não se aplique in casu o regime da neutralidade fiscal previsto no n.º 8 do artigo 10.º do CIRS na redação em vigor à data dos factos – entendimento aceite pela Recorrida –, o regime de exclusão de tributação previsto no artigo 10.º, n.º 2, alínea a) do CIRS é aplicável às mais-valias decorrentes da permuta de partes sociais nos casos em que as ações tenham sido detidas há mais de 2 meses, como sucedeu in casu;
D. Como bem decidiu o Tribunal a quo, estabelecendo o n.º 8 do artigo 10.º do CIRS um regime de diferimento do momento da tributação, isso significa que sempre que, como no caso em apreço, não se encontrem reunidas as condições para que esse regime se aplique, pode aplicar-se o regime de exclusão de tributação previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º do CIRS desde que as ações objeto de permuta tenham sido detidas por mais de 12 meses, o que sucede no caso em apreço;
E. A Fazenda Pública, salvo o devido respeito, laborou em erro a este respeito, porquanto afirma no seu recurso, se bem se compreende a alegação que é pouco clara e intricada, que, estando em causa mais-valias geradas por permuta de ações, para assegurar a exclusão de tributação terá o contribuinte de cumprir os requisitos do regime de neutralidade fiscal;
F. Os regimes previstos no n.º 8 (diferimento de tributação) e no n.º 2 (exclusão de tributação) do artigo 10.º do CIRS são, na sua natureza, distintos, pelo que a aplicação de um não afasta a aplicação do outro, antes sendo perfeitamente suscetíveis de articulação;
G. Por outro lado, decidiu bem o Tribunal a quo quando afirmou que apenas faz sentido, à luz das regras de hermenêutica jurídica, que sendo as mais-valias decorrentes de um contrato de permuta de ações consideradas sujeitas a IRS porque compreendidas no conceito de “alienação” a que se refere o artigo 10.º, n.º 1, alínea b) do CIRS, se considere que o regime de exclusão de tributação previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 10.º do CIRS e que também se reporta a “alienação”, possa aplicar-se a essas mesmas mais-valias quando as ações tenham sido detidas há mais de 12 meses;
H. A lei em vigor à data dos factos não previa a exclusão de tributação das mais-valias resultantes de contratos de compra e venda de ações, mas antes daquelas resultantes da alienação de ações, o que inclui a permuta, prevendo também a sua exclusão de tributação quando as ações fossem detidas há mais de 12 meses;
I. De resto, como o Tribunal a quo bem sublinhou, o efeito da transmissão do direito de propriedade sobre as ações a que se reportará a conceito de “alienação” empregue no artigo 10.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) do CIRS, tanto opera por força da compra e venda, como por força da permuta;
J. Mais: o n.º 8 do artigo 10.º do CIRS é uma exceção ao n.º 1 do mesmo preceito, o que significa que o n.º 8 do artigo 10.º do CIRS apenas existe para estabelecer uma exceção no que se refere ao momento de tributação das mais-valias decorrentes da permuta de ações, de onde decorre que o n.º 1 faz incidir IRS sobre as mais valias decorrentes de uma operação de permuta de partes sociais;
K. Se o n.º 1 do artigo 10.º do CIRS se refere a “alienação” e se considera que os ganhos decorrentes de permutas se incluem aí, então a exclusão de tributação de mais-valias decorrentes da “alienação” de ações detidas há mais de 12 meses prevista no artigo 10.º, n.º 2, alínea a) do CIRS terá de compreender as mais-valias decorrentes da permuta de ações;
L. Entendimento distinto, como aquele defendido pela Fazenda Pública, faz tábua rasa dos elementos sistemático e teleológico que devem intervir na interpretação da lei, sendo ilegal, e conflitua com os princípios da igualdade e da legalidade previstos nos artigos 13.º e 266.º, n.º 2 da CRP, sendo por isso materialmente inconstitucional e desrespeitando, ainda, a proibição de discriminação constante do artigo 4.º da CEDH;
M. Não se aplicando aos ganhos obtidos em resultado da permuta de ações em causa nos autos (e celebrada em 31.05.2010) o regime de neutralidade fiscal previsto no n.º 8 do artigo 10.º do CIRS, tais ganhos estavam em qualquer caso excluídos de tributação em IRS ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 10.º do CIRS, o que desde já se alega para todos os efeitos legais;
N. O recurso interposto pela Fazenda Pública deve improceder, mantendo-se a sentença recorrida e a anulação dos atos de liquidação de IRS e dos respetivos juros compensatórios e a sua substituição por outros que excluam de tributação as partes sociais que, em 31.05.2010, eram detidas pela Recorrida há mais de 12 meses, com as demais consequências legais.
TERMOS EM QUE, EM FACE DA FUNDAMENTAÇÃO EXPOSTA E PORQUE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA BEM DECIDIU, DEVE ESTA SER MANTIDA NA ORDEM JURÍDICA E, POR CONSEGUINTE, NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO APRESENTADO PELA FAZENDA PÚBLICA, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, no parecer que se segue:

I. Objecto do recurso.
1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo TAF de SINTRA, na parte em que julgou parcialmente procedente a ação de impugnação judicial intentada contra o ato de liquidação de IRS e respetivos juros compensatórios, relativo ao ano de 2010.
A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, invocando erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação do “disposto nos arts. 2º do EBF; arts 10º, nº 2, alínea a) em virtude da remissão feita pela alínea a), do seu nº 1 e nº 8, todos do CIRS e 11º e 43º da LGT”.
Para o efeito alega, após diversas considerações críticas sobre o entendimento vertido na sentença recorrida, que «…inexistindo alusão expressa ao contrato de permuta no disposto na alínea a), do nº 2 do art. 10º, do CIRS em virtude da expressa previsão que decorre do seu nº 8, não foi intenção do legislador aplicar aquele normativo legal às mais-valias de ações detidas há mais de 12 meses resultantes de contratos de permuta».
Mais entende que «inexistindo vício de lei no que à interpretação jurídica foi realizada pelos SIT deixam de se mostrar verificados os pressupostos do art. 43º da LGT impondo-se que a Ré seja absolvida do pedido de juros indemnizatórios e retificada a condenação em custas processuais».
E termina pedindo a revogação da sentença nesta parte.
II. Análise do Recurso.
1. A questão que vem suscitada pela Recorrente consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, na parte em que considerou subsumível na alínea a) do nº2 do artigo 10º do CIRS, as mais-valias apuradas com a permuta de ações detidas há mais de 12 meses, e nessa medida verificada a isenção de tributação.
Dado que a questão suscitada é similar às dos processos nº 2495/15.9BESNT (Neste caso o STA não tomou conhecimento do recurso.) e 2493/15.2BESNT, que correm (ou correram) termos neste tribunal, vamos seguir o parecer do Ministério Público ali vertido, com cuja fundamentação concordamos.
Os ganhos obtidos com a alienação onerosa de partes sociais constituem mais-valias (artigo 10.º1/b) do CIRS). Todavia, não constituem (à data do facto tributário) mais-valias tributáveis a alienação de ações detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses (artigo 10.º/2/ a) do CIRS (Na redação dada pela lei nº 64-A/2008, de 31 de dezembro.)). O contrato de permuta não tem, atualmente, regulamentação no Código Civil, sendo um contrato atípico inominado, oneroso, ao qual se aplicam, com as necessárias adaptações, as normas do contrato de compra e venda, atento o estatuído no artigo 939.º do CC (Ver acórdão do STA de 06/06/2018-P. 082/18, citado pela sentença recorrida e disponível em www.dgsi.pt). Ora, será que o conceito de “alienação de ações” referido no artigo 10.º/2/ a) do CIRS abrange o negócio de permuta de ações? A nosso ver e ressalvado melhor juízo sim.
A fim de beneficiar do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 10.º/8 do CIRS, o interessado, nos termos do disposto no artigo 57.º/1/b) do mesmo código, deve juntar declaração que descreva a operação, elaborada nos termos do estatuído no artigo 78.º do CIRC, sendo certo que deve, ainda, fazer a demonstração do cálculo da mais-valia a tributar, no caso de não se aplicar o regime especial de neutralidade fiscal. Como resulta do probatório e dos autos a recorrida deu cumprimento a todo esse procedimento.
No caso de permuta de partes socias, o diferimento de tributação só se verifica, nos termos do artigo 10.º/8 do CIRS, se os sócios da sociedade adquirida ”continuarem a valorizar, para efeitos fiscais, as novas partes socias pelo valor das antigas”. O regime da neutralidade fiscal tem como consequência o diferimento da tributação para momento posterior, tudo se passando, na prática, como se a operação de reestruturação não tivesse ocorrido. Assim, a transferência das participações sociais não gera qualquer tributação de mais-valias, sendo certo que a mesma só ocorrerá no momento da efetiva realização, ou seja, com a alienação dessas partes sociais a terceiros. Todavia, nos termos da cláusula setorial anti abuso, constante do artigo 73.º/10 do CIRC, cujo âmbito abrange as operações de reestruturação empresarial, verificando-se uma situação de abuso, o diferimento da tributação é negado, procedendo-se à aplicação das normas de incidência normais, com a consequente tributação das mais-valias decorrentes da transmissão de elementos patrimoniais.
No caso em análise, uma vez que não estavam verificados os pressupostos para a impugnante/recorrida beneficiar do regime de neutralidade fiscal estatuído no artigo 10.º/8 do CIRS, tendo havido efetiva transmissão de partes sociais e apuradas mais-valias, há que aplicar o regime normal de incidência de tributação previsto no artigo 10.º/1/b) /2/a) do mesmo Código. Assim sendo, as ações transmitidas e detidas pela impugnante/recorrida por mais de 12 meses estão excluídas de tributação, nos termos do estatuído no artigo 10.º/2/ a) do CIRS, pois que parece certo que o contrato de permuta outorgado determinou a sua alienação nos termos e para os feitos desse mesmo normativo.
Tendo a sentença recorrida adotado este entendimento, que se nos afigura conforme a uma adequada interpretação do regime legal previsto no artigo 10º do CIRS, afigura-se-nos que nada há a censurar ao julgamento feito pelo tribunal “a quo”.
A critica que a Recorrente tece a tal interpretação não tem, salvo o devido respeito, a necessária correspondência na letra da lei e no espírito do legislador. Com efeito, não subsistem dúvidas que o contrato de permuta de ações configura uma “alienação onerosa de partes sociais” e nessa medida subsumível na alínea b) do nº1 do artigo 10º do CIRS. Por sua vez, a alínea a) do nº2 do artigo 10º do CIRS exclui(a) da tributação a “alienação de ações detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses”, o que, obviamente, inclui a permuta de ações e não apenas a sua compra e venda. Caso o legislador pretendesse restringir a isenção a esta forma de alienação, assim o teria feito. Ora, ao defender o entendimento vertido nas suas alegações de recurso, a Recorrente não está a fazer uma interpretação estrita da norma de isenção, como pretende convencer, ao citar jurisprudência deste tribunal, mas sim a restringir o âmbito da própria norma. Na verdade, a alínea a) do nº2 limita-se a excluir da tributação da “alienação onerosa de partes sociais“ a “alienação de ações detidas…durante mais de 12 meses”, ou seja, um tipo de “partes sociais”, respeitado o requisito temporal de manutenção da titularidade. Por outro lado também não se descortina em que termos a interpretação feita pelo tribunal “a quo” conflitua com o regime previsto no nº8 do mesmo preceito legal (art.10º do CIRS). Na verdade, para além dos diversos âmbitos e enquadramentos das duas normas em questão, a isenção prevista na alínea a) do nº2 respeita apenas a “ações”, enquanto o nº8 respeita a “partes sociais”, ou seja, não têm a mesma abrangência.
Como refere José Guilherme Xavier de Basto, a propósito do regime previsto no nº8 do artigo 10º do CIRS (in “IRS- Incidência real…”, Coimbra Editora, 2007, pag.422), «o regime de exclusão é, pois, em última análise, um regime de diferimento no tempo da imposição». E ressalva o mesmo autor, em nota de rodapé, «se se tratar de ações, claro que, em qualquer caso, as mais-valias só seriam tributáveis se tivessem sido detidas pelo seu titular por não mais de 12 meses, como resulta da alínea b) do nº2 do artigo 10º».
E, como realça igualmente o mesmo autor, o nº8 do artigo 10º sempre ressalva desta exclusão de tributação as quantias recebidas em dinheiro (segmento final da norma), porque neste caso não há motivo para a não tributação imediata, por “a lei como que supõe que a quantia em dinheiro recebida constitui, toda ela, uma mais-valia suplementar, que terá que ser tributada agora, sob pena de não poder ser captada quando da ulterior transmissão onerosa» (das partes sociais). Mas mesmo neste caso, se as participações objeto de permuta respeitarem a ações, a operação sempre está coberta pela isenção prevista na alínea b) do nº2 do artigo 10º do CIRS.
Em face do exposto, entendemos que o contrato de permuta de ações configura uma “alienação onerosa de partes sociais” e nessa medida as mais-valias apuradas com a celebração desse contrato são subsumíveis na alínea b) do nº1 do artigo 10º do CIRS. Por sua vez, nos termos do estatuído na alínea a) do nº2 do artigo 10º do CIRS, estão excluídas da tributação as mais-valias apuradas com a permuta, no caso das ações detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses.
Afigura-se-nos, assim, que a sentença recorrida fez uma correta interpretação e aplicação da lei, motivo pelo qual se impõe a sua confirmação, julgando-se improcedente o recurso.

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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

a) Em 31-05-2010, foi celebrado um contrato de sociedade, entre a Impugnante, A…………, B…………, C............., D............., E............., de acordo com o qual os referidos contraentes constituíram a «F............., S.A.», com um capital social de €20.000.004,00, integralmente subscrito e realizado em espécie quanto ao valor de €20.000.000,00 e em numerário quanto ao valor de €4,00 (provado por documento, de fls. 78 a 107 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);
b) Na sequência do supracitado contrato, a Impugnante é detentora de parte do capital social da «F…………, S.A.», no montante de €5.000.000,00, o qual subscreveu e realizou em espécie mediante a transferência para aquela sociedade de uma participação no valor de €5.000.000,00, correspondente a: 15.613 ações ordinárias, com o valor nominal de €1,00, representativas de 25% do capital social da «G…………, S.A.»; 12.500 ações ordinárias, com o valor nominal de €1,00, representativas de 25% do capital social da «H.............., S.A.»; e 12.500 ações ordinárias, com o valor nominal de €1,00, representativas de 25% do capital social da «I…………, S.A.» (provado por documento, de fls. 78 a 107 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

c) Em 31-05-2011, a Impugnante apresentou, no serviço de finanças de Cascais 1, requerimento, «em cumprimento do disposto na alínea b) do número 1 do artigo 57.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares», onde foi descrita, além do mais, a operação identificada nas alíneas a) e b) do probatório (provado pelo documento n.º 8 junto à petição inicial);

d) À data em que foi realizada a operação identificada nas alíneas a) e b) do probatório, a Impugnante não detinha as seguintes ações, adquiridas por novas entradas em dinheiro, há mais de 12 meses: 45.000, no capital social da «I.............., S.A.»; 45.000, no capital social da «H.............., S.A.»; 102,26, no capital social da «G.............., S.A.»; e 45.000, no capital social da «J..............» (facto não controvertido, constante do artigo 146.º da petição inicial e artigo 97.º da contestação);

e) No dia 30-05-2011, a Impugnante apresentou declaração modelo 3 de IRS, referente aos rendimentos de 2010, à qual foi atribuída o n.º 1503-2010-J2643-57 (provado por documento, a fls. 190 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

f) Na sequência da declaração identificada na alínea anterior, foi emitida, em 07-06-2011, a liquidação de IRS n.º 2011 5002844195, da qual resultou um valor a pagar de €162.299,46 (provado por documento, a fls. 191 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

g) Em 05-08-2011, a Impugnante apresentou uma declaração modelo 3 de IRS, de substituição, referente aos rendimentos de 2010, à qual foi atribuída o n.º 1503-2010-J3531-37, onde declarou, no anexo G, referente a mais-valias e a outros incrementos patrimoniais, os seguintes rendimentos:

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(provado por documento, de fls. 65 a 69 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

h) Na sequência da liquidação identificada na alínea anterior, à Impugnante foi emitida, em 10-08-2011, a liquidação n.º 2011 5004994746, relativa aos rendimentos de 2010, da qual resultou um valor a pagar de €162.388,26 e onde se pode ler:

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(provado por documento, a fls. 190 e 193 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

i) No dia 19-08-2011, foi emitida a demonstração de acerto de contas n.º 2011 6497893, da qual resulta o total de acerto da liquidação de IRS n.º 2011 5004994746, no valor de €-162.388,26, com o estorno da liquidação de IRS n.º 2011 5002844195, no valor de €162.299,46, com um saldo a pagar €88,80 (provado por documento, a fls. 194 do processo administrativo tributário apenso aos autos);

j) Através do ofício n.º 043240, de 24-06-2014, com o assunto «Carta-Aviso», a Impugnante foi notificada, em 27-06-2014, de que, a muito curto prazo, técnicos dos serviços de inspeção tributária se deslocarão ao seu domicílio fiscal, tendo em vista a verificação do cumprimento das obrigações tributárias, no âmbito da ação inspetiva credenciada pela ordem de serviço n.º OI201402793, com o âmbito delimitado ao IRS do exercício de 2010 (provado pelo documento n.º 9 junto à petição inicial e, no que se refere à data da notificação, facto não controvertido, constante do artigo 59.º da petição inicial);

k) Em 23-07-2014, a Impugnante tomou conhecimento de que, em 17-06-2014, tinha sido proferido despacho, para proceder a ação de inspeção externa, credenciada pela ordem de serviço n.º OI201402793, de âmbito delimitado ao IRS de 2010 (provado por documento, a fls. 40 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

l) Através do ofício n.º 079961, de 12-12-2014, com o assunto «Projeto de Relatório da Inspeção Tributária – Art. 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) e Art. 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA)», a Impugnante foi notificada do projeto de relatório de inspeção tributária, para efeitos de exercício do direito de audição prévia sobre o projeto de relatório de inspeção tributária (provado pelo documento n.º 10 junto à petição inicial);

m) Em 31-12-2014, deu entrada nos serviços da Direção de Finanças de Lisboa de requerimento, apresentado pela Impugnante, a exercer o seu direito de audição prévia, onde, além do mais, expôs o seguinte:

«6. Em 31 de Maio de 2010, foi constituída a F............., SA (…), tendo o seu capital social sido integralmente subscrito e realizado em espécie, através da entrada das partes sociais (acções) que o ora Requerente detinha nas sociedades G………….., S.A. (…), I.............., S.A. (…) e H.............., S.A.(…).

7. A Inspecção Tributária apurou a realização de uma mais-valia tributável de EUR 4.959.387,00, resultante da permuta das partes sociais das sociedades G…………….., S.A. (…), I.............., S.A. (…) e H.............., S.A.(…), por uma participação social na F…………….., S.A.,

8. À data em que as operações de permuta ocorreram, ou seja em 31 de Maio de 2010, o art. 10.º, n.º 2, al. a) do CIRS estipulava que: “[E]xcluem-se do disposto no número anterior as mais-valias provenientes da alienação de: a) Acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses”.

9. Ora, esta norma apenas foi revogada pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, com entrada em vigor no dia seguinte, ou seja, em 27 de Julho de 2014.

[…]

12. Deste modo, é evidente que a Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, não se aplica às mais-valias realizadas antes da sua entrada em vigor.

13. Pelo que tendo as operações de transmissão apreciadas pela Inspecção Tributária ocorrido em 31 de Maio de 2010, quando aquela lei apenas entrou em vigor em 27 de Julho do mesmo ano forçoso é concluir que a consequência a retirar não pode ser outra senão que sobre as mesmas não incidia IRS»

(provado pelo documento n.º 11 junto à petição inicial);

n) Através do ofício n.º 001105, de 08-01-2015, a Impugnante foi, em 09-01-2015, notificada do relatório de inspeção tributária, respeitante à ordem de serviço n.º OI201402793 e da decisão de concordância que sobre ele recaiu, onde se pode ler:

«I. CONCLUSÕES DA AÇÃO INSPETIVA

Da análise da operação de permuta de partes sociais na qual o sujeito passivo A.............. - NIF .............. interveio no ano de 2010, comprovou-se que esta não preenche os requisitos essenciais para beneficiar do regime especial de neutralidade fiscal aplicável à permuta de partes sociais, previsto no artigo 10.º n.º 8 do Código do IRS (na sua redação à data dos factos).

Deste modo por aplicação da norma especial antiabuso, prevista no n.º 10 do artigo 73.° do Código do IRC (anterior artigo 67.º), a mais-valia resultante das operações de permuta de partes sociais é tributável nos termos do artigo 43.º n.° 1 da Código do IRS, sendo aplicável a taxa especial prevista no n.º 4 do artigo 72.º do referido Código do IRS, todos na sua redação à data dos factos.

Assim, à coleta declarada pele sujeito passivo em 2010 é proposto a correção meramente aritmética no montante de 495.938,70€, conforme consta da folha antecedente “Conclusões da Ação de Inspeção" e no seguinte no quadro:

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II. OBJETIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA AÇÃO DE INSPEÇÃO

[…]

II.2. MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL

O sujeito passivo, em cumprimento do disposto no artigo 57.º n.° 1 al. b) do Código do IRS, procedeu à entrega da declaração referente a uma operação de permuta de partes sociais, na qual foi interveniente, e declaração da sociedade adquirente relativa à posse da maioria dos direitos de voto na sociedade adquirida pós operação de permuta, nos termos definidos na primeira parte do n.° 5 do artigo 73.°, conforme determina o n.° 6 do artigo 78.°, ambos do Código do IRC, no sentido de comprovar a aplicação do regime especial de neutralidade fiscal, que afasta a tributação da mais-valia resultante da operação de permuta de partes sociais, na esfera individual do sócio/acionista, previsto no artigo 77.º n.° 1 do Código do IRC, e corporizado no Código do IRS, no artigo 10.º n.° 8.

Os documentos apresentados pelo sujeito passivo foram remetidos para estes serviços de inspeção afim de se proceder à análise da conformidade destes com a moldura fiscal, prevista para estas operações.

Assim, no sentido de verificar se estavam reunidos os requisitos essenciais previstos nos referidos articulados, para que a esta operação fosse aplicável o regime especial de neutralidade fiscal foi programada a presente ação inspetiva externa, de âmbito parcial (IRS), sob a Ordem de Serviço 01201402793, para o ano de 2010, nos termos dos artigos 2°, 12.° n.° 1 alínea a), 13.º alínea b), e 14.° n.° 1 alínea b), todos do Regime Complementar de Procedimento da Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA).

Releva-se que o sujeito passivo nomeou como mandatários, no âmbito do artigo 5.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), seus bastantes procuradores os Sr.°s Dr.°s K.............., L.............., M.............., todos advogados, com escritório na…………….., n.° ….., 1250-… Lisboa, a quem confere todos os poderes forenses em direitos permitidos, bem como os poderes necessários para o representar no âmbito da presente ação inspetiva, podendo estes assinar todas as notificações subsequentes, prestar informações, consultar os processos e neles requerendo o que tiverem por conveniente, com eventual ratificação do processado.

II.3. OUTRAS SITUAÇÕES

II.3.1. CARACTERIZAÇÃO DO SUJEITO PASSIVO

O sujeito passivo tem domicílio fiscal declarado na………, n.º ……., …….., …………….., ………………, …………- Alcoitão, 2645 - ….. Alcabideche, pertencente área do Serviço de Finanças de Cascais - 1. 1503.

II.3.2. ENQUADRAMENTO FISCAL EM IRS

No que respeita ao IRS, o contribuinte A.............. - NIF ……………. é sujeito passivo do imposto nos termos do n.° 1 dos artigos 13.° e 15.° do Código do IRS.

II.3.3. OBRIGAÇÕES DECLARATIVAS

Em relação ao ano de 2010, o sujeito passivo procedeu à entrega da declaração de rendimentos de IRS Mod. 3, com a junção dos Anexos A, E, G, H e J, conforme definido no n.° 1 do artigo 57.° do Código do IRS - Declaração com a identificação 1503-201 0-J3531-37 e a correspondente nota de liquidação com o n.° 2011.5004994746, da qual resulta um rendimento coletável de 50.477.65€ (vide Anexos 1 e2).

Releva-se que, por não ser possível a submissão eletrónica, para efeitos de cumprimento do disposto na alínea b) do n.° 1 do referido artigo 57.°, em conjugação com a alínea a) do n.° 6 do artigo 78.º do Código do IRC, o sujeito passivo procedeu à entrega, em papel, no Serviço de Finanças de Cascais-1, dos documentos relativos à operação de permuta de partes de sociais, envolvendo a entidade F………….., S. A. - NIPC ……………., já referenciada anteriormente no ponto II.2. - vide Anexo 3.

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1. DESCRIÇÃO DO NEGÓCIO DA PERMUTA

De acordo com a documentação apresentada pelo sujeito passivo conjuntamente com a declaração de rendimentos de IRS Mod. 3, já referenciada anteriormente, concluímos que o sujeito passivo participou na constituição da sociedade F…………., S.A. – NIPC………….., através da permuta das suas participações sociais nas sociedades G………………, S.A. - NIPC ………………, I…………., S.A. - NIPC ………….. e H.............., S.A. - NIPC …………. pretendendo atribuir a esta operação, o regime especial de neutralidade fiscal.

Com vista a facilitar a análise desta operação, apresenta-se de forma esquemática o background da constituição da sociedade F…………., S.A. - NIPC ……………..:

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III.1.A. CONSTITUIÇÃO DA SOCIEDADEF………….., S.A. - NIPC ……………

i) Sobre a constituição da sociedade F……………, S.A. - NIPC ………….

Consta do contrato de sociedade, com data de 31/05/2010, que o capital social da F……………… S.A., no valor de 20.000.000,00€, foi integralmente subscrito e realizado em espécie, correspondente a partes sociais (ações) que o sujeito passivo e os restantes acionistas - B............. - NIF ………………, C.............- NIF ………… e D............. - NIF ……………- detinham nas sociedades G…………….., S.A. – NIPC………….., I.............., S.A. - NIPC …………….. e H.............., S.A, - NIPC ………….., por meio de operação de permuta - vide Anexo 4,

O capital social foi subscrito com mais 4,00€, integralmente realizado em numerário por um quinto acionista E..............

Assim, a constituição da sociedade anónima F............. S.A. deu-se com a formação do capital social de 20.000.004,00€, representado por 20.000.004 ações, nominativas, de valor nominal equivalente a 1 ,00€, dividido e distribuído da seguinte forma:

a) O montante de 5.000.000,00€, representado por 5.000.000 ações ordinárias, com o valor nominal de 1,00€ cada, subscrito pelo sujeito passivo - A.............. - NIF …………….. e realizado mediante a transferência para a sociedade de uma participação avaliada no montante de 5.000.000,00€, correspondente a:

- 15.613 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade G............., S.A. – NIPC…………….;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade H.............., S.A. – NIPC…………….;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade I.............., S.A, - NIPC……………...

b) O montante de 5.000.000,00€, representado por 5.000.000 ações ordinárias, com o valor nominal de 1,00€ cada, subscrito por B............. - NIF ………………, e realizado mediante a transferência para a sociedade de uma participação avaliada no montante de 5.000.000,00€, correspondente a:

- 15.613 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade G............., S.A. – NIPC……………..;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade H.............., S.A, - NIPC ……………….;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade I.............., S.A. – NIPC…………….

c) O montante de 5.000.000,00€, representado por 5.000.000 ações ordinárias, com o valor nominal de 1,00€ cada, subscrito por C............. – NIF………….., e realizado mediante a transferência para a sociedade de uma participação avaliada no montante de 5.000.000.00€, correspondente a:

- 15.613 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade G............., S.A. - NIPC ………………;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade H.............., S.A. - NIPC ……………..;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade I.............., S.A. - NIPC …………….

d) O montante de 5.000.000,00€, representado por 5.000.000 ações ordinárias, com o valor nominal de 1,00€ cada, subscrito por D............. - NIF ………….., e realizado mediante a transferência para a sociedade de uma participação avaliada no montante de 5.000.000,00€, correspondente a:

- 15.613 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade G............., S.A. - NIPC …………………;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade H.............., S.A. - NIPC ……………;

- 12.500 ações ordinárias, com valor nominal de 1,00€, representativas de 25% do capital social da sociedade I.............., S.A. - NIPC ……………...

e) O montante de 4,00 € (quatro euros), representado por 4 (quatro) ações ordinárias, com o valor nominal de 1€, subscrito por E............. e realizado em dinheiro.

II) Sobre a permuta e a valorização das partes sociais antigas com vista à realização do capital da sociedade F…………, S.A. - NIPC …………..

Conforme referido, a realização do capital social da sociedade F…………, S.A. NIPC …………., no valor de 20.000.000, 00€, foi efetuada através da permuta de partes sociais detidas pelo sujeito passivo e pelos outros acionistas das sociedades já identificadas:

- G............., S.A. - NIPC ……………;

- I.............., S.A. - NIPC ……………..;

- H.............., S.A. - NIPC ……………….

O valor das participações permutadas (participações antigas) pelo sujeito passivo e restantes acionistas apresentam um valor significativamente inferior ao valor das novas partes sociais recebidas, pelo que, para que esta operação de permuta permitisse a realização do capital social da nova sociedade –F………………, S.A. – NIPC……………., foi promovida a valorização das partes sociais de cada uma daquelas sociedades, de forma a ficar subscrito o capital social da nova sociedade.

Aquando da notificação do sujeito passivo, em conjunto com as entidades envolvidas, para virem esclarecer a operação de permuta de ações e juntar os elementos comprovativos desta operação - n/s Ofícios n.°s 41221 e 41225, ambos de 16/06/2014 - in Anexo 5, foi apresentado o relatório de avaliação das partes sociais, certificado pelo ROC, baseado na aplicação do método denominado Cash Flows Descontado, construído a partir dos últimos resultados conhecidos da empresa, projeção de negócio e o valor em perpetuidade da continuação do negócio.

Resulta da análise do relatório de avaliação a seguinte valorização das partes sociais, conforme explicado nos quadros seguintes:

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Da análise das demonstrações financeiras da sociedade F…………….., S.A. - NIPC …………… verificou-se que esta operação encontra-se refletida contabilisticamente nas contas 4111012/022/032 - Goodwill, pelo valor das novas participações - vide extrato do balancete analítico de 31/12/2010 em Anexo 6.

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Outras situações relevadas nas demonstrações financeiras da sociedade F………, S.A;

- Cedência de suprimentos e prestações suplementares:

Da análise das demonstrações financeiras (DF) da sociedade F............., S.A. – NIPC………….., verificou-se ainda que os suprimentos, bem como as prestações suplementares que os acionistas tinham efetuado nas sociedades G............., S.A. – NIPC……………, I.............., S.A. - NIPC …………… e H.............., S.A. - NIPC …………., passam para a sociedade F............., S.A - NIPC ………….. Esta operação é uma mera regularização contabilística, que se traduz na reflexão de um crédito dos acionistas, na sociedade, que decorrente da operação de permuta, passam a deter.

Assim, na data da constituição da F............., S.A. - NIPC ………., em 31/05/2010, foi celebrado um contrato de cessão de créditos (suprimentos e prestações suplementares) - vide Anexo 7, no qual determina que os acionistas D………………. – NIF…………., B............. - NIF …………….., A.............. - NIF ………….. (sujeito passivo) e C............. - NIF ………….. cedem à sociedade F.............SA, os créditos de que eram titulares nas sociedades G………………, S.A., I.............., S.A e H.............., S.A.

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- Compra pela sociedade F............., S.A – NIPC…………….., das participações sociais na sociedade J.............., S.A. - NIPC …………….:

Em 23/09/2010, foi celebrado contrato de compra e venda de ações e de cessão de créditos entre os acionistas da J.............., S.A. - NIPC ………………. – D…………….., B............., A.............. (sujeito passivo) e C............. (vendedores) e a F............., S.A. - NIPC ………….. (compradora) – in Anexo 9.

A sociedade J.............., S.A. - NIPC …………….. detém nos seus ativos propriedades de investimento de valor aproximado a 3.000.000,00€, sendo que a sua atividade se centra na gestão imobiliária dos imóveis que coloca à disposição das empresas já referidas - G............., S.A. - NIPC …………….., I.............., S.A. - NIPC ……….., H.............., S.A. – NIPC ……………… e F............., S.A. – NIPC…………. A este propósito salienta-se que todas estas sociedades têm sede no …………….. sito na Rua ………………, n.°…. - Estoril, o qual é cedido pela sociedade J.............., S.A. - NIPC …………….

Relativamente ao preço de compra e venda de ações, os acionistas vendem as suas participações na J.............., S.A. - NIPC ……………… à F............., S.A. - NIPC ………….. por 1,00€ cada, conforme se explicita no seguinte quadro:

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Esta transmissão, foi registada em termos contabilísticos, na conta "4111042 investimentos Financeiros Particip. De Cap. MEP – Goodwil” (a débito), por contrapartida da "conta 2611/2/3/4 Acionistas com subscrição" (a crédito).

Questionadas as partes sobre a determinação do preço de venda final - 4,00€, foi referido que não foi efetuada qualquer avaliação, e que consideram que, à luz dos normativos societários as partes são livres de fixar o preço que consideram adequado para as operações de compra e venda de partes de capital - Anexo 10 fl 2.

Realça-se que nesta operação de compra e venda de participações sociais, a qual ocorreu sensivelmente 4 meses após a constituição da sociedade F............., S.A. - NIPC ………….., os intervenientes são os mesmos que intervêm na operação de permuta de partes sociais ocorrida aquando da constituição desta sociedade, porém o modus operandis, é significativamente diferente:

o Os intervenientes optaram agora por efetuar um negócio de compra e venda de partes sociais;

o Sendo o preço fixado de venda determinado sem recurso a qualquer avaliação do valor da empresa.

À semelhança do que aconteceu com a operação de permuta, também esta operação de venda de ações foi acompanhada peia cedência de créditos que os acionistas detinham na sociedade J.............., S.A. – NIPC……………., os quais passam a estar relevados contabilisticamente na sociedade F............., S.A. - NiPC ………………., conta corrente “ 25321/2/3/4 Financiamentos obtidos Out Particip. Suprim. Out. Mút” - in Anexo 8. Vejamos:


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Concluída a descrição destes factos, importa relevar que da consulta às DF, e em especial ao Relatório de Auditoria da sociedade F............., S.A. - NIPC ………………., as principais rubricas de ativos são as participações financeiras - relevadas ao método de equivalência patrimonial (MEP) - e o passivo decorrente dos financiamentos registados na sociedade na sequência dos acordos de “cessão de créditos” referidos.

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III. 2. ANÁLISE DO NEGÓCIO DA PERMUTA DE PARTES SOCIAIS À LUZ DO NORMATIVO FISCAL

Conforme descrito atrás, o sujeito passivo participou na constituição da sociedade F............., S.A. - NIPC ……………., através da permuta de partes sociais que detinha noutras sociedades:

- F............., S.A. - NIPC ……………. G............., S.A. - NIPC ……………, I.............., S.A. - NIPC ………………e H.............., S.A. - NIPC …………..

Defende o sujeito passivo que esta operação foi efetuada com base no regime especial aplicável à permuta de partes sociais, previsto no artigo 77.° do Código do IRC, o qual é transposto para o Código do IRS através do n.° 8 do artigo 10.° - neutralidade fiscal.

(i) O Regime de Neutralidade Fiscal aplicável às permutas de partes sociais

De modo a incentivar a reestruturação e reorganização das sociedades num contexto de crescente competitividade, a legislação fiscal nacional retoma disposições comunitárias de forma a criar um regime de neutralidade fiscal aplicável às operações de transformação das sociedades, fusão, cisão e permuta de partes sociais, pretendendo que os negócios se adaptassem às novas exigências da globalização económica, sem o ónus da carga fiscal.

Este regime fiscal de neutralidade fiscal, aplicável em concreto às permutas de partes sociais encontra-se explanado no artigo 77.° do Código do IRC e conforme já referido, quando as partes sociais são detidas por pessoas singulares, como é o caso em apreço, encontra-se replicado no artigo 10.° n.° 8 do Código do IRS:

[…]

O conceito de permuta de partes sociais encontra-se definido no atual n.° 5 do artigo 73° do Código do IRC, à data artigo 67.º:

5 - Considera-se permuta de partes sociais a operação pela qual uma sociedade (sociedade adquirente) adquire uma participação no capital social de outra (sociedade adquirida), que tem por efeito conferir-lhe a maioria dos direitos de voto desta última, ou pela qual uma sociedade, já detentora de tal participação maioritária, adquire nova participação na sociedade adquirida, mediante a atribuição aos sócios desta, em troca dos seus títulos, de partes representativas do capital social da primeira sociedade e, eventualmente, de uma quantia em dinheiro não superior a 10% do valor nominal ou, na falta de valor nominal, do valor contabilístico equivalente ao nominal dos títulos entregues em troca.

Mas, tal como definido do Direito Comunitário, como vista a garantir que a operação em causa não teve como incentivo a procura de um beneficio fiscal deve-se proceder, em cada caso, à apreciação global da referida operação. O Direito Comunitário, em concreto a al. a) do artigo 11.º da Diretiva 90/434/CEE foi o grande ponto de partida para que, no nosso país se criassem normas especiais antiabuso, direcionadas para a tributação destas operações sempre que se verifique que estas não respeitaram os princípios subjacentes à criação do regime especial de neutralidade fiscal.

No nosso normativo estas normas encontram-se definidas no n.° 10 do atual artigo 73.º do Código do IRC, à data artigo 67.°.

(ii) Sobre a apreciação global da referida operação de permuta à luz do enquadramento fiscal que subjaz ao regime especial de neutralidade fiscal

Da análise da operação, tal como descrito no ponto anterior destaca-se a operação de valorização das partes sociais permutadas, de forma a garantir que com esta operação fosse realizado o capital da sociedade criada.

Releva-se que nos documentos apresentados pelo sujeito passivo, em cumprimento do disposto na al. b) do n.° 1 do artigo 57.º do Código do IRS, não é identificado qualquer rácio de troca das participações, apenas é referido na Declaração de Permuta (vide Anexo 3 fl. 4) que:

- Constituição da sociedade F.............S.A. - NIPC …………..: “(...) o Declarante entregou as participações sociais que detinha nas sociedades G………………, S.A., H.............. S.A. e I…………., S.A., com os valores nominais respetivamente de 15.613,00€, 12.500,00€ e 12.500,00€, tendo recebido em troca uma participação social da F............., S.A., com o valor nominal de € 5.000.000,00.

Conforme já referido, da análise das DF da sociedade F.............S.A. - NIPC ………… a participação do sujeito passivo encontra-se registada por 5.000.000,00€, por contrapartida da conta de investimentos financeiros - Goodwill.

Releva-se que esta valorização não é repercutida nas DF das sociedades permutadas, as quais continuam a relevar o mesmo valor de capital próprio, com exceção do impacto, natural, da rubrica de resultado líquido do exercício e afetação do mesmo a resultados transitados ou reservas - vide Anexo 11.

É de realçar assim nesta operação de permuta, o impacto da valorização das participações, que determina que, o valor das novas partes sociais (recebidas), tenham um valor substancialmente superior ao valor das participações antigas (permutadas).

Ora, o regime especial de neutralidade fiscal aplicado à operação de permuta de partes sociais, desde a sua redação inicial determina, nos artigos 77.º n.º 1 do Código do IRC e 10.º n.º 8 do Código do IRS, um princípio basilar, que limita a obtenção de ganhos fiscais futuros por parte dos intervenientes:

“(…) [que] os mesmos continuarem a valorizar, para efeitos fiscais, as novas partes sociais pelo valor das antigas”

Ou seja, o efeito diretor, do conceito alargado de permuta presente no artigo 2.º alíneas d) da Diretiva 90/434/CEE do Conselho, de 23/7/1990, e simultaneamente, o entendimento do Tribunal de Justiça assente no artigo 11.° dessa Diretiva, que determina que cabe a cada Estado orientar o seu normativo para a limitação do aproveitamento fiscal desta norma, sob o escudo da reorganização/reestruturação empresarial, está presente nas normas referidas anteriormente - artigos 77.º n.º 1 do Código do IRC e 10.° n.º 8 do Código do IRS, quando se determina que se tem que continuar a valorizar, as novas partes sociais pelo valor das antigas.

Ora, a valorização efetuada das partes sociais antigas, por um valor que, sem colocar em causa a escolha do método e a correta aplicação do mesmo, ultrapassa aquilo que pode ser a racionalidade económica de uma operação no contexto em que a mesma se opera, por si, transgride um princípio orientador da aplicação do regime de neutralidade fiscal.

Isto é, na permuta, como em qualquer operação de fusão ou cisão, o legislador, determina que não pode existir alteração do valor dos ativos, quer estejamos perante partes sociais no caso de permuta, quer sejam ativos tangíveis, ou propriedades de investimentos, no caso das fusões ou cisões. A alteração de valor permite a criação de um ganho fiscal que se pretende evitar, o qual é complemente dispensável e irrelevante num contexto de reorganização / reestruturação empresarial. Na verdade, a reestruturação e reorganização do negócio, não se dá pela alteração de valor dos ativos, mas sim pelas sinergias, reafectação e captação de recursos e novas orientações de gestão, associadas à criação de um grupo empresarial, dirigido, eventualmente, por uma sociedade do tipo SGPS.

No caso em concreto, a valorização das participações revela-se uma operação desprovida de racionalidade económica, para além de em nada contribuir para atingir os objetivos pretendidos que subjazem ao regime especial de neutralidade fiscal - Reestruturação e Reorganização do negócio.

A primeira questão que se coloca é precisamente "Qual a racionalidade económica de revalorizar as ações das empresas detidas, quando estamos perante uma operação em que na verdade os detentores do capital de todas as empresas são os mesmos?” Apenas assistimos à alteração de uma participação direta para uma participação indireta através da criação da sociedade F............., S.A.

Aliás, a irracionalidade económica desta operação faz com que mesma só tenha sido possível concretizar, porque os decisores são os mesmos. Caso estivéssemos perante entidades independentes, como se podia aceitar receber uma participação cujo valor nominal é substancialmente inferior àquela que é permutada? - ainda que a suportar este negócio estivesse a avaliação de um perito independente e altamente credenciado. Em termos operacionais (reais) o valor da avaliação da participação tem como suporte uma parte significativa de subjetividade, que se traduz na expetativa de evolução do negócio de acordo com a tendência histórica da empresa. Este tipo de avaliação ainda que ponderada por fatores de risco não é consentânea com o ambiente de incerteza que assistimos nos mercados económicos, cada vez mais, influenciados por eventos internacionais imprevisíveis.

Vejamos de seguida como, num período temporal de 2010 a 2013, os resultados operacionais reais se afastam bastante dos que foram os resultados previstos, numa perspetiva de continuidade da evolução das empresas, e que sustentaram a avaliação das participações.

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Comparando os resultados estimados com os resultados que efetivamente foram alcançados, verifica-se a ocorrência de diferenças significativas entre os valores estimados e os valores reais, estando os valores estimados bastante sobrevalorizados.

Para além de não se encontrar qualquer nexo de racionalidade económica entre a avaliação das participações e a reorganização do negócio, vislumbra-se, para os intervenientes uma razão fiscal que se traduz numa evidente diminuição do resultado fiscal na alienação das partes sociais detidas.

Vejamos.

Da apreciação dos negócios em causa, concluímos que estamos perante o desenvolvimento de atividades comerciais cujo conceito da “marca” impera para a determinação do valor intrínseco de cada negócio. E tal como é enfatizado no próprio relatório de avaliação, o desenvolvimento destes negócios mede-se pelo número de lojas abertas nos centros comerciais. Assistimos por isso a atividades cujos gastos de maior relevância na estrutura empresarial são sem dúvida os gastos associados à cedência do espaço, sobrepondo-se a qualquer estratégia de reorganização ou reestruturação empresarial, na medida que não é possível racionalizar tais encargos com a criação de uma lógica de grupo empresarial.

Mas mais, o acompanhamento do nível dos resultados operacionais alcançados, perante a expetativa de crescimento do negócio, só poderá ser feita através da entrada de novos capitais. Atendendo à forma como a operação de permuta foi desenhada, não se tendo verificado qualquer aumento de capital, apenas a realização de suprimentos pontuais efetuados após o exercício de 2010, vislumbra-se a necessidade de entrada de novos investidores. Por outro lado, a excessiva valorização do capital das sociedades SGPS e a forma como este se encontra dividido, possibilita ao sujeito passivo e aos restantes intervenientes nesta operação, a alienação de partes sociais, com um reduzido, ou até nulo, resultado fiscal.

A segunda questão, que se levanta é “Qual a necessidade de efetuar uma revalorização, como aquela a que assistimos das participações sociais, para atingir os objetivos de reestruturação e reorganização empresarial?"

A este propósito foi o sujeito passivo, bem como a sociedade F............., S.A. - NIPC ………………. notificados (N/ Ofícios 41221 e 41225, ambos do dia 16/06/2014 in Anexo 5) para apresentar as razões económicas que presidiram à realização das operações de permuta.

Em resposta, foi referido que "as razões económicas que presidiram à realização da operação constam dos relatórios da avaliação efetuados às Sociedades G............., S.A., H.............., S.A., I.............., S.A. (…)”

Logo no ponto 1 destes relatórios, denominado por “Introdução” é referido que "pretendem os sócios, com a concentração e/ou detenção indireta das suas participações nas sociedades operacionais existentes, principalmente atingir os seguintes objetivos".

- Capturar as sinergias de natureza operacional, administrativa e funcional do potencial de integração e partilha dos recursos das sociedades

- Otimizar os fluxos financeiros entre as sociedades decorrentes da relação de grupo

- Reduzir custos de funding, aquisição de equipamentos e serviços por via da capacidade da negociação agregada

- Reinvestir resultados na expansão da atividade das sociedades ou em novos de negócios de forma eficiente

- Apropriar o valor acionista imputável à gestão integrada dos negócios das sociedades

- Cristalizar o valor económico atual das sociedades

- Separar a gestão operacional do processo de criação de valor acionista

- Proteger as sociedades das vicissitudes pessoais dos acionistas

- Preparar o grupo para uma eventual entrada em bolsa.

Segue-se a esta introdução, o desenvolvimento do método de avaliação, sendo que em parte alguma, e ainda que notificado para explicar e comprovar estas operações, é explicado como se pretende operacionalizar esta reestruturação do negócio. Pela forma como é exposto parece que tal decorre do "milagre" da revalorização das partes sociais.

Com vista à observação integrada e concreta dos negócios apresentados, numa lógica de reestruturação empresarial e tendo como pano de fundo os objetivos apresentados pelos acionistas, procedeu-se à análise da atividade das sociedades envolvidas, a qual abarcou o período de 2010 a 2013, e em algumas situações estendeu-se até ao exercício de 2014. Vejamos:

(a) Sobre a captura de sinergias de natureza operacional, administrativa e funcional do potencial de integração e partilha dos recursos das sociedades, otimização dos fluxos financeiros entre as sociedades decorrentes da relação de grupo e redução dos custos de funding, aquisição de equipamentos e serviços por via da capacidade da negociação agregada

A sociedade F............., S.A. - NIPC ……………. detêm controlo maioritário sobre as sociedades G............., S.A. - NIPC …………., I.............., S.A. - NIPC ……………. e H.............., S.A. - NIPC ……………., suas participadas, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro - referencial normativo que faz emergir um novo conceito de sociedade - as SGPS, ao qual são atribuídos benefícios fiscais, munindo estas sociedades de motivação, para além a económica, para o exercício de uma atividade com capacidade para dinamizar as organizações que integram.

Assim, constitui, em teoria, a sociedade F............., S.A. - NIPC ……………. entidade jurídica especializada na tomada de participações e seu posterior acompanhamento, supervisão e controlo das empresas participadas, no sentido de um favorecimento de certa unidade e constância na direção das várias empresas, proporcionando uma adequada orientação dos investimentos a realizar, bem como, uma racional angariação e colocação de meios financeiros, em busca de equilíbrio entre necessidades reais de certas empresas e excessos de outras.

Todavia, conforme análise da demonstração de resultados da F............., S.A. - NIPC …………….., esta sociedade não apresenta qualquer atividade. O que influencia os resultados operacionais e líquidos são os ajustamentos decorrentes da aplicação do MEP (método da equivalência patrimonial), relativamente às participações detidas nas sociedades G............., S.A. - NIPC …………….., I.............., S.A. - NIPC ………………. e H.............., S.A. – NIPC ……………...

Também, atente ao poder dominante da F............., S.A. - NIPC ……………., e decorrente da análise das respetivas demonstrações financeiras, as relações com as sociedades participadas são pouco expressivas, não havendo evidência de efeitos sinérgicos, economias de escala e outras vantagens que trarão benefícios comuns ao grupo empresarial. Relevando-se, neste âmbito, o facto de os CMVMC (Custos das matérias vendidas e matérias consumidas), FSE (Fornecimentos e serviços externos) e Gastos com pessoal, centrados exclusivamente nas sociedades participadas, têm grande expressão, sem oscilação nos períodos analisadas 2010 a 2013.

Face ao exposto é adequado concluir, que por si só, a criação da sociedade F............., S.A. - NIPC ……………. não permitiu a captura das sinergias de natureza operacional, administrativa e funcional do potencial de integração e partilha dos recursos das sociedades, bem como a redução dos custos de funding, aquisição de equipamentos e serviços por via da capacidade da negociação agregada. Releva-se mais uma vez, que na realidade os gastos que interferem de forma determinante nos resultados da empresa, não são possíveis de racionalizar pela criação de uma estrutura de grupo. Mas ainda que seja defensável, o que não se comprovou, reduzir alguns custos pela capacidade de negociação, questiona-se onde está a necessidade de revalorizar as participações num valor que não se coaduna com a realidade das empresas.

(b) Sobre o reinvestimento dos resultados na expansão da atividade das sociedades ou em novos negócios de forma eficiente e apropriar o valor acionista imputável à gestão integrada dos negócios das sociedades

Conforme é evidente pela análise das DF da sociedade F............., S.A. não existe uma dinâmica de gestão de fundos próprios ou alheios na expansão da atividade da sociedade ou na criação de novos negócios, ainda que no período de 2010 a 2014 se tenha verificado o investimento pontual em novos mercados.

Isto é, não se assiste a uma canalização de resultados das participadas para a F............., S.A. Esta mesma empresa não se serve do valor elevado da sua participação para se financiar no mercado ou captar novos investidores. Não existe uma movimentação de capitais, ou uma dinâmica financeira que se coadune com a participação valorizada em 20.000.000,00€.

Aliás, releva-se que os financiamentos registados nas DF desta entidade tem origem em acordos de cessão de suprimentos e prestações suplementares efetuados aquando da operação de permuta, tal significa que hão correspondem à entrada de capital mas à simples transferência de créditos.

Não se descorou nesta abordagem, que na análise efetuada entre o período de 2010 e 2014, tenha existido por parte da F............., S.A. - NIPC ……………, ainda que de valor pouco significativo, investimentos em novos mercados:

- A sociedade F............., S.A. - NIPC ………….. investe no mercado Espanhol no exercício de 2014 com a aquisição de uma sociedade - "………………, S.L.U”. O investimento cifra-se em 1.046 000,00€, e decorre exclusivamente de fundos canalizados de forma reiterada das outras sociedades, conforme a sua disponibilidade financeira, o que está comprovado pela análise documental da conta corrente 121 - Conta BPI - Anexo 12.

Ou seja, ainda que tenhamos assistido investimentos em novos negócios, estes não são sustentados por uma dinâmica financeira que tenha florescido com a revalorização das partes sociais. Assistimos sim, a uma reafectação de fundos gerados nas sociedades que pela lógica de grupo se encontra facilitada, mas que em ponto algum se encontra espelhado os benefícios económicos da valorização das participações na lógica de reestruturaçâo/reorganização empresarial conduzida por estes intervenientes.

(c) Sobre a separação da gestão operacional do processo de criação de valor acionista;

Para as empresas criarem valor aos acionistas, as estratégias empresariais devem concentrar-se no crescimento da empresa. Sendo que, na ótica das sociedades gestoras de participações sociais, o crescimento depende do grau de diversificação do investimento e financiamento.

No caso em particular da sociedade F............., S.A. - NIPC …………….., este crescimento não se verificou. Relevando novamente que os movimentos nas DF desta entidade estão influenciados unicamente pela aplicação do MEP, não se tendo verificado a captação de novos investidores ou a obtenção de novas formas de financiamento. Aliás, esta sociedade financia a sua atividade com a disponibilidade de fundos das suas participadas, numa lógica de gestão quotidiana. Assistimos neste campo a uma gestão de fundos que não espelha qualquer sentido estratégico de crescimento, mas antes um crescimento “doméstico”, que em nada se coaduna com a revalorização efetuada.

Por outro lado, parece-nos que a “cristalização do valor económico das sociedades" não pode em si mesmo, ser um objetivo orientado para a reorganização e reestruturação empresarial, numa lógica crescimento empresarial, que sustenta a motivação legal de um regime de neutralidade fiscal.

Ainda, é de salientar que em ponto algum assistimos, sequer, a indícios, da prática da separação entre o valor da empresa e as vicissitudes pessoais dos acionistas. Os detentores do capital e os decisores, quer das participadas, quer da sociedade SGPS, são os mesmos no período em análise, sobre os quais impera relações familiares, ou de proximidade familiar.

Realça-se que em 2014, na sociedade F............., S.A. - NIPC …………., verificou-se um aumento de capital de apenas 500,00€, realizado, pelo sujeito passivo/acionista D…………. - NIF ……………….

Do exposto, e sem por em causa alguns benefícios que emergiram da lógica de grupo, verifica-se não haver uma visão de crescimento estratégico da sociedade que justifique a sobrevalorização das participações.

Por fim, não se assiste que a orientação que foi dada à reestruturação empresarial permita preparar o grupo para uma eventual entrada em Bolsa. Para além dos custos associados à Oferta Publica Inicial (OPI), que é um dos grandes entraves, importa salientar, que existem requisitos que são insuperáveis e que não se vislumbra nesta entidade. Um deles é a sustentação entre o valor económico e a dinâmica empresarial, que já de forma exaustiva se comprovou não existir, sendo que a revalorização das participações tornou ainda maior este fosso. Outro, é a estrutura acionista dispersa em vários acionistas (aponta-se para um número aproximado de pelo menos 20 acionistas), nas situações em análise temos o capital fortemente centrado num pequeno grupo de acionistas.

Da análise integrada efetuada, concluiu-se que a reestruturação do negócio, de acordo com aquilo que são as expetativas dos acionistas deverá passar indubitavelmente pela abertura do capital a novos investidores. A cristalização do capital social do grupo económico em valores tão elevados face à dinâmica apresentada e forma como o capital se encontra dividido facilita a alienação de partes de capital, com ganhos reais assegurados, mas cujo resultado fiscal se encontra fortemente limitado, ou até, anulado.

Face ao exposto é adequado concluir, que, ainda que se tenham verificado algumas vantagens decorrentes de uma visão de grupo empresarial, ficou provado que a forma como a operação de permuta foi concretizada, visou a obtenção de vantagens fiscais e não a reestruturação empresarial, violando o princípio basilar da neutralidade fiscal repercutido no Código do IRC e no Código do IRS, respetivamente nos artigos 77.º n.º 1 e 10.º n.º 8.

Isto é, independentemente das motivações económicas que poderiam estar subjacentes à operação de permuta, a revalorização das participações sociais conduz, pelo disposto no n.º 8 do artigo 10.° do Código do IRS (a contrario), à tributação das mais-valias fiscais que resulta desta operação, porquanto, o referido articulado determina que a exclusão de tributação só se verifica se, e só se: "os mesmos continuarem a valorizar, para efeitos fiscais as novas partes sociais pelo valor das antigas".

Com efeito, estamos perante a perda de neutralidade com a alteração do registo (valor) contabilístico das participações, porquanto, violou-se o princípio da continuidade (corolário da neutralidade) o qual impede o aproveitamento fiscal, acrescendo ainda a demonstração da ausência de motivações económicas subjacentes a esta operação.

III.2. APLICAÇÃO DA NORMA ESPECIAL ANTI-ABUSO PREVISTA NO N.º 10 DO ARTIGO 73.° DO CÓDIGO DO IRC

No âmbito do presente procedimento inspetivo comprovou-se assim não estarem reunidos os requisitos essenciais para a aplicação, à operação de permuta identificada, do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 77.° do Código do IRC e no artigo 10.° n.° 8 do Código do IRS atendendo a legislação em vigor à data dos factos.

Face ao exposto, procedeu-se, por aplicação da norma especial prevista no n.º 10 do artigo 77.º do Código do IRC à correção do imposto decorrente desta operação.

Sendo os intervenientes na operação de permuta pessoas singulares aplica-se para efeitos de tributação o disposto no n.º 8 do artigo 10.º do Código do IRS (a contrario).

Para determinação do resultado desta operação (mais-valia fiscal) aplicam-se as regras previstas no artigo 43.º do Código de IRS, conforme se demonstra seguidamente:

Valor de realização:

O valor de realização a considerar para o apuramento da mais-valia tributável corresponde, conforme preceituado na alínea a) do n.° 1 do artigo 44.° do Código do IRS, ao valor atribuído no contrato aos bens, que no caso em análise corresponde ao valor da participação recebida pelo sujeito passivo na sociedade permutante. Vejamos:

Quadro 14: Valor de realização das partes de capital recebidas peio sujeito passivo na sociedade F............., S.A. - NIPC …………….

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Valor de aquisição:

O valor de aquisição constitui o valor nominal das participações permutadas pelo sujeito passivo nas sociedades adquiridas (G............., S.A. - NIPC ……….., I.............., S.A. - NIPC ………. e H.............., S.A. - NIPC …………..), de acordo com a alínea b) do artigo 48.° do Código do IRS. Vejamos:

Quadro 15: Valor de aquisição (valor nominal) das partes de capital permutadas pelo sujeito passivo nas sociedades G............., S.A. - NIPC ………………., I.............., S.A. - NIPC …………… e H.............., S.A. - NIPC …………….. (sociedades adquiridas)

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Mais-valia:

Nos termos determinados no n.º 1 do artigo 43.° do Código do IRS, o rendimento qualificado como mais-valia corresponde ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano.

Por outro lado, à luz da alínea a) do n.° 4 do artigo 10.° do Código do IRS, o ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição. Vejamos:

Quadro 16: Determinação da mais-valia tributável resultante da permuta das partes sociais das sociedades G............., S.A. - NIPC …………….., I.............., S.A. - NIPC …………….. e H.............., S.A. - NIPC ……………… por uma participação na F............., S.A. - NIPC ………….

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Aplicação da taxa especial prevista no artigo 72.° do Código do IRS:

Nos termos da alínea b) do n.° 3 e do n.° 5 do artigo 22.° e do n.° 4 do artigo 72.°, ambos do Código do IRS, às mais-valias apuradas resultante da operação de permuta de partes sociais em análise, são tributadas à taxa especial de 10%.

Por conseguinte, propõe-se correção à coleta do Imposto pelo montante do produto da taxa especial às mais-valias apuradas, no valor de 495.938,70€, conforme seguidamente se demonstra:

Quadro 17: Apuramento da correção à coleta

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[…]

IX. DIREITO DE AUDIÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO

IX.1. NOTIFICAÇÃO EFETUADA

Através do N/ Ofício n.º 79961, de 12/12/2014 - RC 8591 1670 3 PT (in Anexo 13) foi o sujeito passivo A.............. - NIF ……………, notificado para, querendo, exercer o direito de audição sobre o projeto de relatório de inspeção. Direito esse que veio a ser exercido, por escrito, cuja entrada, sob o n.º 2014E004914218, se deu nesta Direção de Finanças de Lisboa a 31/12/2014, assinado pelos Exm.ºs Sr.ºs Mandatários K.............. e M………………- vide Anexo 14.

IX.2. ANÁLISE DA ARGUMENTAÇÃO EXPENDIDA

Da análise das alegações do sujeito passivo no exercício do direito de audição, evidenciam-se duas questões essenciais na abordagem dos factos e fundamentos que sustentam às correções propostas:

Primeira: O sujeito passivo, não se pronuncia sobre a questão nuclear que conduziu à tributação da operação de permuta efetuada, que se centra na revalorização das partes sociais, o que pelo disposto no a n.º 8 do artigo 10.º do Código do IRS (a contrario), conduziu à tributação das mais-valias fiscais que resultaram desta operação.

E sobre este facto, refere o sujeito passivo que:

“(...) a inspeção Tributária entende que a operação de permuta de partes sociais não preencheu os requisitos essenciais para beneficiar do regime especial de neutralidade fiscal, previsto no artigo 10° n.° 8 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (doravante "CIRS"), conclusão sobre a qual a Requerente não se pronuncia (…). Nosso sublinhado.

Segunda: Centra o sujeito passivo a sua defesa, tão somente no facto de "(...) nos termos do artigo 10° n.° 1 al. b) do CIRS, na redação em vigor à data dos factos, as mais-valias mobiliárias resultantes da alienação de ações detidas por mais de 12 meses se encontravam excluídas de tributação (…)”. Concluiu assim, que "(...) da conclusão a que chegou a Inspeção Tributária, no sentido de que a operação em apreço não seria afinal aplicável o regime de neutralidade fiscal, não pode retirar a consequência que a mais-valia tributável, que assim se considera realizada na data da operação, se encontrava então sujeita a tributação em sede de IRS (…)”

Isto é, numa abordagem simplista aos argumentos despendidos pelo sujeito passivo, concluímos que este pretende agora desprezar o negócio que foi efetuado, transformando-o num simples negócio de alienação de ações, para que desta forma pudesse aproveitar a exclusão de tributação das mais-valias previstas na al. b) do n.º 1 do artigo 10? do Código do IRS.

Ora, a análise efetuada versa sobre o negócio de permuta de partes sociais, formalmente efetuado e comunicado pelos intervenientes a estes Serviços, e não sobre um negócio de alienação de partes sociais, cujos termos e efeitos fiscais, são de facto diferentes.

Recordamos que os procedimentos inspetivos conduzidos por estes Serviços, resultaram do facto do sujeito passivo, em cumprimento do disposto no artigo 57.º n.º 1 al. b) do Código do IRS, ter procedido à entrega da declaração referente a operação de permuta de partes sociais, na qual foi interveniente e a declaração da sociedade adquirente relativa à posse da maioria dos direitos de voto na sociedade adquirida pós operação de permuta, nos termos definidos na primeira parte do n.° 5 do artigo 73.°, conforme determina o n.° 6 do artigo 78.°, ambos do Código do IRC, no sentido de comprovar a aplicação do regime especial de neutralidade fiscal, pretendendo desta forma o afastamento da tributação da mais-valia resultante da operação de permuta de partes sociais, previsto no artigo 77.° n.° 1 do Código do IRC, e corporizado no Código do IRS, no artigo 10.° n,° 8.

Releva-se que, conforme determina o artigo 57.° n.° 1 al. b) do Código do IRS, sempre que se verifique a exclusão de tributação prevista no n.° 8 do artigo 10.° do Código do IRS, os sujeitos passivos devem juntar declaração que descreva a operação, elaborada nos termos do artigo 78.° do Código do IRC (redação à data), e mais, devem fazer a demonstração do cálculo da mais-valia a tributar caso não se aplique o regime especial de neutralidade fiscal.

E a todos estes preceituados foi dado cumprimento por parte do sujeito passivo, inclusivamente a demonstração do resultado da operação. Porém, face às características particulares da operação em causa, tais documentos foram remetidos para estes serviços de inspeção, no sentido de verificar se estavam reunidos os requisitos essenciais previstos nos referidos articulados, para que a esta operação fosse aplicável o regime especial de neutralidade fiscal, conforme pretendido pelo sujeito passivo.

Aliás, a prova de que o sujeito passivo tinha consciência de que o negócio de permuta e o negócio de alienação de ações, seguem em termos fiscais, regras diferentes, é que em 23/09/2010, celebra com os mesmos intervenientes o negócio de alienação das ações da sociedade J.............., S.A. - NIPC ……………….

O negócio de permuta de partes socais e o negócio de alienação de partes sociais, são de facto negócios para efeitos fiscais distintos, e tal revê-se desde logo nos requisitos formais que o primeiro tem que respeitar, para que possa aproveitar o regime de exclusão de tributação previsto no n.° 8 do artigo 10.° do CIRS.

Mas mais, o regime de exclusão de tributação das mais-valias decorrentes da permuta de partes sociais, previsto no n.° 8 do artigo 10.° do CIRS é anterior ao regime de exclusão de tributação na alienação de partes sociais, o qual apenas surge pela redação do Decreto -Lei 228/2002, de 31 de Outubro, com efeitos a 1 de janeiro de 2003, no n.º 2 do referido artigo 10.°. E mais, a Lei 15/2010, de 26 de janeiro revoga o n.° 2 do artigo 10.°, mas continua em vigor, sem qualquer alteração o n.° 8.

Ora, desde sempre em termos fiscais a permuta de partes sociais e a alienação de partes sociais teve um enquadramento diferente. E o legislador, deixou tal bem patente na redação do artigo 10.° do Código do IRS, quando autonomizou a permuta e a alienação.

Aliás a redação do próprio articulado não deixa dúvidas: o tratamento fiscal (requisitos formais e regras de tributação) da permuta de partes sociais, pelas particularidades inerentes a tal negócio foi particularizado e autonomizado da simples alienação de partes sociais:

Artigo 10.° n.° 2 do Código do IRS, na sua redação à data dos factos (anterior à entrada em vigor da Lei n. ° 15/2010 - 25/07:

“Excluem-se do disposto no número anterior as mais-valias provenientes da alienação de: (Redação do Decreto-Lei n.° 228/2002, de 31 de Outubro).

a) Acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses (Aditada peto Decreto-Lei n.° 228/2002, de 31 de Outubro). Produz efeitos a partir de 1/1/2003.

Nosso negrito e sublinhado

Artigo 10.° n.º 8 do Código do IRS, na sua redação à data dos factos (anterior à entrada em vigor da Lei n.º 15/2010 - 26/07):

No caso de se verificar uma permuta de partes sociais nas condições mencionadas no n.° 5 do artigo 67.° e n.° 2 do artigo 71.° do Código do IRC, a atribuição, em resultado dessa permuta, dos títulos representativos do capital social da sociedade adquirente aos sócios da sociedade adquirida não dá lugar a qualquer tributação destes últimos se os mesmos continuarem a valorizar, para efeitos fiscais, as novas partes sociais pelo valor das antigas, determinado de acordo com o estabelecido neste Código, sem prejuízo da tributação relativa às importâncias em dinheiro que lhes sejam eventualmente atribuídas."

Nosso negrito e sublinhado

Pretende o sujeito passivo com a sua exposição, defender que, caso não se verifiquem os requisitos para beneficiar da exclusão de tributação prevista no n.° 8 do artigo 10.º do Código do IRS, então deve em seu entendimento beneficiar da exclusão prevista no n.° 2, indicando vária jurisprudência, a qual, salienta-se, decide sobre a aplicação ao tempo do disposto no n.° 2 do artigo 10° do Código do IRS. A jurisprudência junta pelo sujeito passivo incide apenas sobre negócios de alienação de partes sociais, suportados por contratos de compra e venda de ações.

Ora, face ao exposto, podemos concluir que, o que o sujeito passivo pretende, é mais do que uma interpretação extensiva da lei, suscitando que, ao abrigo do n.° 2 do artigo 10.° fiquem afastadas de tributação todas as mais-valias decorrentes de ações detidas há mais de 12 meses, independentemente de ter decidido efetuar à data, um negócio de permuta de partes sociais ao invés de um negócio de compra e venda de ações.

Ao contrário do que parece pretender o sujeito passivo, o n.° 8 do artigo 10° do Código do IRS não regula apenas os requisitos gerais da neutralidade fiscal, os quais se encontram previstos no n.° 5 do artigo 73.° e n.° 1 do artigo 77.º do Código do IRC, é mais do que isso, garante a transposição do corolário da neutralidade, o qual impede o aproveitamento fiscal deste tipo de operação, e que determina que este negócio de permuta de partes sociais seja tratado à luz do normativo fiscal de forma distinta de um simples negócio de alienação de partes sociais.

Concluímos assim, que reforçada a natureza do negócio em causa, e atendendo a toda a fundamentação exposta no relatório, sobre o qual o requente não se pronuncia e enaltecendo mais uma vez que, no caso em concreto - permuta de partes sociais, a exclusão de tributação só se verifica nos termos do n.°8 do artigo 10.° do Código do IRS, se, e só se:

“os mesmos continuarem a valorizar, para efeitos fiscais as novas partes sociais pelo valor das antigas”.

Com efeito, concluímos pela perda de neutralidade com a alteração do registo (valor) contabilístico das participações, porquanto, se encontra demonstrado a violação do princípio basilar da neutralidade, o qual impede o aproveitamento fiscal.

IX. 3. CONCLUSÃO

Face ao exposto mantém-se as correções propostas, de acordo com os fundamentos e os termos previstos no capítulo III deste relatório.

Para efeitos de concretização das correções, procedeu-se ao preenchimento do respetivo Documento de Correção Único.

[…]»

(provado por documento, de fls. 41 a 63 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

o) Em resultado do relatório de inspeção tributária identificado na alínea anterior, à Impugnante foi emitida, em 19-01-2015, a liquidação de IRS n.º 2015 5000006689, relativa aos rendimentos de 2010, da qual resultou um valor a pagar de €1.289.373,45 e onde se pode ler:

[IMAGEM]

(provado pelo documento n.º 1 junto à petição inicial);

p) Na sequência da liquidação acima identificada, à Impugnante foi ainda emitida a liquidação de juros compensatórios n.º 2015 00000008447, no total de €135.207,79 (provado pelo documento n.º 2 junto à petição inicial);

q) Foi emitida a demonstração de acerto de contas n.º 2015 00001085509, com um saldo a pagar de €1.126.985,19, até 02-03-2015, onde se pode ler o seguinte:

[IMAGEM]


r) Em data que o Tribunal não consegue determinar com exatidão, mas que terá ocorrido entre 19-01-2015 e, no máximo, em 02-02-2015, a Impugnante foi notificada dos atos de liquidação identificados nas alíneas o) e p) do probatório;

s) Pelo menos, em 10-02-2015, a Direção de Finanças de Lisboa detetou que à Impugnante foi emitida liquidação «que não estava em conformidade com a correção determinada no relatório inspetivo – erro na aplicação da taxa especial prevista no n.º 4 do art.º 72.º do Código do IRS» e solicitou à Direção de Serviços de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares «a correção da liquidação» (provado por documento, a fls. 181 do processo administrativo tributário, apenso aos autos);

t) Na sequência do exposto na alínea anterior, à Impugnante foi emitida, em 13-02-2015, a liquidação de IRS n.º 2015 5000025649, relativa aos rendimentos de 2010, da qual resultou um valor a pagar de €725.873,31 e onde se pode ler:

[IMAGEM]

(provado pelo documento n.º 4 junto à petição inicial);

u) Na sequência da liquidação acima identificada, à Impugnante foi ainda emitida a liquidação de juros compensatórios n.º 2015 00000055054, de acordo com a qual foram calculados juros no total de €67.602,99 (provado pelo documento n.º 5 junto à petição inicial);

v) Em 27-02-2015, foi emitida a demonstração de acerto de contas n.º 00002668758, onde se pode ler o seguinte:

[IMAGEM]

(provado pelo documento n.º 6 junto à petição inicial);

w) Em data que o Tribunal não consegue determinar com exatidão, mas que terá ocorrido entre 19-01-2015 e, no máximo, em 06-05-2015, a Impugnante foi notificada dos atos de liquidação de IRS n.º 2015 5000025649 e de juros compensatórios n.º 2015 00000055054, referentes ao período de 2010;

x) Em 29-05-2015, a Impugnante efetuou o pagamento de IRS referente a 2010, no valor de €563.485,05 (provado pelo documento n.º 13 junto à petição inicial).

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Com interesse para a decisão da causa, inexistem factos não provados.

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A decisão da matéria de facto assenta na análise dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo tributário apenso, nomeadamente das informações oficiais e dos documentos juntos, conforme referido a propósito de cada alínea da matéria de facto provada.

No que se refere às alíneas r) e w) dos factos provados, a data em que a Impugnante foi notificada foi determinada de acordo com o alegado pela mesma, nos artigos 28.º e 31.º da petição inicial.

Isto porque, para a prova dessas notificações, a AT limita-se a juntar print retirado do seu sistema informático interno, do qual consta a menção à data de emissão, a um número de registo postal para uma «D. Compensação –Nota» n.º 2015 1085509 e «D. Liquidação –Sem doc. Cobrança» n.º 2015 2668758 (cfr. fls. 195 a 204 do processo administrativo tributário apenso aos autos). Estes prints somente indicam o número e a data do registo postal. E juntou ainda os prints da base de dados pública dos Correios de Portugal (cfr. fls. 195 a 204 do processo administrativo tributário apenso aos autos).

Como a jurisprudência tem repetido, não basta, para os efeitos visados, um mero print interno, processado pelos respetivos serviços da AT (Cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19-03-2015, proferido no processo n.º 07740/14.) . Esses prints não podem deixar de ser considerados como documentos elaborados pela própria AT, para efeitos internos, que não são oponíveis à Impugnante (Cfr. acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 23-03-2010, proferido no processo n.º 03499/09, de 14-03-2019, proferido no processo n.º 1061/07.7BELSB, de 30-09-2019, proferido no processo n.º 1325/10.2BESNT, e de 23-04-2020, proferido no processo n.º 404/06.5BECTB.).

Aliás, como é referido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no seu acórdão de 23-04-2020, proferido no processo n.º 404/06.5BECTB, «[n]o caso de notificação através de carta registada, tanto o «print» do sistema informático da administração tributária, como o «print» da base de dados dos CTT, não permitem saber se a notificação foi remetida para o correcto domicílio fiscal do contribuinte. Deste modo, tais documentos extraídos de sistemas informáticos da administração tributária e dos CTT são insuficientes para conduzir à prova da remessa da correspondência para a morada correcta»

De facto, são documentos manifestamente insuficientes para demonstrar de forma cabal e com segurança as referidas notificações, pois não provam a remessa dos respetivos ofícios, nem tão-pouco o seu recebimento (Cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11-03-2012, proferido no processo n.º 01181/13, e acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12-04-2013, proferido no processo n.º 01727/07.1BEPRT, de 27-02-2014, proferido no processo n.º 00076/11.5BEPRT.) Além de que nada garante que os prints juntos estejam em conformidade com os elementos com base nos quais os mesmos foram, alegadamente, elaborados.

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2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA e 2º, al. e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação, padece de erro de julgamento na parte em que considerou subsumível na alínea a) do nº 2 do artigo 10º do CIRS, as mais-valias apuradas com a permuta de acções detidas há mais de 12 meses, e nessa medida verificada a isenção de tributação, ocorrendo, desse modo, um insuficiente enquadramento jurídico - por não prefigurada diferenciação ontológica da exclusão tributária à luz do EBF - e de subsunção jurídica, mostrando-se violado o disposto nos arts. 2º do EBF, arts 10º, nº 2, alínea a) em virtude da remissão feita pela alínea a), do seu nº 1 e nº 8, todos do CIRS e 11º e 43º da LGT.
Vejamos.
Cumpre desde logo assentar em que os ganhos obtidos com a alienação onerosa de partes sociais constituem mais-valias (artigo 10.º1/b) do CIRS).
Apesar disso, ao tempo dos factos, não estavam tipificadas como mais-valias tributáveis a alienação de acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses, isso por força do disposto no artigo 10.º/2/ a) do CIRS na redacção emprestada pela lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro.
Por outro lado, há ainda a considerar que o contrato de permuta não tem, atualmente, regulamentação no Código Civil, sendo um contrato atípico inominado, oneroso, ao qual se aplicam, com as necessárias adaptações, as normas do contrato de compra e venda, atento o estatuído no artigo 939.º do CC como se plasmou no acórdão do STA de 06/06/2018-P. 082/18, citado pela sentença recorrida e pelo EPGA e disponível em www.dgsi.pt.
É da conjugação das antecedentes premissas, que cumpre determinar se o conceito de “alienação de ações” ínsito no artigo 10.º/2/ a) do CIRS abarca o negócio de permuta de acções, pois é essa a questão nuclear no presente litígio.
Isto posto.
Enfrentando a questão “Da ilegalidade dos atos de liquidação impugnados, por violação do disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS”, gizou-se na sentença o seguinte discurso fundamentador:
“(…)
Antes de mais, cumpre delimitar a questão ora em apreciação. Não é controvertido que as mais-valias em discussão nos presentes autos provêm de um negócio de permuta de ações, celebrado pela Impugnante.
As partes apenas dissentem na aplicação àquele tipo de negócios da exclusão de tributação de IRS prevista na alínea b) do n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS e se esta norma é aplicável ao caso dos autos, atendendo à sua revogação levada a cabo pela Lei n.º 15/2010, de 26 de julho.
Ora, é sabido que constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 75.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas («IRC»), seja considerado como mais-valia (Cfr. alínea b) do n.º 1 do art.º 10.º do Código do IRS, na redação então em vigor.).
No entanto, excluíam-se de tributação as mais-valias provenientes «da alienação de (…) [a]cções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses» (Cfr. alínea a) do n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de outubro.). No que releva para o caso dos autos, os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos atos que concretizam a alienação onerosa de partes sociais (Cfr. n.º 3 do art.º 10.º do Código do IRS.).
Neste tipo de situações, o ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso (Cfr. alínea a) do n.º 4 do art.º 10.º do Código do IRS.).
Ora, o contrato de permuta é um contrato atípico, inominado, oneroso, a que são aplicáveis com as devidas adaptações, as normas da compra e venda (art.º 939.º do Código Civil). Como é referido pelo Supremo Tribunal Administrativo, «[a] realidade que lhe está subjacente são duas compras e vendas recíprocas e de sinal contrário, de bens ou de direitos, em que a contraprestação não é dinheiro, mas sim o bem alienado pela contraparte integradas num mesmo contrato, um único acordo de vontades. A regulamentação própria do contrato de compra e venda não lhe é adequada quanto às regras que são efeito necessário da existência de preço, aqui inexistente» (Cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 06-06-2018, proferido no processo n.º 082/18.).
Acresce que, no caso de se verificar uma permuta de partes sociais nas condições mencionadas no n.º 5 do art.º 67.º e n.º 2 do art.º 71.º do Código do IRC, a atribuição, em resultado dessa permuta, dos títulos representativos do capital social da sociedade adquirente aos sócios da sociedade adquirida não dá lugar a qualquer tributação destes últimos se os mesmos continuarem a valorizar, para efeitos fiscais, as novas partes sociais pelo valor das antigas, determinado de acordo com o estabelecido neste Código, sem prejuízo da tributação relativa às importâncias em dinheiro que lhes sejam eventualmente atribuídas (Cfr. n.º 8 do art.º 10.º do Código do IRS, na redação então em vigor.).
O n.º 5 do referido art.º 73.º do Código do IRC, correspondente ao n.º 5 do art.º 67.º, na redação em vigor previamente à produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, que republicou aquele Código, estabelecia que se considera «permuta de partes sociais a operação pela qual uma sociedade (sociedade adquirente) adquire uma participação no capital social de outra (sociedade adquirida), que tem por efeito conferir-lhe a maioria dos direitos de voto desta última, ou pela qual uma sociedade, já detentora de tal participação maioritária, adquire nova participação na sociedade adquirida, mediante a atribuição aos sócios desta, em troca dos seus títulos, de partes representativas do capital social da primeira sociedade e, eventualmente, de uma quantia em dinheiro não superior a 10% do valor nominal ou, na falta de valor nominal, do valor contabilístico equivalente ao nominal dos títulos entregues em troca».
Em todo o caso, os sujeitos passivos deviam declarar a alienação onerosa das ações, ainda que detidas durante mais de 12 meses, bem como a data da respetiva aquisição (Cfr. n.º 11 do art.º 10.º do Código do IRS, na redação então em vigor.).
Por último, a Lei n.º 15/2010, de 26 de julho, veio a revogar o n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS e, bem assim, introduziu um regime de tributação das mais-valias mobiliárias à taxa de 20%.
A este respeito, o Pleno da Seção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo, no seu acórdão de 16-09-2015, proferido no processo n.º 01292/14, já defendeu que:
«I -O Código do IRS estabelece, de forma clara e expressa, que constituem mais-valias os ganhos obtidos com a alienação onerosa de partes sociais, e que tais ganhos se consideram obtidos no momento da alienação -artigo 10º, nº 1, al. b), e nsº 3 e 4. E sendo o ganho apurado nesse preciso momento –pela diferença entre o valor de realização e o de aquisição do bem transmitido –as mais-valias não podem deixar de reportar-se a cada ganho de per si.
II -Razão por que o facto tributário nasce e esgota-se no momento autónomo e completo da alienação e da realização das mais-valias, sendo, por isso, um facto tributário instantâneo e não um facto tributário complexo de formação sucessiva ao longo de um ano, pese embora o valor a considerar para a determinação da base tributável para efeitos de IRS seja o correspondente ao saldo anual apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano.
III -A Lei nº 15/2010, de 26 de Julho, é omissa no que toca ao estabelecimento de regras específicas quanto à sua aplicação no tempo, pois não contém qualquer norma que deponha sobre a sua aplicação temporal, limitando-se a prescrever que “A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação”. Razão por que se impõe aplicar a regra geral que rege a aplicação da lei fiscal substantiva no tempo, plasmada no artigo 12º da LGT.
IV -As mais-valias produzidas antes de 27/07/2010 com a alienação de acções detidas há mais de 12 meses continuam a seguir o regime de não sujeição que vinha determinado no nº 2 do CIRS anteriormente às alterações introduzidas pela Lei nº 15/2010 de 26 de Julho, e, como tal, não concorrem para a formação do saldo anual tributável de mais-valias a que se refere o artigo 43º do CIRS».
Sentido este reiterado no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 18-05-2016, em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, n.º 0784/15, cujo sumário aqui transcrevemos:
«I -As alterações introduzidas ao regime tributário das mais-valias mobiliárias pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho apenas podem aplicar-se aos factos tributários ocorridos em data posterior à da sua entrada em vigor (27 de Julho de 2010 –art. 5.º da Lei n.º 15/2010).
II -Nas mais-valias resultantes da alienação onerosa de valores mobiliários sujeitas a IRS como incrementos patrimoniais o facto tributário ocorre no momento da alienação (artigo 10.º n.º 3 do Código do IRS), sendo esse o momento relevante para efeitos de aplicação no tempo da lei nova, na ausência de disposição expressa do legislador em sentido diverso (artigos 12.º n.º 1 da LGT e do CC).»
Delimitado o regime aplicável, cumpre agora responder à questão de saber se a exclusão da tributação da alienação de partes sociais prevista na alínea a) do n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS inclui, ou não, a operação de permuta de partes sociais que não beneficie do regime especial de neutralidade fiscal previsto no n.º 8 do art.º 10.º do Código do IRS.
E, desde já, adianta-se que entendemos que a resposta terá de ser positiva, pelos seguintes motivos.
Em primeiro, a desoneração fiscal resultante da aplicação das normas do regime previsto no n.º 8 do art.º 10.º do Código do IRS, na redação então em vigor, visa estritamente garantir para as operações em causa a dita neutralidade fiscal, a qual, se não fosse alcançada, representaria uma injustificada penalização fiscal de atos que são fundamentais para a maximização da eficiência organizacional das empresas (e para a economia em geral), donde, tal regime especial de tributação não contém uma isenção de tributação, contendo apenas um deferimento para momento ulterior da tributação a que haveria lugar.
Assim sendo, caso a operação não possa beneficiar do referido regime, a tributação far-se-á de acordo com as normas gerais de incidência sobre ganhos obtidos que resultem da alienação onerosa de partes sociais, mais concretamente, a alínea b) do n.º 1 do art.º 10.º do Código do IRS. Isto, independentemente de, no processo de aplicação da norma especial anti abuso do n.º 10 do artigo 73.º do Código do IRC, na redação então em vigor, terem, ou não, sido trazidos ao procedimento elementos que permitam identificar a vantagem fiscal que a Impugnante pretendeu aceder através da realização da operação de permuta de ações ocorrida no caso dos autos, o que não é discutido pelas partes.
Ora, quer na norma de incidência de IRS da alínea b) do n.º 1, quer na alínea a) do n.º 2, ambas do art.º 10.º do Código do IRS, é utilizada a mesma expressão «alineação». De acordo com as regras de hermenêutica jurídica, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (Cfr. n.º 3 do art.º 9.º do Código Civil.), pelo que não poderia a alínea b) do n.º 1 sujeitar a tributação a operação de permuta de ações ocorrida no caso dos autos e a alínea a) do n.º 2 não a poderia excluir.
Segundo, o efeito real da transmissão do direito de propriedade tem como causa legítima a permuta, como teria como causa legítima a compra a venda se a Impugnante tivesse optado por este negócio.
Terceiro, o n.º 8 do art.º 10.º do Código do IRS não se aplica apenas às permutas de partes sociais, mas também às fusões, cisões e entradas de ativos, como tem vindo a ser decidido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, que sustenta que o regime fiscal comum estabelecido pela Diretiva Fusões se aplica indistintamente a todas as operações de fusão, cisão, entrada de ativos e de permuta de ações, independentemente dos seus fundamentos (Cfr. caso Leur Bloem, processo C-28/95.).
Por último, o n.º 11 do art.º 10.º do Código do IRS estabelece que, sem prejuízo do disposto no n.º 2 (e, portanto, da exclusão de tributação), os sujeitos passivos devem declarar a alienação onerosa das ações, ainda que detidas durante mais de 12 meses.
Nos termos e com os fundamentos acima expostos, concluímos que as mais-valias realizadas pela Impugnante na permuta de ações detidas há mais de 12 meses podiam beneficiar da exclusão de tributação prevista na alínea a) do n.º 2 do art.º 10.º do Código do IRS, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de outubro, anterior, portanto, à entrada em vigor da Lei n.º 15/2010, de 26 de julho.
Para tanto, seguindo a jurisprudência acima transcrita, perfilha-se ainda o entendimento de que as mais-valias produzidas antes de 27-07-2010, como é o caso dos autos, com a alienação de ações detidas há mais de 12 meses continuam a seguir o regime de não sujeição que vinha determinado no n.º 2 do art.º 10.º do Código IRS, antes das alterações introduzidas pela Lei n.º 15/2010, de 26 de julho.
Tendo os serviços da AT entendido de outro modo, os atos de liquidação impugnados enfermam do invocado vício de violação de lei, o que os torna, nessa parte, anuláveis, com as legais consequências.
Sendo, parcialmente, ilegais as liquidações de IRS impugnadas, são também, parcialmente, ilegais as respetivas liquidações de juros compensatórios (n.ºs 1 e 8 do art.º 35.º da LGT).”
O assim fundamentado e decidido merece a nossa inteira aprovação, na linha da jurisprudência deste STA que na bem elaborada sentença é apropriadamente citada.
Patenteia o probatório que a recorrida, para beneficiar do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 10.º/8 do CIRS, nos termos do disposto no artigo 57.º/1/b) do mesmo código, juntou declaração na qual descrevia a operação, elaborada nos termos do preceituado no artigo 78.º do CIRC, procedendo, outrossim, à demonstração do cálculo da mais-valia a tributar, para o caso de não se aplicar o regime especial de neutralidade fiscal.
Sucede que no caso de permuta de partes socias, o diferimento de tributação só se verifica, nos termos do artigo 10.º/8 do CIRS, se os sócios da sociedade adquirida ”continuarem a valorizar, para efeitos fiscais, as novas partes socias pelo valor das antigas”.
Vale isto por dizer que o regime da neutralidade fiscal acarreta o diferimento da tributação para momento posterior, tudo se passando, na prática, como se a operação de reestruturação não tivesse ocorrido.
Explicitando: a transferência das participações sociais não gera qualquer tributação de mais-valias, e a mesma só ocorrerá no momento da efectiva realização, ou seja, com a alienação dessas partes sociais a terceiros.
No entanto, por força da cláusula sectorial anti abuso consagrada no artigo 73.º/10 do CIRC, a qual abarca as operações de reestruturação empresarial, apurando-se uma situação de abuso, o diferimento da tributação é negado, procedendo-se à aplicação das normas de incidência normais, com a consequente tributação das mais-valias decorrentes da transmissão de elementos patrimoniais.
Aplicando tais ditames ao caso sub judice, dado que não estavam verificados os pressupostos para a impugnante/recorrida beneficiar do regime de neutralidade fiscal estatuído no artigo 10.º/8 do CIRS, uma vez que ocorreu a efectiva transmissão de partes sociais e apuradas mais-valias, tinha de se aplicar o regime normal de incidência de tributação previsto no artigo 10.º/1/b) /2/a) do mesmo Código, pelo que as acções transmitidas e detidas pela impugnante/recorrida por mais de 12 meses estão excluídas de tributação, nos termos do instituído no artigo 10.º/2/ a) do CIRS, já que é incontroverso, nos termos assertivamente abordados na sentença, que o contrato de permuta outorgado determinou a sua alienação nos termos e para os efeitos desse mesmo preceito legal.
Por assim ser e na esteira do douto Parecer do Ministério Público, não granjeia acolhimento a censura que a Recorrente indigita à hermenêutica seguida pela sentença dado que não reveste a imprescindível correspondência na letra da lei e no espírito do legislador.
Na verdade, é isento de dúvidas que o contrato de permuta de acções configura uma “alienação onerosa de partes sociais” e nessa medida subsumível na alínea b) do nº1 do artigo 10º do CIRS.
Acresce que a alínea a) do nº2 do artigo 10º do CIRS excluía da tributação a “alienação de ações detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses”, o que, como bem se demonstra na sentença abrange a permuta de acções e não apenas a sua compra e venda pois se o legislador pretendesse restringir a isenção a esta forma de alienação, assim o teria declarado.
É por demais manifesto, como salienta o Ministério Público, que a Recorrente perfilha uma interpretação restritiva do âmbito da referida norma porquanto “a alínea a) do nº2 limita-se a excluir da tributação da “alienação onerosa de partes sociais“ a “alienação de ações detidas…durante mais de 12 meses”, ou seja, um tipo de “partes sociais”, respeitado o requisito temporal de manutenção da titularidade.
Por outro lado também não se descortina em que termos a interpretação feita pelo tribunal “a quo” conflitua com o regime previsto no nº8 do mesmo preceito legal (art.10º do CIRS). Na verdade, para além dos diversos âmbitos e enquadramentos das duas normas em questão, a isenção prevista na alínea a) do nº2 respeita apenas a “ações”, enquanto o nº8 respeita a “partes sociais”, ou seja, não têm a mesma abrangência.”
Evoca-se, com pertinência, o ensinamento de José Guilherme Xavier de Basto, a propósito do regime previsto no nº8 do artigo 10º do CIRS (in “IRS- Incidência real…”, Coimbra Editora, 2007, pag.422), «o regime de exclusão é, pois, em última análise, um regime de diferimento no tempo da imposição» (…).
Em nota de rodapé, reforça o mesmo doutrinador que «se se tratar de ações, claro que, em qualquer caso, as mais-valias só seriam tributáveis se tivessem sido detidas pelo seu titular por não mais de 12 meses, como resulta da alínea b) do nº2 do artigo 10º», mais aditando que o disposto no nº8 do artigo 10º sempre ressalva desta exclusão de tributação as quantias recebidas em dinheiro (segmento final da norma), porque neste caso não há motivo para a não tributação imediata, porque “a lei como que supõe que a quantia em dinheiro recebida constitui, toda ela, uma mais-valia suplementar, que terá que ser tributada agora, sob pena de não poder ser captada quando da ulterior transmissão onerosa» (das partes sociais). Mas mesmo neste caso, se as participações objeto de permuta respeitarem a ações, a operação sempre está coberta pela isenção prevista na alínea b) do nº2 do artigo 10º do CIRS.
Assim, na letra de lei, plasmada naquele artigo 10.º, n.º2 do CIRS, cabe a alienação de acções efectuada por permuta pois, conforme expendido no acórdão do STA, de 06/06/2018, tirado no Processo n.º2082/18, “O contrato de permuta não tem actualmente regulamentação no Código Civil, apresentando-se como um contrato atípico, inominado, oneroso, a que são aplicáveis, com as devidas adaptações, as normas da compra e venda - artigo 939º -. Será talvez o mais antigo contrato estabelecido entre humanos desde tempos imemoriais em que, na ausência de dinheiro, apenas a troca de bens permitia obter o que o outro possuía e nos faltava. Guardou essa característica de troca de bens que o Código de Seabra tipificou no artigo 1592º com a designação de “escambo” ou “troca”, apresentando-se actualmente com um uso renovado ao nível do mercado imobiliário. A realidade que lhe está subjacente são duas compras e vendas recíprocas e de sinal contrário, de bens ou de direitos, em que a contraprestação não é dinheiro, mas sim o bem alienado pela contraparte integradas num mesmo contrato, um único acordo de vontades. A regulamentação própria do contrato de compra e venda não lhe é adequada quanto às regras que são efeito necessário da existência de preço, aqui inexistente.”
Destarte e na consideração de que os efeitos da permuta são os efeitos da compra e venda, quer obrigacionais quer reais, e que não se coloca em dúvida nestes autos que o contrato tenha sido cumprido na data da sua celebração, apesar de nada se dizer quanto à entrega dos títulos, a AT aceita que na data do contrato se deu a transmissão, e em face de tudo o que vai dito, teremos de concluir que se deu a alienação das acções detidas pelo aqui impugnante, sendo possível desta forma também concluir que as mais-valias decorrentes do contrato celebrado, cabem na letra da lei, em concreto no vocábulo “alienação” que o legislador escolheu para verter na norma do artigo 10.º, n.º2 do CIRS.
Em reforço, adita-se que se a norma de incidência a que a AT lançou mão foi a norma do artigo 10.º, n.º1, do CIRS, onde, no seu texto, mais não se encontra do que a previsão normativa da tributação de alienação de partes sociais, nada se dispondo, especificamente, sobre a permuta, é indevido buscar na letra da lei, no mesmo artigo, mas no n.º2, para a exclusão da tributação, a previsão específica da alienação por permuta, quando tal especificação, não se encontra na própria norma de incidência.
Em suma:- se o legislador fixou a tributação das mais-valias obtidas com a permuta de acções recorrendo ao conceito de alienação, não é expectável, que na mesma norma, utilizasse a mesma expressão com sentido que pretendesse ficar aquém daquele e onde não pretenda incluir a mesma realidade, assim se as mas valias provenientes da permuta de acções cabem no vertido na alínea b) do n.º1 do artigo 10.º, cabem igualmente no seu n.º2.
Nessa rota, chama-se de novo à colação o Ac. do Pleno desta Secção do STA de 16.09.2015, Processo nº 01292/14, em que também se ancora a sentença recorrida, mais especificamente o seguinte bloco fundamentador:
“(…)
Posto isto, a questão que importa passar a conhecer é a da aplicação da lei no tempo, isto é, a de saber qual a lei aplicável aos ganhos obtidos com a alienação de acções ocorrida em 30/03/2010 [nos caso que dos autos, em 31 de Maio de 2010] e detidas pelo seu titular por mais de 12 meses, tendo em conta que nesse momento estava em vigor o artigo 10º, nº 2, al. a), do CIRS, segundo o qual “excluem-se do disposto no número anterior (Isto é, excluem-se do nº 1 do art.º 10º do CIRS, que prevê a sujeição a IRS dos ganhos (mais-valias) obtidos com a alienação onerosa de partes sociais.) as mais-valias provenientes da alienação de: acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses», mas que essa norma foi revogada pelo artigo 2º da Lei nº 15/2010, de 26 de julho.
Esta Lei nº 15/2010 é omissa no que toca ao estabelecimento de regras específicas quanto à sua aplicação no tempo, pois não contém qualquer norma que deponha sobre a sua aplicação temporal, limitando-se a prescrever que “A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação”. O que não pode deixar de representar uma opção silente do legislador no que toca a essa matéria, até porque essa problemática, da aplicação no tempo das alterações legislativas que o diploma veio introduzir na tributação das mais-valias, foi colocada e discutida no quadro do debate parlamentar que precedeu a aprovação desta Lei.
Ora, tendo o legislador optado por não disciplinar essa matéria, limitando-se a determinar a data da entrada em vigor do diploma no dia seguinte ao da sua publicação, sem estabelecer qualquer norma que permitisse a sua aplicação a um período tributário anterior, impõe-se, necessariamente, aplicar a regra geral que rege a aplicação da lei fiscal substantiva no tempo, plasmada no artigo 12º da LGT, sendo insustentável afastar tal regra ou princípio geral com o argumento de que existirão elementos históricos e genéticos que permitem inferir que o legislador terá pretendido que a lei nova se aplicasse a todas as transmissões realizadas no ano de 2010. É que ainda que fosse essa a vontade inicial do legislador, o certo é que acabou por não a expressar e conformar no texto legislativo, e tal conduz, necessariamente, à aplicação do princípio geral sobre a aplicação da lei tributária no tempo, segundo o qual as normas tributárias se aplicam apenas aos factos posteriores à sua entrada em vigor.
Razão por que consideramos que a lei aplicável é a vigente na data da ocorrência do facto tributário instantâneo gerador. E não há, no caso, qualquer dificuldade em situar esse facto no tempo, dado que a alienação é datada (30/03/2010) [in casu, em 31 de Maio de 2010], nem há qualquer questão que se coloque quanto ao princípio da progressividade do imposto, já que a consequência da aplicação do artigo 12º nº 1 da LGT é a não consideração das mais-valias em questão para efeitos de liquidação do imposto.
Assim sendo, também no que diz respeito a esta questão, de saber se a liquidação em análise respeitou as regras de aplicação da lei tributária no tempo consignadas no artigo 12º da LGT, se subscreve a argumentação jurídica tecida no acórdão fundamento.
E por todo o exposto julgamos ser claro que, no caso, ocorreu a aplicação de lei nova a factos tributários de natureza instantânea já completamente formados em momento anterior à data da sua entrada em vigor, o que envolve uma retroactividade autêntica, porquanto o que para esse efeito releva não é o momento da liquidação ou do apuramento do imposto, mas o momento em que ocorre o facto tributário que determina uma eventual liquidação e pagamento de imposto, pois é nessa altura que se exige que se encontre em vigor a lei que prevê a criação ou o agravamento do tributo (em obediência ao princípio da legalidade, na vertente fundamentada pelo princípio da proteção da confiança), de modo a que o cidadão possa equacionar as consequências fiscais do seu comportamento.
Em conclusão, as mais-valias em discussão nestes autos estão sujeitas ao regime legal vigente à data da venda, e preenchendo os pressupostos vertidos no artigo 10º, nº 2, al. a), do CIRS, estão excluídas de tributação, sendo, por isso, ilegal a liquidação que sobre elas incidiu.”
Sentido este reiterado no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 18-05-2016, em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, n.º 0784/15, cujo sumário aqui transcrevemos:
«I -As alterações introduzidas ao regime tributário das mais-valias mobiliárias pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho apenas podem aplicar-se aos factos tributários ocorridos em data posterior à da sua entrada em vigor (27 de Julho de 2010 –art. 5.º da Lei n.º 15/2010).
II -Nas mais-valias resultantes da alienação onerosa de valores mobiliários sujeitas a IRS como incrementos patrimoniais o facto tributário ocorre no momento da alienação (artigo 10.º n.º 3 do Código do IRS), sendo esse o momento relevante para efeitos de aplicação no tempo da lei nova, na ausência de disposição expressa do legislador em sentido diverso (artigos 12.º n.º 1 da LGT e do CC).»
Portanto e secundando o ponto de vista consagrado na sentença apoiada em jurisprudência pacífica, mormente deste STA, e também defendido pelo Ministério Público, entende-se que o contrato de permuta de acções configura uma “alienação onerosa de partes sociais” e nessa medida as mais-valias apuradas com a celebração desse contrato são subsumíveis na alínea b) do nº1 do artigo 10º do CIRS; e que, nos termos do estabelecido na alínea a) do nº2 do artigo 10º do CIRS, estão excluídas da tributação as mais-valias apuradas com a permuta, no caso das acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses.
Pelo que deve o recurso improceder e confirmar-se a sentença recorrida.

*

3.- Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

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Lisboa,13 de Julho de 2021

José Gomes Correia (relator) * - Aníbal Ferraz – Paula Cadilhe Ribeiro

* Relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13/3, aditado pelo art.3º do DL nº 20/2020, de 1/5, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes Conselheiros integrantes da formação de julgamento.