Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0355/11
Data do Acordão:07/06/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:NULIDADE DE SENTENÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
ORDEM DE CONHECIMENTO DE VÍCIOS
Sumário:I – Se o juiz deixou de apreciar vícios de fundo do acto tributário em virtude de ter julgado procedente vicio de forma, sem ter justificado essa prioridade de conhecimento, e conduzindo este à procedência da impugnação, não pode
dizer-se que haja omissão de pronúncia para efeitos do artº 668º, nº 1, alínea d) do CPC.
II – No entanto, devendo, por força do disposto no artº 124º, nº 2 do CPPT, conhecer-se, em primeiro lugar, dos vícios de violação de lei stricto sensu, visto que assim se assegura uma tutela mais eficaz dos direitos do contribuinte, deve revogar-se a respectiva decisão para que sejam conhecidos os vícios pela ordem do artº 124º citado.
Nº Convencional:JSTA00067079
Nº do Documento:SA2201107060355
Data de Entrada:04/07/2011
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF LOULÉ PER SALTUM.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Área Temática 2:DIR PROC CIV.
Legislação Nacional:CPC96 ART660 N2 ART668 N1 O.
CPPTRIB99 ART123 N2 ART124 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC447/04 DE 2004/07/01.; AC STA PROC32702 DE 1994/09/22.; AC STA PROC569/10 DE 2010/12/07.; AC STA PROC939/06 DE 2007/01/24.; AC STA PROC916/04 DE 2006/03/22.; AC STA PROC35367 DE 1997/04/23.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I – A… Lda., com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que condenou-a ao pagamento de custas, não obstante ter julgado procedente a impugnação judicial por si deduzida, contra a liquidação de contribuição autárquica do ano de 1996, referente a todas as fracções autónomas do prédio urbano, inscrito sob o artigo nº 9450, sito na freguesia de … no montante de 1.285.429$00, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
A) - Na douta sentença proferida no tribunal ad quo foi omitida a pronúncia sobre questões julgadas prejudicadas mas que efectivamente não o eram pelo que foi decidido.
B) - O tribunal deve julgar todas as questões peticionadas, sob pena de omissão de pronúncia que acarreta a nulidade da sentença.
C) - O decidido na douta sentença recorrida não prejudica as restantes peticionadas.
D) - Esta nulidade pode ser conhecida por esse Supremo Tribunal Administrativo, atento o disposto no artº 722° do CPC, que pode, desde logo, conhecer das questões em que houve omissão de pronúncia.
E) - Por outro lado, não tendo decaído em qualquer das questões a conhecer, a Autora não é responsável pelo pagamento das custas, nos termos do artº 446° do CPC.
Nestes termos, sempre com o douto suprimento de V. Exas. deve julgar-se procedente o presente recurso e considerar-se a nulidade da douta decisão recorrida por falta de pronuncia sobre questões que o tribunal recorrido deveria e deixou de conhecer, nos termos do artº 715° do CPC, com todas as consequências legais, sendo logo proferida decisão sobre tais questões pelo Tribunal ad quem, como é de inteira JUSTIÇA.
II – Não foram apresentadas contra alegações.
III - O MP emitiu parecer que consta de fls. 130/131, no qual defende que o recurso merece provimento e a “Sentença impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão que ordene a devolução do processo ao TF Loulé para conhecimento prioritário do vício de violação de lei invocado pelo recorrente.”
IV. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
V. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
A) — A Impugnante construiu um prédio urbano situado na Rua … e Rua …, da freguesia de …, do Concelho de Faro, composto por cave destinada a arrumos e estacionamento de automóveis, rés-do-chão destinado a comércio ou indústria e mais quatro pisos destinados a habitação, constituído por 25 fracções autónomas, individualizadas pelas Letras “A” a “AB”.
B) — Em 16-12-1996, a Impugnante apresentou uma declaração modelo 129, para a inscrição deste prédio na matriz, cfr. fls. 19.
C) — Na declaração a que se refere a alínea anterior mencionou no quadro 9 que a propriedade horizontal é a constituir, mas sem o preenchimento dos itens de 1 a 4 do quadro 10 da mesma declaração cfr. fls. 19.
D) — Em 20-12-1996, apresentou nova declaração modelo 129 na qual mencionou esta com a menção de que a propriedade horizontal já estava constituída, mas sem o preenchimento dos itens de 1 a 4 do quadro 10 da mesma declaração, cfr. fls. 22 a 24.
E) — Em 23/01/1997, o técnico responsável pela direcção técnica da obra passa a competente declaração informando que a obra se encontrava concluída desde o dia 22 de Janeiro de 1997, cfr. fls. 25.
F) — Em 27/01/1997, a Impugnante requereu a emissão do competente alvará de utilização deste prédio urbano, o qual lhe foi concedido em 04-04-1997, com o nº 66, cfr. fls. 26 e 27.
G) — O Livro de Obras respeitante a este prédio urbano foi encerrado no dia 27-01-1997, com a conclusão da obra em 22/01/1997, cfr. fls. 28 e 29.
H) — A Administração Fiscal emitiu a liquidação da contribuição autárquica referente ao ano de 1996, terminando o prazo para pagamento voluntário em 31/10/1998, cfr, fls. 17.
I) — Em 20/04/2008, a Impugnante requereu no Serviço de Finanças de Faro (fls.34 do apenso):
« (…) a não sujeição de Contribuição Autárquica das fracções autónomas designadas pelas letras A, A4. AR, N, e Z do artigo urbano 09450 da freguesia de …, de harmonia com o estabelecido na alínea f) do artigo 10° do Código da Contribuição Autárquica.»
J) — No Serviço de Finanças foi prestada a seguinte informação (fls. 42 do apenso):
«Para os devidos efeitos, cumpre-me informar V Exa. que, A…, Lda., com sede em Faro, NIPC …, colectada pela actividade de Construção de Prédios para Venda, vem requerer a não sujeição de Contribuição Autárquica, nos termos da alínea f) do nº. 1 do artigo 10° do C.C.A., relativamente às fracções autónomas designadas pelas letras A, AA, AB, N e Z do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal e inscrito na respectiva matriz da freguesia de … sob o artigo nº. 9450, cuja data da conclusão das obras se verificou em 23 de Dezembro de 1996 e a data do pedido de não sujeição deu entrada nesta Repartição em 20 de Abril de 1998, tendo sido apresentado o balancete onde se verifica que o referido prédio passou a figurar nas existências da empresa a partir de 31 de Dezembro de 1996.
Pelo exposto, o pedido encontra-se fora do prazo estabelecido no n°. 5 do artigo 10° do Código da Contribuição Autárquica e considerando que o período de beneficio da não sujeição a imposto é o compreendido entre 1996 a 1998 o qual está ultrapassado, não é de considerar qualquer período de não sujeição.
No entanto V Exa. melhor decidirá.
Repartição de Finanças do Concelho de Faro, 05 de Maio de 1998»
J) — Sobre a antecedente informação recaiu o seguinte despacho (fls. 42 do apenso):
«Em face da informação supra não considero qualquer período de não sujeição, nos termos da alínea» do nº. 1 do artigo 10° do Código da Contribuição Autárquica, para o prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal inscrito na respectiva matriz da freguesia de … sob o artigo n° 9450.
Notifique.
Faro, 05 de Maio de 1998»
K) — A Impugnante foi notificada do despacho a que se refere a alínea anterior, por carta registada datada de 05/05/1998, cfr. fls. 49 do apenso.
L) — O chefe do Serviço de Finanças de Faro, em 25/08/2000, proferiu o seguinte despacho (fls. 121 a 123 do apenso):
«Em cumprimento do determinado no oficio n.º 8922, de 06/08/98, insistido pelo oficio n.° 4336, de 04/05/2000, n.º 5137, de 25/05/2000, nº 5692, de 14/06/2000, nº 618, de 29/06/2000 e nº 7349, de 16/08/2000, do qual foi pedida a confirmação pelo oficio nº 7584, de 21/08/2000, confirmado pelo oficio nº 7522, de 22/08/2000 (fotocópias de fls. 4 a 21), cumpre-me decidir
Factos e sua cronologia
1. Em 96/12/16 é apresentada por A…, Lª declaração Mod. 129 com a indicação de propriedade horizontal “a constituir”. (Fotocópias de fls. 22 a 24).
2. Em 96/12/18 é celebrada a escritura de propriedade horizontal relativa ao prédio objecto da apresentação da Mod. 129 referida em 1. (Fotocópias de fls. 25 a 36)
3. Em 96/12/20 é apresentada pela mesma entidade nova declaração Mod. 129. (Fotocópias de fls. 37 a 39)
4. Em 96/12/20 é registado definitivamente a constituição de propriedade horizontal, sobre o prédio objecto das Mod 129 referidas em 1 e 3. (Fotocópias de fls. 40 a 41)
5. Em 97/01/14 é celebrada escritura de concretização de permuta, relativa às fracções B, C, M L, P e X (Fotocópias de fls. 42 a 46)
6. Em 97/01/18 é avaliado o prédio que após o trânsito em julgado da respectiva avaliação é inscrito na matriz respectiva sob o artº 9450. (Fotocópias de fls. 47 a 53)
7. Em 98/04/20 é requerida a não sujeição ao abrigo da alínea f) do artº 10º do Código da Contribuição Autárquica que mereceu indeferimento (Fotocópias de fls. 54 a 58),
8. Em 98/07/23, através do ofício n.º 8232 é solicitada informação sobre os motivos do recebimento das declarações referidas em 1 e 3. (Fotocópias de fls. 59 a 61)
9. Em 98/07/28 é dado cumprimento ao solicitado em 8, através do ofício n. 8004. (Fotocopia de fls. 62)
10. Em 98/08/14, é passada Ordem de Serviço ao S.F.T. para averiguação da data de conclusão da obra. (Fotocópias de fls. 63 a 74)
Antes de entrarmos no campo controverso, convém atentarmos ao ofício referido em 8 onde são feitas considerações sobre o modo da constituição da propriedade horizontal, que subscrevo na íntegra. Todavia, nada se diz quanto às consequências a nível do Registo Predial, consoante os instrumentos da constituição sejam uns ou outros e que constam da al. b) no art.º 92º nº 1 (inscrições pedidas como provisórias por natureza) e do Código do Notariado no seu art.º 62° (não celebração de quaisquer instrumentos pelo qual se transmitam direitos reais ou contraiam encargos).
Refere-se aí também “as declarações apresentadas e recebidas nestas condições são pura e simplesmente nulas” e, sendo assim ilegal a tributação efectuada. Porém, perante a ilegalidade não se ordenou a anulação da tributação efectuada nem tão pouco a sanação pelo contribuinte das deficiências apontadas, mas antes afixação da data da conclusão das obras que adiante trataremos”.
Sobre os factos relevantes para afixação da data da conclusão das obras realçamos:
- Declaração Mod 129 apresentada em 96/12/20, referida em 3;
- Registo definitivo da propriedade horizontal em 96/12/20, referido em 4;
- Pedido de não sujeição e balancete de suporte que o acompanhava, referido em 7;
- Escritura de concretização de permuta, referido em 5;
- Avaliação do prédio, referida 6;
- Informação do S.F.T., referida em 10.
Da análise de todas eles verificámos que foram praticadas no espaço que medeia 30 dias e resulta claro que as obras já se achavam concluídas) pelo que nenhuma dificuldade se levanta quanto ao apuramento da data a considerar para efeitos da fixação da data da conclusão das obras, ou seja 96/12/20, data esta que os Serviços tomaram em consideração e que resultou da aplicação da presunção estabelecida a favor da Administração Fiscal no art.º 11º do Código da Contribuição Autárquica, presunção esta que pode ser ilidida mas a iniciativa e prova competia ao contribuinte por força do que dispõem os artigos 349° e 350° do Código Civil.
Nestes termos fixo em 96/12/20 a data de conclusão das obras ordenada no ofício em referência.
Faro, 25 de Agosto de 2000»
M) — O despacho a que se refere a alínea anterior, foi notificado à Impugnante em 04/09/2000, cfr. fls. 124 e 125 do processo administrativo apenso.
N) — Em 29/05/2007, na Direcção de Serviços do Imposto Municipal Sobre Imóveis foi prestada a seguinte informação (fls. 20 a 25):
I— Questão Prévia
1° A sociedade atrás identificada vem interpor recurso hierárquico do despacho de 2000.08.25 do Chefe do Serviço de Finanças de Faro, exarado no através do qual foi fixada a data e 1996.12.20 como sendo aquela em que ficaram concluídas as obras de construção do prédio sito na Rua …, nº …, e Rua …, inscrito na predial urbana da freguesia de …, concelho de Faro, sob o artigo nº 9450.
2° Tal despacho foi notificado à recorrente, em 2000.09.04 (data da assinatura do aviso de recepção), através do ofício nº 7750, de 2000.05.25, do SF de Faro.
3° O recurso hierárquico deu entrada no SF de Faro, em 2000.09.26, pelo que se considera interposto em tempo — nº 2 do artigo 66° do Código de Procedimento e de Processo Tributário -, reconhecendo-se às partes personalidade, capacidade e legitimidade tributárias.
II— Os factos e a fundamentação do recurso
4° Em 1996.12.20, a recorrente apresentou no Serviço de Finanças de Faro uma declaração mod.129, participando a construção de um prédio sito na Rua …, nº …, e Rua ….
5° No seguimento dessa apresentação, esse prédio veio a ser inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, concelho de Faro, sob o artigo n°9450.
6° Porém, em tal declaração não preencheu nenhum dos campos 01 a 04 do quadro 10, em virtude de a mesma ter apenas em vista a possibilidade de constituição da propriedade horizontal e respectivo registo na Conservatória de Registo Predial, por ter necessidade urgente de proceder a escritura de permuta de algumas fracções autónomas com a proprietária dos terrenos onde o prédio fora implantado (Associação de Beneficência B…), no interesse desta.
7° O não preenchimento dos referidos campos do quadro 10 da declaração deveu-se ao facto de a obra ainda não se encontrar efectivamente concluída, o que só veio a acontecer em 1997.01.22.
8° Com efeito, foi nesta data que o técnico responsável pela direcção técnica da obra a deu por concluída, conforme declaração por si emitida em 1997.01.23, junta aos autos.
9º Foi, também, em 1997.01.22 que no Livro de Obras foi o prédio considerado concluído, tal como se pode verificar dos averbamentos aí apostos.
10° Daí que, só no dia 24 de Janeiro de 1997, tenha sido requerida na Câmara Municipal de Faro a concessão do Alvará de Utilização, o qual foi emitido em 1997.04.04.
11° Por outro lado, ao contrário do que se afirma na informação dos serviços de fiscalização tributária, a obra em causa teve custos repercutidos no ano de 1997.
12° Se, por um lado, é correcto o que se afirma na mencionada informação - “o valor constante na conta 35 referente à obra nº 11 Rua … no final de 1996 é o mesmo valor em Janeiro de 1997” (como não podia deixar de ser uma vez que se trata de uma mera transferência de saldo para efeitos de encerramento e abertura dos respectivos exercícios), por outro lado, não é menos verdade que esta obra teve custos no ano de 1997, no montante de 26 466 702$, imputados ao exercício deste ano.
13º Na verdade, tal facto é evidenciado no mapa de obras em curso de 1997, em que a obra em causa foi lançada em 1996.01.01 com o saldo de 213 519 593$ que transitou para o ano de 1996 e em que teve uma imputação de custos no valor de 26 466 702$, terminando com um custo total de 239 096 295$.
14° O que bem demonstra que a obra teve o seu termo e conclusão já no ano de 1997.
15º Ora, o artigo 11º do Código da Contribuição Autárquica determina, de forma persuasivo, a data em que os prédios urbanos devem ser considerados concluídos, fixando na alínea b) do nº 1 a data em for apresentada a declaração para inscrição na matriz.
16° Contudo, tal artigo não fixa mais do que uma presunção que pode ser ilidida, como bem acontece no caso em apreço.
17° Na verdade, não obstante ter sido apresentada a declaração mod 129 em Dezembro de 1996, fica cabalmente demonstrado que a real conclusão da obra em causa se verificou em Janeiro de 1997.
18° Termos em que é neste ano de 1997 que deve ser fixada a data da conclusão da obra, com todas as consequências legais daí decorrentes, nomeadamente, considerando-se este ano de 1997 como o de inicio de sujeição a Contribuição Autárquica e não o de 1996.
19° Face ao exposto, pede-se o deferimento do recurso hierárquico, anulando o despacho recorrido e procedendo-se à sua substituição por outro em que se fixe a data da conclusão das obras em Janeiro de 1997.
III - Informação dos serviços
19° -Sobre os factos relevantes para afixação da data da conclusão das obras, o Chefe do SF de Faro realça os seguintes:
• declaração mod 129 apresentada em 1996.12.20;
• registo definitivo da propriedade horizontal em 1996.12.20;
• pedido de suspensão da tributação em sede de Contribuição Autárquica em 1998.04.20;
• escritura de permuta celebrada em 1997.07.14;
• avaliação do prédio em 1997.01.18;
• informação dos serviços de fiscalização tributária de 1998.09.03, em que se afirma que face aos elementos verificados é de concluir que o prédio já se encontrava concluído em Dezembro de 1996.
20°- Da análise e da conjugação desses factos, conclui o Chefe do SF de Faro que todos eles foram praticados num espaço de 30 dias, donde resulta claro que as obras já se encontravam concluídas em Dezembro de 1996, pelo que, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 11° do Código da Contribuição Autárquica, fixou a data da conclusão das obras em 1996.12.20, decisão esta que, em face do recurso hierárquico interposto, entende ser de manter.
VI. De acordo com as conclusões das alegações, são as seguintes as questões a apreciar no presente recurso:
A) A nulidade por omissão de pronúncia:
B) A condenação em custas.
Comecemos pela 1ª questão.
VI.1. Refere a recorrente que a sentença recorrida, de todas as questões por si colocadas na petição inicial, apenas conheceu uma – a da preterição do direito de audição prévia. Ora, de acordo com o disposto no nº 2 do artº 660º do CPC, ao juiz cabe resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, sendo que, no caso concreto, a questão conhecida na sentença não prejudicava o conhecimento das restantes questões.
Assim sendo, ao omitir o conhecimento daquelas questões, violou o disposto nos artº s 125º do CPPT e 668º, nº 1, alínea d) do CPC.
O MºPº, por sua vez, entende que não ocorre omissão de pronúncia, uma vez que, decidido que se verificava o vício de forma de preterição do direito de audição prévia, a impugnação procedia, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas pela recorrente.
Porém, tendo sido pela recorrente invocados outros vícios, nomeadamente o erro sobre os pressupostos de facto, o conhecimento deste, porque permite melhor tutela judicial, deveria preceder o daquele.
Assim, mostra-se violado o disposto no nº 2 do artº 124º do CPPT.
Vejamos então.
VI.2. De acordo com o artº 668º, nº 1, alínea d) é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Ora, tal como referido no Ac. do STA (1ª Secção - 1ª Subsecção), de 01.07.2004 - Recurso nº 447/04 “Não ocorre nulidade por omissão de pronúncia quando na sentença expressamente se apontam as razões pelas quais se não conhecem das questões tidas por não apreciadas: tal abstenção poderá integrar erro de julgamento mas não aquela nulidade”.
Na decisão recorrida foi, efectivamente, indicada a razão pela qual não se conhecia das outras questões – vícios do acto tributário.
Porém, foi desrespeitada a ordem de conhecimento dos vícios estabelecida no artº 123º, nº 2 do CPPT.
A questão que aqui se coloca é a de saber se, não tendo a recorrente invocado a violação do artº 124º, nº 2 citado, o tribunal pode conhecer da sua violação.
Parece-nos que sim, já que, não obstante a ausência de referência expressa a essa norma, o que a recorrente pretendia essencialmente era que a sentença se pronunciasse sobre a data de conclusão do prédio e o seu direito a não sujeição a contribuição autárquica.
VI.3. O artº 124º do CPPT determina o seguinte:
“1. Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação.
2. Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte:
a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior”.
Na petição, o impugnante alegou vícios de violação de lei - erro quanto aos pressupostos de facto e de direito da tributação - e de forma – violação do direito de audição prévia.
A sentença começou por conhecer deste último vício sem qualquer justificação, limitando-se a dizer o seguinte: “A questão jurídica que importa enfrentar e decidir no presente recurso traduz-se em saber se era obrigatória a audição do impugnante…”, sem mais nada referir quanto às outras questões invocadas pela recorrente.
Ora, a eventual procedência da violação de lei propícia ao interessado tutela mais estável e eficaz, uma vez que, em geral, impede a renovação do acto.
Daí que, de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, salvo nos casos em que, não se possa aprender o conteúdo do acto, nomeadamente no caso de falta de fundamentação, deve começar-se por conhecer dos vícios de violação de lei (stricto sensu) (Neste sentido v., entre outros, os Acórdãos deste Tribunal de 22.09.1994 – Processo nº 32.702, de 07.02.1996 – Processo nº 15.887, de 23.04.1997 – Processo nº 35.367, de 18.09.2008 - Processo nº 0437/08, de 07.12.2010 - Processo nº 0569/10, de 22.03.06 –Processo nº 0916/04 e de 24.01.2007 –Processo nº 0939/06).
Verifica-se então que o Mmº Juiz recorrido, ao começar por conhecer o vício de forma sem qualquer justificação, violou o disposto no artº 124º, nº 2 do CPPT, pelo que o recurso procede.
VI.4. Relativamente à questão das custas, só por mero lapso se pode compreender a condenação da recorrente em custas, atenta a procedência da impugnação e o disposto no artº 446º, nºs 1 e 2 do CPC.
Assim, as custas não são devidas pela recorrente.
VII. Nestes termos e pelo exposto concede-se provimento ao recurso, ordenando-se a baixa dos autos para apreciação dos restantes vícios imputados ao acto tributário.
Sem custas.
Lisboa, 6 de Julho de 2011. – Valente Torrão (relator) – Dulce Neto – Casimiro Gonçalves.