Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0590/13.8BEVIS
Data do Acordão:02/05/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:NOTIFICAÇÃO
INDEFERIMENTO
RECLAMAÇÃO GRACIOSA
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO
Sumário:I - A notificação da decisão de indeferimento de reclamação graciosa de liquidação deve ser efectuada por carta registada c/ aviso de recepção, uma vez que desse acto decorre a possibilidade de ser alterada a situação tributária do reclamante.
II - Quando se emprega a carta registada c/ aviso de recepção, a notificação considera-se feita no dia em que se mostra assinado o aviso de recepção.
III - O n.º 3 do art.º 39.º do CPPT afasta completamente a possibilidade de aplicação do disposto no art.º 254.º do Código de Processo Civil ao estatuir que: «Havendo aviso de recepção, a notificação considera-se efectuada na data em que ele for assinado e tem-se por efectuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário».
Nº Convencional:JSTA000P25527
Nº do Documento:SA2202002050590/13
Data de Entrada:07/05/2019
Recorrente:A..........
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1 – A………., com os sinais dos autos, inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que, em 5 de Novembro de 2018, julgou procedente a excepção dilatória da caducidade do direito de deduzir impugnação por manifesta intempestividade e, em consequência absolveu a Fazenda Pública da instância relativamente à impugnação judicial por si deduzida do indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações de IRS dos anos de 2009 e 2010, apresentou recurso, formulando, para tanto, alegações que concluiu do seguinte modo:
A) A Presente Impugnação Judicial deu entrada em 25 de Novembro de 2013.
B) A notificação feita ao recorrente da decisão proferida na reclamação graciosa, tendo sido feita por carta registada com aviso de recepção, que não foi assinada pelo impugnante só se presume recebida no terceiro dia seguinte ao envio ou aplicada a dilação de 5 dias.
C) A notificação postal presume-se realizada no 3.º dia útil seguinte ao do envio.
D) A citação sendo pessoal beneficia da dilação de 5 dias quando não é o citado a assinar o aviso de recepção.
E) A Presente impugnação Judicial deu entrada em Juízo dentro do prazo legal.
Entendem-se assim violadas as normas previstas nos artigos 38.º, 39.º do CPPT 245, 228, 232.º, 39.º n.º 1 do CPC.
Termos em que,
E sempre com o Douto Suprimento de Vs. Exas. se pugna pela procedência do presente
Recurso, devendo ser proferida decisão que julgue tempestiva a Impugnação Judicial
apresentada pelo recorrente».


2 – A Recorrida não apresentou contra-alegações.

3 – Tendo o recurso sido remetido para o Tribunal Central Administrativo Norte ali veio a ser proferida, em 1 de Junho de 2019, a decisão (fls. 535/539) que julgou procedente a excepção de incompetência absoluta do tribunal em razão da hierarquia para conhecer do recurso, fundamentando-se no facto de tal competência pertencer à Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, uma vez que o recurso versava exclusivamente matéria de direito.

4 – O Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento e confirmado a excepção dilatória da caducidade do direito de deduzir impugnação por manifesta intempestividade.

5 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.


II – Fundamentação

1. De facto
Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
1. No cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI201200551, os Serviços da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Viseu, desencadearam procedimento inspectivo externo ao aqui Impugnante, com incidência aos exercícios de 2009 e 2010 – cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 544 a 574 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
2. Em 27/12/2012, na sequência do procedimento inspetivo referido em 1), foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária, relatório de inspeção tributária, onde foram efetuadas correções à matéria tributável em sede de IRS com recurso a métodos indiretos, no montante de € 12.105,92 e € 23.244,5473, relativamente aos anos de 2009 e 2010, respetivamente - cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 544 a 574 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
3. O Impugnante deduziu pedido de revisão da matéria coletável junto do Diretor de Finanças de Viseu, sem que tivesse sido obtido acordo entre os peritos nomeados pelo Impugnante e pela Autoridade Tributária e Aduaneira, no procedimento de revisão – cfr. ata de fls. 577 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
4. Por despacho do Diretor de Finanças de Viseu de 27/02/2013, proferido no procedimento de revisão, foram mantidos os valores das correções apurados no relatório a que se alude em 2) - cfr. Doc. de fls. 575 e 576 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
5. Em resultado da correção com recurso a métodos indiretos efetuada pelos Serviços da Inspeção Tributária a que se alude em 2), mantida por decisão referida em 4), por referência ao ano de 2009 e ao aqui Impugnante, foi emitida em 05/03/2013, a liquidação adicional de IRS aqui impugnada, com o n.º 2013 5000069652, código de identificação de documento n.º FFCC – 201300000594051, no montante total a pagar de € 2.077,03, a qual por demonstração de compensação com a liquidação anterior com o n.º 2010 5003340779, resultou, face a estorno, no valor total a pagar de € 3.378,23, em que se inclui € 194,72 de juros compensatórios – cfr. cópia da demonstração da liquidação de IRS e demonstração de compensação, de fls. 502 e 503 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
6. A liquidação a que se alude em 5), a que corresponde o código de identificação de documento n.º FFCC – 201300000594051, foi remetida ao Impugnante por via eletrónica, com o n.º de registo na Via CTT 132536811 e entregue na sua caixa postal eletrónica do Via CTT, em 08/03/2013, cujo acesso ocorreu em 11/03/2013, às 14:59:17 – cfr. demonstração de liquidação de IRS e print eduzido do sistema informático da AT em ficheiro “Aplicação FFCC – Fluxos Financeiros Conta Corrente”, de fls. 503 e 504 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos, e documento com prova de acesso à Caixa Postal Eletrónica emitido pelos CTT Correios de Portugal, S.A. Sociedade Aberta, a fls. 430 do processo físico.
7. Em resultado da correção com recurso a métodos indiretos efetuada pelos Serviços da Inspeção Tributária a que se alude em 2), mantida por decisão referida em 4), por referência ao ano de 2010 e ao aqui Impugnante, foi emitida em 08/03/2013, a liquidação adicional de IRS aqui impugnada, com o n.º 2013 5000070219, código de identificação de documento n.º FFCC – 201300000820988, no montante total a pagar de € 7.006,79, a qual por demonstração de compensação com a liquidação anterior com o n.º 2011 5005005019, resultou, face a estorno, no valor total a pagar de € 7.400,00, em que se inclui € 413,99 de juros compensatórios – cfr. cópia da liquidação e demonstração de compensação, de fls. 506 e 507 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
8. A liquidação a que se alude em 7), a que corresponde o código de identificação de documento n.º FFCC – 201300000820988, foi remetida ao Impugnante por via eletrónica, com o n.º de registo na Via CTT 132536811 e entregue na sua caixa postal eletrónica do Via CTT, em 18/03/2013, cujo acesso ocorreu em 19/03/2013, às 11:16:49 – cfr. demonstração de liquidação de IRS e print eduzido do sistema informático da AT em ficheiro “Aplicação FFCC – Fluxos Financeiros Conta Corrente”, de fls. 507 e 508 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos, e documento com prova de acesso à Caixa Postal Eletrónica emitido pelos CTT Correios de Portugal, S.A. Sociedade Aberta, a fls. 430 verso do processo físico;
9. Em 26/08/2013, foi apresentada pelo Impugnante, via eletrónica, por email dirigido à Direção de Finanças de Viseu, petição de reclamação graciosa contra as liquidações de IRS a que se alude em 5) e 7), que originou o processo com o n.º 2720201304002563 – cfr. fls. 5 e seguintes do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos.
10. Em 06/11/2013, foi proferido despacho pelo Chefe de Divisão, em regime de substituição, por delegação de competências, de indeferimento da reclamação graciosa – cfr. fls. 585 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos presentes autos.
11. Em 06/11/2013, foi remetido via postal sob registo com aviso de receção, pela Direção de Finanças de Viseu, o ofício n.º 9211, dirigido ao aqui Impugnante e seu domicílio, dando conta da notificação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa a que se alude em 10), cujo aviso de receção se mostra assinado na data de 07/11/2013, por “………..” – cfr. cópia do oficio, cópia do registo postal coletivo e aviso de receção, de fls. 586 a 588, do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos presentes autos.
12. Em 25/11/2013, foi remetida via eletrónica, ao Serviço de Finanças de Viseu, por email, a petição inicial que deu lugar aos presentes autos - cfr. email, de fls. 4 do processo físico».


2. Questão a decidir
Saber se se verifica ou não a excepção dilatória da caducidade do direito de deduzir impugnação por intempestividade.

3 – Do direito

A excepção dilatória foi suscitada pela Fazenda Pública na impugnação judicial a que respeita o presente recurso e fundamentada na intempestividade da impugnação que, por ter sido apresentada quando estava já esgotado o prazo, quer para impugnar a liquidação, quer para impugnar o indeferimento da reclamação graciosa, acabou por ser foi apresentada depois de o acto de liquidação impugnado se ter consolidado na ordem jurídica como caso decidido ou resolvido. Por isso, no entender da Fazenda Pública, havia já caducado o direito a deduzir impugnação judicial do acto de liquidação.

Em sua defesa, o Impugnante alegou que a impugnação era tempestiva, uma vez que a decisão da reclamação graciosa lhe foi comunicada por carta com aviso de recepção (o que, no seu entender, consubstanciou um excesso de formalismo), acrescendo que não tinha sido ele a assinar o aviso de recepção, pelo que a impugnação teria de considerar-se apresentada dentro do prazo, fosse pela aplicação das regras do artigo 39.º, n.º 1 do CPPT, presumindo-se a notificação ao terceiro dia do registo, fosse pela aplicação das do artigo 245.º do CPC, fazendo-se acrescer ao prazo a dilação de cinco dias aí prevista.

Da matéria de facto dada como provada resulta, para o que importa decidir no âmbito do presente recurso, que o Recorrente: i) foi notificado do acto de liquidação em 19 de Março de 2013 [a notificação foi efectuada por via electrónica (Via CTT), em 18 de Março de 2013 (data da entrega do documento na caixa postal electrónica), tendo o mesmo acedido a ela em 19 de Março de 2013, data em que, nos termos do n.º 9 do artigo 39.º do CPPT na redacção então em vigor a notificação se considerava efectuada – ponto 8 da matéria de facto dada como provada]; ii) foi notificado por carta com aviso de recepção da decisão da reclamação graciosa que havia apresentado relativamente àquele acto de liquidação, tendo o aviso de recepção sido assinado por um terceiro em 7 de Novembro de 2013 (ponto 11 da matéria de facto dada como provada); iii) remeteu, por via electrónica, a petição inicial respeitante à impugnação judicial da liquidação em 25 de Novembro de 2013 (ponto 12 da matéria de facto dada como provada).

3.1. Do prazo para a apresentação da impugnação judicial

Como se afirma na sentença recorrida, a impugnação foi apresentada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa. Assim, segundo o disposto no artigo 102.º do CPPT, na redacção então em vigor, a impugnação judicial teria de ser apresentada no prazo de 3 meses a partir do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte (al. a do n.º 1) ou, em caso de indeferimento da reclamação graciosa, no prazo de 15 dias após a notificação daquela decisão (n.º 2). Excepto se o fundamento for a nulidade do acto de liquidação, caso em que a impugnação pode ser deduzida a todo o tempo. O que significa que a tempestividade da impugnação tem, neste caso, de aferir-se a partir do mencionado prazo de 15 dias após a notificação do acto de indeferimento da reclamação graciosa, a não ser que a mesma se baseasse na nulidade da liquidação, o que manifestamente não era o caso, como aclarou a decisão do Tribunal a quo.

De resto, o Recorrente limitou o objecto do presente recurso à interpretação das normas previstas nos artigos 38.º e 39.º do CPPT, bem como à da aplicabilidade ou não, in casu do disposto nos artigos 245.º, 228.º, 232.º e 39.º n.º 1 do CPC.

3.1.1. A primeira questão que importa esclarecer é a da contagem do prazo. Tratando, como resulta do probatório e foi já mencionado, de uma notificação por carta registada com aviso de recepção, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 39.º do CPPT, segundo o qual, “[H]avendo aviso de receção, a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado e tem-se por efetuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário”. Daqui resulta, como se afirma na sentença recorrida, que há que considerar o aqui Recorrente notificado na data em que o aviso de recepção foi assinado, ou seja, no dia 7 de Novembro de 2013. O prazo de 15 dias para apresentar a impugnação judicial, previsto no n.º 2 do artigo 102.º do CPPT, contava-se nos termos do disposto no artigo 279.º do Código Civil – i. e. “[N]a contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr” (al. b) e “[O] prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo” (al. e) – ex vi do n.º 1 do artigo 20.º do CPPT, com a especialidade de se transferir o respectivo termo “quando os prazos terminarem em dia em que os serviços ou os tribunais estiverem encerrados, para o primeiro dia útil seguinte”. De acordo com estas regras, o prazo para impugnar o acto de indeferimento da reclamação graciosa terminou no dia 22 de Novembro de 2013 (uma Sexta-feira) e como a petição inicial da impugnação apenas deu entrada na Segunda-feira, dia 25 de Novembro, temos de concluir pela intempestividade do pedido, concordando com o que foi decidido pela sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.

A sentença recorrida acrescenta ainda, acertadamente, que “à contagem dos prazos de impugnação contenciosa aplica-se o disposto no artigo 279.º do Código Civil, resultando então que porque perante um prazo de caducidade, cujo decurso faz extinguir o direito a demandar, e não perante um prazo estabelecido para a prática de um ato inserido num processo judicial pendente, não tem aplicação sequer a possibilidade de apresentação da respetiva petição num dos três dias úteis seguintes ao seu termo, mediante o pagamento da multa prevista no nº 5 do artigo 138.º do CPC (à data, artigo 145.º), atento que este regime apenas se reporta aos prazos judiciais - neste sentido, por todos, vide o Acórdão do Supremo tribunal Administrativo de 21/06/2017, rec. n.º 01128/14, disponível em www.dgsi.pt”.

3.1.2. O Recorrente alega, porém, que o prazo não pode contar-se desta forma, pois verificou-se um “excesso de formalismo” na notificação, a qual deveria ter sido enviada por carta registada, sem aviso de recepção, uma vez que se trataria de uma notificação reconduzível à previsão normativa do n.º 3 do artigo 38.º do CPPT – “As notificações não abrangidas pelo n.º 1, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada” – e não do n.º 1 do mesmo artigo 38.º - “As notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em actos ou diligências” –, o que determinaria que a interposição da impugnação no dia 25 de Novembro não teria sido extemporânea por efeito do disposto no n.º 1 do artigo 39.º do CPPT – “As notificações efectuadas nos termos do n.º 3 do artigo anterior presumem-se feitas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil” (redacção em vigor àquela data).

Porém, não lhe assiste razão como bem se explica na sentença do Tribunal a quo em consonância com o que tem sido reiterado pela jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo: “(…) bem andou a Administração Tributária ao efetuar a notificação do Impugnante por meio de carta registada com aviso de receção, posto que estava em causa a notificação de uma decisão de indeferimento de reclamação graciosa, na qual se discutia a possibilidade de ser alterada a sua situação tributária (…)

I - A notificação da decisão de indeferimento de reclamação graciosa de liquidação deve ser efectuada por carta registada c/ aviso de recepção, uma vez que aí estava em discussão a possibilidade de ser alterada a situação tributária do reclamante.

II - Quando se emprega a carta registada c/ aviso de recepção, a notificação considera-se feita no dia em que se mostra assinado o aviso de recepção.” – cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11/03/2009, rec. n.º 0919/08, disponível em www.dgsi.pt.

3.1.3. O Recorrente apresenta ainda um segundo argumento para sustentar a tempestividade da interposição da impugnação, baseado na aplicação in casu do disposto no n.º 1 do artigo 245.º do CPC – “[A]o prazo de defesa do citando acresce uma dilação de cinco dias quando: a) A citação tenha sido realizada em pessoa diversa do réu, nos termos dos n.ºs 2 do artigo 228.º”, onde se dispõe que “[A] carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de receção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando” –, atento o facto de, neste caso, o aviso de recepção não ter sido assinado por ele. Mas também este argumento não pode proceder, pelas razões que são igualmente bem fundamentadas na sentença recorrida e também por referência à jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo: “este preceito apenas impõe essa dilação relativamente “[a]o prazo de defesa do citando”, fazendo então sentido se aplicar apenas em relação aos meios de defesa cujos prazos se contam a partir da data da citação (Daí que seja pacífica a aplicação dessa dilação de cinco dias aos prazos para o exercício dos direitos de oposição à execução fiscal, pagamento em prestações e dação em pagamento, quando a citação em processo de execução fiscal tenha sido efetuada em pessoa diversa do executado - neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Volume III, p. 381.). O mesmo não se pode dizer relativamente ao prazo para impugnar, na medida em que não há razão alguma para equiparar a notificação à citação para efeitos de aplicação da dilação prevista no artigo 245.º do CPC. Enquanto a citação no âmbito tributário, se situa no âmbito da execução fiscal e “é o ato destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada”, a notificação é o ato “pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa ou se chama alguém a juízo” (cfr. artigo 35.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT) sendo que, e no caso, a notificação da decisão de indeferimento de reclamação graciosa apenas marca o início de deduzir recurso hierárquico ou apresentar impugnação judicial dessa mesma decisão (cfr. artigos 76.º e 102.º, n.º 2 do CPPT). São, pois, bem distintas a natureza e finalidade da citação no processo de execução fiscal ou num processo judicial, da notificação de um ato de indeferimento de reclamação graciosa, pois enquanto esta notificação tem lugar no âmbito de um procedimento em que o notificando já esteve presente (o mesmo se diria se fosse a notificação de um ato de liquidação), não se verificam os motivos que determinaram o legislador a fixar aquela dilação no caso da citação, pois, a notificação da decisão de reclamação graciosa ocorre no final de um procedimento que se iniciou com o requerimento do contribuinte, no âmbito do qual lhe é assegurado o direito de participação, ao contrário da citação, em que é chamado pela primeira vez ao processo.

Ademais, e citando o Colendo Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão de 22/11/2017, proferido no processo n.º 0533/17 (disponível em www.dgsi.pt), “As normas do Código de Processo Civil invocadas referem-se a formalidades legais da citação do réu e, não a normas próprias da notificação de decisões administrativas de indeferimento em procedimento tributário. Quanto às formalidades legais a observar na notificação de decisões administrativas de indeferimento em procedimento tributário, como ocorre na presente situação, o Código de Processo e Procedimento Tributário dispõe expressamente quais sejam, impedindo que haja qualquer lacuna legal que torne passível a aplicação subsidiária de normas do Código de Processo Civil seja previstas para a citação seja as previstas para a notificação de decisões. Haverá que visitar o disposto no art.º 38.º, n.º 1 do Código de Processo e Procedimento Tributário para verificar que foi cumprida a formalidade exigida, notificação da decisão de indeferimento por carta registada com aviso de recepção. Em seguida o n.º 3 do art.º 39.º do mesmo diploma legal afasta completamente a suposição do recorrente de beneficiar de uma dilação por não ter sido ele que assinou o aviso de recepção ao estatuir que:« - Havendo aviso de recepção, a notificação considera-se efectuada na data em que ele for assinado e tem-se por efectuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.». Por tudo isto, ao prazo para deduzir impugnação judicial não é aplicável a dilação prevista no artigo 245.º do CPC, como sustenta o Impugnante”.

Conclusões
Assim, podemos concluir, relativamente à questão em apreço, que:
- A notificação da decisão de indeferimento de reclamação graciosa de liquidação deve ser efectuada por carta registada c/ aviso de recepção, uma vez que desse acto decorre a possibilidade de ser alterada a situação tributária do reclamante.

- Quando se emprega a carta registada c/ aviso de recepção, a notificação considera-se feita no dia em que se mostra assinado o aviso de recepção.
- O n.º 3 do art.º 39.º do CPPT afasta completamente a possibilidade de aplicação do disposto no art.º 254.º do Código de Processo Civil ao estatuir que: «Havendo aviso de recepção, a notificação considera-se efectuada na data em que ele for assinado e tem-se por efectuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário».

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente [nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi a alínea e), do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário].


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Lisboa, 5 de Fevereiro de 2020. - Suzana Tavares da Silva (relatora) – Paulo Antunes – Francisco Rothes.