Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0800/17
Data do Acordão:03/14/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:IMPOSTO DE SELO
CONCESSÃO
CRÉDITO
UTILIZAÇÃO DE CRÉDITO
LIQUIDAÇÃO
CADUCIDADE
Sumário:I - A concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido.
II - O facto tributário eleito para tributação em imposto de selo é, sempre, a concessão de crédito - prestação de valores monetários de uma parte a outra obrigando-se esta última a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro-.
III - A mera celebração do contrato de concessão de crédito nem sempre gera facto tributário do imposto. Quando a utilização do crédito for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que coincide com a data de celebração do contrato de concessão de crédito.
IV - Quando a utilização do crédito não for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que não coincide com a data de celebração do contrato concessão de crédito.
V - Para um crédito concedido e utilizado em 2002, a notificação da liquidação respeitante a contrato deveria ser notificada à recorrida até 31 de Dezembro de 2006, pelo que em 2012 tinha caducado, há muito, o direito de liquidar o imposto.
Nº Convencional:JSTA00070602
Nº do Documento:SA2201803140800
Data de Entrada:06/27/2017
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - SELO
Legislação Nacional:CIS ART1 ART5 ART2
TGIS VERBA 17.1.4
CPPTRIB99 ART59 N7
LGT ART45
Aditamento:
Texto Integral: RECURSO JURISDICIONAL
DECISÃO RECORRIDA – Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga
. 28 de Março de 2017

Julgou procedente a impugnação judicial.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo
Tribunal Administrativo:

A Representante da Fazenda Pública veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida no âmbito do processo de Impugnação judicial nº 336/13.0 BEBRG, que A…………., S.A. deduziu contra os actos de liquidação de Imposto do Selo (IS), respeitantes aos anos de 2008, 2009 e 2010, no montante global de €47.541,76, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

A. Na douta sentença recorrida julgou-se procedente a impugnação deduzida pela Impugnante, com a consequente anulação das liquidações de Imposto de Selo, referentes aos anos de 2008, 2009 e 2010, por se entender, e passamos a citar:
(…) o crédito em questão não revestiu a forma de conta corrente, nem a sua utilização foi deferida para momento posterior à celebração do contrato.
Pelo contrário, resultou demonstrado que o crédito foi utilizado no momento da sua concessão, ocorrendo, por isso, nesse momento, o facto gerador do imposto.
(…) Atento o regime legal transcrito e considerando que o Imposto de Selo deveria ter sido liquidado no momento em que o crédito foi concedido, ou seja, no ano de 2002, é forçoso concluir que o direito da AT de liquidar tal imposto caducou, o que acarreta a invalidade das liquidações impugnadas.

B. Ora, a Fazenda Pública não se pode conformar com a douta decisão do tribunal a quo, pelos motivos que se passam a explanar.

C. No âmbito das ações inspetivas a que a ora impugnante foi sujeita, os serviços de inspeção tributária, detetaram a concessão de empréstimos por parte da mesma ao sujeito passivo B…………., S.A., no montante de € 3.879.445,96, mantendo-se esses empréstimos sem qualquer alteração (reforço ou restituição do mesmo) nos anos posteriores a 2007.

D. Tal como resulta dos Relatórios de Inspeção Tributária, o Sr. Inspetor concluiu, pelos motivos devidamente explanados nos mesmos, que a concessão dos referidos empréstimos, estava sujeita a Imposto de Selo, nos termos do disposto no artigo 1º, n.º 1 do CIS, e que aos referidos empréstimos seria de aplicar o valor constante da verba n.º 17.1.4 da Tabela Geral do CIS.

E. A concessão de empréstimos está sujeita a Imposto de Selo, nos termos do disposto no artigo 1º, n.º 1 do CIS.

F. No caso em apreço, o sujeito passivo do imposto, é a entidade concedente de crédito, nos termos do preceituado no artigo 2º, n.º 1, alínea b) do CIS.
G. Nos termos do artigo 5º do CIS:
(…) A obrigação tributária considera-se constituída: g) Nas operações de crédito, no momento em que foram realizadas ou, se o crédito for utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outro meio em que o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês.
H. A Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), na sua verba 17, estabelece o seguinte:

17Operações financeiras:
17.1Pela utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de crédito a qualquer título exceto nos casos referidos na verba 17.2, incluindo a cessão de créditos, o factoring e as operações de tesouraria quando envolvam qualquer tipo de financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, considerando-se, sempre, como nova concessão de crédito a prorrogação do prazo do contrato - sobre o respetivo valor, em função do prazo:
17.1.1Crédito de prazo inferior a um ano - por cada mês ou fração: 0,04%
17.1.2Crédito de prazo igual ou superior a um ano: 0,05%
17.1.3Crédito de prazo igual ou superior a cinco anos: 0,06%
17.1.4Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30: 0,04%

I. Na conceção desta norma destaca-se a necessidade de atentarmos à definição de utilização de crédito, que será a operação pela qual uma entidade põe determinada soma à disposição de um beneficiário, com a garantia deste lhe pagar os juros convencionados e de lhe restituir, na data fixada para o reembolso, a importância correspondente à que havia sido emprestada.

J. Desde logo, na apontada definição destaca-se uma condição, o prazo fixado entre as partes para a devolução da quantia mutuada.

K. Com efeito, com exceção das dívidas perpétuas (aquelas em que nunca ocorre a devolução dos montantes emprestados) e dos créditos sob a forma de conta corrente ou descoberto bancário, todos os empréstimos têm necessariamente de determinar um prazo para devolução do capital mutuado.

L. A TGIS prevê, nas suas verbas 17.1.1 a 17.1.3, o Imposto de Selo a pagar para as várias situações em que está estabelecido um prazo para a devolução do capital mutuado, sendo a verba 17.1.4 reservada a situações residuais de créditos em conta corrente ou descoberto bancário (existe um plafond de crédito passível de utilização por parte do beneficiário que só cessará quando as partes o entenderem) e outras em que não seja determinado ou determinável o prazo para o mesmo.

M. Na douta sentença ora recorrida refere-se que o crédito em causa foi mobilizado e utilizado no ano de 2002, sem oscilações, materializando-se, assim, de forma instantânea os efeitos do contrato, pelo que não existiu uma utilização de crédito na forma de conta-corrente.

N. Ora, e salvo melhor opinião não pode a Fazenda Pública concordar com a posição defendida na sentença, dado que tal verba (17.1.4) não se aplica apenas aos créditos que revestem a forma de conta corrente, mas também a descobertos bancários e a créditos utilizados por qualquer outra forma, desde que o prazo, nas três situações, não seja determinado ou determinável.

O. De facto, caso a IT realizasse uma inspeção, no ano de 2002, a proceder a tese da impugnante, nada poderia liquidar a título de Imposto de Selo, uma vez que, não podendo aplicar a verba 17.1.4, também não poderia aplicar qualquer uma das verbas 17.1.1, 17.1.2 ou 17.1.3, uma vez que o mútuo em causa não tinha prazo determinado ou determinável.

P. Bastando, assim, aos sujeitos passivos - caso não existisse a verba 17.1.4 -, para não pagarem Imposto de Selo, não convencionarem um prazo para a devolução do capital mutuado.

Q. No que se refere ao facto de o crédito em causa ter sido utilizado de forma "instantânea", tal situação não interfere com a qualificação do mesmo como sendo um mútuo com prazo não determinado ou determinável.

R. De novo se destaca o facto da verba 17.1.4 do TGIS se referir aos factos tributários relativos a outras formas de crédito com prazo não determinado ou determinável, sendo indiferente se, nessas outras formas, existe uma utilização do capital mutuado de forma instantânea ou de forma faseada.

S. Da análise à Tabela Geral de Imposto de Selo, retira-se que apenas serão de aplicar as verbas 17.1.1, 17.1.2 ou 17.1.3, quando a utilização de crédito decorrer de um mútuo contratado por um período de tempo definido (variando a taxa a aplicar de 0,04% a 0,06% em função desse tempo contratualizado), o que não é o caso dos presentes autos, uma vez que, na utilização de crédito em apreço não foi determinado um prazo, ou seja, não foi determinada uma data para a devolução das quantias mutuadas.

T. Pelo que, dúvidas não restam de que à situação concreta, e tendo em conta que nos empréstimos concedidos pela impugnante à sociedade B…………., S.A, não foi determinado um prazo um prazo para a devolução das quantias mutuadas, não poderá ser aplicada qualquer uma das verbas 17.1.1, 17.1.2 ou 17.1.3, mas, apenas, a verba 17.1.4 da respetiva Tabela Geral, da qual consta expressamente que um crédito utilizado por qualquer forma em que o prazo não seja determinado está sujeito a Imposto de Selo, à taxa de 0,04%, aplicado sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30.

U. Verificando-se, assim, todas as condições legais para sujeitar os empréstimos em causa nos autos à verba 17.1.4 da Tabela Geral do CIS.

V. Face ao exposto, entende a Fazenda Pública, que ao contrário do que alega a impugnante o Imposto de Selo não deveria ter sido liquidado no momento em que o crédito foi concedido, ou seja, no ano de 2002, e como tal o direito por parte da AT de liquidar o tributo, ainda não caducou.

W. Pelo que, a douta sentença proferida pela Mmº Juiz a quo fez, a nosso ver, uma incorreta interpretação das normas legais e do ratio legis que a fundamentam, incorrendo assim em erro de julgamento, devendo, por esse motivo, ser revogada, com as legais consequências.
Requereu que seja dado provimento ao recurso.

Foram apresentadas contra-alegações, pela recorrida A………… S.A. em suporte da decisão recorrida que terminam com as seguintes conclusões:

Em face do que se alegou nas presentes contra-alegações de recurso, bem como em sede de petição inicial, ficou demonstrado que:
i. No caso em concreto, o crédito foi mobilizado, concedido e utilizado em 2002, sem qualquer oscilação de capital ou flexibilidade, tendo sido utilizado no momento da sua concessão;

ii. O crédito sob a forma de conta corrente caracteriza-se pelo facto de o prazo de utilização não ser determinado ou determinável e em que a utilização do crédito é deferida para momento ou momentos posteriores à celebração do contrato;

iii. Por outro lado, o crédito que não reveste a forma de conta corrente caracteriza-se pelo facto do crédito concedido ser utilizado no momento em que se efetiva o direito potestativo do creditado, de mobilização dos fundos para o seu património;

iv. Assim, no caso em apreço, o IS deveria ter sido liquidado no momento em que o crédito foi concedido, isto é, em 2002;

v. Sucede, porém, que o direito de liquidar tal imposto há muito que já caducou, nos termos dos artigos 45º e 46º, ambos da LGT e do artigo 39º do Código do IS;

vi. Deste modo, podemos concluir que o crédito aqui em crise não reveste a forma de conta corrente, pelo que o IS deveria ter sido liquidado no momento em que o mesmo foi concedido, isto é, em 2002;

vii. Contudo, o direito da AT liquidar o referido IS há muito que já caducou, nos termos dos artigos 45º e 46º, ambos da LGT e do artigo 39º do Código do IS;

viii. Por conseguinte, devem ser anuladas as liquidações aqui em crise, com todas as consequências legais, nomeadamente, a restituição do indevidamente pago acrescido dos respetivos juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43º da LGT, porquanto as mesmas padecem do vício de violação de lei, por erro nos seus pressupostos de Direito.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso.

Mostram-se provados, os seguintes factos com relevo para a decisão do presente recurso:

1. A ora Impugnante é detida a 100% pela empresa C…………, SA. e pertence ao grupo A…………, cuja empresa mãe é a Companhia Industrial A……….. SGPS, SA.

2. A impugnante desenvolve a actividade de obtenção e primeira transformação de alumínio, a que corresponde o CAE 24420, encontrando-se enquadrada no regime geral de determinação do lucro tributável para efeitos de IRC e em sede de IVA no regime normal de periodicidade mensal.

3. Em cumprimento das ordens de serviço internas n°s. 01201202373 (ano 2008), 01201202378 (ano de 2009) e 01 201201406 (ano de 2010), foram iniciados no ano de 2012 procedimentos inspectivos à impugnante - cfr. fls. I, 91 e 141 do processo administrativo apenso aos autos (doravante PA).

4. No decorrer dos referidos procedimentos a Inspecção Tributária constatou a existência de empréstimos concedidos pela impugnante à sociedade B…………, SAI no ano de 2002, no montante de €3.879.445,96, mantendo-se esses empréstimos sem qualquer alteração (reforço ou restituição do mesmo), nos anos posteriores a 2007.

5. A impugnante não liquidou Imposto de Selo sobre os empréstimos efectuados ao sujeito passivo B…………, SA.

6. Os serviços de inspecção concluíram que a concessão dos referidos empréstimos estava sujeita a Imposto de Selo, nos termos do disposto nos artigos 1°, n.º 1 do Código do Imposto de Selo (CIS), e que aos referidos empréstimos seria de aplicar o valor constante da verba n.º 17.1.4 do Tabela Geral do CIS, "uma vez que no empréstimo em questão não foi determinado um prazo para o mesmo" - cfr. fls. 86, verso e 87, fls. 137 e 138 verso e fls. 220, verso e 221 do PA.

7. O sujeito passivo foi notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs. 60° da LGT e 60° do RCPIT, dos projectos de relatório dos procedimentos inspectivos referidos e, ainda, para, querendo, exercer o seu direito de participação na decisão mesmos, direito que exerceu - dr. fls. 2 e ss., fls. 116 e ss. e fls. 166 e ss. do PA.

8. Em 22-10-2012, foi a impugnante notificada do RIT referente à ordem de serviço n.º 01201202373, referente ao exercício de 2008, através do ofício n.º 506.9463 - dr. fls. 82 do PA.

9. Em 18-01-2013, foi a impugnante notificada do RIT referente à ordem de serviço n.º 01201202378, referente ao exercício de 2009, através do ofício n.º 506.572 - dr. fls. 131 do PA.

10. Em 22-01-2013, foi a impugnante notificada do RIT referente à ordem de serviço n.º 01201201406, referente ao exercício de 2010, através do ofício n.º 506.754 - fls. 215 do PA.

11. As correcções efectuadas deram origem aos actos tributários, ora em apreço, os quais foram notificados ao sujeito passivo, tendo os mesmos, como data limite de pagamento voluntário os dias 05-12-2012 (liquidação nº 2012 6430001145, do ano de 2008), 28-03-2013 (liquidação nº 2013 6430000095, ano de 2009) e 25-03-2013 (liquidação nº 20136430000094, do ano de 2010) - dr. fls. 12 a 14 do suporte físico dos autos.

12. Em 06.12.2012, a Impugnante procedeu ao pagamento do Imposto do Selo de 2008 - doc. fls. 18 do suporte físico dos autos.

13. Na sequência das referidas liquidações de Imposto de Selo, foi deduzida a presente impugnação judicial.

14. O crédito concedido pela Impugnante à sociedade B…………, SA referido no ponto 4) foi mobilizado e utilizado em 2002, sem qualquer oscilação de capital ou flexibilidade, tendo sido utilizado no momento da sua concessão - cfr. fls. 19 a 27 do suporte físico dos autos.
****

Questão objecto de recurso:

1- Caducidade do direito à liquidação e quais as consequências sobre a validade dos próprios actos tributários de liquidação.


Discorda a Representante da Fazenda Pública da sentença recorrida porque secundando a posição assumida pela fiscalização tributária considera que a situação em apreço é tributada em sede de imposto de selo nos termos do disposto no artigo 1º, n.º 1 do CIS, e que aos referidos empréstimos seria de aplicar o valor constante da verba n.º 17.1.4 da Tabela Geral do CIS - Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30: 0,04%.-
Para assim concluir atribui ao prazo de utilização o único critério de enquadramento da questão fiscal em apreço. Segundo a Representante da Fazenda Pública, não estando determinado no contrato o prazo de utilização, obteria a operação financeira enquadramento na verba 17.1.4 da Tabela Geral do CIS.
O imposto de selo, nas operações financeiras, tributa a concessão de crédito independentemente da forma contratual que lhe está subjacente (“a concessão de crédito a qualquer título”, como determina a referida verba da Tabela Geral na verba 17:
«17
Operações financeiras:
17.1
Pela utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de crédito a qualquer título excepto nos casos referidos na verba 17.2, incluindo a cessão de créditos, o factoring e as operações de tesouraria quando envolvam qualquer tipo de financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, considerando-se, sempre, como nova concessão de crédito a prorrogação do prazo do contrato - sobre o respectivo valor, em função do prazo:».
Nos termos do artigo 5º do CIS:
(…) A obrigação tributária considera-se constituída:
g) Nas operações de crédito, no momento em que foram realizadas ou, se o crédito for utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outro meio em que o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês.
Na situação presente, diz a matéria de facto que:
«a existência de empréstimos concedidos pela impugnante à sociedade B…………, SAI no ano de 2002, no montante de €3.879.445,96, mantendo-se esses empréstimos sem qualquer alteração (reforço ou restituição do mesmo), nos anos posteriores a 2007.». Assim, é claro que em 2002 foi realizada a operação de crédito sujeita a tributação, e o momento da tributação é o momento em que foi realizada, em 2002.
Em 2002 ocorreu a celebração do contrato de concessão de crédito e a utilização de crédito por parte do mutuário - mobilização efectiva dos fundos, materializada por transferência bancária ou por cheque- com base num negócio jurídico típico de concessão de crédito (contrato de mútuo, nos termos previstos nos artigos 1142.º e seguintes do Código Civil). Em 2002 verificou-se um dispêndio financeiro da Recorrida com recurso aos seus fundos próprios ou alheios para fazer face às obrigações por si assumidas no contrato de concessão de crédito celebrado.
O Código do Imposto do Selo considera sujeitos passivos do imposto, de forma genérica, as “entidades concedentes do crédito” - art. 2.º, n.º 1, alínea g) do referido Código.
Nos termos do n.º 1, h) a concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido e não o contrato que lhe é subjacente o que significa que, mais que a forma do contrato, importa para a tributação a efectiva relação de crédito, estando sujeito a imposto apenas a efectiva utilização do crédito pelo beneficiário. Assim, teremos que concluir que a mera celebração do contrato de concessão de crédito nem sempre gera facto tributário do imposto. Quando a utilização do crédito for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que coincide com a data de celebração do contrato de concessão de crédito. Quando a utilização do crédito não for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que não coincide com a data de celebração do contrato concessão de crédito. O facto tributário eleito para tributação é, sempre, a concessão de crédito em que uma parte se obriga a realizar uma prestação de valores monetários a outra que por sua vez se obriga a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro.
A utilização de crédito com base em negócio jurídico de concessão de crédito é que torna aparente o contrato de concessão de crédito que o legislador quer tributar. Até que essa utilização se verifique, não há lugar a tributação e esta, quanto à sua taxa, depende muito do valor e periodicidade da utilização.
Na situação em análise, parecendo coincidir o momento de celebração do contrato de concessão de crédito – ou, pelo menos o momento em que dele há notícia - com o da utilização do capital, também para efeitos de determinação do prazo de caducidade do direito de liquidar o imposto, só ao momento da utilização se deve atender e este é, incontestavelmente a data de 2002, que a recorrente não discute.
A Administração Tributária, na sequência de uma fiscalização à ora recorrida, verificou a existência de factos tributários não declarados tendo procedido a liquidação oficiosa do imposto em falta, como lhe é imposto pelo n.º 7 do art. 59.º do Código de Processo e Procedimento Tributário. Nos termos do art. 45.º da LGT, aplicável ex vi do n.º 1 do art. 39.º do CIS a liquidação oficiosa do imposto de selo está sujeita ao instituto da caducidade.
Tomando por referência o último dia do ano de 2002, pelas razões antes indicadas, a notificação da liquidação respeitante a contrato efectuado nesse dia deveria ser notificada à recorrida até 31 de Dezembro de 2006.
Ainda que a matéria de facto não indique com precisão a data da notificação à recorrida, todos os actos de liquidação foram efectuados no ano de 2012, muito depois de esgotado o prazo de caducidade. O procedimento de inspecção decorreu também em 2012, quando há muito tinha caducado o direito de liquidar o imposto de selo por factos ocorridos em 2002, pelo que não haverá que considerar qualquer efeito suspensivo de um prazo já terminado.
A sentença recorrida não enferma, pois, dos vícios que lhe vinham apontados tendo efectuado uma adequada interpretação e aplicação da lei ao caso concreto, a determinar a sua integral confirmação.

Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

(Processado e revisto pela relatora com recurso a meios informáticos (art.º 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).


Lisboa, 14 de Março de 2018. – Ana Paula Lobo (relatora) – António Pimpão – Ascensão Lopes.