Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0121/21.6BEPRT-A
Data do Acordão:09/09/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
FUMUS BONI JURIS
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista se o erro acometido ao acórdão recorrido não se apresenta como suscetível de vir a lograr ser apreciado e obter procedência.
Nº Convencional:JSTA000P28131
Nº do Documento:SA1202109090121/21
Data de Entrada:08/27/2021
Recorrente:MUNICÍPIO DE VILA NOVA DE GAIA
Recorrido 1:CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P. E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:




1. MUNICÍPIO DE VILA NOVA DE GAIA, devidamente identificado nos autos e invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 02.07.2021 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 945/993 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que concedeu provimento ao recurso de apelação que A…………. deduziu por inconformado com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto - Juízo Administrativo Social [doravante TAF/PRT-JAS] - cfr. fls. 769/794 - , e que deferiu parcialmente a pretensão cautelar, determinando «a suspensão da eficácia do identificado ato que concluiu pela passagem do Requerente à situação de licença sem remuneração».

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 1003/1011], ao que se infere da sua alegação, na relevância jurídica e social da questão que reputa de fundamental [determinar se a passagem à situação de licença sem remuneração obriga à audição prévia do trabalhador ou se, sendo uma consequência ope legis de uma situação factual, essa audição prévia é dispensada, por desnecessária] e para efeitos de «uma melhor aplicação do direito», invocando, incorreta aplicação dos arts. 34.º, n.ºs 1 e 3, do DL n.º 35/2014, 121.º, 148.º e 163.º, n.º 5, todos do Código de Procedimento Administrativo [CPA/2015].

3. Foram produzidas contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 1019/1036 e fls. 1041/1046] nas quais se pugna, desde logo, pela não admissão do mesmo.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/PRT-JAS, por decisão de 13.04.2021, julgou improcedente a pretensão cautelar por não se encontrar verificado o requisito do fumus boni juris, juízo esse que foi revogado pelo TCA/N o qual entendeu que tal requisito se verificava por se mostrar como provável a procedência da ação administrativa principal fundada quer na verificação de «erro nos pressupostos de facto, que consubstancia um vício de violação de lei, conformador de uma ilegalidade de natureza material» [conclusão extraída pág. 36 da decisão sob o ponto «III.2.3.B.2. - Da questão - da iniciativa do ato administrativo»], quer na preterição do direito de audiência prévia [conclusão extraída pág. 40 da decisão sob o ponto «III.2.3.B.3. - Da questão - violação do direito de audiência prévia»], tendo de seguida concluído pela verificação igualmente dos demais requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do art. 120.º do CPTA.

7. Compulsados os autos importa, destarte, apreciar «preliminar» e «sumariamente» se se verificam os pressupostos de admissibilidade referidos no n.º 1 do citado art. 150.º do CPTA, ou seja, se está em causa uma questão que «pela sua relevância jurídica ou social» assume «importância fundamental», ou se a sua apreciação por este Supremo Tribunal é «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

8. O caráter excecional deste recurso tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência desta Formação, com especial destaque para os processos cautelares em que se tem afirmado a exigência de um rigor acrescido.

9. Com efeito, a orientação jurisprudencial desta Formação de Admissão Preliminar tem sido a de que não se justifica admitir revista de decisões de segunda instância, salvo quando se discutam aspetos do regime jurídico específicos ou que exclusivamente digam respeito ou se confinem à tutela cautelar, ou quando a decisão contenda com situações de relevância comunitária particularmente intensa ou de inobservância de princípios processuais fundamentais.

10. Entrando na análise do preenchimento dos pressupostos da revista sub specie impõe-se referir, desde logo, que não se mostra persuasiva a motivação/argumentação expendida pelo recorrente, impondo-se a não admissão da revista.

11. Com efeito, os tribunais na sua ação e função destinam-se a prevenir e dirimir situações com interesse prático e não a praticar atos inúteis [cfr. art. 130.º do CPC/2013], sendo que as pronúncias pelos mesmos emitidas não podem servir como meros pareceres ou opiniões sem outra valia.

12. As pronúncias dos tribunais destinam-se e visam decidir questões concretas e que tenham utilidade, na medida em que sejam suscetíveis de influir na decisão da causa, e já não decidir outras questões, que por muito interesse académico ou teórico que revistam, se devam ter como inúteis na lide.

13. E o afirmado vale com igual força para os recursos jurisdicionais e para as pronúncias proferidas nessa sede, razão pela qual a admissibilidade da revista apenas poderá ocorrer se a decisão a ser proferida na mesma seja suscetível de influir no sentido da decisão da causa, pelo que falhando uma tal possibilidade não se justificará tal admissão.

14. Ora analisadas as alegações produzidas pelo recorrente constata-se que o mesmo nenhuma reação ou impugnação deduziu quanto ao juízo do TCA/N de preenchimento do requisito do fumus boni juris enquanto estribado na provável procedência da pretensão anulatória por verificação do erro sobre os pressupostos de facto, já que no quadro das alegações de recurso produzidas o mesmo insurgiu-se única e exclusivamente quanto ao segmento relativo à preterição do direito de audiência.

15. Assim, tendo deixado incólume aquele outro segmento fundamentador do juízo do TCA, segmento esse suficiente e bastante para manutenção do preenchimento do requisito do fumus boni juris, temos que o recorrente nenhum benefício pode vir a lograr extrair do eventual desfecho positivo decorrente da procedência do presente recurso e, como tal, mostra-se o mesmo como manifestamente inviável, valendo, então, in casu a regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas a cargo do recorrente.
D.N..
Lisboa, 09 de setembro de 2021
[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, a Conselheira Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa e o Conselheiro José Augusto de Araújo Veloso] Carlos Luís Medeiros de Carvalho