Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0392/13
Data do Acordão:04/03/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
SUSPENSÃO
VENDA JUDICIAL
Sumário:Em sede de execução fiscal estando prevista a possibilidade de reclamação judicial de todos os actos lesivos e a subida imediata da reclamação a juízo quando tenha por fundamento prejuízo irreparável (cfr. arts. 276º e 278º, nº 3, do CPPT), com o consequente efeito suspensivo da execução, não pode considerar-se que a tutela judicial efectiva exija a admissibilidade providência cautelar em ordem à suspensão da venda, quando a recorrente podia ter reclamado precisamente do acto que determinou a venda.
Nº Convencional:JSTA00068183
Nº do Documento:SA2201304030392
Data de Entrada:03/08/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:INST DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, IP - COIMBRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT COIMBRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:CPPT98 ART220 ART276 ART237 N3
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0669/12 DE 2012/07/11; AC STA PROC060/12 DE 2012/03/14
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. A………………., com os sinais dos autos, requereu providência cautelar de suspensão da eficácia da decisão do INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, que determinou a desocupação de imóvel vendido em processo de execução fiscal, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que absolveu a entidade requerida da instância.
2. Não se conformando com tal aresto, A……………… interpôs recurso para a secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentou as suas Alegações, com as seguintes Conclusões:
“A.)
O Tribunal a quo, absolveu a entidade requerida da presente instância, com fundamento na utilização de meio processual não idóneo para o fim pretendido.
B.)
Porém, a impugnante não pode conformar-se com o decidido.
C.)
Com efeito, a acção a propor visa atacar a venda do imóvel, e não a ordem de entrega.
D.)
A ordem de entrega, individualmente considerável não é sequer atacável.
E.)
Enquanto se mantiver a venda efectuada, a entrega do bem é um acto inteiramente válido.
F.)
Entende a recorrente que a nulidade da venda não pode ser alegada em sede no âmbito do processo executivo, mas apenas em acção própria com essa finalidade.
G.)
Até porque, a nulidade é invocável a todo o tempo.
H.)
É certo que com o recurso à reclamação nos termos do artigo 277.° do CPPT se lograria a suspensão do acto.
I.)
Porém esse não seria o meio processual adequado para dirimir a questão da nulidade invocada.
J.)
O acórdão acompanhado pela Tribunal a quo na sentença ora recorrida, parte de pressupostos factuais diferente, pelo que não é aplicável ao caso ora em análise.
L.)
Como tal, deverá a decisão proferida pelo Tribunal a quo ser revogada.
Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exas mui doutamente suprirão, deverá o presente Recurso ser julgado totalmente procedente por provado e em consequência ser revogada a sentença proferida, e remetidos os autos novamente à primeira instância para apreciação do mérito da causa.”

3. A entidade recorrida deduziu Contra-alegações, com as Conclusões seguintes:
“1. A Recorrente requereu junto ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra “a concessão de uma providência cautelar do acto administrativo ínsito à ordem de desocupação e entrega, de 07 de Setembro, subscrita pela Coordenadora da Secção de Processos de Coimbra do IGFSS, Dra. B………………..”;
2. Em 3 de Janeiro de 2013 foi proferida decisão pelo Meritíssimo Juiz a quo de absolvição da Secção de Processo de Coimbra do IGFSS, IP da instância por impropriedade do meio processual utilizado;
3. O meio processual adequado, considerando a natureza judicial do processo de execução fiscal (artigo 103, n.° 1 da LGT), seria uma reclamação da decisão do órgão de execução fiscal apresentada nos termos do artigo 276.° e seguintes do CPPT.
4. Nos termos do artigo 10.°, n.° 1 alínea f) do Código de Procedimento e Processo Tributário cabe aos “serviços de administração tributária instaurar os processos de execução fiscal e realizar os actos a estes respeitantes, salvo os previstos no n.° 1 do artigo 151.° do presente Código”
5. O que está conforme o previsto no DL 42/2001 de 9 de Fevereiro que cria as Secções de Processo Executivo do Sistema Solidariedade e Segurança Social.
6. A actuação do Tribunal Tributário de 1.ª instância está limitada às questões previstas no artigo 151.º, n.° 1 (com a redacção introduzida pelam Lei 55/2010 de 31 de Dezembro): decidir incidentes, embargos, oposição e reclamações dos actos materialmente administrativos praticados pelo órgão de execução;
7. “O conhecimento e apreciação de nulidades ocorridas no processo de execução fiscal (e alegadamente emergentes da violação das regras.... atinentes à publicidade da venda) traduz-se na prática de acto ou actos processuais que ao órgão de execução fiscal cabe realizar, ao abrigo da 1ª parte da alínea f) do n.°1 do artigo 10.° do CPPT” (in acórdão do STA de 05/07/2012 no processo 0873/11 in ww.dgsi.pt).
8. O artigo 95.° da Lei Geral Tributária diz no seu n.º 1 que “o interessado tem direito de impugnar ou recorrer de todo o acto lesivo dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, segundo as formas de processo prescritas na lei.”
9. A Recorrente dirigiu requerimento a 6 de Dezembro de 2011 ao órgão de execução que não mereceu provimento;
10. Poderia, nos dez dias após a notificação, ter apresentado uma reclamação nos termos dos artigos 101°, alínea d) e 103.°, n.° da LGT e 276.° e seguintes do CPTT que consagram o controlo da legalidade pelo juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por um órgão de execução;
11. Existindo na execução meios processuais próprios para reagir contra eventuais nulidades processuais não faz sentido o recurso da Recorrente às providências cautelares previstas no Código de Procedimento dos Tribunais Administrativos ou à acção administrativa especial.
Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis deve ser mantida a decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, mantendo-se a absolvição da Secção de Processo de Coimbra do IGFSS, IP da instância por concluir pela impropriedade do meio processual utilizado pela Recorrente, assim se fazendo JUSTIÇA.”

4. O Digno Representante do Ministério Público, junto do STA, emitiu Parecer onde conclui:
“(…). A recorrente requereu a adopção de providência cautelar visando a suspensão da eficácia da ordem de desocupação de imóvel vendido em processo de execução fiscal (petição inicial; doc.fls.23)
Sufraga-se o entendimento vertido na decisão recorrida sobre:
a) a impropriedade do meio processual utilizado para obter a suspensão da eficácia do acto objecto da providência cautelar;
b) a impossibilidade de convolação para o meio processual adequado reclamação, por intempestividade da apresentação da petição (art.276° CPPT).
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A decisão impugnada de ser confirmada”.

5. Com dispensa de vistos, por o processo ser urgente, cumpre apreciar e decidir.


II - FUNDAMENTOS

1. DE FACTO
1 - A sentença, sob recurso, deu como provada a seguinte matéria:
“A — Encontra-se registada a favor de C……………… a aquisição de uma casa de habitação sita em ……………, ……….., inscrito na matriz sob os n.°s 3176 e 11160, daquela localidade (cf. doc. a fls. 136 a 143 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
B — A casa de habitação referida na alínea anterior foi objecto de penhoras por parte da Entidade Requerida (cf. docs. a fls. 99 a 127 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
C — Em 27.03.2006, a Requerente e C……………….., declararam que o único bem por partilhar era o referido nas alíneas anteriores, sobre o qual incidem as aludidas penhoras, adjudicando-o à Requerente, tendo sido esta advertida de que a referida partilha “[...] é ineficaz em relação aos exequentes das referidas penhoras [...]” (cf. doc. a fls. 31 a 34 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
D — A Requerente, através do seu Advogado, apresentou uma exposição escrita em 22.06.2006, dando conta que havia interposto neste Tribunal um “[...] processo de embargos de terceiro, visando o cancelamento na Conservatória do Registo Predial de Montemor-o-Velho dos registos de penhora [...]” (cf. doc. a fls. 200 a 201 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
E — Por decisão deste Tribunal, datada de 26.03.2009, proferida no Proc. n.° 407/07.2BECBR movido pela ora Requerente, foi decidido “[...] rejeitar os presente embargos, por julgar procedente caducidade do direito, absolvendo-se os embargados da presente instância [...]” (cf. doc. a fls. 126 a 136 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
F — Por despacho datado de 22.12.2009 foi determinada a venda da casa referida nas alíneas anteriores, tendo a mesma sido objecto de publicitação (cf. docs. a fls. 222 a 240 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
G — A casa de habitação referida nas alíneas anteriores foi objecto de venda (cf. doc. a fls. 436 a 456 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
H — Em ofício da Entidade Requerida firmado pela Sra. Directora do Processo Executivo, datado de 29.08.2012, dirigido à Requerente, relativamente à casa de habitação referida nas alíneas anteriores, retira-se que: “[...] na sequência da venda, em execução, do mesmo prédio, houve conhecimento, através dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, que o mesmo estará ocupado por V. Exa. e por familiares seus;
Nestes termos, fica por este meio notificada de que deve deixar o referido prédio devoluto de pessoas e bens e facultar o acesso ao mesmo, no prazo de 10 (dez) dias, a fim de se proceder à concreta entrega ao seu legítimo proprietário/adquirente [...]” (cf. doc. a fls. 548 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
I — A Requerente teve conhecimento do ofício referido na alínea anterior em 30.08.2012 (cf. doc. a fls. 549 dos autos do Proc. 346/10.OBECBR que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
J — O requerimento inicial do presente meio processual foi remetido via SITAF para este Tribunal em 27.09.2012 (cfr. fls. 1 a 38 dos autos).”

2. DE DIREITO

2.1. Das questões a apreciar e decidir

A………………. veio interpor providência cautelar, contra o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, requerendo a suspensão da eficácia da ordem de 7 de Setembro de 2012, subscrita pela coordenadora da secção de processo de Coimbra do IGFSS, nos termos da qual lhe era dado o prazo de dez dias para deixar o prédio urbano, sito no lugar de ……………, freguesia de ………… descrito na matriz predial urbana sob o artigo nº 3176, e descrito na Conservatória do registo predial de Montemor-o-velho, sob o nº 08086, devoluto de pessoas e bens e facultar o acesso ao mesmo, a fim de se proceder à entrega do mesmo ao legítimo proprietário/adquirente.
Para tanto invocou, entre o mais, que era proprietária do imóvel, que foi vendido pela Segurança Social, sendo que a dívida a que respeita o processo de execução era da exclusiva responsabilidade do ex-marido.
A entidade requerida suscitou a excepção quanto à impropriedade do meio processual utilizado, o que foi aceite pelo Mmº Juiz “a quo”, seguindo sobretudo a jurisprudência vazada no Acórdão do STA de 11/7/2012, proferido no âmbito do Proc. n.° 0669/12.
Para esse efeito ponderou-se na sentença recorrida:
“(…) Na presente situação, a Requerente pretende suspender os efeitos de um acto praticado ainda no âmbito da execução a que se alude nos presentes autos. Por tal acto determina-se que a ora Requerente deverá abandonar a casa de habitação na qual aquela aqui afirma residir com o seu agregado familiar. Esta decisão vem na sequência lógica da venda da referida habitação em processo de execução fiscal, pelo que se trata inequivocamente de um acto conexo com o aludido processo.
Deste modo, tal como no Acórdão supra citado, entendemos que o meio processual idóneo que a Requerente teria para lançar mão seria o da Reclamação prevista nos artigos 276.º e segs. do CPPT e não a forma do processo cautelar regulada no CPTA, tal como vai referido no citado aresto e nas considerações que nele são referidas e que seria fastidioso aqui repetir (embora naquele se refira a um acto pelo qual se determina a venda de um bem penhorado e aqui esteja em causa um acto que ordena a desocupação de um bem já vendido, o que, porém, não invalida a transposição para os presentes autos das considerações ali feitas).
Assim, conclui-se que a presente forma processual não é o meio idóneo para a Requerente por em causa a citada ordem de desocupação, cuja suspensão de efeitos é aqui pedida (ordem esta constante do ofício a que se alude na alínea «H» da matéria de facto).
O Mº Juiz conclui pela impossibilidade de convolação do requerimento de suspensão da eficácia na reclamação de actos do órgão de execução fiscal, com base na seguinte argumentação:
(…) Como resulta da factualidade provada, a Requerente foi notificada da decisão suspendenda em 30.08.2012, pelo que interpondo o respectivo processo judicial de reclamação, teria que o fazer no prazo referido no n.° 1 do art.° 277.º do CPPT, ou seja de 10 (dez) dias, estes computados nos termos do art.° 20.º n.º 2 daquele mesmo código e 144.º do CPC. Ora, tendo sido o presente processo interposto em 27.09.2012, já se encontra esgotado o aludido prazo de dez dias.
Deste modo, a aventada convolação, a operar-se, resultaria na prática de um acto processualmente inútil, uma vez que estaria ultrapassado o prazo para apresentação do respectivo meio processual de Reclamação.
Por isso, por estar vedada a prática ao Tribunal de actos inúteis, não se determina a aludida convolação e procedendo a apontada excepção terá que a Entidade Requerida ser absolvida da instância”.
Contra este entendimento se insurge a ora recorrente argumentando, em síntese, que:
· “(…), a acção a propor visa atacar a venda do imóvel, e não a ordem de entrega” e que “A ordem de entrega, individualmente considerável não é sequer atacável”.
· A recorrente alega também a nulidade da venda, invocável a todo o tempo, e que a reclamação nos termos do artigo 277.° do CPPT, não seria, no caso, o meio processual adequado para dirimir a questão da nulidade invocada.
· E, alega, ainda que “O acórdão acompanhado pelo Tribunal a quo na sentença ora recorrida, parte de pressupostos factuais diferente, pelo que não é aplicável ao caso ora em análise” (Conclusão L).

3. Da idoneidade do meio processual utilizado

3.1. Como vimos, a recorrente lançou mão da providência cautelar suspensão da eficácia contra a ordem de desocupação e entrega proveniente da coordenadora da secção de processos de Coimbra do IGFSS, embora alegue, nas conclusões das alegações, que o que pretende com tal providência é atacar a venda do imóvel e não a ordem de entrega, reconhecendo que esta não é sequer autonomamente impugnável.
Acontece que se a ordem de entrega não é susceptível de suspensão por ser um acto de mera execução de um acto judicial ( Cfr., entre outros, o Acórdão do STA de 10/10/2012, proc nº 933/12.) (o acto de venda), a verdade é que tal acto de venda (ainda que fosse de considerar acto administrativo) também não seria susceptível de suspensão por se tratar de acto já executado. Assim sendo, abstraindo o facto de se tratar de uma providência cautelar enxertada no processo de execução, a verdade é que, mesmo no âmbito do contencioso administrativo, a suspensão de actos já executados obedece a pressupostos apertados, que no caso não são sequer invocados.
De todo o modo, por não estarmos perante um acto administrativo, a suspensão da eficácia o acto de venda nunca seria alcançado através da providência utilizada pela recorrente, que sempre teria de se entender como uma providência cautelar não especificada ou inominada ainda que dirigida a obter a suspensão do acto de venda.
Feito este reparo, impõe-se, desta forma analisar se assiste razão à recorrente.
Recortada a questão, tal como é feita pela recorrente nas alegações e respectivas conclusões, a mesma aproxima-se da que foi analisada no Acórdão deste Supremo Tribunal de 11/7/2012, proc nº 669/12, que se debruçou sobre a idoneidade da instauração de uma providência cautelar, no âmbito da execução fiscal, com vista a obter a suspensão da venda e que foi objecto de indeferimento liminar, com base, desde logo, na inidoneidade do meio processual usado.
No mencionado Acórdão, este Supremo Tribunal concordou com o despacho recorrido, na parte em que no mesmo se considerou não haver que lançar mão de providência cautelar alguma como meio de assegurar a tutela judicial efectiva.
Assim, ficou consignado naquela aresto “(…) temos que reconhecer que nem o art. 20.º nem o art. 268.º, n.° 4, da CRP, preceitos que consagram o princípio da tutela judicial efectiva, impõem a duplicação de meios processuais para a tutela efectiva dos direitos e interesses legítimos dos particulares. O que significa que não deverá reconhecer-se a possibilidade indiscriminada de lançar mão de providências cautelares em ordem à suspensão da execução fiscal quando a lei estabelece de modo fechado as condições e os meios processuais em que pode haver lugar à suspensão da execução fiscal (cfr. art. 169.º do CPPT e art. 52.º da LGT), sendo proibida tal suspensão fora desses casos (cfr. art. 85.º do CPPT).
Como salientou a Juíza do Tribunal a quo, a Requerente podia ter conseguido a suspensão da execução fiscal até que fosse efectuada a partilha, se tivesse requerido a separação de bens (cfr. art. 220.º do CPPT, por remissão para o n.° 7 do art. 825.º do CPC), sendo que foi citada para o efeito e nada requereu (cfr. alínea b) dos factos arrolados no despacho recorrido).
Por outro lado, na execução fiscal está prevista a possibilidade de reclamar judicialmente de todas as decisões do órgão da execução fiscal que afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro (cfr. art. 276.º do CPPT). Essa reclamação, nos termos do disposto no n.° 3 do art. 278.º do CPPT, subirá imediatamente a tribunal nos casos em que se fundamente em prejuízo irreparável para o interessado (A jurisprudência é unânime em reconhecer a subida imediata da reclamação, não só nos casos elencados no n.° 3 do art. 278.° do CPPT, como em todos aqueles em que o direito à tutela judicial efectiva requeira tal subida imediata como modo de evitar prejuízos para os interessados. Com interesse, vide JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª edição, volume IV, anotação 5 ao art. 278.º, págs. 305/306.), o que lhe assegura o efeito suspensivo, uma vez que a reclamação é tramitada na própria execução fiscal (Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. e vol, cit, anotação 2 d) ao art. 278.º págs. 302/303.). Ou seja, a ora Recorrente podia ter questionado mediante reclamação judicial a legalidade do despacho que ordenou a venda.
Salvo o devido respeito, não vislumbramos que no caso sub judice se exigisse o recurso a qualquer providência cautelar para assegurar a tutela judicial efectiva, que sempre estaria plenamente garantida quer através do pedido de separação de bens, quer através da reclamação judicial do despacho que ordenou a venda, um e outra a determinarem a suspensão da execução fiscal.
3.2. Em face do exposto, afigura-se patente não assistir razão à recorrente quando defende que a questão objecto do presente recurso é diferente da visada no Acórdão acabado de transcrever, porque no caso em apreço a reclamação prevista no art. 276º ss. do CPPT não seria o meio processual adequado a dirimir a alegada nulidade da venda.
Na verdade, para além da recorrente já ter lançado mão da figura dos embargos de terceiro e de ter tido a possibilidade de requerer a meação, quando citada para esse efeito, nos termos do disposto no art. 220º do CPPT (cfr. fls. 197 dos Autos), também podia ter reclamado do acto de marcação da venda invocando aí as ilegalidades/nulidades do mesmo junto do órgão de execução fiscal, reclamação esta que teria efeito suspensivo automático, não necessitando da utilização de qualquer providência cautelar para obter tal efeito. Acresce que o órgão de execução fiscal teria competência para corrigir, desde logo, eventuais ilegalidades invocadas.
Assim sendo, não podemos deixar de concordar com o decidido na sentença quando conclui que “(…) o meio processual idóneo que a Requerente teria para lançar mão seria o da Reclamação prevista nos artigos 276.º e segs. do CPPT e não a forma do processo cautelar regulada no CPTA (…) pelo que “a presente forma processual não é o meio idóneo para a Requerente por em causa a citada ordem de desocupação, cuja suspensão de efeitos é aqui pedida (ordem esta constante do ofício a que se alude na alínea «H» da matéria de facto)”.
Por outro lado, assiste também razão ao Mmº Juiz “a quo” quando conclui pela impossibilidade de convolação do presente meio processual na aludida forma de processo de Reclamação.
Como se pode ler na sentença recorrida, “(…) a Requerente foi notificada da decisão suspendenda em 30.08.2012, pelo que interpondo o respectivo processo judicial de reclamação, teria que o fazer no prazo referido no n.° 1 do art.° 277.º do CPPT, ou seja de 10 (dez) dias, estes computados nos termos do art.° 20.º n.º 2 daquele mesmo código e 144.º do CPC. Ora, tendo sido o presente processo interposto em 27.09.2012, já se encontra esgotado o aludido prazo de dez dias.
Deste modo, a aventada convolação, a operar-se, resultaria na prática de um acto processualmente inútil, uma vez que estaria ultrapassado o prazo para apresentação do respectivo meio processual de Reclamação.
Por isso, por estar vedada a prática ao Tribunal de actos inúteis, não se determina a aludida convolação e procedendo a apontada excepção terá que a Entidade Requerida ser absolvida da instância”.
Esta conclusão não é posta em causa pelo facto de a recorrente alegar que a venda enferma de nulidade. É que contra a venda nem sequer os embargos podem ser deduzidos, conforme dispõe o art. 237º, nº 3, do CPPT, solução que tem justificação evidente, que é a protecção da estabilidade das vendas em execução, que incrementa a segurança dos compradores, fomentando o aparecimento de um maior número de interessados e a obtenção de melhores preços. Como ficou consignado, no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, de 14/3/2012, proc nº 60/12, “Trata-se, aqui, de um interesse público, oposto ao que a embargante tem em defender o seu direito, que justifica uma restrição deste, independentemente da formulação de um juízo negativo sobre a diligência do embargante em defender os seus direitos.”
Em suma, não sendo de acolher a argumentação da recorrente, deve improceder o recurso confirmando-se a sentença recorrida.

III - DECISÃO

Termos em que os Juízes Conselheiros da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 3 de Abril de 2013. – Fernanda Maçãs (relatora) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.