Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03108/12.6BELSB-A
Data do Acordão:02/11/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESCRIÇÃO
CONHECIMENTO DE DIREITO
Sumário:Não se justifica admitir revista de acórdão que decidiu através de discurso jurídico plausível que o prazo da prescrição do direito à indemnização previsto no art. 498º, 1 do CC começa a correr a partir da data do conhecimento desse direito e que esse conhecimento, num caso de erro de diagnóstico se conta a partir do conhecimento do diagnóstico certo.
Nº Convencional:JSTA000P24214
Nº do Documento:SA12019021103108/12
Data de Entrada:02/04/2019
Recorrente:A.....
Recorrido 1:HOSPITAL DE SANTA MARIA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………………, identificada nos autos, recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Sul, proferido em 14 de Outubro de 2018, que revogou a sentença proferida pelo TAC de Lisboa e julgou procedente a excepção da prescrição do direito à indemnização, na ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM por si intentada contra B……………….., Hospital de Santa Maria EPE/Centro Hospitalar Lisboa Norte EPE e em que é interveniente C……………… SA.

1.2. Não fundamentou a admissibilidade da revista.

1.3. Não foram produzidas contra-alegações

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A autora pediu uma indemnização imputando à Dra. B……………. um diagnóstico errado e negligente, quando se deslocou aos Serviços de Urgência do Hospital de Santa Maria, em 1 de Dezembro de 2009. Não obstante a alta clínica pelas 4h55m daquele dia 1-12-2009, e por ter continuado com dores dirigiu-se ao Hospital da Luz, em 4 de Dezembro de 2009, onde nesse mesmo dia foi operada, tendo tido alta hospitalar em 13 de Dezembro de 2009. Alega ainda que em 6 de Janeiro de 2010 se dirigiu novamente ao Hospital da Luz, tendo ficado internada até 8 de Janeiro de 2010, estando de baixa médica de 2 de Dezembro de 2009 e de 13 de Dezembro de 2009 a 11 de Fevereiro de 2010.

Perante os factos sumariados entendeu a primeira instância julgou não verificada a prescrição.

No caso dos autos – diz a decisão – afigura-se que o direito à indemnização só pôde ser exercido pela autora a partir do momento em que esta recuperou efectivamente a sua saúde e que foi, está provado, em 12 de Fevereiro de 2010. Pelo que o início do curso da prescrição só se deu naquela data, pelo que em 13 de Dezembro de 2012, e cinco dias após esta data (art. 323º, n.º 2 do Código Civil) o prazo da prescrição ainda não tinha decorrido, razão pela qual tem de ser julgada improcedente a suscitada excepção peremptória da prescrição do invocado direito de indemnização”.

3.3. O TCA Sul revogou a decisão da primeira instância por entender, em suma, que a autora ficou a conhecer a existência do seu direito à indemnização quando teve conhecimento do diagnóstico “"abdómen agudo por perfuração do cego".

E, adianta o acórdão recorrido, “(…) Mesmo que nessa data não tivesse compreendido toda a amplitude da sua situação clínica, é seguro dizer que aquando da alta hospitalar, em 13/12/2009 se terá inteirado totalmente sobre os termos da sua condição de saúde, isto é, a patologia de que sofria, a sua gravidade, o tratamento/cirurgia a que foi submetida e os cuidados médicos a ter”.

Assim e tendo a autora tido alta em 13 de Dezembro de 2009, foi nessa data que começou a correr o prazo da prescrição.

A presente acção deu entrada em juízo no dia 13/12/2012, precisamente três anos decorridos da alta hospitalar, sendo os réus citados em 15-1-2013 e a ré médica em 12-2-2013.

Consequentemente julgou procedente a excepção da prescrição: “(…)Tem de se entender que pelo menos desde a altura em que teve alta hospitalar, desde 13/12/2009 a Autora conhece a factualidade relevante relativa quer ao errado diagnóstico médico ocorrido no Hospital de Santa Maria, enquanto facto causador dos danos alegados, quer à sua imputação subjetiva, não sendo necessário que conhecesse a integralidade dos danos.

O direito de indemnização, segundo o disposto no n.° 1 do artigo 498.° do CC, prescreve no prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento da verificação dos pressupostos que condicionam a responsabilidade do lesante, ou seja, o prazo prescricional conta-se a partir da data em que o lesado, conhecendo a verificação dos pressupostos que condicionam a responsabilidade (o facto, a ilicitude, a culpa, a existência de danos e o nexo de imputação objectiva entre a conduta e o dano, apurado segundo a teoria da causalidade adequada), soube ter direito à indemnização”.

3.4. Como decorre do exposto a questão destes autos resume-se a saber qual a data relevante para início da contagem do prazo de prescrição.

Não estão em causa questões gerais de natureza jurídica, mas sim de subsunção de uma concreta situação de facto. Deste modo, a questão essencial é de natureza singular, esgotando a sua utilidade neste processo, o que lhe retira importância jurídica fundamental.

A questão não tem relevância social determinante, sendo que a autora pediu a condenação dos Réus a pagarem a quantia de € 8.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais e a quantia de € 2.377,00 a título de danos patrimoniais, acrescida de juros legais, fundada na responsabilidade civil dos Réus, por diagnóstico errado e negligente da Ré, médica, por falta de observação cuidadosa da paciente, ora Autora e Recorrida, ou seja, por violação das leges artis e da ciência médica.

Também não se afigura existir erro manifesto na decisão do TCA Sul – a qual se mostra fundamentada através de um discurso jurídico plausível – e portanto não é claramente necessária a intervenção do STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do direito.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pela recorrente.

Porto, 11 de Fevereiro de 2019. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.