Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0994/22.5BELSB
Data do Acordão:05/04/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES
ADVOGADO
Sumário:O recurso de revista que tem vindo a ser admitido em nome da necessidade de esclarecer o tratamento jurídico de questão considerada complexa, deve deixar de o ser, em casos semelhantes, depois da mesma ter sido objecto de tratamento jurídico pelo tribunal de revista em sentido coincidente com o defendido pelas instâncias.
Nº Convencional:JSTA000P30961
Nº do Documento:SA1202305040994/22
Data de Entrada:04/27/2023
Recorrente:INSTITUTO DOS REGISTOS E NOTARIADO, I.P.
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. INSTITUTO DOS REGISTOS E DO NOTARIADO, I.P. [IRN] - demandado neste processo de «intimação para prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões» - vem, invocando o artigo 150º do CPTA, interpor recurso de revista da «decisão sumária» proferida pelo TCAS - datada de 28.03.2023 - que negou provimento à sua apelação e manteve a sentença do TAC de Lisboa - de 18.11.2022 - que julgou procedente o pedido formulado por AA, e, em conformidade, o intimou a, no prazo de cinco dias, prestar a esta requerente a informação por ela solicitada em 05.04.2022.

Alega que o recurso de revista deverá ser admitido em nome da «necessidade de uma melhor aplicação do direito» e em nome da «relevância jurídica e social da questão».

A recorrida - AA - não apresentou contra-alegações.

2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

3. A autora do processo de intimação em causa - AA - pediu ao tribunal administrativo - TAC de Lisboa - que intimasse o demandado IRN - Conservador dos Registos Centrais - a prestar-lhe, em cinco dias, a informação que, enquanto advogada, lhe havia solicitado a 05.04.2022, ou seja, «se o processo nº...17 do sector PAI-Índia se encontra pendente ou arquivado; se existe[m] mandatário[s] constituído[s]; e, caso afirmativo, o nome e o número de cédula profissional desses mandatários».

Os tribunais de instância - TAC de Lisboa e TCAS - julgaram procedente tal pedido e, assim, decretaram a intimação do IRN nos termos solicitados. Fizeram-no - essencialmente - por entenderem que atendendo a que as informações pretendidas pela requerente não dizem respeito a dados pessoais do requerente da nacionalidade, a advogada requerente tem direito, ao abrigo do disposto no artigo 79º, nº1, do Estatuto da Ordem dos Advogados [EOA], a obter essas informações, sem que, para tanto, tenha de exibir procuração.

O IRN discorda de novo, e pede revista do assim decidido - mormente pela «decisão sumária» do TCAS - por entender que os tribunais de instância não aplicaram correctamente, ao caso litigado, os regimes e normas jurídicas chamadas a intervir. Defende que a «advogada requerente», para ter acesso à informação solicitada deveria estar previamente munida de procuração para o efeito, pois só isso a legitima com um interesse directo, pessoal, e constitucionalmente protegido na obtenção da mesma. Explica que esta conclusão se extrai, e é imposta, pela mais correcta «interpretação conjugada» [artigo 9º, nºs 1 e 3 do CC] dos regimes jurídicos decorrentes da LADA [artigos 3º nº1 alíneas a) e b), 4º nº1 alínea c), e 6º nº5], do RGPD da União Europeia [Regulamento (UE) nº679/2016, de 27.04, nomeadamente seu artigo 4º nº1], do CPA [artigo 85º], e do EOA [artigos 79º, e 112º nº2]. E sublinha que uma tal interpretação, e o consequente indeferimento do requerimento em causa - dirigido ao Conservador dos Registos Centrais - lhe são impostos por «parecer vinculativo» dos Serviços Jurídicos do IRN.

Compulsados os autos, importa apreciar «preliminar e sumariamente», como compete a esta Formação, se estão verificados os «pressupostos» de admissibilidade do recurso de revista - referidos no citado artigo 150º do CPTA - ou seja, se está em causa uma questão que «pela sua relevância jurídica ou social» assume «importância fundamental», ou se a sua apreciação por este Supremo Tribunal é «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Feita essa apreciação preliminar e sumária, tal como nos compete, constatamos que, não obstante o sentido decisório dos tribunais de instância ser idêntico, e essa decisão não parecer desrazoável, este tipo de recurso de revista tem vindo a ser admitido, por esta Formação, a fim de que a questão que constitui seu objecto - e considerada eivada de alguma complexidade, desde logo pela necessidade de concatenação interpretativa de vários regimes jurídicos chamados a intervir - obtivesse do tribunal de revista o necessário «esclarecimento interpretativo e aplicativo» - ver entre outros, AC STA/Formação de 09.02.2023, processo nº992/22.9BELSB; e AC STA/Formação de 09.03.2023, processo nº01053/22.6BELSB.

Acontece, porém, que entretanto já foram proferidos arestos pelo tribunal de revista - AC STA de 30.03.2023, processo nº992/22.9BELSB; AC STA de 19.04.2023, processo nº1053/22.6BELSB - que, procedendo ao tratamento jurídico da questão objecto da revista, negaram provimento aos recursos e mantiveram as decisões das instâncias.

Assim, encontra-se, actualmente, dissipada a «importância fundamental» em nome da qual foram vindo a ser admitidas revistas idênticas à presente, todas antes da prolação de qualquer acórdão tirado, a tal respeito, por este Supremo Tribunal.

Deste modo, e por presentemente não se encontrarem preenchidos os «pressupostos» justificativos da admissão do recurso de revista, deverá o mesmo, neste caso, «não ser admitido».

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em não admitir a revista.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 4 de Maio de 2023. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Fonseca da Paz.