Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0741/15
Data do Acordão:07/09/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VÍTOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não se justifica a admissão do recurso de revista excepcional quando o que se pretende discutir respeita à fundamentação do acto administrativo, matéria abundantemente trabalhada jurisprudencialmente e em que a resposta é intrinsecamente dependente das particularidades do caso concreto, nada indiciando a decisão concordante das instâncias a seu propósito que torne claramente necessária a intervenção do órgão de cúpula da jurisdição.
Nº Convencional:JSTA000P19283
Nº do Documento:SA1201507090741
Data de Entrada:06/12/2015
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. A………… Ldª interpõe recurso, ao abrigo do art. 150.º do CPTA, do acórdão do TCA Norte de 23/01/2015, que negou provimento a recurso de sentença do TAF de Braga, em acção administrativa especial intentada contra o Instituto de Segurança Social IP, visando a decisão que determinou a restituição de €16.256,40, correspondente a prestações de desemprego pagas a uma trabalhadora da Autora, por virtude de estar esgotada a “quota” estabelecida pela alínea a) do n.º 4 do art.º 10.º do Dec. Lei n.º 220/06, de 3 de Novembro.

Em síntese, o acórdão recorrido entendeu, confirmando a decisão recorrida, que o acto impugnado não enferma de falta de fundamentação, porque a recorrente ficou de posse das razões de facto e direito que determinaram a devolução da verba em causa, não sendo exigível a identificação de todos os ex-trabalhadores a quem foi emitida pela empresa em causa declaração para obtenção do subsídio de desemprego e que o foram efectivamente reivindicar, pois o cuidado a ter nesta tarefa de apuramento compete à empresa interessada.

A recorrente sustenta no presente recurso, em síntese, que a exigência de fundamentação do tipo de acto em causa só se satisfaz mediante a revelação, no próprio acto, de quais os trabalhadores em função de cuja atribuição de prestação de desemprego se entende que está esgotada a “quota” atendível nos termos do art.º 10.º, n.º 4, do Dec. Lei n.º 220/2006, não bastando fazê-lo no decurso da acção, tanto mais que a empresa não tem acesso a essa informação que é reservada e pode ter havido uma multiplicidade de razões para que os trabalhadores despedidos não recorram ao subsídio de desemprego.
2. O recorrido, no que agora interessa, defende que não estamos perante uma questão de relevância jurídica ou social, nem há clara necessidade da sua admissão para melhor aplicação do direito, contrariamente ao que a recorrente sustenta.

3. As decisões proferidas pelos tribunais centrais administrativos em segundo grau de jurisdição não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário. Apenas consentem recurso nos termos do n.º 1 do art.º 150.º do CPTA, preceito que dispõe que das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, a título excepcional, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

4. Não estamos perante uma questão jurídica em se coloquem especiais dificuldades de interpretação ou aplicação da lei. Trata-se de uma questão de fundamentação do acto administrativo, que é matéria abundantemente trabalhada jurisprudencialmente e em que a resposta é intrinsecamente dependente das particularidades do caso concreto. É certo que a recorrente procura colocar a questão num plano susceptível de alguma generalização, em função de um tipo de acto. Mas não há evidência de se tratar de assunto que se coloque frequentemente nos tribunais, de modo a que possa falar-se em aptidão do caso para servir de paradigma de solução de um número indeterminado de casos semelhantes, com virtualidade de “expansão da controvérsia”.

E também não se trata de questão que possa revestir-se de especial repercussão comunitária. Com efeito o que se pretende ver apreciada é a fundamentação dos actos que ordenam a restituição, a cargo do empregador, do montante de subsídio e que só ao destinatário interessa, não estando sequer em causa aspectos relativos ao regime substantivo da protecção no desemprego ou de protecção social em casos de cessação do contrato de trabalho por acordo no âmbito de redução de efectivos pelos motivos previstos no art.º 10.º do Dec. Lei n.º 220/2006.

Finalmente também não se justifica a admissão do recurso excepcional com fundamento na “clara necessidade de melhor aplicação do direito”. Efectivamente, o decidido concordantemente pelas instâncias quanto a este vício do acto administrativo impugnado não assenta em opções interpretativas que se afastem dos parâmetros hermenêuticos correntes, nem se traduz em juízos aplicativos que enfermem de vícios lógicos ou erro manifesto perante a situação de facto. Concretamente, no aspecto sobre que incide a discussão, o acórdão considera a fundamentação do acto administrativo suficiente porque, além do mais, a destinatária do acto foi informada do modo de apuramento da “quota” e dos factores considerados, designadamente do quadro de pessoal inicial, do período atendível e da “quota” resultante (11 trabalhadores no triénio) e de que, antes da prestação que se quer recuperar, tinham sido deferidas 11 prestações de subsídio de desemprego com base em declarações emitidas pela própria recorrente. Esta apreciação pode ser discutível, mas não indicia uma situação de aplicação insólita do direito ou de preterição de princípios processuais fundamentais que torne claramente necessária a intervenção do órgão de cúpula da jurisdição, num sistema que assenta em, apenas, dois graus de jurisdição.

5. Decisão
Pelo exposto, decide-se não admitir a revista e condenar a recorrente nas custas.

Lisboa, 9 de Julho de 2015. – Vítor Gomes (relator) – Alberto Augusto OliveiraSão Pedro.