Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0277/18
Data do Acordão:05/09/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL
EXECUÇÃO FISCAL
CUSTAS
TAXA DE JUSTIÇA
Sumário:Dada a estrutural dependência da reclamação de actos praticados pelo órgão da execução fiscal, prevista no art. 276º do CPPT, em relação à própria execução fiscal na qual é praticado o acto potencialmente lesivo “reclamável”, a tributação daquela reclamação deverá ser feita pela Tabela II-A, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), que prevê expressamente a taxa de justiça na execução.
Nº Convencional:JSTA000P23267
Nº do Documento:SA2201805090277
Data de Entrada:03/12/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………………, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF do Porto) datada de 20 de Fevereiro de 2018, que se absteve de conhecer da reclamação que havia deduzido no âmbito da execução fiscal n° 1821200901054902 e apensos, a correr termos no Serviço de Finanças de Matosinhos 1, em que é executado seu pai – B……………., sindicando a legalidade do despacho que indeferiu o seu direito de remição no âmbito do daquele processo executivo, absolvendo a fazenda Pública da instância.
Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
1- A recorrente discorda da decisão recorrida.
2- A reclamação do artigo 276° e ss. do CPPT não é um incidente do processo de execução fiscal, nem é uma oposição à execução fiscal, por força da autonomização daquele remédio processual em relação aos outros, pelos artigos 151° n° 1 e 204° do CPPT e artigo 49° n° 1 alínea a) subalínea iii) do ETAF.
3- A reclamação do artigo 276° e ss. do CPPT é um expediente processual híbrido, onde se recorre de um acto materialmente administrativo praticado pela Administração Tributária para o Juiz da execução, não se considerando um recurso, uma vez que o processo de execução fiscal já tem natureza judicial, por força do disposto no artigo 103° n° 1 da LGT.
4- A reclamação prevista no artigo 276° e ss. do CPPT deve ser considerada como um expediente processual autónomo.
5- A taxa de justiça inicial da reclamação do artigo 276° do CPPT terá que ser liquidada de acordo com a Tabela I do Regulamento de Custas Processuais, tal como a reclamante liquidou a taxa.
6- O Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou acerca da matéria objecto do presente recurso - no Acórdão de 16 de Dezembro de 2010, no processo n° 0708/10 e no Acórdão de 05 de Julho de 2007, no processo n° 0506/07 — considerando que a taxa de justiça inicial da reclamação do artigo 276° do CPPT deve ser liquidada como acção de impugnação, ou seja, pela Tabela I do Regulamento de Custas Processuais.
Ainda sem prescindir,
7- Não faz sentido a taxa de justiça inicial da reclamação do artigo 276° ser liquidada pela Tabela II-A do Regulamento de Custas Processuais.
8- A Tabela II-A do Regulamento de Custas Processuais, diz respeito à taxa de justiça inicial a ser paga pela entrada em juízo de um requerimento executivo em processo civil, sendo que o valor de 2 UC só se aplica quando as diligências são praticadas por oficial de justiça.
9- Não existe qualquer relação formal e/ou material entre a entrada em juízo de um processo de execução em processo civil, com a reclamação do artigo 276° do CPPT em processo tributário.
NESTES TERMOS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, REVOGANDO-SE A SENTENÇA PROFERIDA, ORDENANDO-SE O PROSSEGUIMENTO DOS AUTOS A FIM DE SER PROFERIDA DECISÃO FINAL.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer.

A decisão recorrida tem o seguinte teor:
A…………, contribuinte fiscal n.º ……………., com domicílio na Rua ………., …….., ......, São Mamede de Infesta, deduziu em 21/07/2014, no âmbito da execução fiscal n° 1821200901054902 e apensos, a correr termos no Serviço de Finanças de Matosinhos 1, em que é executado seu pai, B……………., a presente reclamação de acto do órgão de execução fiscal sindicando a legalidade do despacho que indeferiu o seu direito de remição no âmbito do sobredito processo executivo.
Estriba a sua pretensão no facto de ser filha do executado, do processo executivo em causa se encontrar em fase de venda judicial e de, apesar de ter sido adjudicado o prédio rústico sito na Quinta do ………….., …………, em Arouca, este ainda não ter sido entregue ao adquirente.
Alega que a Autoridade Tributária (doravante "AT") erra ao aplicar a al. a), do n.º 1 do art. 843.° do CPC e não a al. b) do referido preceito legal pelo que poderia exercer o seu direito de remição até à entrega do bem em causa.
Diz, ainda, que exerceu o seu direito de remissão no prazo mais curto que conseguiu, desde que tomou conhecimento da venda.
Conclui pela violação, por banda da AT, dos princípios da legalidade, igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade e celeridade previstos no art. 55.° da LGT e do princípio da colaboração previsto no art. 59.°, n.º 2 da LGT e ainda, pela subida imediata da presente reclamação.
Pugna, a final, pela procedência da reclamação, pela admissão do seu direito de remição pelo valor de EUR 281,00 e pela condenação da Fazenda Pública na emissão das competentes guias para pagamento do preço.
A reclamante fez acompanhar a petição do comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial no montante de EUR 51,00 [Ações Declarativas (A - Ações Declarativas) - Tabela 1].
Por despacho de fls. 83 dos autos, datado de 27/12/2017, e face ao valor liquidado de taxa de justiça, a Reclamante foi convidada a proceder ao pagamento do remanescente da taxa de justiça em falta pela Tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais.
Em resposta, a Reclamante veio requerer a dispensa de pagamento do complemento da taxa de justiça inicial.
Por despacho de fls. 93, datado de 17/01/2018, foi indeferido o sobredito pedido de dispensa de pagamento e, bem assim, renovado o teor do despacho de fls. 82 dos autos, com a cominação ali mencionada.
Volvido o prazo dado para o referido pagamento a Reclamante nada disse, nem procedeu ao respetivo pagamento do complemento de taxa de justiça devido.
Ora, como se mencionou no despacho proferido em 27/12/2017, a presente reclamação de acto enquadra-se no âmbito da Tabela II-A do Regulamento das Custas Processuais (RCP), e a taxa devida corresponde a 2UC e não a que se mostra paga - Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 24/07/2013, no processo n.º 01221/13 e Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, datado de 31-03-2016, no processo n.º 02452/15.5BEPRT.
Apreciando.
Com a entrada da acção no tribunal é devido o pagamento da taxa de justiça inicial, autoliquidada, e o documento comprovativo do seu pagamento é entregue ou remetido ao tribunal com a apresentação da petição inicial ou requerimento do autor.
A Reclamante, com a apresentação da petição inicial, não pagou a taxa de justiça inicial devida, apresentando comprovativo de pagamento de montante inferior ao devido, o que equivale à falta de pagamento da taxa de justiça inicial.
A falta do pagamento da taxa de justiça constitui uma irregularidade formal, que configura uma excepção dilatória inominada insuprível e de conhecimento oficioso (art. 576.°, n.º 2 e 578.°, ambos do CPC), susceptível de conduzir ao indeferimento liminar da petição inicial (art. 590° do CPC) quando a mesma ainda não tenha sido admitida ou, se já foi admitida, à absolvição da instância da Fazenda Pública (art. 278°, n° 1 alínea e) do CPC).
ln casu, constata-se que a petição foi recebida mas a Reclamante não pagou a taxa de justiça inicial devida, nem após convite para o efeito a taxa se mostra paga, o que afecta todo o processado como acima se referiu.
Ante o que vem dito, abstenho-me de conhecer a reclamação e absolvo a Fazenda Pública da instância.


Cumpre decidir.
A questão colocada no presente recurso já não é nova e foi por diversas vezes, mais recentemente, decidida de modo uniforme em sentido contrário ao propugnado pela recorrente.
No recurso n.º 01221/13, de 24.07.2013, resumiu-se a questão nos seguintes termos:
no que respeita à reclamação de actos praticados por órgão de execução fiscal, a jurisprudência do STA tem vindo a entender que, dada a estrutural dependência desta reclamação prevista no art. 276º do CPPT, em relação à própria execução fiscal na qual é praticado o acto potencialmente lesivo “reclamável”, também a tributação daquela reclamação deverá ser feita, não pela Tabela I, mas sim pela Tabela II, rectius pela Tabela II-A, do Regulamento das Custas Processuais, que prevê expressamente a taxa de justiça na execução [cfr., entre outros, os acs. de 20/1/2010, 17/11/2010, 30/11/10 e 1/8/2012, proferidos nos recs. 1077/09, 0656/10, 0641/10 e 0766/12 (No mesmo sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª ed., 2011, Vol. IV, anotação 7 ao art. 277º, pp. 297/298.)].
Assim, no âmbito desta Tabela II-A a taxa devida por esta reclamação de acto do OEF incluir-se-á, no caso, na rubrica “execuções até 30.000,00 Euros” (2 UC) e não, como pretende a recorrente, na rubrica “Reclamações, pedidos de rectificação, de esclarecimento e de reforma da sentença” (0,25 a 3 UC), nem sequer, como entendeu o despacho recorrido, na rubrica “Oposições à Execução ou à Penhora” (3 UC) (a decisão recorrida considera ser aplicável a taxa de justiça prevista para a oposição à execução, por ser esta a forma processual elencada na Tabela e que melhor se compagina com a reclamação de actos do OEF, em termos de natureza, escopo e estrutura jurídicas, e porque a oposição à penhora prevista nas execuções comuns também corresponde, na ambiência da execução fiscal, a essa reclamação prevista no art. 276° do CPPT).
Quanto a esta matéria é de referir, aliás, que, como se salienta no ac. do STA, de 31/1/2012, rec. nº 0591/11, a oposição é «um meio processual autónomo (regido por normas adjectivas próprias) relativamente ao processo de execução fiscal, apesar de dependente desta», sendo que «diferente é o caso da reclamação judicial de actos praticados na execução pelo órgão da execução fiscal, prevista nos artigos 276° e seguintes do CPPT, que configura um meio processual regido por normas adjectivas muito diversas do processo de oposição, constituindo uma fase processual própria do processo executivo, inscrevendo-se no normal desenvolvimento deste e detendo, por força disso, uma verdadeira dependência estrutural relativamente a esse processo, não representando um novo processo judicial como bem se deixou explicado em diversos acórdãos proferidos por este Supremo Tribunal, designadamente em 20/01/2010 e em 30/11/2010, nos processos nº 01077/09 e nº 0641/10».
E no mesmo sentido parece pronunciar-se igualmente o ac. do STA, de 1/8/2012, rec. nº 0766/12, supra já citado, quando considera que a taxa de justiça ali decidida de 2 UC se mostra correcta «por a reclamação da decisão do órgão de execução fiscal se inserir no processo de execução sendo um seu incidente».
E sendo esta a jurisprudência reiterada do STA, cujo discurso fundamentador aqui acolhemos, havemos de concluir que, no caso, a taxa de justiça devida pela apresentação da reclamação deveria ter sido liquidada de acordo com aquela mencionada rubrica constante da tabela II-A, o que implicaria que a reclamante, ora recorrente, tivesse procedido ao pagamento de uma taxa de justiça não inferior a 2 UC

No recurso n.º 01077/09, em acórdão proferido com data de 20.01.2010, e citado naquele recurso, escreveu-se de forma muito impressiva:
Independentemente da adequada qualificação da “reclamação” judicial a que se refere o artigo 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) – como incidente, como recurso ou como impugnação, solução esta para que aponta o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais de 2002 (cfr. o seu artigo 49.º, n.º 1, alínea a) subalínea iii) e alínea d) -, matéria em que o legislador não revela senão hesitações e incertezas reflectidas na variação terminológica que utiliza para designar este meio de defesa dos lesados perante decisões do órgão da execução fiscal praticados no processo de execução fiscal, parece inequívoca a estrutural dependência desta “reclamação” em relação à execução fiscal na qual é praticado o acto potencialmente lesivo “reclamável”. É, aliás, esta dependência estrutural que permite à Lei Geral Tributária (cfr. o seu artigo 103.º) a enfática afirmação de que o processo de execução fiscal tem natureza judicial, pois que, embora possa correr a generalidade dos seus termos no Serviço de Finanças, é garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária.
Desta estrutural dependência da “reclamação” relativamente à própria execução fiscal resulta que a instauração da “reclamação” não constitui propriamente a introdução em juízo de um processo novo, razão pela qual se entende ser aplicável à determinação da taxa de justiça inicial devida não o disposto no Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro) e que entrou em vigor no passado dia 20 de Abril, atento ao disposto no seu artigo 27.º, mas o disposto no Código das Custas Judiciais.

Porque não se vê, agora, que tenha havido qualquer alteração legislativa que imponha diferente solução ou que os condicionalismos próprios da situação concreta dos autos imponha diferente solução, reitera-se aquela jurisprudência, o que implica a improcedência do recurso.

Nestes termos acorda-se em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
D.n.

Lisboa, 9 de Maio de 2018. – Aragão Seia (relator) – Dulce Neto – Pedro Delgado.