Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0108/13.2BELLE 01104/16
Data do Acordão:12/17/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:OPOSIÇÃO
REVERSÃO
ADQUIRENTE
BENS
PRESSUPOSTOS
FALTA
INSUFICIÊNCIA DE BENS
DEVEDOR ORIGINÁRIO
Sumário:I - O exercício do direito de sequela de que gozam as hipotecas legais constituídas a favor do exequente depende de a execução ser movida contra o adquirente desses bens.
II - O meio adequado para o prosseguimento da execução contra terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real é a reversão.
III - O prosseguimento da execução contra terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real pressupõe a demonstração da «falta ou insuficiência de bens do originário devedor ou dos seus sucessores».
Nº Convencional:JSTA000P25349
Nº do Documento:SA2201912170108/13
Data de Entrada:10/04/2016
Recorrente:INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. SECÇÃO DE PRC. EXEC. FARO.
Recorrido 1:A........, CRL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., Pessoa Coletiva n.º 500 715 505, com sede na Avenida Manuel da Maia, n.º 58, 1049-002 Lisboa, recorreu da sentença do Mm.º Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou procedente a oposição à execução fiscal n.º 0801200701072854 e apensos, originariamente instauradas na Secção de Processo Executivo de Faro contra B………, Lda., pessoa coletiva n.º ………., com sede na Rua …………, ……………, 8800-…….. Tavira, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de cotizações e contribuições, tituladas pelas certidões n.ºs 5586/2007, 5597/2007, 58067/2008, 58068/2008, 9041/2007, 9043/2007, 65336/2008 e 65337/2008, no montante total de € 86.827,91, e revertidas contra A………, C.R.L., pessoa coletiva n.º ……….., com sede em Rua …………., 8800-………. Tavira.

Recurso este que foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Notificado da sua admissão, apresentou alegações, que rematou com as seguintes conclusões: «(…)

A. A douta sentença de que se recorrer, determinou a procedência da oposição judicial e em consequência, a anulação do despacho de reversão praticado contra a A……….., CRL e ora recorrida, por considerar que “este padece do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, que consequência a sua remoção da ordem jurídica”.

B. E entendeu que “ao actuar com base num pressuposto desactualizado” (valores patrimoniais dos prédios da devedora originária) o órgão de execução fiscal emitiu um despacho de reversão ilegal. Pelo que “se impunha a promoção oficiosa da avaliação dos prédios, ao abrigo do artº 250 nº2 do C.P.P.T., de modo a ser possível efectuar um juízo fundado sobre a (in)suficiência do património da devedora originária para o pagamento da totalidade da dívida.”

C. Na realidade, por forma a garantir o pagamento das contribuições e juros de mora em dívida à segurança social, no âmbito dos processos nºs 0801200701072854 e apensos, no valor de 106.206,81€, o exequente constituiu 2 hipotecas legais – pelas Ap. 4678 de 06-10-2010 e Ap. 3046 de 02-12-2011 – sobre o prédio misto, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira, sob o nº 3399/19980525 da freguesia de ………….., concelho de Tavira, propriedade da devedora originária nos autos “B………, Lda”.

D. A 16-05-2012, através de consulta de certidão predial, teve a recorrente conhecimento que o prédio constituído em hipoteca legal, foi objecto de dação em cumprimento por parte da devedora originária, tendo o referido bem imóvel sido adquirido pela ora recorrida, mediante escritura pública e registada a aquisição em 31-01-2010 pela Ap. 319.

E. Concretizada a audição da ora recorrida, por despacho da Coordenadora da Secção de Processo de Faro de 26/10/2012, foi determinado que “…prossegue a reversão da execução fiscal contra a A………, CRL, na qualidade de terceiro adquirente de bem onerado com garantia real pela dívida” no valor de 106.206,81€.. “encontrando-se preenchidos os requisitos exigidos no art.º 153º e art.º 157º do C.P.P.T.

F. Isto porque, as hipotecas legais constituídas pelo exequente e objecto de dação em cumprimento à oponente, conferem ao credor o direito a ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo, nos termos do artº 686 do Código Civil.

G. Assim, por se tratar de dívida à segurança social garantida por hipoteca legal sobre um imóvel da devedora originária que posteriormente o transmitiu à oponente, assiste ao exequente a faculdade de prevalecer-se da sequela característica da garantia real que impende sobre o seu crédito, de perseguir e reivindicar o referido imóvel, onde quer que ele se encontre, mesmo que esteja em poder de terceiro (a oponente e ora recorrida), podendo executá-lo em ordem a ser pago pelo respectivo valor.

H. O recorrente, ao direcionar a execução contra a recorrida, baseou o despacho de reversão no art.º 157º do C.P.P.T., mas o conteúdo da fundamentação assenta no facto de o oponente ter adquirido do devedor originário um imóvel onerado com duas hipotecas legais registadas pelo recorrente, em momento anterior à dação em cumprimento e ao direito de sequela que o acompanha.

I. Donde, não pretendeu o recorrente chamar o oponente à execução, na qualidade de devedor subsidiário.

J. Pelo que, assentando a reversão no direito de sequela de que gozam as hipotecas legais constituídas a favor do recorrente, o despacho não carece de fundamentação da falta ou insuficiência de bens do devedor originário, como exigido no n.º 1.º do art.º 157º do C.P.P.T.

K. Veja-se neste sentido o esclarecedor Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, no proc. Nº 916/11 de 23-02-2012: “assentando a reversão no direito de sequela de que goza a hipoteca constituída a favor do recorrente, o despacho não carece da fundamentação exigida no n.º 1 do art.º 157º do C.P.P.T.

A circunstância de o recorrido basear a reversão no art.º 157º do C.P.P.T. encontra eventual justificação na dificuldade criada pelo facto de a lei não prever o mecanismo da reversão como figura geral destinada a chamar terceiros à execução”.

L. Não sendo por isso condição de invalidade do despacho, a falta ou insuficiente fundamentação da in(suficiência) do património da devedora originária para o pagamento da totalidade da dívida, contrariamente ao entendido na sentença “a quo” que subsumiu a invalidade do despacho de reversão ao juízo de suficiência de bens da devedora originária.

M. Ainda que assim não se entendesse, a concluir-se pela existência de ilegalidade, haveria sempre que entender-se a ilegalidade como não invalidante, com a consequente remoção da ordem pública, por força do princípio do aproveitamento do ato e da economia processual.

N. Pelo que deverá a sentença recorrida julgar-se improcedente, por falta de fundamentação legal.».

1.2. A Recorrida apresentou contra-alegações, que condensou nas seguintes conclusões: «(…)

a) A Recorrente não captou bem a essência do mecanismo de reversão previsto no artigo 157º do CPPT, nem fez uma leitura adequada do preceito em causa pois que a norma legal, logo no seu introito, diz o seguinte: «1 – na falta ou insuficiência de bens do originário devedor ou dos seus sucessores […]»

b) Face a tão explícita redação, dúvidas não restarão que a reversão, para operar legalmente, depende de um pressuposto, que é, precisamente, a falta ou insuficiência de bens do originário devedor.

c) A reversão em causa, para ser válida, dependeria da ausência de bens na esfera do devedor originário ou então que os mesmos, a existirem, fossem insuficientes.

d) Como o sustentam a Jurisprudência e Doutrina supra citadas.

e) A Recorrente, fazendo apelo às regras da experiência comum e a valores de matriz de € 0,70 e € 2,50, incorre em grosseira falta de fundamentação formal e material do acto que praticou uma vez que aquela para chegar a uma conclusão, fosse ela qual fosse, teria de ter lançado mão do regime previsto no artigo 250º, nº 1 b) do CPPT.

f) Preceito este que remete para o artigo 27º, nº 1 c) do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, ou seja a avaliação deve levar em conta o VPT inscrito na matriz actualizado com base em factores de correção monetária com limite que não exceda 44,21.

g) Ora a Recorrente não fez tal assim como não fez uma avaliação nos termos do artigo 250º, nº 2 do CPPT, o que se lhe impunha

h) Pelo que fica carecida de fundamento a argumentação do acto praticado uma vez que não só a fundamentação material é errada como a formal é claramente insuficiente, o que equivale á sua falta.

i) Pelo que, sem qualquer dúvida, o acto de reversão colocado em crise padecia deste vício de falta de fundamentação, sendo, em consequência, passível de anulação, como, e bem, o foi pela Douta sentença recorrida.».

Concluiu dizendo que o recurso deverá ser declarado improcedente, mantendo-se a Douta sentença recorrida na ordem jurídica, por disso ser merecedora, tudo o mais com as consequências legais.

1.3. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

O Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.



2. Das questões a decidir

A única questão a decidir é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que a reversão contra terceiros adquirentes de bens a coberto do disposto no artigo 157.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário depende da falta ou insuficiência de bens do devedor originário ou dos seus sucessores.



3. Dos fundamentos de facto

Na douta sentença recorrida foram julgados provados os seguinte factos:

1. No dia 6 de Janeiro de 2010, foi registada, através da apresentação 4.678, hipoteca legal a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, sobre o bem imóvel misto descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º 3399/19980525 da freguesia …………., à data propriedade de B……….., Lda., para garantia das contribuições devidas no âmbito dos processos de execução fiscal n.º 0801-2007/01072854 e apensos – cfr. fls. 184-186 do apenso.

2. Em 31 de Janeiro de 2012, foi registada, através da apresentação 319, a aquisição, por dação em cumprimento, a favor da A………, CRL, do bem imóvel misto descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º 3399/19980525 da freguesia ………., até então propriedade de B…….., Lda. – cfr. fls. 230 do apenso.

3. A……….., CRL, foi notificada para exercer o seu direito de audição prévia quanto ao projecto de reversão relativo aos processos de execução fiscal n.º 0801-2007/01072862 e apensos, e 0801-2011/00368520 e apensos – cfr. fls. 135-136 do apenso.

4. A…………, CRL, não foi notificada para exercer o seu direito de audição prévia quanto ao projecto de reversão relativo ao processo de execução fiscal n.º 0801-2007/01072854 e apensos – cfr. apenso.

5. Em 26 de Outubro de 2012, o Processo de Execução Fiscal n.º 0801-2007/01072854 e apensos, instaurados na Secção de Processo Executivo de Faro do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, contra B………., Lda., reverteu contra A……….., CRL – cfr. fls. 164-170 do apenso.

6. Em causa está a cobrança de € 106.206,81, relativos a contribuições e juros de mora – cfr. fls. 164 do apenso.

7. Em 26 de Outubro de 2012, a sociedade B…….., Lda., era proprietária de 9 prédios sitos no concelho de Tavira – facto admitido por acordo: artigo 7.º da PI e 6.º da Contestação.



4. Dos fundamentos de Direito

Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Mm.º Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que anulou o despacho de reversão da execução fiscal contra terceiro adquirente de bens penhorados e onerados com garantia real a favor da exequente.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente por entender que a reversão contra terceiros adquirentes de bens onerados com garantia real não carece da fundamentação exigida no n.º 1 do artigo 157.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Ou seja, não pressupõe a demonstração da «falta ou insuficiência de bens do originário devedor ou dos seus sucessores».

A alegação da Recorrente não é muito clara: umas vezes parece derivar para a ideia de que pode perseguir a coisa e reivindicá-la onde quer que esta se encontre, independentemente de o seu atual proprietário ter sido chamado à execução, isto é, independentemente de a execução ter revertido contra ele (ver o ponto 11 das doutas alegações de recurso e a primeira parte do seu ponto 21); outras vezes, parece defender que o direito de sequela de que gozam as hipotecas legais constituídas a favor do exequente pressupõem a reversão mas não pressupõem a excussão do património do devedor originário (ver o ponto 23).

Assim, importa começar por responder à seguinte questão: o direito de sequela de que gozam as hipotecas legais constituídas a favor do exequente pressupõe que a execução seja movida contra o adquirente desses bens?

A esta questão respondemos afirmativamente.

Porque a lei não permite que sejam penhorados bens de quem não for chamado à execução.

É o que resulta do artigo 735.º do Código de Processo Civil. Em especial no seu n.º 2: «[n]os casos especialmente previstos na lei, podem ser penhorados bens de terceiro, desde que a execução tenha sido movida contra ele» (sublinhado nosso).

Ou seja, tem que haver coincidência entre a legitimidade substancial (a legitimidade para suportar os efeitos da execução) e a legitimidade formal (a legitimidade para intervir no processo como executado).

Dizendo de outro modo: não é «possível a penhora de bens pertencentes a pessoa que não tenha a posição de executado» [cit., José Lebre de Freitas, in «A ação executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013», Gestlegal, 7.ª edição, pág. 148]. «Esta regra não tem exceções» [idem, ibidem, pág. 238].

E também se aplica na execução fiscal. É o que deriva do próprio artigo 157.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao dispor que «se se tratar de dívida com direito de sequela sobre bens que se tenham transmitido a terceiros, contra estes» (isto é, contra os terceiros adquirentes desses bens) «reverterá a execução».

Mas há outros indicadores de que é assim. No n.º 2 do artigo 219.º consigna-se que, «[t]ratando-se de dívida com privilégio (…), a penhora começa pelos bens a que este respeitar, se ainda pertencerem ao executado e sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 157º» (sublinhado nosso). Quer dizer: a penhora só começa por estes bens se o titular dos mesmos for o executado ou, sendo terceiro, a execução prosseguir contra ele.

E no n.º 4 do mesmo dispositivo legal consigna-se que, [c]aso a dívida tenha garantia real onerando bens do devedor por estes começará a penhora». Quer dizer: a penhora só começa por estes bens se o titular dos mesmos for o devedor (entendendo-se aqui por devedor quem nos termos da lei substantiva estiver vinculado ao cumprimento).

A segunda questão que importa enfrentar é a seguinte: o prosseguimento da execução contra terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real pressupõe a demonstração da «falta ou insuficiência de bens do originário devedor ou dos seus sucessores»?

A esta questão respondemos também afirmativamente.

Importa começar por salientar que o terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real não é, em execução fiscal, devedor da obrigação exequenda. Porque só é, em princípio, devedor da obrigação tributária em execução o sujeito passivo da relação jurídica tributária, isto é, quem vê constituídos na sua esfera jurídica os pressupostos do facto tributário – cfr. o artigo 21.º da Lei Geral Tributária.

A figura jurídica que deve ser chamada à colação para descrever a situação do terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real é a da responsabilidade tributária: apesar de não existir um vínculo obrigacional entre o credor Estado e o adquirente desses bens, existe o direito de o responsabilizar pelo pagamento da dívida do alienante em virtude da garantia que onera esses bens.

Ora, nos termos do n.º 4 do artigo 22.º da Lei Geral Tributária a responsabilidade tributária por dívidas de outrem é, salvo determinação (legal) em contrário, apenas subsidiária.

E, no caso da responsabilidade de terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real, não só não existe nenhuma disposição em contrário, como existe uma disposição que confirma esta regra: precisamente o artigo 157.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao dispor que a execução reverte contra ele «[n]a falta ou insuficiência de bens do originário devedor ou dos seus sucessores».

Mesmo que assim não fosse entendido (isto é, mesmo que fosse de entender que a responsabilidade de terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real é uma responsabilidade solidária), nem assim o recurso mereceria provimento.

Porque deriva do artigo 153.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em conjugação com o seu artigo 9.º, n.º 2, que a legitimidade como executados dos garantes que se tenham obrigado como principais pagadores também depende de contra eles ter sido exigido o cumprimento da obrigação tributária.

E como não existe meio processual de demandar terceiro inicialmente na execução fiscal [visto que na execução fiscal não existe o requerimento executivo onde possam ser expostos os factos que não constem do título executivo, a que alude a alínea e) do n.º 1 do artigo 724.º do Código de Processo Civil], sobravam apenas dois meios de demandar os garantes: ou os meios procedimentais prévios à execução ou a reversão.

Ou seja, o Estado poderia ter optado por demandar logo o garante desde que a qualidade de principal pagador tivesse sido estabelecida no procedimento e este figurasse como tal no título executivo. Não o tendo feito, resta-lhe o procedimento de reversão. Mas, neste caso, de acordo com as regras próprias da reversão contra terceiro, que pressupõe também a falta ou insuficiência dos bens do originário devedor.

E bem se compreende que assim seja, visto que, através da reversão, o terceiro adquirente ingressa na posição que o executado tem no momento em que a dívida reverte, o que significa que é chamado a pagar apenas o que não foi possível cobrar ao devedor originário, podendo pagar o remanescente sem juros de mora e custas. Não faria sentido que constituísse uma escolha do credor o momento em que o chama às suas responsabilidades e, por essa via, quanto lhe vai ser exigido em pagamento.

Na prática, trata-se de um regime simétrico ao do Código de Processo Civil. Aqui, a execução começa necessariamente pelo terceiro titular dos bens onerados com a garantia real e, se o credor optar por não demandar também o devedor inicial, a execução só poderá contra ele prosseguir contra o devedor se for reconhecida a insuficiência dos bens onerados com a garantia real – n.º 3 do seu artigo 54.º

Resta acrescentar que o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de fevereiro de 2012, no processo n.º 916/11, que a Recorrente cita na alínea “K” abordou uma situação bem diversa: a da hipoteca constituída sobre bens transmitidos a terceiro pelo próprio responsável subsidiário. E o que ali se diz é que, naquela situação específica, não há que indagar sobre a insuficiência de bens do responsável originário, porque o facto de a dívida ter revertido contra o responsável subsidiário que transmitiu a terceiro o bem onerado com a hipoteca implica já ter sido confirmada a insuficiência dos bens do responsável originário, de que depende a reversão contra o próprio responsável subsidiário.

Improcedem, por isso, todas as conclusões do recurso.

Pelo que o recurso não merece provimento.



5. Conclusões

5.1. O exercício do direito de sequela de que gozam as hipotecas legais constituídas a favor do exequente depende de a execução ser movida contra o adquirente desses bens.

5.2. O meio adequado para o prosseguimento da execução contra terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real é a reversão.

5.3. O prosseguimento da execução contra terceiro adquirente dos bens onerados com a garantia real pressupõe a demonstração da «falta ou insuficiência de bens do originário devedor ou dos seus sucessores».



6. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.

D.n.

Lisboa, 27 de novembro de 2019. – Nuno Bastos (relator) – Ascensão Lopes – José Gomes Correia.