Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01065/08.2BEALM
Data do Acordão:01/25/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
ALVARÁ DE LOTEAMENTO
Sumário:Deve admitir-se revista de acórdão do TCA que declarou a nulidade de actos de licenciamento e ordenou a demolição (parcial) de uma moradia, por aqueles actos estarem em desconformidade com as prescrições do respetivo Alvará de Loteamento.
Nº Convencional:JSTA000P24140
Nº do Documento:SA12019012501065/08
Data de Entrada:12/06/2018
Recorrente:MUNICÍPIO DE SESIMBRA
Recorrido 1:MINISTÉRIO PÚBLICO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1 O Município de Sesimbra, recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, proferido em 11 de Julho de 2018, que na ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL contra si intentada pelo Ministério Público manteve a decisão proferida pelo TAF de Almada que, por seu turno, declarou a nulidade dos despachos do Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra de 30-11-2005 e de 3-3-2006 que determinaram a demolição parcial da construção no lote, para assegurar o alinhamento com a construção contígua, à frente e a tardoz, sem qualquer empena.

1.2. Justifica a admissão da revista por entender estarmos perante uma questão de grande relevância jurídica e social e por ser necessária a intervenção do STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do direito.

1.3. O MP pugna pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. O acórdão recorrido manteve a decisão da 1ª instância por entender que a moradia implantada no lote 1 – em causa nestes autos – não está inteiramente geminada com a implantada no lote 2, sendo que a sua implantação não coincide com a que figura na planta síntese e não está alinhada a tardoz, sendo dissonante com as moradias implantadas nos lotes 2 a 4.

A entidade recorrente sustentou no TCA que estas diferenciações entre a implantação, o alinhamento e a profundidade da moradia com a do lote contíguo, o 2, ou com as dos restantes lotes eram irrelevantes, porque o que o quadro síntese e o Alvará de Loteamento 11/95 exigiam era apenas que fossem observados os afastamentos mínimos, sendo todos os referidos aspectos – a implantação, o alinhamento e a profundidade da moradia- questões tratadas por aquela planta em termos meramente orientadores e não vinculativos.

O TCA refutou tal entendimento porquanto do Alvará de Loteamento resulta expresso que se autoriza “a constituição de 18 (dezoito) lotes de terreno, numerados de 1 a 18, com as áreas e localizações previstas na planta anexa que faz parte integrante”. Estas indicações – diz ainda o acórdão recorrido – coincidem, depois, com a memória descritiva do projecto de loteamento, que exige que as moradias sejam “exatamente iguais”, com excepção das moradias de fim das bandas, “em que uma das empenas dá lugar a uma frente”.

Deste modo, conclui o acórdão, a licença que foi emitida em dissonância com os termos do Alvará de Loteamento tem de ser considerada nula, como se decidiu na primeira instância.

3.3. Neste recurso, o Município de Sesimbra insiste na mesma argumentação considerando que os actos de licenciamento respeitam o Alvará de Loteamento. Termina a sua alegação considerando ter havido erro de julgamento uma vez que o que ocorre, a seu ver, é uma interpretação diferente do Alvará de Loteamento e não a sua violação.

3.4. Como decorre da exposição da controvérsia, a mesma radica na circunstância de se ter licenciado a construção de uma moradia geminada, com uma profundidade diferente. Essa divergência é permitida pelo alvará de loteamento, no entender do recorrente; mas não o é no entendimento das instâncias.

Trata-se de uma questão em torno da interpretação de um Alvará de Loteamento que poderá ter relevância em outras situações, uma vez que o mesmo prevê a construção de várias moradias. A decisão recorrida implica a demolição de uma moradia, que como vimos, foi licenciada pela entidade competente. Os custos associados a tal demolição são sempre muito significativos. E se é certo que ambas as instâncias convergiram na interpretação dos termos do Alvará de Loteamento a entidade administrativa competente para a sua aplicação sustenta uma interpretação diversa.

Deste modo perante alguma plausibilidade da controvérsia se repetir e a relevância social da questão (demolição de moradia licenciada pela entidade competente) justifica-se que este Supremo Tribunal a reaprecie.

4. Decisão

Face ao exposto admite-se a revista.

Porto, 25 de Janeiro de 2019. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.