Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:039/14.9BEPDL 0578/18
Data do Acordão:02/17/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PAULO ANTUNES
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO
Sumário:I - O n.º 2 do art. 45.º da L.G.T., na redação dada antes de 2015, em que se previa o prazo de caducidade de 3 anos, quanto à tributação de métodos indirectos, “por motivo da aplicação ao sujeito passivo dos indicadores objectivos de actividade previstos na lei”, dizia respeito ao previsto no art. 90.º da L.G.T., aliás, na dependência de regulamentação prevista no art. 89.º n.º 2, que não ao previsto no art. 89.º-A da referida Lei (tributação por manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados).
II - A revisão do ato tributário, nos termos do art. 78.º n.º 4 da L.G.T. só pode ser autorizada pelo dirigente máximo dos serviços, verificados que sejam os seguintes requisitos:
1 - três anos posteriores ao ato tributário;
2 - Fundamento de injustiça grave e notória, conceito que é precisado no seguinte n.º 5, em termos de “tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional”;
3 - Erro não imputável a comportamento negligente do contribuinte.
Nº Convencional:JSTA000P27187
Nº do Documento:SA220210217039/14
Data de Entrada:06/14/2018
Recorrente:A............
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório

I.1. A............, com os sinais dos autos, vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, proferida em 01/03/2018, que julgou improcedente a impugnação que intentara do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado contra o ato de liquidação adicional de IRS do exercício de 2006, no montante de € 96.151,37.
I.2. Formulou alegações que finalizou com as seguintes conclusões:

1.º
A determinação da matéria tributária foi feita com recurso a métodos indirectos bem assim como com recurso a indicadores objectivos, pelo que caducou o direito à liquidação com fundamento nos artigos 92°, do Cód. IRS, 45.0, n.º 2 e 4, da LGT, e 36.0, do CPPT.
2.º
Isto determina a ilegalidade do acto de liquidação, por violação de lei, mais concretamente das indicadas disposições legais.
3.º
O despacho que indeferiu o pedido de revisão oficiosa radica numa injustiça grave ou notória da qual resultou tributação manifestamente exagerada e desproporcionada, por não considerar os encargos financeiros e investimento em obra e fornecimento de equipamento, do que resulta uma clara violação do artigo 78.º, n.º 4 e 5, da LGT.
4.º
Isto determina também a ilegalidade do acto de liquidação, por violação de lei, mais especificamente o artigo 78.º, n.º 4 e 5, da LGT.
5.º
A tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos, o que está claramente posto em causa no acto impugnado, que assim viola o disposto no artigo 103.º, n.º 3, da C.R.P..
6.º

Não se pode aplicar impostos a não rendimentos, porque se não pode distribuir o que não existe, sob pena de atribuição ao sujeito passivo de rendimentos inexistentes e sujeitá-lo ao pagamento de imposto indevido, o que viola o indicado preceito constitucional.

Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, considerando-se procedente a impugnação e anuladas as decisões de liquidações adicionais efectuadas em 18/04/2010 e 20/09/2010 referentes ao sujeito passivo ora à A. e à sua mulher, efectuadas pela Direcção de Finanças de Ponta Delgada, por padecer de vício de violação de lei e inconstitucionalidade.
I.3. A Administração Tributária e Aduaneira (A.T.) aduziu contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos:
Ao pretender que o Tribunal a quo decida de maneira diferente do decidido, está o recorrente a radicar as suas alegações em dois fundamentos inexistentes: por um lado, ter a Administração Tributária fixado a matéria coletável através de métodos indiretos e, por outro, estar o ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa inquinado de uma injustiça grave e notória.
No que tange ao primeiro aspeto, apenas se dirá que as correções efetuadas foram realizadas através de correções meramente aritméticas, nada mais podendo – ou devendo – ser acrescentado, não assistindo qualquer razão ao recorrente.
Quanto ao segundo aspeto, andou bem o Tribunal a quo ao considerar que a negligência do ora recorrente impede o deferimento da revisão oficiosa ao abrigo do n.º 4 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, por o erro ser imputável a comportamento negligente do contribuinte, o que ficou sobejamente comprovado nos autos, acrescentando-se que nem no âmbito do presente processo judicial o ora recorrente comprovou as despesas em que alega ter incorrido, ainda que por hipótese académica fosse possível considerá-las.
Com efeito, não pode ser apontada qualquer mácula à sentença do Tribunal a quo, pelo que deverá esta manter-se nos seus exatos termos.
Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas., Colendos Juízes Conselheiros, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser considerado totalmente improcedente, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
I.4. O ex.mº magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
“1. A questão que se coloca consiste em saber se a sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento que lhe é imputado pelo Recorrente, o que passa por saber se:
a) Se verificou a caducidade do direito de liquidação por parte da AT; e se
b) O tribunal "a quo" fez uma correta interpretação e aplicação do disposto no artigo 78º, nº 4, da LGT, ao ter sufragado o entendimento da AT de que não se mostravam reunidos os requisitos do pedido de revisão oficiosa do ato tributário, com base em "injustiça grave e notória".
2. No que respeita à invocada caducidade do direito de liquidação, entende o Recorrente que se mostra aplicável o prazo previsto no nº 3 do artigo 45º da LGT, prazo este que terá sido ultrapassado.
Dispunha o nº 2 do artigo 45º da LGT que nos casos de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo ou de utilização de métodos indiretos por motivo da aplicação à situação tributária do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade previstos na lei, o prazo de caducidade é de três anos.
Considera o Recorrente que a situação em causa nos autos é subsumível no 2º segmento da citada norma, mas sem razão. Com efeito, o facto de o valor das mais-valias imobiliárias ter sido apurado com recurso ao valor patrimonial tributário, que é determinado com recurso a regras objetivas previstas no CIMI, tal facto não é qualificado pela lei como avaliação indireta, pois não se funda em métodos presuntivos, como os previstos no artigo 89º da LGT. Por outro lado e como se deixou exarado na sentença recorrida, o Recorrente não contestou o valor fixado ao imóvel por qualquer dos meios legais ao seu dispor. Na verdade, o que está subjacente às alegações do Recorrente não é uma discordância com o VPT atribuído ao imóvel, mas sim o facto de a AT não ter atendido às obras que alegadamente terão sido realizadas no imóvel e que lhe aumentaram o seu valor (art. 51º do CIRS).
Assim sendo e como se entendeu na sentença recorrida, o prazo de exercício do direito de liquidação é o prazo geral de 4 anos previsto no nº 1 do artigo 45º da LGT, prazo este que foi respeitado, uma vez que o ato de liquidação respeita ao ano de 2006 e foi comunicado ao sujeito passivo em 20/10/2010 (ponto 29) do probatório).
Carece, assim, de razão o Recorrente, motivo pelo qual se impõe a confirmação da sentença nesta parte.
3. Quanto à questão da ilegalidade do ato de indeferimento do pedido de revisão do ato tributário.
Na ação que propôs contra o ato de indeferimento do pedido de revisão o Recorrente assentou a sua discordância no facto de a AT não ter atendido aos encargos financeiros suportados em "obra e fornecimento de equipamento", circunstância da qual, no seu entendimento, acarreta uma "injustiça grave e notória" que constitui fundamento da revisão do ato tributário, ao abrigo do disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 78º da LGT.
E é com esse mesmo fundamento que alicerça o seu recurso quanto a esta questão, nada mais adiantando acerca do entendimento sufragado na sentença recorrida quanto a esta matéria.
Pese embora a forma algo displicente e imprecisa como é colocada a questão por parte do Recorrente, uma vez que se limita a repetir o mesmo argumento que apresentou ao tribunal "a quo", sem tecer qualquer crítica à apreciação por este realizada, importa analisar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao apreciar esta questão.
Pese embora algumas deficiências na fixação da matéria de facto (Confunde-se fixação de factos com descrição de atos, o que conduz à falta de discriminação de alguns elementos de facto relevantes.), decorre da sentença, designadamente da discussão da matéria de direito, que o tribunal "a quo" deu como assente que a alteração do valor patrimonial entre a 1a e 2a avaliação teve subjacente o facto de a AT ter constatado que as áreas de construção do imóvel eram superiores às que constavam da documentação remetida pelo município e licenciadas e tidas em consideração no ato da 1a avaliação (cfr. último parágrafo de fls. 93).
Ora, na invocação do fundamento de "injustiça grave e notória" o Recorrente aparentemente pretende fazer valer um pressuposto que carece de demonstração: o acréscimo do valor do imóvel resultar de obras realizadas após a sua aquisição.
O Tribunal a quo considerou que o ónus da prova sobre os encargos suportados com as obras recaía sobre os impugnantes e nada tinha sido demonstrado.
Pese embora esteja em causa uma decisão proferida em sede de pedido de revisão de ato tributário, não foi junto aos autos, nem levado ao probatório, qualquer elemento sobre esse pedido. De todas as formas resulta das informações que servem de fundamento à decisão de indeferimento desse pedido que a última avaliação do imóvel refletiu as alterações ocorridas com as obras efetuadas no imóvel e a alteração da sua afetação (inicialmente para habitação e depois para comércio). Ora, pese embora esses elementos tenham sido recolhidos em procedimento inspetivo, no qual expressamente se fez constar que o imóvel sofreu obras de edificação/melhoramento e os anos de 2004 e 2006 com o propósito de ser instalado um estabelecimento comercial, certo e que não resulta que tenham sido feitas quaisquer diligências para apuramento dos encargos suportados com essas obras e melhoramentos, atento o disposto no artigo 51.º do CIRS. Resultando que a alteração do valor do bem resultou da realização dessas obras e de uma ampliação significativa da área de construção é no mínimo surpreendente que a AT não tenha reunido quaisquer elementos sobre esses encargos, como lhe impõe os princípios do inquisitório, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade, que devem nortear a sua atuação - artigo 55º da LGT. Até porque se foram realizadas significativas obras, certamente que os encargos devem estar contabilizados, atento que o imóvel foi afeto à atividade comercial do sujeito passivo. (Sendo certo que aparentemente toda a situação foi despoletada com um pedido de reembolso de IVA por parte dos sujeitos passivos, o que poderá estar relacionado com o imposto suportado com essas obras.)
Assim e independentemente de cair sobre os Recorrentes o ónus da prova do valor exato desses encargos, certo é que em face dos elementos trazidos aos autos é notório que parte substancial do acréscimo do valor atribuído ao imóvel aquando da sua venda resulta das obras e aumento da área de construção (que é significativo), elementos estes que não foram minimamente atendidos para aferir que encargos foram ou não suportados pelo sujeito passivo e que contribuíram para a valorização do imóvel. Ora, afigura-se-nos, que o tribunal "a quo" devia ter esclarecido tal situação, no âmbito dos seus poderes inquisitórios, motivo pelo qual se nos afigura que a sentença padece de insuficiência da matéria de facto com vista à apreciação da questão que lhe foi colocada e que consiste em saber se na determinação da matéria tributável se verifica ou não injustiça ostensiva e inequívoca, de que possa ter resultado tributação manifestamente exagerada e desproporcionada.
Entendemos, assim, que se impõe a revogação da sentença, determinando-se a baixa dos autos à 1ª instância, com vista à ampliação da matéria de facto nos termos supra expostos, ao abrigo do disposto no artigo 682º, nº 3, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo tributário.”
I.5. Cumpre apreciar e decidir, em conferência, as seguintes questões: a) se, ao contrário do decidido, se verifica a caducidade do direito de liquidação por parte da A.T., nos termos dos artigos 92° do C.I.R.S., 45º, nº 2 e 3 da L.G.T., e 36º do C.P.P.T.; b) se, ao sufragar o entendimento da A.T. de que não se mostravam reunidos os requisitos do pedido de revisão oficiosa do ato tributário, com base em injustiça grave e notória, e sem considerar os encargos financeiros e investimento em obra e fornecimento de equipamento, foi efetuada uma correta interpretação e aplicação do disposto no artigo 78.º, n.ºs 4 e 5 da L.G.T., bem como inconstitucionalidade por violação do art. 103.º n.º 3 da C.R.P..

II. Fundamentação.
II.1. De facto.
A sentença recorrida reputou como relevante a seguinte matéria de facto:
1) Em 25 de maio de 2007, foi apresentada a 1ª declaração de rendimentos de IRS modelo 3, relativa ao ano de 2006, de A............, cujo anexo G, relativo a mais-valias e outros incrementos patrimoniais, consta que no mês de Outubro do correspondente exercício fiscal havia realizado € 150.000,00 com a venda do prédio urbano sito à …………, São Pedro, Ponta Delgada, inscrito sob o artigo 3094 da matriz correspondente, o qual foi adquirido em agosto de 2001 por € 99.759,58 (cfr. fls. 4 a 7 do processo administrativo).
2) Em 26 de julho de 2007, foi efetuada a liquidação n.º 2007 5003889991, no valor a pagar de € 3.525,71, com base na declaração de rendimentos em 1) (cfr. fls. 8 do processo administrativo e teor de fls. 24 do suporte físico do processo).
3) Em 26 de novembro de 2008 foi apresentada a declaração modelo 1, de IMI, do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3094, freguesia de São Pedro, com base no motivo “1ª transmissão na Vigência do IMI” 71 (cfr. fls. 1 e 3 do processo administrativo).
4) Em consequência do referenciado em 3), o valor patrimonial tributário do prédio foi fixado em € 202.250,00, de acordo com a ficha n.º 1404005, de 15 de novembro de 2006 (cfr. fls. 1 do processo administrativo e teor de fls. 24 do suporte físico do processo).
5) Em 23 de março de 2010, a administração tributária elaborou uma declaração oficiosa de rendimentos em nome de A............, pela qual se corrigiu os valores da declaração referenciada em 1), de acordo com a qual foi considerado o valor patrimonial referido em 4) (cfr. fls. 1 do processo administrativo e teor de fls. 24 do suporte físico do processo).
6) A............ foi alvo de uma inspeção tributária, interna e de âmbito parcial, relativo a IRS, de 2006, desenvolvida a coberto da ordem de serviço n.º OI201000005, de 13 de janeiro de 2010 (cfr. fls. 41 do processo administrativo).
7) Em 23 de fevereiro de 2010, foi elaborado projeto de conclusões da inspeção tributária (cfr. fls. 59 a 65 do processo administrativo).
8) Em 4 de março de 2010, foi elaborado o ofício n.º 1196, dirigido a A............, pelo qual se levou ao seu conhecimento o projeto de conclusões da inspeção tributária (cfr. fls. 58 do processo administrativo).
9) O ofício n.º 1196 foi enviado em 5 de março de 2010, através da carta registada n.º RM533818480PT (cfr. fls. 66 do processo administrativo).
10) Em 23 de março de 2010, foi elaborado o relatório da inspeção tributária, no qual se determinou a correção aritmética da matéria tributável do IRS, de 2006, no valor de € 78.866,61, com fundamento na alteração do valor patrimonial tributário referenciada em 3) e 4) (cfr. fls. 34 a 40 do processo administrativo e teor de fls. 24 do suporte físico do processo).
11) Em 29 de março de 2010, foi elaborado o ofício n.º 1540, dirigido a A............, pelo qual se levou ao seu conhecimento o teor do relatório de inspeção tributária (cfr. fls. 42 do processo administrativo).
12) O ofício n.º 1540 foi enviado através da carta registada n.º RM533819468PT (cfr. fls. 56 do processo administrativo).
13) A carta registada n.º RM533819468PT não foi entregue com base no motivo “não atendeu”, tendo sido deixado aviso na estação de correios de Capelas (cfr. fls. 57 do processo administrativo).
14) A carta registada n.º RM533819468PT foi devolvida em 12 de abril de 2010, com fundamento no facto de não ter sido reclamada (cfr. fls. 57 do processo administrativo).
15) O Serviço de Finanças de Ponta Delgada submeteu uma declaração de correção oficiosa de rendimentos de IRS, de 2006, de acordo com o teor do relatório referenciado em 10) (cfr. fls. 9 a 13 do processo administrativo).
16) Em 18 de Abril de 2010, foi efetuada da liquidação n.º 2010 5001337775, no valor a pagar de € 27.035,77, com base na declaração de rendimentos em 15) (cfr. fls. 14 do processo administrativo e teor de fls. 24 do suporte físico do processo).
17) Foi efetuada uma nova avaliação ao prédio identificado em 1), em razão da qual o valor patrimonial tributário do mesmo foi fixado em € 382.400,00, de acordo com a ficha n.º 3091045 (cfr. fls. teor do relatório de inspeção, a fls. 106 do processo administrativo e teor de fls. 25 do suporte físico do processo).
18) A ficha n.º 3091045 foi levada ao conhecimento de A............ através do ofício n.º 6679114, enviado através da carta registada n.º RY14188311PT, a qual foi recebida em 20 de maio de 2010 (cfr. fls. teor do relatório de inspeção, a fls. 106 do processo administrativo).
19) A............ foi alvo de uma inspeção tributária, interna e de âmbito parcial, relativo a IRS, de 2006, desenvolvida a coberto da ordem de serviço n.º OI201000175, de 20 de julho de 2010 (cfr. fls. 91 do processo administrativo).
20) Em 21 de julho de 2010, foi elaborado projeto de conclusões da inspeção tributária (cfr. fls. 122 a 137 do processo administrativo).
21) Em 22 de julho de 2010, foi elaborado o ofício n.º 3202, dirigido a A............, pelo qual se levou ao seu conhecimento o projeto de conclusões da inspeção tributária (cfr. fls. 140 do processo administrativo).
22) O ofício n.º 3202 foi enviado em 5 de agosto de 2010, através da carta registada n.º RM588943955PT (cfr. fls. 138 e 139 do processo administrativo).
23) Em 3 de setembro de 2010, foi elaborado o relatório da inspeção tributária, no qual se determinou a correção aritmética da matéria tributável do IRS, de 2006, no valor de € 180.150,00, em virtude da alteração do valor patrimonial tributário referenciada em 17) (cfr. fls. 100 a 108 do processo administrativo e teor de fls. 25 do suporte físico do processo).
24) Em 7 de setembro de 2010, foi elaborado o ofício n.º 4080, dirigido a A............, pelo qual se levou ao seu conhecimento o teor do relatório de inspeção tributária (cfr. fls. 99 do processo administrativo).
25) O ofício n.º 4080 foi enviado através da carta registada n.º RM646936845PT (cfr. fls. 68 do processo administrativo).
26) O Serviço de Finanças de Ponta Delgada submeteu uma declaração de correção oficiosa de rendimentos de IRS, de 2006, de acordo com o teor do relatório referenciado em 23) (cfr. fls. 15 a 19 do processo administrativo).
27) Em 20 de setembro de 2010 foi efetuada da liquidação n.º 2010 5004976892, no valor a pagar de € 96.151,37, com base na declaração de rendimentos em 26) (cfr. fls. 20 do processo administrativo e teor de fls. 25 do suporte físico do processo).
28) Foi emitida a nota de cobrança n.º 2010 1925436, pelo valor de € 69.115,60 (cfr. informação de fls. 7 do processo administrativo).
29) Em 20 de outubro de 2010, A............ teve conhecimento do ato referido em 27) (por acordo).
30) Em 5 de março de 2012, A............ apresentou um pedido de revisão oficioso do ato de liquidação de IRS, de 2006 (cfr. teor de fls. 25 do processo administrativo).
31) Em 26 de novembro de 2013, a Diretora de Serviços do IRS decidiu indeferir o pedido de revisão oficioso, nos termos constantes de fls. 21 a 28 do suporte físico do processo.
*
Da instrução da causa, mais se fixou inexistirem factos não provados.
II.2. De direito.
Quanto à caducidade, nos termos dos artigos 92.°, do Cód. I.R.S., 45.0, n.°s 2 e 4, da L.G.T., e 36.0, do C.P.P.T.:
Face ao invocado quanto a se tratar de tributação por métodos indirectos, importa considerar que no n.º 2 do art. 45.º da L.G.T., na redação ao tempo dos factos vigente, se previa o prazo de caducidade de 3 anos, quanto àquele método “por motivo da aplicação ao sujeito passivo dos indicadores objectivos de actividade previstos na lei”.
Ora, este última situação dizia respeito ao previsto no art. 90.º da L.G.T., aliás, na dependência de regulamentação prevista no art. 89.º n.º 2, tal como decidido nos acórdãos do S.T.A. de 24-3-2003, proc. 0914/03, e de 28-1-2015, proc. 01385/14, acessíveis em www.dgsi.pt.
Não sendo esse o caso dos autos, não é possível considerar o dito prazo de 3 anos aplicável.
Da matéria de facto, consta ter sido efetuada liquidação adicional de IRS, alterando avaliação efetuada a imóvel que o recorrente declarou em 2007, no anexo G, ter alienado em outubro de 2006, por via de avaliações que foram ao mesmo efetuadas que nada têm a ver com os referidos indicadores de actividade e regulamentação à mesma aplicável.
Por outro lado, a liquidação foi efetuada em setembro de 2010 e o referido recorrente tomou conhecimento da mesma no mês seguinte.
Assim, a liquidação foi efetuada no prazo de caducidade 4 anos, conforme previsto no n.º 1 do dito art. 45.º da L.G.T., e contado nos termos do seu n.º 4, conforme se entendeu na sentença recorrida.
Não procede, assim, erro quanto às disposições invocadas pelo recorrente quanto ao prazo de caducidade, nem esta ocorreu.
Quanto à interpretação e aplicação do disposto no artigo 78.º, n.°s 4 e 5 da L.G.T., e inconstitucionalidade por violação do art. 103.º, n.º 3, da C.R.P.:
No art. 78.º n.º 4 da L.G.T. prevê-se o seguinte:
“O dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao acto tributário a revisão da matéria colectável com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte” (esta última parte corresponde a aditamento efetuado pela Lei n.º 60-A/2005, de 30/12, vigente já à data dos factos).
Ou seja, a mesma só pode ser autorizada pelo dirigente máximo dos serviços, verificados que sejam ainda os seguintes requisitos:
1- três anos posteriores ao ato tributário;
2- Fundamento de injustiça grave e notória, conceito que é precisado no seguinte n.º 5, em termos de “tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional”;
3- Erro não imputável a comportamento negligente do contribuinte.
A previsão constante do dito art. 78.º n.º 4, como excepcional, é de entender como correspondendo a um poder-dever que implica a sua aplicação a todos os casos, verificados que sejam os referidos requisitos – cfr, entre outros, acórdão do S.T.A. de 2-11-2011, proc. 0329/11, acessível em www.dgsi.pt e Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, em Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª ed., Encontro de escrita, 2012, pág. 710.
Quanto a se verificar tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade, implica que seja considerado não só o princípio da proporcionalidade, como ainda os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, e em termos de corrigir todos os erros nas liquidações de que resulte ter sido cobrado imposto superior ao previsto na lei, conforme defendem ainda os autores acima citados a pág. 711.
Ora, se o primeiro requisito se verifica quanto à liquidação efetuada em setembro de 2010 – o pedido foi formulado em março de 2012 e o indeferimento ocorreu em novembro de 2013 -, já os demais não ocorrem, tal como considerado na sentença recorrida.
Sobre o invocado pelo recorrente regula ainda o art. 51.º, a), do C. do I.R.S., na versão ao tempo aplicável com os seguintes termos:
“Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:
a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º.
(…)”.
Como se expendeu na dita sentença, o mesmo não comprovou no pedido de revisão que efetuou, os encargos financeiros, os investimentos em obras e as aquisições de equipamento que teriam de ser relativas aos últimos cinco anos, limite previsto no referido art. 51.º, a).
Não tendo os ditos encargos, e demais invocado, sido levados em conta no relatório de inspeção que suportou a tributação efetuada, impunha-se que o recorrente o tivesse efetuado, nos termos do art. 74.º, n.ºs 1 e 2 da L.G.T., quanto mais não fosse por indicação quanto ao local onde se encontrassem.
Nada a esse respeito resulta da matéria de facto fixada.
Também não é possível considerar que o dito dirigente máximo do serviço estivesse na posse de elementos no sentido de se verificar a dita comprovação.
Não se pode ainda deixar de concordar com o referido na sentença recorrida quanto ao comportamento negligente do recorrente.
Para além do já acima referido quanto ao pedido que efetuou, não consta que, notificado do relatório de inspeção que suporta a tributação, algo tenha então manifestado. Também não consta que tenha reclamado do dito ato de tributação, de que tomou conhecimento, ou que tivesse ainda impugnado o mesmo.
Finalmente, do decidido não resulta a violação do art. 103.º n.º 3 da C.R.P., relativo ao princípio da igualdade que o legislador pretendeu acautelar em sede de revisão na forma acima indicada.
III. Decisão:
Nos termos expostos, os juízes Conselheiros da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam em negar provimento ao recurso, confirmando o decidido na sentença recorrida.
Custas pelo recorrente – art. 527.º n.º1 do C.P.C..
Lisboa, 17 de fevereiro de 2021. - Paulo José Rodrigues Antunes (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva.