Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01053/14
Data do Acordão:10/21/2014
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA
ÓNUS DE PROVA
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
Sumário:É de admitir revista para apreciação do problema de saber se para a procedência de acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa é necessário estar demonstrada a inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional ou apenas não estar demonstrada essa ligação efectiva.
Nº Convencional:JSTA000P18082
Nº do Documento:SA12014102101053
Data de Entrada:10/02/2014
Recorrente:A...............
Recorrido 1:MINISTÉRIO PÚBLICO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1.

1.1. O Ministério Público propôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, contra A…………., pedindo que se ordenasse o arquivamento do processo conducente ao respectivo registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais, «com fundamento na inexistência de ligação efectiva à comunidade portuguesa».

1.2. Por sentença de 04/04/2013 (fls. 172 a 185), a oposição foi julgada improcedente.

1.3. O Autor apelou para o Tribunal Central Administrativo Sul que acordou (acórdão de 24/04/2014, fls. 246 a 257), «conceder provimento ao recurso, revogar a sentença e julgar procedente o pedido feito na p.i.».

1.4. É desse acórdão que a requerente da nacionalidade vem, ao abrigo do artigo 150.º do CPTA, interpor recurso de revista.
Em abono da sua tese, sustenta, em síntese, que o acórdão recorrido errou na consideração do ónus de prova neste tipo de acções, errou também ao não considerar matéria de facto que havia sido dada por provada, e errou ainda ao considerar a necessidade de diligência de prova que haviam sido requeridas.

1.5. O Autor defende a não admissão do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

2.

2.1. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada no acórdão recorrido.

2.2. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».
A jurisprudência deste Supremo Tribunal, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. Trata-se, efectivamente, não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

2.3. A problemática que a recorrente pretende submeter ao presente recurso de revista prende-se com a aplicação do disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 37/81, de 03/10, na redacção introduzida pela Lei n.º 2/2006, de 17/04, Lei da Nacionalidade, e no artigo 56.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14/12, Regulamento da Nacionalidade Portuguesa:
«Artigo 9.º
Fundamentos
Constituem fundamento de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa:
a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional»

«Artigo 56.º
Fundamento legitimidade e prazo
1 – (…).
2 – Constituem fundamento de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou da adopção:
a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional».

As instâncias julgaram de modo diverso.
O TAC radicou em que a alegação do Ministério Público não lograra «demonstrar a inexistência de ligação efectiva da Ré à comunidade portuguesa» e julgou improcedente a acção.
Já o TCA concluiu não haver factos provados indicadores de ligação efectiva «à nação e sociedade portuguesa» e, revogando a sentença, julgou procedente a acção.
Há, portanto, um problema jurídico de alcance geral: saber se para a procedência de acção de oposição é necessário estar demonstrada a inexistência de ligação efectiva ou apenas não estar demonstrada a ligação efectiva.
Este problema tem tido apreciação no Tribunal Central Sul, e foi objecto de apreciação, neste Supremo Tribunal, no acórdão, também em revista, de 19.6.2014, processo 103/14.
No presente processo, tal como nesse último, as instâncias, perante a mesma factualidade, chegaram a decisão diversa. E essas decisões, segundo se aparenta, não resultaram determinantemente de diferentes ilações de facto, mas, antes, de entendimento jurídico divergente perante o problema assinalado.
Ora, os processos contenciosos em matéria de aquisição de nacionalidade por efeito da vontade são frequentes, e ainda não existe nessa matéria jurisprudência abundante deste Supremo Tribunal, que possa servir de orientação para os envolvidos.
Assim, trata-se de matéria que assume importância fundamental.

3. Pelo exposto, admite-se a revista.
Lisboa, 21 de Outubro de 2014. - Alberto Augusto Oliveira (relator) – Vítor Gomes – São Pedro.