Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0533/10
Data do Acordão:01/12/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IVA
DEDUÇÃO DE IMPOSTO
FACTURA
DOCUMENTO
SEGUNDA VIA
Sumário:Ao contrário das "segundas vias de facturas" em caso de extravio dos originais em virtude de circunstâncias excepcionais, as meras cópias, ainda que autenticadas, não constituem "documento em forma legal" adequado para suportar o direito à dedução do IVA nelas constante, pois que não está demonstrado que as cópias de documento sirvam o propósito de adequada fiscalização do exercício do direito à dedução, garantindo que o imposto não será deduzido por mais de uma vez.
Nº Convencional:JSTA00066755
Nº do Documento:SA2201101120533
Data de Entrada:06/21/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA DE 2010/03/08 PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR FISC - IVA.
Legislação Nacional:CIVA08 ART19 N2 ART35 N5.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC25033 DE 2000/09/27.; AC STA PROC724/04 DE 2004/10/20.
Jurisprudência Internacional:AC TRIJ PROCC-85/95 DE 1996/12/05.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– Relatório –
1 – A…, SA., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 8 de Março de 2010, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra liquidações adicionais de IVA relativas ao exercício de 1998 e respectivos juros compensatórios, apresentando para tal as seguintes conclusões:
(A) A ora recorrente submeteu perante o Tribunal “a quo” a apreciação jurisdicional da legalidade das liquidações de IVA do ano de 1998, em virtude da violação do disposto no artigo 19.º do CIVA
(B) A ora Recorrente entende que os actos tributários objecto dos presentes autos padecem ainda do vício de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito e violação expressa do artigo 19.º do CIVA, violando ainda a jurisprudência nacional e comunitária sobre o direito à dedução do IVA;
(C) Na óptica do Tribunal “a quo”, para efeitos de exercício do direito à dedução do IVA, não basta uma cópia autenticada de uma factura, devendo ser apresentado o original ou uma segunda via, de forma a que os serviços da Administração Tributária possam controlar e prevenir comportamentos fraudulentos ou abusivos dos sujeitos passivos;
(D) Inexistem no caso dos autos quaisquer indícios de fraude ou evasão fiscal, não tendo sido questionadas pela Administração Tributária a veracidade das operações, nem tão pouco foi questionada a autenticidade das cópias autenticadas das facturas;
(E) A inspecção tributária estava adstrita à adopção de diligências de prova para efeitos de fundamentação da não admissibilidade do imposto deduzido pela ora Recorrente, o que implica uma clara violação do princípio do inquisitório, uma intolerável inversão do ónus da prova, bem como a recusa da Administração Tributária em efectuar todas as diligências tendentes à descoberta da verdade material;
(F) O procedimento de inspecção tributária viola, assim, de forma frontal os princípios do inquisitório, da verdade material e da proporcionalidade previstos nos artigos 58º da LGT e 5º, 6º e 7º do RCPIT;
(G) As cópias autenticadas das facturas apresentadas pela ora Recorrente para efeitos de suportar documentalmente a dedução do IVA contém todos os requisitos previstos no número 5 do artigo 35.º do CIVA, pelo que, permitem um controlo inequívoco da validade e legitimidade das operações subjacentes;
(H) Inexiste qualquer disposição legal que impeça, em caso de destruição ou desaparecimento dos documentos originais, a reforma dos documentos ou mesmo a sua reprodução devidamente certificada nos termos legais;
(I) O entendimento defendido pela Administração Tributária e pelo Tribunal “a quo” implica uma clara e frontal violação do princípio da neutralidade e do direito à dedução, pilares fundamentais do sistema de funcionamento do IVA;
(J) A sentença proferida pelo Tribunal “a quo” mostra-se claramente contrária à jurisprudência deste Venerando Tribunal, o qual numa situação de contornos factuais semelhantes à situação em apreço - extravio de documentos originais - admitiu expressamente o exercício do direito à dedução do IVA com base noutro tipo de documentação para além das facturas originais (Acórdão do STA de 27/09/2000, recurso n.º 25033);
(K) Inexistindo causas específicas de prevenção e não estando legitimamente em causa a fiabilidade dos documentos e da própria contabilidade do sujeito passivo, será de admitir, ao abrigo do princípio da substância sobre a forma, a possibilidade de reforma de documentos para efeitos de exercício do direito à dedução previsto no n.º 2 do artigo 19.º do CIVA, o que se invoca para efeitos de anulação dos actos tributários objecto dos presentes autos;
(L) O próprio TJCE já defendeu, embora num caso referente à aplicação da Oitava Directiva do IVA, que para efeitos de exercício do direito à dedução e ao abrigo do princípio da proporcionalidade, “na hipótese de perda de uma factura ou de um documento de importação que não lhe é imputável, provar o seu direito ao reembolso apresentando um duplicado da factura ou do documento de importação em questão, quando a transacção que está na origem do pedido de reembolso se realizou efectivamente e não há risco de pedidos de reembolso posteriores” (cfr. Acórdão do TJCE, de 11.06.1998, Processo C-361/96);
(M) Em face do acima exposto, sempre se concluirá pela manifesta ilegalidade do procedimento tributário subjacente aos presentes autos, por violação expressa dos artigos 58.º, 60.º e 77.º todos da LGT, bem como do artigo 19.º do CIVA, e a consequente ilegalidade dos actos tributários que lhe sobrevieram, a saber, as liquidações de IVA objecto dos presentes autos, tudo com as devidas consequências legais, mormente a anulação das liquidações de juros compensatórios, por falta de verificação dos respectivos pressupostos legais;
(N) Subsidiariamente, sempre se diga que a decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa que está na origem mediata do processo de impugnação judicial viola de forma frontal o artigo 60.º n.º 7 da LGT, uma vez que não foram apreciados os elementos novos apresentados em sede graciosa, os quais não foram tidos em conta na decisão final o que acarreta a anulabilidade, por falta de fundamentação, da decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa dos actos tributários melhor identificados no presente articulado.
Nestes termos, e nos melhores de Direito que os mui ilustres Juízes CONSELHEIROS deste Venerando Tribunal assim o julgarem no seu MUI douto juízo, deve o recurso interposto pela ora Recorrente ser julgado totalmente procedente, por provado, devendo a sentença recorrida ser anulada, nos termos acima melhor expostos, Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS, a costumada Justiça!
2 - Não foram apresentadas contra-alegações.
3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer nos seguintes termos:
São duas as questões objecto do presente recurso:
1. Saber se o IVA mencionado em cópias de facturas apresentadas pelo contribuinte pode ser aceite como dedutível e se esses documentos preenchem os requisitos dos arts. 19º, n.º 2 e 35.º, n.º 5 do CIVA;
2. Saber se a decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa que está na origem mediata do processo de impugnação viola o art.º 60.º, n.º 7 da Lei Geral Tributária (conclusão N)
A nosso ver o recurso não merece provimento.
1. No que respeita à primeira questão importa sublinhar que, nos termos do art.º 19.º do CIVA, o direito à dedução encontra-se subordinado à realização de um certo número de condições formais.
Assim não será possível recuperar um imposto facturado em condições irregulares ou ilegais (Vide neste sentido Emanuel Vidal de Lima, CIVA anotado, 7.ª edição, pags. 375-376).
Como se escreveu no acórdão desta Secção do STA de 31/1/08, in rec. n.º 902/07, “para evitar a fraude fiscal, o legislador determinou que só seria dedutível o imposto mencionado em facturas, documentos a estas equivalentes passados em forma legal ou no recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, e desde que tais documentos estivessem em nome e na posse do sujeito passivo. E, atento aquele objectivo, o legislador foi especialmente exigente - n.º 6 do dito artigo 19.º:”para efeitos do exercício do direito à dedução, consideram-se passados em forma legal as facturas ou documentos equivalentes que contenham os elementos previstos no artigo 35.º … A factura ou documento equivalente deve ser emitida pelo sujeito passivo “por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º do presente diploma, bem como pelos pagamentos que lhe sejam efectuados antes da data da transmissão de bens ou prestação de serviços” - artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do CIVA…Na verdade, é reconhecido o carácter formalista do IVA, em ordem nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que as respectivas formalidades o são “ad substanciam”, que não meramente “ad probationem” (neste sentido ver também os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 15.04.2009, recurso 951/08 e de 02.03.2005, recurso 1186/04, ambos in www.dgsi.pt
Como bem se refere na decisão recorrida uma coisa é uma segunda via da factura, sendo consensual o direito de dedução do correspondente imposto, outra é uma mera cópia mesmo que seja autenticada.
Nesta conformidade bem andou a Administração Fiscal ao não admitir a dedução do IVA constante de facturas não originais.
A sentença recorrida, que assim decidiu, deve ser confirmada, pelo que nesta parte o recurso não merece provimento.
2. A segunda questão suscitada consiste em saber se a decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa que está na origem mediata do processo de impugnação viola o art.º 60.º, n.º 7 da Lei Geral Tributária.
Alega a recorrente que não foram apreciados os elementos novos apresentados em sede graciosa, os quais não foram tidos em conta na decisão final, o que acarreta anulabilidade por falta de fundamentação da decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa dos actos tributários.
Trata-se no entanto de fundamento que não foi invocado na petição nem foi objecto da decisão recorrida.
Ora, como é sabido, os recursos jurisdicionais, salvo o dever de conhecimento oficioso, o que não é o caso, visam apenas o reexame da decisão recorrida com vista à sua eventual anulação ou revogação (vide, neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01.06.2005, processo 28/05 in www.dgsi.pt).
Isto porque no sistema processual vigente o objecto do recurso é constituído pela decisão recorrida, não podendo obter provimento o recurso quando se vê que o objecto de ataque não é a peça decisória recorrida, mas antes o acto inicialmente impugnado (vide neste sentido Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.06.1991, processo 13169, in AP Diário da República de 30.09.1993, pag. 705)
Daí que se entenda que, também nesta parte, não deverão proceder os argumentos da recorrente.
Termos em que somos de parecer que o presente recurso deve ser julgado improcedente, confirmando-se o julgado recorrido.
4 - Notificadas as partes do parecer do Ministério Público (fls. 173 a 175 dos autos), nada vieram dizer.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
5 - Questão a decidir
É a de saber se o IVA mencionado em cópias de facturas, algumas autenticadas, apresentadas pelo contribuinte deve ser aceite como dedutível em face dos artigos 19.º n.º 2 e 35.º n.º 5 do Código do IVA (CIVA).
Caso se entenda que assim é, importa emitir pronúncia sobre a questão dos juros compensatórios liquidados à ora recorrente.
A questão suscitada na conclusão N) das alegações de recurso - a de saber se decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa que está na origem mediata do processo de impugnação viola o artigo 60.º n.º 7 da Lei Geral Tributária -, não poderá ser apreciada, pois que, como bem diz o Excelentíssimo Procurador Geral Adjunto no seu parecer junto aos autos, se trata de questão nova, não suscitada na petição de impugnação, logo não objecto de apreciação na sentença recorrida.
6 - Na sentença recorrida foram fixados os seguintes factos:
1. No âmbito da credencial e Ordens de Serviço nº 6633/4/5 todas de 22/10/99 a Impugnante foi alvo de uma acção de fiscalização teve início em 26/04/00 e fim em 06/09/00 (fls. 2 do processo administrativo);
2. A acção inspectiva teve por fim o controlo da retenção e entrega de I.R. devido pela aquisição de direitos (Royalties) fora do território nacional, no âmbito pagamento de rendimentos a não residentes que abrangeu os exercícios de 1996 a 1999 (fl. 6 do processo administrativo);
3. A sociedade teve início de actividade em 01.10.95;
4. O capital social de 400.000$ está dividido em duas quotas 20.000$ da sócia B… SA nif A-… com sede em Madrid R. … nº 15,
5. 80.000$ da sócia C…, com sede em … -USA
6. No relatório com referência ao ponto III A Exercício de 1998 – foram efectuadas as seguintes correcções:
“3.1 Custos não documentados
Relativamente à situação irregular mencionada no ponto III A) 1.3., também no exercício em causa foram contabilizados custos com as amortizações respectivas no valor de 69.000$, pelo que não são aceites fiscalmente nos termos do artº 23º do CIRC
3.2 Custos contabilizados a débito da conta 71.8 descontos e abatimentos em vendas sem qualquer suporte documental
Conforme se discrimina no Anexo I fls. 7 a 9, do Termo de Declarações de 12/07/00, permanecem em falta os referidos documentos lançados a débito da c/ 71.8, com excepção para os doc nº 649.09 e, 246.09 de 29/01/99 e 30/09/98, respectivamente nos valores de 5.518.880$ e 10.200.000$, que foram já apresentados, pelo que não são aceites nos termos do artº 23º do CIRC, custos no valor de 12.826.700$.
3.3 Custos contabilizados a débito da conta 62236 Trabalhos especializados sem qualquer suporte documental
Permanecem em falta os documentos lançados a débito da c/ 62236, referidos no anexo 1 fls. 4 dos termos de declaração de 12/07/99, com excepção para o documento nº 10.07 de 31/01.99 no valor de 1.429.700$ + IVA, que foi apresentado em 06/09/00, pelo que não são aceites nos termos o artº 23 do CIRC, custos no valor de 44.250.424$.”
Também não é aceite o IVA deduzido sem qualquer suporte documental no valor de 7.522.572$ nos termos do n.º 2 do artigo 19º do CIVA, conforme apuramento efectuado a fls. 35 (fl. 12 do processo administrativo)
7. Tendo em conta os factos referidos nos pontos antecedentes a Administração Tributária apurou o imposto em falta com a seguinte fundamentação:
IVA em falta – exercício de 1998 – Imposto deduzido indevidamente, por infracção ao art. 19.º nº 2 do CIVA:
Valores em escudos Período IVA em falta ponto III A)3.4
07.08 ---------------- 396.365
08.98 ---------------- 385.525
09.98 ---------------- 525.281
10.98 ---------------- 793.065

11.98 ---------------- 571.360
12.98 --------------- 271.337
01.99 --------------- 271.337
Totais --------------- 3.160.930
8. Com a reclamação graciosa das liquidações impugnadas a Impugnante juntou cópias autenticadas das facturas/recibos em nome de D..., com os nºs 15 a 20, referentes a comissões que suportaram Imposto sobre o Valor Acrescentado à taxa de 17% (fl. 36 a 44 dos autos);
9. A Impugnante juntou ainda cópia da factura/recibo nº 13, 14, 15, 48, 19, 20,21, 22, 23, 24, 25 emitidas por E..., com a designação de honorários e que suportaram Imposto sobre o Valor Acrescentado à taxa de 17% (fl. 45 a 55 dos autos);
10. Na sequência da acção inspectiva e dos factos referidos nos pontos antecedentes, foram efectuadas as liquidações impugnadas e com os nºs 01029252, 01029228, 01029229, 01029230, 01029231, 01029232, 01029233, 01029234, 01029235, 01029236, 01029237, 01029238, 01029239.
7 - Apreciando
7.1 Da não aceitação como imposto dedutível do IVA mencionado em cópias de facturas
A sentença recorrida, a fls. 103 a 118 dos autos, julgou improcedente a impugnação deduzida, porque, ao contrário do que sustentava a então impugnante, a entender suficientemente fundamentada (cfr. sentença recorrida, a fls. 106 a 108 dos autos) e por entender que a liquidação adicional que desconsiderou o direito à dedução do imposto mencionado nas cópias de facturas não padece de vício de violação de lei por violação dos artigos 19.º n.º 2 e 35.º n.º 5 do CIVA (cfr. sentença recorrida, a fls. 109 a 118 dos autos).
Fundamentou-se o decidido, quanto à questão do vício de violação de lei, na consideração de que: «para efeitos de dedução do IVA, as facturas não podem ser constituídas por duplicados de outros documentos, sob pena de se frustrar o fim visado pelo legislador de facilitar a fiscalização e evitar a fraude fiscal, pois que a permitir-se que a dedução fosse efectuada com base em duplicados (qualquer que seja a sua designação) a fiscalização seria praticamente impossível e a porta estaria aberta à fraude fiscal, já que a mesma transacção poderia dar lugar a tantas deduções quanto os duplicados existentes. A exigência de que a factura (ou documento equivalente) seja um documento original e não um duplicado de qualquer outro documento não é, assim, uma questão meramente formal, pois que representa a única forma de garantir que uma e apenas uma só vez o IVA referente às aquisições de bens e serviços seja objecto do direito à dedução. Ou seja, uma coisa é uma segunda via da factura, que conforme se referiu já é consensual para efeitos de direito à dedução do correspondente imposto, outra é uma cópia, mesmo que seja autenticada» (cfr. sentença recorrida, a fls. 117 dos autos), para concluir de seguida que: «Na situação vertente, comprovaram-se os pressupostos factuais do acto tributário posto em crise: inexistência de documentos de suporte emitidos sob forma legal, que mencionasse o IVA. Asserção que, de harmonia com os normativos citados, inibe o direito à dedução do IVA.
Discorda do decidido a recorrente, alegando que as cópias autenticadas das facturas apresentadas pela ora Recorrente para efeitos de suportar documentalmente a dedução do IVA contém todos os requisitos previstos no número 5 do artigo 35.º do CIVA, pelo que, permitem um controlo inequívoco da validade e legitimidade das operações subjacentes, que inexiste qualquer disposição legal que impeça, em caso de destruição ou desaparecimento dos documentos originais, a reforma dos documentos ou mesmo a sua reprodução devidamente certificada nos termos legais, pelo que o entendimento defendido pela Administração Tributária e pelo Tribunal “a quo” implica uma clara e frontal violação do princípio da neutralidade e do direito à dedução, pilares fundamentais do sistema de funcionamento do IVA, para além de claramente contrária à jurisprudência deste Venerando Tribunal e da jurisprudência comunitária.
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal no seu parecer junto aos autos e supra transcrito entende que a sentença recorrida deve ser confirmada, improcedendo o recurso.
Vejamos.
A “ausência de forma legal” necessária para permitir o direito à dedução do IVA circunscreve-se, no caso dos autos, ao facto de os documentos apresentados pela recorrente para titular tal direito não serem nem os documentos originais nem segundas vias desses, mas meras cópias de facturas/recibos, algumas autenticadas pelo “Chefe de Estação” (documentos de fls. 36 a 44 dos autos), outras não autenticadas (documentos de fls. 45 a 55 dos autos).
Pretende a recorrente que, inexistindo no caso dos autos quaisquer indícios de fraude ou evasão fiscal, não tendo sido questionadas pela Administração Tributária a veracidade das operações, nem tão pouco foi questionada a autenticidade das cópias autenticadas das facturas, tais cópias seriam suficientes, em face do artigo 19.º do CIVA, para suportar o exercício do direito à dedução do imposto nelas mencionado, pois que contêm todos os requisitos previstos no número 5 do artigo 35.º do CIVA, pelo que, permitem um controlo inequívoco da validade e legitimidade das operações subjacentes e inexiste qualquer disposição legal que impeça, em caso de destruição ou desaparecimento dos documentos originais, a reforma dos documentos ou mesmo a sua reprodução devidamente certificada nos termos legais.
Quer a sentença recorrida, quer o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal aceitam a possibilidade aberta pela jurisprudência deste Supremo Tribunal (cfr. os Acórdãos de 27 de Setembro de 2000, rec. n.º 025033 e de 20 de Outubro de 2004, rec. n.º 724/04, que remete para aquele primeiro) de o original da factura ou documento equivalente poder ser substituído, em caso de extravio do original, por segunda via de factura.
A recorrente vai mais além, pretendendo a equiparação à segunda via de factura da mera reprodução desta, ao menos se certificada.
Não nos parece, contudo, que tal pretensão possa colher, nem que a jurisprudência, nacional ou comunitária, suporte o alegado entendimento.
É que está por demonstrar que as meras cópias de facturas, e não já as segundas vias destas, sirvam adequadamente o propósito de adequada fiscalização do exercício do direito à dedução (cuja fiscalização cabe aos Estados Membros), garantindo que o imposto não será deduzido por mais de uma vez.
De facto, a jurisprudência comunitária tem entendido que cabe aos Estados Membros “o poder de determinarem as regras relativas à fiscalização do exercício do direito à dedução e, designadamente, o modo como o sujeito passivo deve fazer prova desse direito”, conferindo-lhes “o poder de exigirem a apresentação do original da factura para justificar o direito à dedução, bem como o de admitirem, quando o sujeito passivo já não esteja na posse do original, outros meios de prova que demonstrem que existiu efectivamente a transacção que é objecto do pedido de dedução (Acórdão do TJCE de 5 de Dezembro de 1996 “Reisdorf”, processo n.º C-85/95).
No que se refere ao primeiro dos Acórdãos deste Supremo Tribunal acima mencionados o que nele estava em causa eram “segundas vias das facturas autenticadas pelos fornecedores”, e não meras cópias de facturas como no caso dos autos, daí não haver identidade entre a situação subjacente àquele julgado e a subjacente aos presentes autos (inexistindo, do mesmo modo, identidade de circunstancialismo do qual derivou a não apresentação dos originais dos documentos, pois que no caso dos autos não se encontra no probatório fixado qualquer alusão à impossibilidade de apresentação destes por extravio ou caso de força maior, enquanto que no Acórdão de 27 de Fevereiro de 2000 se refere a existência de um “incêndio que destruiu os elementos contabilísticos existentes”).
Ora, não se excluindo que em casos limitados, mas não como regra, perante circunstâncias excepcionais de destruição ou extravio não culposo dos documentos originais que suportam o direito à dedução, deva ser ponderada a admissibilidade de o direito à dedução ser suportado por facturas ou documentos equivalentes não originais, necessário é, contudo, que estes se apresentem como meios adequados ao controlo da situação tributária do contribuinte, sendo a Administração fiscal o primário julgador dessa adequação, sob controlo jurisdicional posterior, se requerido, obviamente.
Ora, no caso dos autos, a recorrente não logrou demonstrar porque razão tais cópias deviam ter sido aceites, cabendo-lhe a ela essa demonstração pois que, em princípio, é sobre facturas ou documentos equivalentes originais (ou segundas vias destes, em caso de extravio ou perda dos primeiros) que o direito à dedução se exerce, não por capricho do legislador ou da Administração fiscal, mas por necessidade de prevenir que o direito à dedução não é exercido mais do que uma vez relativamente à mesma operação.
A sentença recorrida que assim decidiu não merece, pois, censura, improcedendo as alegações do recorrente.
- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6.
Lisboa, 12 de Janeiro de 2011. – Isabel Marques da Silva (relatora) - Pimenta do Vale - António Calhau.