Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01773/17.7BEPRT 0748/18
Data do Acordão:11/09/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
Sumário:Não se justifica admitir revista de acórdão, relativamente a questões cuja relevância se esgota no caso concreto e cuja decisão se mostre fundamentada e juridicamente plausível.
Nº Convencional:JSTA000P23838
Nº do Documento:SA12018110901773/17
Data de Entrada:07/23/2018
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:IMPRENSA NACIONAL CASA DA MOEDA, SA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1 A………… S.A. recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, proferido em 4 de Maio de 2018, que revogou a sentença proferida pelo TAF do Porto, e consequentemente, julgou improcedente uma acção de contencioso pré-contratual por si intentada contra a IMPRENSA NACIONAL CASA DA MOEDA SA, sendo contra-interessada a B…………, LDA.

1.2. Fundamenta a admissibilidade da revista para melhor aplicação do direito, por o acórdão corroborar a actuação de um concorrente que presta, de forma culposa, falsas declarações; interpreta a menção prevista nas peças do concurso “colaboradores a integrar a equipa” seja tida como colaboradores sem vínculo de contrato de trabalho e torna desnecessária a entrega de declarações de compromissos por parte dos elementos de equipa que assumem a qualidade de terceiros face à Adjudicatária; não aprecia a legalidade da conduta do Júri por considerar que o processo de avaliação decorre de valorações próprias da função administrativa; e, finalmente, por acolher um critério de desempate com desvalorização das regras nacionais e internacionais da contratação pública (proposta apresentada em primeiro lugar na plataforma electrónica de compras públicas).

1.3. A IMPRENSA NACIONAL CASA DA MOEDA SA e a B………… pugnam pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A autora (ora recorrente) na petição inicial pediu o seguinte:

a) o acto de adjudicação ser anulado e, em consequência, (i) ser a Entidade Adjudicante condenada a proceder a uma nova análise e ordenação das propostas, nos termos do art. 146º do CCP; (ii) ser a proposta da concorrente B………… excluída do procedimento, com base nos fundamentos aduzidos supra; e (iii) ser a proposta da Autora ordenada em 1º lugar, propondo-se-lhe a adjudicação do contrato;

SUBSIDIARIAMENTE

b) o acto de adjudicação ser anulado e, em consequência, (i) ser a Entidade Adjudicante condenada a proceder a nova análise e ordenação das propostas, nos termos do art. 146º do CCP; (ii) ser a pontuação da proposta da Autora referente ao subfactor “adequação dos métodos de governance propostos ao âmbito dos trabalhos” revista em alta; e, consequentemente, (iii) ser a proposta da Autora ordenada em 1º lugar, propondo-se-lhe a adjudicação do contrato;

SUBSIDIARIAMENTE

Ser o critério de desempate utilizado pelo júri do procedimento para operar a ordenação final das propostas julgado inválido, extraindo-se as devidas consequências jurídico-procedimentais.”

3.3. A primeira instância julgou a acção procedente, anulou o acto de adjudicação, excluiu do procedimento a proposta da contra-interessada (B………… Lda) e adjudicou o contrato de aquisição de serviços à autora.

A autora pedira a exclusão da proposta da B………… Lda por vários motivos, a saber:

(i) falta de junção de documentos que permitissem relacionar o subscritor da proposta com os correspondentes poderes de representação e as suas funções;

(ii) falsas declarações, culposas, na proposta apresentada a concurso;

(iii) e ausência de recursos humanos para a pontual execução do contrato.

3.4. A primeira instância julgando procedente a primeira causa de exclusão, julgou – como já referimos – a acção procedente.

3.5. A imprensa Nacional Casa da Moeda SA e a B………… Lda recorreram para o TCA Norte, que através do acórdão recorrido revogou a sentença recorrida e negou provimento à ampliação do objecto do recurso formulada pela A………….

3.6. Entendeu o TCA Sul que não procediam os fundamentos que serviram para a primeira instância excluir a proposta da B…………, Lda. quanto à inexistência de documentos que permitissem relacionar o subscritor da proposta com os correspondentes poderes de representação. Com efeito, neste aspecto, concluiu o acórdão recorrido, que da mera análise da assinatura electrónica e respectivo certificado constavam todos os elementos necessários, a saber que o subscritor agia e detinha poderes de representação da B………… Lda.: “Das imagens fac-similadas reproduzidas resulta manifesto – diz o acórdão - que o subscritor da proposta da B………… Lda. C………… tinha poderes para obrigar a referida sociedade, enquanto “gerente com poderes para obrigar individualmente a pessoa colectiva””.

De seguida passou a analisar os vícios suscitados pela A…………, no âmbito da por si requerida ampliação do objecto do recurso. Julgou, todavia, que esses vícios se não verificavam.

O alegado vício de falsas declarações culposas não se verificava porque no caso dos autos nada apontava no sentido de que a contra-interessada tivesse querido prestar falsas declarações, tudo apontando antes no sentido da mesma estar erradamente convencida de estar a dizer a verdade, ao referir-se à experiência dos membros da equipa que apresentou a concurso e também por não se alcançar qual a vantagem que a contra-interessada poderia obter com tais declarações. O acórdão, neste segmento, transcreveu parte da sentença e concluiu: “uma vez que nos revemos na apreciação feita exactamente a este respeito por parte do Tribunal a quo, improcederão os vícios invocados”.

Quanto ao vício traduzido na circunstância da contra-interessada não ter apresentado os recursos humanos necessários para a pontual execução do contrato, o acórdão seguiu a mesma técnica: transcreveu a parte da sentença que apreciou o alegado vício e reviu-se na mesma.

Finalmente o TCA Norte apreciou ainda os vícios imputados ao acto que não tinham sido apreciados pelo TAF do Porto. Tais vícios traduziam-se (na delimitação que deles fez o TCA Norte) na (i) errónea aplicação dos factores e subfactores do critério da adjudicação e (ii) da ilegalidade do critério de desempate. Tais vícios foram julgados improcedentes: o primeiro (erro na aplicação dos factores e subfactores) por entender que o júri adoptou uma postura adequada, discriminando suficientemente as classificações, justificando a avaliação qualitativa das propostas e identificando os pontos fortes e fracos destas e a sua relevância nas classificações atribuídas; o segundo (legalidade do critério de desempate), por se tratar de um critério residual, depois de esgotadas as anteriores tentativas de desempate, em decorrência até de um dever de adjudicar.

3.7. Como decorre do exposto, as questões jurídicas estão circunscritas ao caso concreto, não levantando questões gerais sobre contratação pública susceptíveis de se colocarem no futuro.

Na questão da assinatura digital, o que aqui se discutiu foi a questão de saber se os elementos que acompanhavam a assinatura digital, designadamente, o teor do certificado digital devidamente articulado com a mesma assinatura, evidenciavam a qualidade de representante da pessoa colectiva.

A alegada falsidade das declarações, experiência profissional e relação contratual dos “meios humanos” afectos à execução do contrato, e aplicação dos factores e subfactores, também foi apreciada tendo em conta a análise da proposta da contra-interessada e ali se esgotou.

Deste modo, todas as referidas questões pela sua ligação estrita ao caso em análise não se revestem de importância jurídica ou social bastantes para justificar a admissão de um recurso excepcional de revista.

A validade do critério de desempate (proposta que primeiro deu entrada na plataforma), encerra uma questão mais geral, sendo previsível que ocorra em outras situações. Todavia, no presente caso, a decisão recorrida mostra-se plausível e fundamentada, desde logo, por entender que se trata de um critério residual aplicável quando não exista mais nada para desempatar e subsistir o dever de adjudicar.

Não se justifica assim a admissão da revista.

4. Decisão

Face ao exposto, não se admite a revista.

Custas pela recorrente.

Porto, 9 de Novembro de 2018. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.