Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0365/17 |
Data do Acordão: | 03/14/2018 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ISABEL MARQUES DA SILVA |
Descritores: | RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL PRESSUPOSTOS |
Sumário: | Constitui jurisprudência pacífica deste STA que, atento o carácter extraordinário da revista excepcional prevista no artigo 150.º do CPTA, não pode este recurso ser utilizado para arguir nulidades do acórdão recorrido, devendo as mesmas ser arguidas em reclamação para o tribunal recorrido, nos termos do artigo 615.º n.º 4 do Código de Processo Civil. |
Nº Convencional: | JSTA000P23042 |
Nº do Documento: | SA2201803140365 |
Data de Entrada: | 03/23/2017 |
Recorrente: | A............ E B............ |
Recorrido 1: | INSTITUTO DA SOLIDARIEDADE E DA SEGURANÇA SOCIAL |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A………… e B…………, ambos com os sinais dos autos, vêm interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista, ao abrigo nomeadamente do artigo 150.º Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), de dois acórdãos diferentes com data de 25/02/2016 do TCA-Norte, alegadamente nulos por preterição de formalidade legal que influi no processo, concluindo a sua alegação nos seguintes termos:1. Os dois acórdãos são nulos por preterição de formalidades legais. Ausência de notificação dos pareceres desfavoráveis do MP. Devendo ser anulados. 2. Deveriam os impugnantes ter sido notificados dos pareceres do MP para se pronunciarem sobre ele. 3. Essa omissão viola o direito a um processo equitativo, mormente o princípio do contraditório e igualdade de armas previsto no artigo 20, n.º 4, da Constituição e artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 4. Como viola o artigo 13º da Constituição e o artigo 14.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que garantem o princípio da igualdade. 5. A nulidade vem prevista no artigo 195 e seguintes do CPC. Essa omissão influi seguramente na decisão da causa. É nulo todo o processado após os alegados pareceres, logo também as próprias sentenças/acórdãos são nulas/as. 6. A esse propósito diz o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que é violado o artigo 6.º, n.º 1 da Convenção. 7. Assim, deve conhecer-se da nulidade, reconhecer-se que foi cometida uma omissão ou não cumprida uma formalidade legal, mandar-se notificar as partes dos pareceres para sobre eles se pronunciarem e as decisões do tribunal serem declaradas nulas por omisso de formalidades legais, cumprida a lei e depois decidir-se em conformidade. 8. O despacho que declara não haver nulidade, diz, em síntese que nenhuma questão nova se levantava susceptível de influenciar a decisão de impugnação. E que o parecer não levantava questões novas. 9. Trata-se de erro clamoroso, violentamente grosseiro. Pois o tribunal até seguiu erros grosseiros do parecer do MP. 10. No despacho de indeferimento datado de 29/05/2014 a SS confirma na folha 1/3 que os requerentes juntaram “declaração de IRS de 2009 sem rendimentos e de 2011 com rendimento global de 7400 €.” (sic) 11. Na folha 2/3 a diz que: “Na base de dados da SS nada consta sobre ambos relativamente à qualificação e na base das Finanças constam rendimentos prediais e mais-valias de 2010 e de 2011, de 343.102,33 € e 342.438,98 €, respectivamente, destinando-se este processo a impugnar judicialmente o IRS solicitado pelas Finanças” (sic) 12. No recurso do apoio judiciário os requerentes escreveram: “Os impugnantes não tiveram os rendimentos que a SS alega. Lastimavelmente, os impugnantes não tiveram os rendimentos que a SS alega. Nem no ano em causa impugnado nem o outro de milhares de euros de 2010 e 2011. Os documentos de prova respectiva até constam dos autos de impugnação. DEVE SER LAPSO DA SS.” 13. Os requerentes não foram notificados de qualquer documento da SS ou Finanças que diga ou contenha esse erro da SS. 14. No parecer de 18/11/2014 o MP segue esse erro, tipo copiar/colar, transcrevendo tal erro na folha 211. Fazendo-o sem qualquer critério, sem sentido crítico. 15. E o juiz, na folha 10 da sentença de indeferimento do apoio judiciário, transcreve esse erro sem qualquer critério ou sentido crítico. 16. A função do tribunal é corrigir os erros da administração. 27. (sic) Tanto mais que os documentos que contradiziam a SS, o parecer do MP e a decisão do juiz até constavam do processo como se escrevia no recurso de impugnação do apoio judiciário. Escreveu-se: “Os documentos de prova respectiva até constam dos autos de impugnação.” (sic) 28. A decisão judicial que confirma erros grosseiros da SS e do MP, segue esses despachos da SS e do parecer do MP ipsis verbis, sem critério, copiando e colando tais erros, e ainda dizendo que nada de novo se suscitava! 29. Para que conste, os impugnantes/recorrentes nunca foram notificados das folhas 104 a 107 do dossier que a SS mandou para o tribunal, não sabendo da sua existência. Papéis que são falsos. 30. Por aqui também foi violado o direito ao contraditório e igualdade de armas, tendo os requerentes sido surpreendidos com papéis falsos. 31. Tudo não passa duma trapalhada por violação das mais elementares regras de direito. 32. Essa violação e trapalhada, já vinda da SS, inquinou todo o processo e prejudicou os recorrentes. 33. E aplicando-se aqui mutatis mutandis tudo o que se escreve sobre a não notificação do parecer do MP. 34. Ao não ouvir os impugnantes sobre o parecer, o tribunal cometeu um erro grosseiro, que poderia ter evitado, e deu uma decisão errada por causa desse erro, concluindo que os impugnantes estavam a abarrotar de dinheiro com operações das acções, quando afinal era o contrário, tal como consta dos documentos nos próprios autos. 35. A conclusão do tribunal tinha que ser a inversa, tendo causado um dano moral e patrimonial aos requerentes/impugnantes, competindo ao sistema judiciário e ao Estado reparar esse erro. 36. Tal erro gera responsabilidade civil extra-contratual do Estado e dos seus autores. 37. A prática de um erro grosseiro viola o sentido de Justiça e descredibiliza os tribunais. 38. Mas mesmo que não existisse tal erro, o despacho/parecer do MP tinha de ser notificado conforme jurisprudência do TEDH que o tribunal ignorou. 39. As decisões deste tribunal são decisões-surpresa. 40. “O princípio do contraditório tem como objectivo assegurar um tratamento igualitário das partes no processo, designadamente ao nível da admissão da prova e da apreciação do seu valor. Sendo obrigado a ouvir ambas as partes, o tribunal fica dotado da base imprescindível para proferir uma decisão imparcial e justa. Esse princípio decorre portanto também, quer do direito de acesso aos tribunais para defesa de direitos e interesses legalmente protegidos (artigo 20º, n.º 1, da Constituição), quer do direito a um processo equitativo (artigo 20º, n.º 4), quer do próprio princípio da igualdade (artigo 13º).” (TC) 41. O despacho é nulo por omissão de pronúncia por não se pronunciar sobre a inconstitucionalidade suscitada. 42. O tribunal cita a propósito a norma do artigo 195º, nº 1 e 201º, nº 1, do CPC para justificar a não nulidade. 43. Tais normas quando interpretadas no sentido de não exigirem a prévia notificação dos pareceres do MP às partes são inconstitucionais por violação do direito a um processo equitativo previsto no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República e por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13º da CRP. 44. E por violação do direito a um processo equitativo previsto no artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que garante o direito ao contraditório e igualdade de armas e por violação do artigo 14º da Convenção que garante a igualdade. 45. Se é violada a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, é também violado o artigo 8 da Constituição, que manda obedecer aos instrumentos de direito internacional que obrigam Portugal. 46. Os vícios em causa cometidos pelas instâncias classifica-os o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos como “constatações e conclusões flagrante e evidentemente arbitrárias, contrárias à justiça e ao bom senso, constituindo por si mesmas uma violação da Convenção.” 47. Ao contrário do que pretendem os acórdãos, os recorrentes estão a discutir nulidades e não o apoio judiciário. Isso vai ser discutido até ao TC e TEDH. 48. O tribunal superior, dando procedência a estas conclusões, deve revogar os dois acórdãos e mandar cumprir a lei. 49. Só deve correr um processo e não dois. Justiça! 2 – Não foram apresentadas contra-alegações. 3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 415/416 dos autos, nele suscitando a questão da inconstitucionalidade dos artigos 150.º, n.º 1, art. 2 al. c) e art. 2.º al. e) todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, na interpretação segundo a qual, por via da aplicação supletiva as normas sobre organização e processo nos tribunais administrativos e tributários e do Código de Processo Civil, o recurso de revista é admissível no contencioso tributário. Quanto a esta questão prévia, diga-se desde já que não deixaremos de acompanhar a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal, entretanto sancionada pelo Tribunal Constitucional – cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 610/16, de 15 de Novembro de 2016, cujo entendimento vem sendo reiterado em Decisões Sumárias e Acórdãos posteriores (cfr. o recente Acórdão n.º 35/18, de 31 de Janeiro) - no sentido na admissibilidade no contencioso tributário do recurso excepcional de revista previsto no artigo 150.º do CPTA (cfr., por todos o Acórdão de 8 de Outubro de 2014, rec. n.º 772/14 e numerosa jurisprudência nesse sentido aí citada), não se nos afigurando ocorrer a invocada inconstitucionalidade, porquanto, como tem considerado a jurisprudência deste STA, tal competência encontra fundamento legal na expressa remissão para o CPTA operada pelo artigo 2.º alínea c) do CPPT e bem assim na alínea e) do mesmo preceito legal, que opera remissão idêntica para o Código de Processo Civil, diploma este que desde as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, passou também a prever recurso excepcional de revista para o STJ de acórdãos de tribunais da Relação, não havendo, pois, razão para tal recurso se ter apenas por excluído no contencioso tributário e suscitando tal solução, ao invés, dúvidas quanto à sua conformidade à lei fundamental por atentatória do direito à tutela jurisdicional efectiva e ao princípio da igualdade (artigos 13.º e 268.º n.º 4 da CRP). Julga-se, pois, não haver obstáculo de ordem constitucional à admissibilidade do presente recurso, preenchidos que estejam os respectivos pressupostos legais. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir da admissibilidade do recurso. - Fundamentação - 4 – Matéria de facto É do seguinte teor o probatório fixado no Acórdão recorrido: Nos termos do n.º 1 do art.º 662.º do CPC, por ser relevante para a decisão e no processo existirem elementos de prova, fixa-se a seguinte factos:
2) Em 18.11.2014, foi emitido parecer pelo Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o qual não foi notificado aos impugnantes, (fls. 152 a 156 dos autos); 3) Em 25.11.2014 foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto tendo julgado improcedente o pedido (fls. 158 a 170); 4) Em 04.02.2015 vieram, os ora Recorrentes, arguir a nulidade da sentença proferida em 25.11.2014, nos termos do art.º 195.º do CPC, por não lhe ter sido notificado o parecer do Ministério Público (fls. 175/178 dos autos); 5) Por despacho do MM Juiz de 15.04.2015, foi apreciada a alegada nulidade tendo sido indeferida “(…) por não terem sido suscitadas no parecer do Ministério Público quaisquer questões novas suscetíveis de influenciar a decisão de impugnação, a falta de notificação deste parecer não afronta o princípio do contraditório, não produzindo a invocada nulidade processual.” (fls. 180/181 dos autos); 6) Em 18.05.2015 veio o Impugnante, interpor recurso para o TCAN, do despacho referido em 5 , que lhe indeferiu a declaração da nulidade (fls. 186/286 dos autos).
- Decisão - 6 - Termos em que, face ao exposto, acorda-se em não admitir o presente recurso, por inadmissibilidade legal do seu objecto. Custas pelo recorrente. Após trânsito, baixem os autos ao TCA - Norte para efeitos de pronúncia sobre a admissibilidade do “recurso de apelação” interposto do Acórdão que sobre as arguidas nulidades se pronunciou. Lisboa, 14 de Março de 2018. - Isabel Marques da Silva (relatora) – Ascensão Lopes - António Pimpão. |