Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0111/14
Data do Acordão:03/12/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
INCOMPETÊNCIA RELATIVA
Sumário:I - O artigo 17.º do CPPT estabelece, para os processos de impugnação e de execução fiscal, um regime especial sobre a arguição da incompetência territorial que se afasta do regime estabelecido no artigo 13.º do CPTA, nos termos do qual a infracção das regras de competência territorial determina a incompetência meramente relativa do Tribunal (cfr. o n.º 1 do artigo 17.º), sendo que essa incompetência apenas pode ser arguida, no processo de execução, pelo executado, até findar o prazo para a oposição (cfr. a alínea b) do n.º 2 do artigo 17.º do CPPT).
II - Como tal, a infracção às regras de competência territorial não pode ser oficiosamente conhecida em oposição à execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA00068618
Nº do Documento:SA2201403120111
Data de Entrada:01/30/2014
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A....... E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART12 N1 ART17 N2 B ART103 ART151 N1 ART203 - ART213.
CPTA02 ART13.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01945/13 DE 2014/01/22.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO VOLI 6ED PAG248.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -

1 – O Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra recorre para este Supremo Tribunal da decisão daquele tribunal, de 4 de Outubro de 2013, que oficiosamente se declarou incompetente em razão do território para conhecimento da oposição deduzida por A……, com os sinais dos autos, à execução fiscal contra si instaurada para cobrança coerciva de coimas, portagens, custas e juros de mora devidas ao Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I.P., e competente para o efeito o Tribunal Tributário de Lisboa.
O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
I - Recorre o Ministério Público da douta sentença proferida a fls. 126 a 128 dos autos (suporte físico do processo), mediante a qual se declarou a incompetência, em razão do território, deste TAF de Sintra, e determinou a posterior remessa dos autos para o Tribunal Tributário de Lisboa por ser este o competente, em razão do território, para conhecer da oposição apresentada por A………. relativamente à execução fiscal a correr termos pelo Serviço de Finanças da Amadora -3 para cobrança de dívida no valor total de €2.071,15 relativa a taxas de portagem, coimas, custas e juros de mora, de que é credor o Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I.P.
II - As questões a apreciar no âmbito do presente recurso são duas, e bem simples. Por um lado, a de saber se a incompetência territorial pode ser conhecida oficiosamente, sem que tenha sido invocada. Por outro lado, a entender-se que a incompetência territorial pode ser conhecida oficiosamente, então, nesse caso, qual o tribunal competente, em razão do território, para conhecer da oposição apresentada relativamente a um processo de execução fiscal.
III - Na sentença ora em recurso foi sufragado o entendimento de que, e de acordo com o disposto nos artigos 12º, nº 1 e 103º, ambos do CPPT, compete ao tribunal tributário de 1ª instância da área da sede da entidade credora decidir da oposição à execução fiscal. Como a entidade credora tem a sua sede em Lisboa concluiu-se ser o Tribunal Tributário de Lisboa, que não o TAF de Sintra, o competente territorialmente para conhecer da oposição, e daí a verificação da excepção dilatória de incompetência relativa, e a consequente ordem de remessa dos autos àquele tribunal.
IV - Entendemos, pela nossa parte, que a decisão recorrida integra erro de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação da lei, mais precisamente das disposições dos artigos 12º, nº 1, 17º, nº2, alínea b) e 103º, todos do CPPT, e por violação do disposto no artigo 151º, nº 1, ambos do CPPT. Com efeito, e em primeiro lugar, em processo judicial tributário relativo a execução fiscal ou respectivos incidentes, seja a oposição, como é o caso, e face ao disposto no artigo 17º, nº 2, alínea b), do CPPT, a incompetência territorial não é de conhecimento oficioso.
V - Tal significa que a incompetência territorial, para ser conhecida, teria de ser invocada pelo executado, ou ora Oponente, o que não sucedeu, pelo que estava vedado ao juiz conhecer oficiosamente da incompetência territorial do TAF de Sintra.
VI - Sucede ainda, e por outro lado, que na eventualidade de se entender que o juiz poderia conhecer oficiosamente da incompetência em razão do território, o que apenas por mera hipótese se admite, então o certo é que de acordo com o disposto no artigo 151º, nº 1, do CPPT, a competência respectiva radicaria em função da área do Serviço de Finanças onde corre o processo de execução fiscal.
VII - Ora, a sede do Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I.P., erigida como critério da competência (territorial) na sentença recorrida, é irrelevante uma vez que esta entidade é credora. Relevante, para tal efeito e à luz da referida disposição legal, é o facto de ser no Serviço de Finanças da Amadora – 3, situado no concelho da Amadora, que corre termos a execução fiscal, pelo que seria este TAF de Sintra o competente, em razão do território, para conhecer da oposição em apreciação nos autos.
VIII - Assim, nestes termos, e nos demais de direito que doutamente não deixarão de ser supridos, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, por via disso, ser revogada a sentença recorrida, e determinado o prosseguimento da oposição neste TAF de Sintra e se a tal nada mais obstar.
Porém, V. Exas., Venerandos Conselheiros, apreciarão e decidirão como for de Direito!

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -

3 – Questões a decidir
São as de saber se pode o juiz oficiosamente declarar a incompetência territorial do tribunal para conhecimento de uma oposição à execução fiscal e, em caso afirmativo, se bem decidiu o TAF de Sintra ao declarar-se territorialmente incompetente para conhecimento da oposição deduzida, ordenando a remessa dos autos ao Tribunal Tributário de Lisboa, julgado o competente em razão do território para conhecimento daquela oposição.


4 – Apreciando.
4.1 Do (não) conhecimento oficioso da incompetência territorial do tribunal
A decisão recorrida, a fls. 126 a 128 dos autos, julgou oficiosamente o TAF de Sintra incompetente em razão do território para conhecimento da oposição deduzida pelo ora recorrido à execução fiscal que lhe foi movida pelo Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I.P., e que corre termos no Serviço de Finanças da Amadora – 3, julgando territorialmente competente para o efeito o Tribunal Tributário de Lisboa.
Fundamentou-se o decidido quanto à possibilidade de conhecimento oficioso da incompetência do tribunal em razão do território na regra contida no artigo 13.º do CPTA, aplicável ex vi do disposto na alínea c) do artigo 2.º do CPPT, afastada que foi pela decisão recorrida a aplicabilidade do disposto no artigo 17.º do CPPT ao caso dos autos porquanto se concluiu, do teor do n.º 1 do referido artigo, que aquele dispõe, apenas, quanto à competência do Tribunal no processo de impugnação judicial (alínea a), e do Serviço de Finanças no processo de execução fiscal (alínea b) – cfr. decisão recorrida, a fls. 126 dos autos.
Discorda do decidido o Ministério Público alegando, a este respeito, que em processo judicial tributário relativo a execução fiscal ou respectivos incidentes, seja a oposição, como é o caso, e face ao disposto no artigo 17º, nº 2, alínea b), do CPPT, a incompetência territorial não é de conhecimento oficioso pelo que a incompetência territorial, para ser conhecida, teria de ser invocada pelo executado, ou ora Oponente, o que não sucedeu, pelo que estava vedado ao juiz conhecer oficiosamente da incompetência territorial do TAF de Sintra (cfr. as conclusões IV e V das suas alegações de recurso).
Tem razão o recorrente.
Estabelece o Código de Procedimento e de Processo Tributário no seu artigo 17.º para os processos de impugnação e de execução fiscal um regime especial sobre a arguição da incompetência territorial que se afasta do regime estabelecido no CPTA, diploma este em cujo artigo 13.º se prescreve que a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de outra matéria.
Dispõe o referido preceito:
Artigo 17.º

Incompetência territorial em processo judicial

1 - A infracção das regras de competência territorial determina a incompetência relativa do tribunal ou serviço periférico local ou regional onde correr o processo.
2 - A incompetência relativa só pode ser arguida:

a) No processo de impugnação, pelo representante da Fazenda Pública, antes do início da produção da prova;
b) No processo de execução, pelo executado, até findar o prazo para a oposição.

3 - Se a petição de impugnação for apresentada em serviço periférico local ou regional territorialmente incompetente, o seu dirigente promoverá a sua remessa para o serviço considerado competente no prazo de quarenta e oito horas, disso notificando o impugnante.

Ora, a alusão constante do artigo 17.º do CPPT ao processo de execução fiscal deve ser entendida, não apenas como referindo-se à competência do Serviço de Finanças no processo de execução fiscal, mas também à competência do Tribunal para decidir dos meios judiciais de defesa do executado na execução fiscal instaurada, como paradigmaticamente sucede com a oposição à execução fiscal ou a reclamação de decisão do órgão de execução fiscal (quanto a esta última, cfr. o recente Acórdão deste STA de 22 de Janeiro último, rec. n.º 1945/13).
É que nenhum sentido faz afastar nesta matéria a regra especial contida na lei processual tributária e sobre ela fazer prevalecer a regra contida no CPTA, sabido que a oposição à execução fiscal é regulada por regras processuais próprias contidas na lei processual tributária (artigos 203.º a 213.º do CPPT) e pelas regras processuais da impugnação judicial (cfr. o n.º 1 do artigo 211.º do CPPT), e não pelas regras do CPTA, sendo em relação aos meios processuais regulados pela lei processual administrativa, e não aos regulados por normas próprias contidas na lei processual tributária, que se admite que a infracção às regras de competência territorial seja de conhecimento oficioso, por aplicação subsidiária do disposto no artigo 13.º do CPTA (neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Volume I, 6.ª ed., 2011, p. 248 – nota 4 a) ao artigo 17.º do CPPT).

Pelo exposto, e no provimento do recurso, haverá que revogar a decisão recorrida, que mal andou ao oficiosamente julgar verificada a excepção de incompetência em razão do território do tribunal para julgar a oposição deduzida, determinando-se a baixa dos autos ao TAF de Sintra para que aí prossigam os seus termos.

Prejudicado fica o conhecimento da segunda questão suscitada pelo recorrente.

- Decisão -
5 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, determinando a baixa dos autos ao TAF de Sintra para que aí prossigam para conhecimento da oposição, se a tal nada mais obstar.

Sem custas.

Lisboa, 12 de Março de 2014. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro Delgado – Ascensão Lopes.