Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02569/08.2BEPRT
Data do Acordão:11/18/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IVA
NULIDADE DE SENTENÇA
EXCESSO DE PRONÚNCIA
EXPORTAÇÃO
ISENÇÃO
Sumário:I - A nulidade da sentença por excesso de pronúncia ocorre se o Tribunal exceder os seus poderes de cognição quanto à causa de pedir e pedido, em violação da regra da identidade de causa de pedir e de causa de julgar.
II - Cabe ao sujeito passivo que pretende beneficiar da isenção prevista na alínea s) do nº do artigo 14º do CIVA fazer prova de que os bens exportados saíram efectivamente do território nacional.
III - Tal prova constitui um ónus do sujeito passivo, uma vez que se trata de uma operação, em princípio, sujeita a tributação ex vi do artigo 6º nº 17 do CIVA.
Nº Convencional:JSTA000P26783
Nº do Documento:SA22020111802569/08
Data de Entrada:04/01/2020
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.............., LDA.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 29-10-2018, que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida por “A…………, Lda.” no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com o indeferimento da reclamação graciosa por si apresentada relativamente à liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios respeitante ao 3.º trimestre de 2003, no valor de € 19.530,38.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada por A…………, LDA., NIPC ………, no segmento relativo à anulação, por erro nos pressupostos, da liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios, relativa ao 3º trimestre de 2003, na parte atinente às correções efetuadas no montante de € 16.676,12.

B. Conforme decorre da petição inicial, no que a esta parte se refere, a impugnante apenas alega que as situações de isenção do art.º 14º n.º 1, al. s) e de não sujeição contemplada no artigo 6º n.º 18, ambos do CIVA, não pressupõem a comprovação referida no art.º 28º, n.º 8, do CIVA, não fazendo qualquer menção relativamente à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA.

C. Neste sentido, a impugnante apenas se insurge contra as correções que resultaram da desconsideração da isenção prevista no art.º 14º n.º 1, al. s) e da não-sujeição contemplada no artigo 6º n.º 18, não fazendo qualquer reparo às correções resultantes da desconsideração da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA.

D. No entanto, na sentença recorrida, o Tribunal a quo pronunciou-se relativamente à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA, determinando a anulação da correção resultante da sua desconsideração pelos serviços de Inspeção Tributária.

E. Nestes termos, pronunciou-se o Tribunal a quo sobre uma questão que, não sendo de conhecimento oficioso, não podia tomar conhecimento, considerando uma causa de pedir que não foi invocada.

F. Motivo pelo qual, com o devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida enferma de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do art.º 125º n.º 1 do CPPT e art.º 615º n.º 1 d) do CPC, aplicável por força do art.º 2º, al. e) do CPPT. Sem prescindir,

G. A sentença recorrida anulou a liquidação impugnada na parte atinente correções efetuadas no montante de € 16.676,12, por erro nos pressupostos, por considerar: que o n.º 8 do artigo 28.º do CIVA não é aplicável à isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, pelo que, em relação às exportações, mostra-se incorreto o afastamento da isenção com tal fundamento; que a não aceitação da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA com fundamento no disposto no n.º 8 do artigo 28.º não se mostra correta, porquanto esta norma legal estabelece uma imposição de comprovação através de “documentos alfandegários apropriados” e a Administração Tributária não invocou a falta de apresentação desses documentos, tendo efetuado a correção aos valores das transmissões intracomunitárias invocando tal norma e enquadrando na mesma a falta de registo dos adquirentes e de comprovação da saída dos bens do território nacional.

H. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto entende que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, por errada interpretação das alíneas q) e s) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA, bem como do art.º 28º n.º 8 do CIVA.

I. Relativamente às prestações de serviços de intermediação relacionadas com transmissões intracomunitárias, concretamente, as comissões cobradas ao cliente “vendedor”, decorre inequivocamente do Relatório de Inspeção Tributária que o que obstou à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA foi a falta de comprovação dos pressupostos desta isenção.

J. Em relação às comissões cobradas ao cliente “adquirente”, considerou-se que seriam operações não tributáveis nos termos do n.º 18º do art.º 6º do CIVA “quando o adquirente da prestação de serviços de intermediação seja um sujeito passivo registado, para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado, em outro Estado Membro e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição”.

K. Verificaram os serviços de Inspeção Tributária que o sujeito passivo, aqui impugnante/recorrida, debitou comissões ao “vendedor” e ao “adquirente” relativas a transmissões cujos adquirentes não se encontravam registados ou sem número de identificação fiscal (conforme decorre do anexo 1 e 2 do RIT).

L. Por outro lado, constataram que não existiam elementos comprovativos de que os bens saíram de Portugal para outro Estado Membro, pressuposto fundamental para que os serviços de intermediação relacionados com transmissões intracomunitárias pudessem beneficiar da isenção de IVA.

M. Ora, atenta a redação do art.º 28º n.º 8 do CIVA e o invocado no RIT sobre a falta de elementos comprovativos de que os bens saíram de Portugal para outro Estado Membro, entende a Fazenda Pública que não se afigurava necessária a menção específica à falta de “documentos alfandegários”, como parece decorrer da sentença.

N. É a própria al. q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA (e não o art.º 28º n.º 8 do CIVA) que prevê que só há isenção destas prestações de serviços se estiverem relacionadas com a expedição ou transporte de bens destinados a outros Estados membros, quando o adquirente dos serviços seja um sujeito passivo do imposto registado e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição.

O. Tendo as correções efetuadas sido sustentadas na falta de comprovação de todos os pressupostos da isenção previstos prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA, não podiam ser anuladas tais correções com o fundamento de que não foi feita menção, no RIT, à falta de apresentação de documentos alfandegários.

P. No que concerne às prestações de serviços de intermediação relacionadas com exportações, ao contrário do que refere a sentença recorrida, o afastamento da isenção não se fundamentou no n.º 8 do artigo 28.ºdo CIVA, mas sim na falta de comprovativos do pressuposto da isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.ºdo CIVA, nomeadamente de que aquelas prestações de serviços estão relacionadas com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade.

Q. Dispõe a alínea s) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA que são isentas do imposto “As prestações de serviços realizadas por intermediários que atuam em nome e por conta de outrem, quando intervenham em operações descritas no presente artigo ou em operações realizadas fora da Comunidade”.

R. Conforme se refere no RIT: “para que os serviços de intermediação possam beneficiar da isenção é necessário que estejam relacionados com exportações, ou seja, com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste” conforme o disposto no art.º 14º do Código do CIVA (…) Para que estas operações possam beneficiar da isenção do disposto na alínea s) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA, tem que haver comprovativo dos pressupostos da isenção (…)”

S. Ora, independentemente da menção ao n.º 8 do art.º 28º do CIVA, da leitura do RIT é patente que as correções decorrem da falta de comprovação de que aquelas prestações de serviço estão relacionadas com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade, pelo que, não existindo qualquer elemento de prova nesse sentido, não podiam ser anuladas apenas por se considerar que as correções foram efetuadas com base na falta dos documentos a que se refere o art.º 28º n.º 8 do CIVA.

T. Nestes termos, com ressalva do devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece, além de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do art. 125.º n.º 1 do CPPT e art. 615.º n.º 1 d) do CPC, aplicável por força do art. 2.º, al. e) do CPPT, de erro de julgamento de direito, pois não faz uma adequada interpretação das alíneas q) e s) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA, bem como do art. 28.º n.º 8 do CIVA.

Nestes termos e nos demais de direito, sempre com o mui Douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA.”

A Recorrida “A…………, Lda.” apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“(…)

1.ª - Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls._, dada em 3 de Novembro de 2019, que julgou a presente impugnação parcialmente procedente e, em consequência, anulou a liquidação em IVA, e correspondentes juros compensatórios, na parte relativa à correcção efectuada no montante de 16.633,25 € (7.999,53 € + 8.633,72 €), relativamente ao 4.º T de 2003.

2.ª - Este recurso foi interposto, pela Fazenda Pública, para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE, por requerimento de fls. _, com data de 15 de Novembro de 2018.

3.ª - Tal como requerido, foi o recurso admitido por despacho de fls. _, dado em 20 de Novembro de 2018.

4.ª - Na data em que as alegações da Recorrente foram entregues (11 de Dezembro de 2018), tinha-se operado, entretanto, o trânsito em julgado do despacho de admissão do recurso.

5.ª - É, por isso, extemporâneo o requerido pela Recorrente, na data em que apresentou as suas alegações (11 de Dezembro de 2018), no sentido de que a Mma. Juíza “a quo” considerasse o recurso dirigido ao SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, pedido que, não obstante se mostrar feito com louvável delicadeza, subverte, no entanto, com todo o à vontade, o rito processual.

6.ª - Admitido o presente recurso para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE (cfr. requerimento de fls._, apresentado em 15 de Novembro de 2018), só a este Tribunal Superior podiam ser submetidas as alegações da Recorrente para que ele viesse a conhecer do recurso.

7.ª - Não estando as alegações da Recorrente dirigidas para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE, não está já a Recorrente em tempo para lhas apresentar,

8.ª - pelo que deverá o presente recurso ser julgado deserto, nos termos do art. 282.º/4 do CPPT.

SEM PRESCINDIR

9.ª - A reclamação graciosa e a impugnação judicial sobre que incidiu a sentença recorrida, tiveram na sua origem uma acção inspectiva realizada pela AT, cujo objectivo foi analisar e concluir sobre a actuação da Impugnante/Recorrida enquanto sujeito passivo de IRC e de IVA, anos de 2003 e 2004.

10.ª - Essa inspecção foi realizada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto e decorreu entre 22-03-2006 e 11-10-2006.

11.ª - Dessa acção inspectiva resultaram correcções meramente aritméticas introduzidas à matéria tributável da ora Recorrida, quer em IRC, quer em IVA, anos de 2003 e 2004,

12.ª - tendo originado 10 (dez) liquidações adicionais – 2 (duas) em IRC (anos de 2003 e de 2004) e 8 (oito) em IVA (4 trimestres de 2003 e 4 trimestres de 2004).

13.ª - A ora Recorrida, inconformada com a forma como decorreu a sobredita acção inspectiva e com os resultados nela apurados, apresentou a defesa dos seus direitos, legitimamente protegidos, entre os anos de 2007 e 2008.

14.ª - Dos 10 (dez) processos de impugnação apresentados, está decidido, com trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 20-05-2015, o processo relativo ao IRC de 2004 (proc. n.º 1021/14, da 2.ª Secção).

15ª - Dos restantes 9 (nove) processos foram julgados em 1.ª Instância os seguintes 2 (dois) - o presente processo e o processo relativo ao IRC de 2003, julgado por sentença, de 6 de Junho de 2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, Unidade Orgânica 5, da qual interpôs recurso a Fazenda Pública.

16.ª - A Recorrida mantém na íntegra a sua petição inicial, as suas alegações escritas, e revê-se na prova testemunhal produzida e na perícia colegial realizada.

17.ª - Por sua vez, a Recorrente, indiferente às decisões entretanto proferidas, prossegue na senda dos recursos. Ainda são possíveis 7 (sete), no contencioso tributário. E, porventura, mais alguns, fora já do contencioso tributário.

18.ª - No presente recurso a Recorrente invoca dois argumentos para sustentar o consequente pedido de provimento: (i) a sentença é nula; (ii) o julgamento enferma de erro.

- Quanto à nulidade da sentença

19.ª - Essa (pretensa) nulidade decorreria, segundo a Recorrente, do facto de a sentença se ter pronunciado sobre uma questão de que não podia tomar conhecimento. Teria havido excesso de pronúncia por parte da sentença.

20.ª - O excesso de pronúncia residiria, então, na circunstância de a Impugnante/Recorrida não ter feito alusão, a propósito da isenção, à norma do art. 14.º/1-q) do CIVA.

21.ª - Só que a Impugnante/Recorrida tratou a matéria da isenção em causa, e não apenas incidentalmente ou de passagem: fê-la nos arts. 47.º e 48.º da petição inicial e fê-la também no exercício do direito de audição, no âmbito da reclamação graciosa, conforme se vê de fls. 51/52, especialmente dos n.ºs 14.º e 15.º, descrevendo repetidamente os factos que enquadram a previsão do referido art. 14.º/1-q) do CIVA.

22.ª - E é aqui, na descrição da realidade e na menção dos factos (E não na eventual falta de indicação expressa da norma em causa.), que reside o ónus de quem litiga no processo tributário, como expressivamente se diz no célebre brocardo “dabo mihi factus, dabo tibi jus”.

23.ª - Não pode nunca esquecer-se que, para além doutros princípios fundamentais caracterizadores do contencioso tributário, como o princípio da legalidade e o princípio da verdade material, o princípio aqui dominante é o princípio do inquisitório (Neste sentido, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, cit. supra, nota 7 de rodapé.), correctamente interpretado e aplicado na sentença sob recurso.

- Quanto ao erro de julgamento

24.ª - Contrariamente ao alegado pela Recorrente, o julgamento feito na sentença recorrida, quer quanto à identificação fiscal dos adquirentes, quer quanto à saída dos bens do território nacional não padece de qualquer insuficiência ou inexactidão.

25.ª - E nem a identificação feita mediante a indicação do número do grupo que integra empresas clientes da Recorrida deveria ser susceptível de provocar qualquer reparo, sabido como é que constitui um procedimento aceite nos vários Estados-Membros.

26.ª - Sem esquecer, porque estamos no domínio do IVA, o princípio da neutralidade fiscal.

27.ª - A comprovação da saída das mercadorias está feita em muitos dos documentos incorporados nos 2 (dois) volumes que constituem a perícia colegial realizada.

28.ª - É o próprio RIT que declara existir prova de que parte dos bens saíram do país e que quanto a outra parte não há prova inequívoca, não explicando nem a AT (no RIT), nem a Recorrente o que seja uma prova não inequívoca, pelo que não pode, obviamente, desconsiderar a isenção em causa.

29.ª - Inequívoca é a declaração produzida no Relatório Pericial e transcrita em 7.3. supra, pronunciando-se por que a correcção fixada pela AT em 16.676,12 € deva, por sua vez, ser corrigida para 6.559,28 €.

30.º - Em suma, a sentença sob recurso não enferma de excesso de pronúncia, pelo que lhe não é aplicável a norma do art. 125.º/1 - parte final do CPPT, nem, obviamente, a norma do art. 615.º/1-d), parte final do CPC; e também não enferma de erro de julgamento na interpretação que fez das normas do art. 14.º/1-q) e s) e 28.º/8, todas do CIVA, aplicando-as com justa observância dos princípios da legalidade tributária, do inquisitório e da verdade material.

31.ª - Julgando como julgou, a sentença sob recurso fez correcta interpretação da LEI e do DIREITO, não merecendo qualquer censura.

Nestes termos e nos mais, de Direito, aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado deserto, ou, quando assim se não entenda, deve ser negado provimento ao presente recurso e confirmada a sentença recorrida, para que se cumpra a LEI e se faça JUSTIÇA.”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em analisar a invocada nulidade da sentença por excesso de pronúncia bem como indagar da bondade da decisão recorrida que recorrida anulou a liquidação impugnada na parte atinente correcções efetuadas no montante de € 16.676,12, por erro nos pressupostos, por considerar: que o n.º 8 do artigo 28.ºdo CIVA não é aplicável à isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.ºdo CIVA, pelo que, em relação às exportações, mostra-se incorrecto o afastamento da isenção com tal fundamento; que a não aceitação da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA com fundamento no disposto no n.º 8 do artigo 28.º não se mostra correta, porquanto esta norma legal estabelece uma imposição de comprovação através de “documentos alfandegários apropriados” e a Administração Tributária não invocou a falta de apresentação desses documentos, tendo efetuado a correcção aos valores das transmissões intracomunitárias invocando tal norma e enquadrando na mesma a falta de registo dos adquirentes e de comprovação da saída dos bens do território nacional.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

A. Em 06.11.2006, foi emitido “Relatório de inspecção tributária” relativamente à sociedade impugnante com o seguinte teor – cfr. fls. 122 e ss. do processo físico:

“(…)

(…)
3) DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
(…)




















(…)


(…)

Não aplicável ao caso em concreto

(…)

B. O montante de € 16.676,12 foi calculado pela soma dos valores considerados pela impugnante isentos e constantes das facturas relativas ao 3.º trimestre de 2003 – cfr. anexo 1 ao relatório de inspecção.
C. Em nome da impugnante e com base do teor do relatório de inspecção que antecede, foi emitida a liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios respeitante ao 3.º trimestre de 2003, no valor de € 19.530,38 - cfr. doc. 2 junto com a p.i.
D. A actividade da impugnante consiste, fundamentalmente, na intermediação entre empresas confeccionadoras de têxteis e calçado e potenciais clientes - cfr. fls. 2 do relatório de inspecção.
E. Em 28.06.2007, a impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação impugnada – cfr. doc. 1 junto com a p.i.
F. Em 26.09.2007, a impugnante pronunciou-se sobre o projecto de indeferimento da reclamação no exercício do direito de audição através de requerimento com o seguinte teor - cfr. doc. 4 junto com a p.i.:










G. Em 17.10.2008, pelos serviços de inspecção tributária foi elaborada informação com o seguinte teor - cfr. fls. 32 e ss. do processo físico:







H. Em 05.11.2008, a reclamação apresentada foi indeferida com base no “Parecer” com o seguinte teor – cfr. doc. 1 junto com a p.i.:




Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos com relevância para a decisão da causa.

Motivação
A decisão da matéria de facto assentou na análise dos documentos constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, salientando-se a factualidade constante do relatório de inspecção e que o impugnante não pôs em causa, e no acordo das partes.
O relatório pericial constante dos autos não foi considerado por o mesmo incidir sobre factualidade que não se mostrou relevante para a decisão da causa considerando que, no que toca às correcções que foram objecto da perícia, está em causa saber se as mesmas resultaram de avaliação directa ou indirecta da matéria tributável, afigurando-se o mesmo inútil para o efeito.
A prova testemunhal produzida, de igual modo, também não foi considerada por ter tido por objecto factualidade que encontra sustentação na prova documental constante dos autos e que não se mostra controvertida, versando ainda sobre juízos conclusivos, por natureza irrelevantes para a decisão da causa.”

«»

3.2. DE DIREITO

Nas suas contra-alegações, a Recorrida aponta que este recurso foi interposto, pela Fazenda Pública, para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE, por requerimento de fls. _, com data de 15 de Novembro de 2018 e, tal como requerido, foi o recurso admitido por despacho de fls. _, dado em 20 de Novembro de 2018 e na data em que as alegações da Recorrente foram entregues (11 de Dezembro de 2018), tinha-se operado, entretanto, o trânsito em julgado do despacho de admissão do recurso, de modo que, é, por isso, extemporâneo o requerido pela Recorrente, na data em que apresentou as suas alegações (11 de Dezembro de 2018), no sentido de que a Mma. Juíza “a quo” considerasse o recurso dirigido ao SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, pedido que, não obstante se mostrar feito com louvável delicadeza, subverte, no entanto, com todo o à vontade, o rito processual, pois que, admitido o presente recurso para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE (cfr. requerimento de fls._, apresentado em 15 de Novembro de 2018), só a este Tribunal Superior podiam ser submetidas as alegações da Recorrente para que ele viesse a conhecer do recurso, pelo que, não estando as alegações da Recorrente dirigidas para o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE, não está já a Recorrente em tempo para lhas apresentar, o que significa que deverá o presente recurso ser julgado deserto, nos termos do art. 282.º/4 do CPPT.

Neste domínio, cumpre notar que, entretanto, em 11-02-2020, foi proferido despacho com o seguinte teor:

“…

Requerimento de fls. 1240 dos Autos:
No momento da apresentação das alegações de recurso oportunamente interposto, vem a Fazenda Pública requerer a correção do lapso consistente na errada indicação do Tribunal ad quem uma vez que pretendia interpor recurso não para o TCAN, mas sim para o STA.
Considerando a Recorrida nas suas contra-alegações que tal lapso determina a deserção do recurso interposto para o STA nos precisos termos em que o mesmo foi admitido uma vez que o mesmo transitou em julgado.
Sem, a nosso ver, razão.
O despacho de admissão de recurso cabe nas exceções contempladas no artigo 672º do CPC não se caracterizando pela imodificabilidade própria do caso julgado podendo ser modificado.
E no caso concreto tal nem se mostra necessário, quer pelo teor do despacho proferido, omisso quanto à decisão do Tribunal ad quem, quer pelo regime consagrado no artigo 280º do CPPT, que reparte a competência para a apreciação dos recursos entre os TCA e o STA consoante o objeto do mesmo verse ou não sobre matéria de facto respetivamente.
Ora mostrando-se admitido o recurso, caberia ao juiz titular, quando confrontado com o teor das alegações, e verificada uma eventual desconformidade entre a matéria do recurso e o tribunal inicialmente indicado pelo recorrente indagar da conformidade entre tal tribunal e o teor das alegações apresentadas, promovendo caso necessário a correção do pedido formulado.
O que se torna desnecessário, face ao lapso admitido pela Recorrente e ao teor das alegações que, para além da questão da nulidade por omissão de pronúncia, a abordar infra, versa exclusivamente matéria de direito da competência do STA.
Termos em que se admite a correção do lapso, conforme requerido.
Notifique. …”.

O referido despacho foi notificado às partes, não tendo sido posto em crise, de modo que, nada mais cumpre apreciar e decidir nesta sede, impondo-se prosseguir para o conhecimento do presente recurso.

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida a tarefa de indagar da nulidade da sentença por excesso de pronúncia.

Com efeito, nas suas alegações, a Recorrente refere que o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente presente a impugnação judicial no segmento relativo à anulação, por erro nos pressupostos, da liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios, relativa ao 3º trimestre de 2003, na parte atinente às correcções efetuadas no montante de € 16.676,12 e conforme decorre da petição inicial, no que a esta parte se refere, a impugnante apenas alega que as situações de isenção do art.º 14º n.º 1, al. s) e de não sujeição contemplada no artigo 6º n.º 18, ambos do CIVA, não pressupõem a comprovação referida no art.º 28º, n.º 8, do CIVA, não fazendo qualquer menção relativamente à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA, sendo que a impugnante apenas se insurge contra as correcções que resultaram da desconsideração da isenção prevista no art.º 14º n.º 1, al. s) e da não-sujeição contemplada no artigo 6º n.º 18, não fazendo qualquer reparo às correcções resultantes da desconsideração da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA.

No entanto, na sentença recorrida, o Tribunal a quo pronunciou-se relativamente à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art.º 14º do CIVA, determinando a anulação da correcção resultante da sua desconsideração pelos serviços de Inspecção Tributária, ou seja, o Tribunal a quo pronunciou-se sobre uma questão que, não sendo de conhecimento oficioso, não podia tomar conhecimento, considerando uma causa de pedir que não foi invocada, motivo pelo qual entende a Recorrente que a sentença recorrida enferma de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do art.º 125º n.º 1 do CPPT e art.º 615º n.º 1 d) do CPC, aplicável por força do art.º 2º, al. e) do CPPT.

Nesta matéria, diga-se que um dos princípios estruturantes do direito processual civil é o princípio do dispositivo, a que alude o artigo 264º do C. Proc. Civil e o art. 5º nº 1 do NCPC, segundo o qual “às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”.

Conforme este princípio, cabe às partes alegar os factos que integram o direito que pretendem ver salvaguardado, impondo-se ao juiz o dever de fundamentar a sua decisão nesses factos e de resolver todas as questões por aquelas suscitadas, não podendo, por regra, ocupar-se de outras questões.

Nos termos do artigo 668º nº 1 al. d) do C. Proc. Civil - 615º nº 1 al. d) do NCPC é nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo que resulta também do então art. 660º nº 2 (agora 608º nº 2 NCPC) do Código de Processo Civil que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e que não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Assim haverá nulidade por excesso de pronúncia quando o juiz conheça de excepções na exclusiva disponibilidade das partes (….), ou quando seja violado o princípio dispositivo na vertente relativa à conformação objectiva da instância, nomeadamente quando a sentença não observe os limites impostos pelo art. 661º nº 1 (actual art. 609º, nº 1 do NCPC), condenando ou absolvendo em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido (Neste sentido Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, 2ª edição, Coimbra Editora, vol. II, pag.670).

Como salienta o Cons. Jorge de Sousa no seu Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, vol. II, 6ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2011, anotação 5 ao art. 123º, págs. 318 e 319; e anotação 12 ao art. 125º, pág. 366, as «partes é que circunscrevem o thema decidendum, através do pedido e da defesa» e em «processos anulatórios, cada um dos vícios imputados ao acto impugnado constitui uma causa de pedir, como se conclui do preceituado na parte final do nº 4 do art. 498º do CPC, em que se estabelece nas acções de anulação a causa de pedir é “a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido”», não bastando que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado; é necessário, além disso que haja identidade entre a causa de pedir (causa petendi) e a causa de julgar (causa judicandi). «Por isso, se for pedida a anulação de um acto de liquidação com base em determinado vício gerador de mera anulabilidade (causa de pedir no processo de impugnação judicial), não pode o tribunal anular o acto impugnado com fundamento em vício diferente, não invocado»; ou seja, haverá também excesso de pronúncia «se o tribunal, apesar de se limitar a apreciar um pedido que foi formulado, exceder os seus poderes de cognição quanto à causa de pedir, violando a regra da identidade de causa de pedir e de causa de julgar, por exemplo, anulando um acto com base em vício não invocado» (.)

Como vem sublinhando a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo o que se proíbe, no referido art. 660º nº 2 (actual 608º nº 2 do NCPC) do C. Proc. Civil é que se conheça de “questões” não suscitadas. Mas não se deve confundir “questões” com “argumentos”, pois que quanto a argumentos o Tribunal não está limitado pelos invocados pelas partes, podendo utilizar os que entender, para apreciar questões que tenham sido suscitadas.

Ora, no caso em apreço, a sentença não se pronuncia sobre o IVA liquidado respeitante às isenções da alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA (transmissões intracomunitárias), pronuncia-se apenas sobre o montante do IVA liquidado pela AT na sequência do procedimento de inspecção tributária relativo às exportações, ou seja, às ilegalidades imputadas à “contabilização dos serviços de intermediação das transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste” e cuja isenção se encontra prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA. Um elemento que é facilmente comprovado, desde logo, atentando no valor inscrito no quadro 3.2.1.3. (repartição do IVA por Trimestres) que consta do relatório de inspecção tributária e que está transcrito na matéria de facto da sentença, sendo que a referência que na fundamentação da sentença recorrida se faz à alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA visa apenas sustentar a decisão tomada no sentido de que a exigibilidade do “documento alfandegário apropriado” se encontrava, no n.º 8 do artigo 28.º do CIVA, expressamente previsto para os casos da mencionada alínea q) (transmissão intracomunitária de bens), mas não para os casos da alínea s) (exportação), tal como vinha alegado na petição; razão pela qual a exigibilidade daquele requisito para o reconhecimento da isenção, tal como contava do RIT, determinava a anulação da liquidação, nesta parte.

Assim, a referência à al. q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA consubstancia um elemento de retórica na fundamentação da decisão (obiter dictum), apto a gerar confusão quando concluiu que também quanto à alínea q) se imporia a anulação da correcção da liquidação do IVA pelo sujeito passivo; mas ainda assim tal afirmação não consubstancia uma pronúncia judicial, na medida em que não é anulada a liquidação relativa a estes valores, de modo que, não tendo neste caso sido decidida pelo Tribunal recorrido qualquer questão que não tivesse sido suscitada, designadamente em relação à liquidação de montantes de IVA relativos à transmissão intracomunitária, improcede o alegado fundamento de nulidade da sentença por excesso de pronúncia.

Avançando, diga-se que sentença recorrida anulou a liquidação adicional de IVA relativo ao 3.º trimestre de 2003, na parte atinente às correcções efectuadas com o fundamento de não estarem verificados os pressupostos da isenção nas operações de exportação, no montante de € 16.676,12, tendo considerado que se verificava erro nos pressupostos jurídicos ao ser exigida a apresentação de um documento alfandegário apropriado ex vi do disposto no n.º 8 do artigo 28.º do CIVA (na redacção em vigor àquela data) para que o sujeito passivo pudesse beneficiar da isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, quando o referido n.º 8 do artigo 28.º do CIVA não fazia depender aquela isenção da apresentação do referido documento.

Pois bem, como resulta do probatório e dos autos a AT fundamentou as correcções aritméticas em causa nos seguintes termos:
-TRANSMISSÕES INTRACOMUNITÁRIAS
São requisitos da isenção:
- que os bens sejam expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional:
- que o adquirente se encontre registado, para efeitos de IVA, noutro Estado Membro, tenha indicado o NIF e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.
O sujeito passivo debitava comissões isentas de IVA ao “vendedor” e “adquirente” dos bens.
O vendedor situa-se no mercado nacional e o adquirente no Estado Membro.
A comissão cobrada ao “vendedor” poderia estar isenção ao abrigo do disposto no artigo 14.º/1/ q), através da comprovação dos pressupostos da isenção, nos termos do artigo 28.º/8 do CIVA.
A comissão cobrada ao “adquirente” seria uma operação não sujeita, nos termos do artigo 6.º/18 do CIVA, quando aquele seja um sujeito passivo registado para efeitos de IVA, em outro Estado Membro e utilize o respectivo NIF na aquisição.
O sujeito passivo debitou comissões ao “vendedor” e ao “adquirente” relativas a transmissões, cujos “adquirentes” não se encontram registados, bem como não têm NIF.
O sujeito passivo não tem elementos comprovativos de que os bens saíram de Portugal para outro Estado Membro para que os serviços de intermediação relacionados com transmissões intracomunitárias pudessem beneficiar de isenção de IVA.
EXPORTAÇÕES.
Para que os serviços de intermediação beneficiem de isenção é necessário que estejam relacionados com exportações, ou seja, com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste, conforme artigo 14.º do CIVA.
O Sujeito Passivo debitou comissões, tanto ao “vendedor” como ao cliente “adquirente”.
Para haver isenção, nos termos do artigo 14.º/1/ s) do CIVA, tem de haver comprovativo dos pressupostos da isenção, conforme artigo 28.º/8 do CIVA.
Além dos serviços de intermediação o SP também declarou “exportações”, mas não tem comprovativo de que os bens foram expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste, nomeadamente documentos alfandegários.

Nesta sequência, cumpre notar, tal como se aponta no recente Ac. deste Tribunal de 28-10-2020, Proc. nº 2567/08.6BEPRT, www.dgsi.pt, que o segmento da sentença posto em crise refere-se à parte da liquidação adicional do IVA do 3.º trimestre de 2003 na parte respeitante à isenção das exportações ao abrigo do disposto na alínea s) do n.º do artigo 14.º do CIVA, por, como sustenta a sentença recorrida “apenas a isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º está abrangida pela obrigação de comprovação a que se reporta o n.º 8 do artigo 28.º, norma esta que não se reporta à isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º e, nessa medida, não lhe é aplicável. Assim, quanto às exportações em causa, não há que aplicar a norma do n.º 8 do artigo 28.º, razão pela qual o afastamento da isenção com tal fundamento se mostra incorrecto, assim determinando a anulação da correcção efectuada”.
Ora, não é verdade que o fundamento da correcção tributária impugnada, vertido no Relatório de Inspecção Tributária, assente na falta de documento alfandegário apropriado (embora também alegue a sua inexistência) ou na violação do n.º 8 do artigo 28.º do CIVA (embora também alegue que a mesma se verifica), o fundamento da correcção é mais vasto e radica, como resulta do excerto que transcrevemos, da falta de prova de que os bens tenham efectivamente saído do território nacional, o que, na falta do referido documento, seria um ónus que o sujeito passivo que pretendia beneficiar daquela isenção teria de cumprir, uma vez que se trata de uma operação, em princípio, sujeita a tributação ex vi do artigo 6.º n,º 17 do CIVA (sendo que esta análise deslocada da decisão recorrida acompanha a forma como a ora Recorrida desenhou a lide neste domínio).
Dito de outro modo, o que resulta do RIT é que o sujeito passivo não fez prova dos pressupostos da isenção e, independentemente do modo como essa prova teria de produzir-se, cujos requisitos legais podem não ser os do n.º 8 do artigo 28.º do CIVA, o que se alega no RIT e não vem contestado em nenhum outro sítio pelo Impugnante, é que ela (a prova da saída dos bens) não foi efectuada por nenhum meio.
Assim, ainda que a invocação do n.º 8 do artigo 28.º do CIVA pudesse ser incorrecta, não poderia a sentença ter concluído pela verificação da ilegalidade do acto de liquidação adicional, uma vez que o Impugnante não realizou prova, por nenhuma via, da verificação dos pressupostos da isenção de que pretendia beneficiar.


4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida na parte impugnada, julgando improcedente a presente impugnação judicial relacionada com a liquidação adicional de IVA respeitante ao 3º trimestre de 2003 na parte relativa à correcção efectuada no montante de € 16.676,12.

Custas neste recurso pela Recorrida, sendo que, em primeira instância, as custas serão suportadas pela Impugnante e pela AT, na proporção do decaimento, que se fixa em 80% para a primeira e 20% para a segunda.

Notifique-se. D.N..






Lisboa, 18 de Novembro de 2020. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.