Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0162/16
Data do Acordão:04/20/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:OPOSIÇÃO
NULIDADE DE CITAÇÃO
FALTA DE REQUISITOS ESSENCIAIS DO TÍTULO EXECUTIVO
Sumário:Não ocorrendo falta de citação do responsável subsidiário, mas apenas estando em causa a falta de requisitos essenciais do título, tal nulidade deve ser arguida no prazo da oposição, sob pena de a arguição ser julgada extemporânea.
Nº Convencional:JSTA00069658
Nº do Documento:SA2201604200162
Data de Entrada:02/12/2016
Recorrente:A............
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART165 N1 N2 ART160 ART190 ART203 N1.
LGT98 ART22 N4.
CPC96 ART188.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório

1. A…………, identificado nos autos, vem interpor recurso da sentença do TAF de Leiria, que julgou improcedente a acção que intentou contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Santarém, que lhe indeferira o requerimento relativo a arguição de nulidade da citação.

2. Formulou as seguintes conclusões das suas alegações:
1ª — O Recorrente entende que não se está perante uma nulidade da citação, mas num vício de falta de citação, o que faculta àquele a arguição deste a todo o tempo até à decisão final e não no prazo previsto para a oposição;
2ª — Pois, com ela não foram incluídos os elementos respeitantes à incidência objetiva do imposto exigido, designadamente as matrículas das viaturas sobre que o mesmo incidiu;
3ª — A fim de possibilitar ao Recorrente, executado revertido, o seu direito de defesa;
4ª — Pelo que, faltando aqueles elementos que contendem com a natureza e proveniência da dívida, somente se pode concluir pelo vício da falta de citação, mesmo, como no caso dos autos, esta tenha sido parcialmente efetuada;
5ª — Por conseguinte, é evidente que o Recorrente não pôde tomar conhecimento do ato e tal omissão não lhe pode ser assacada;
6ª - E esta omissão constitui vício que prejudica a sua defesa.
Assim, o Mmo. juiz “a quo” fez incorreta aplicação do regime da nulidade da citação, aplicando as normas conjugadas dos arts. 198°, n° 2, do CPC e 203°, n° 1, do CPPT, quando deveria ter aplicado o disposto no art. 165°, n° 1, al. a) e 190°, n° 1, ambos deste último diploma, qualificando o invocado vício como falta de citação do executado revertido e, em consequência, ordenando a baixa dos autos a fim de a AT sanar o vício.
Termos em que, revogando Vs. Ex.as a sentença recorrida, substituindo-a por outra em que declare a nulidade insanável por falta de citação, ordenando que o ato seja repetido sem o apontado vício, farão a melhor JUSTIÇA.

3. Não houve contra-alegações.

4. O magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, de acordo com o parecer que se segue:
Insurge-se A………… contra a sentença do TAF de Leiria de 09.11.2015 que julgou improcedente a Reclamação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Santarém de 06.07.2015, absolvendo a Fazenda Pública do pedido.
Sustenta que o Mmº Juiz “a quo” fez incorrecta aplicação do regime da nulidade da citação, aplicando as normas conjugadas dos arts. 198.º, n.º 2 do CPC e 203.º do CPPT, quando deveria ter aplicado o disposto no art. 165°, n.º 1, al. a) e 190°, n.º 1, ambos do CPPT.
Mas não tem razão, salvo melhor entendimento.
A falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado, constitui uma nulidade insanável em processo de execução fiscal, nulidade essa que é de conhecimento oficioso e que pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final (art. 165°, n.º 1, al. a) e n.º 4 do CPPT).
Como esclarece Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª edição, vol III, pág. 136, “a falta de citação não ocorre apenas nos casos em que ela é omitida”. Ocorrerá também nas situações mencionadas no art. 195.° (agora art. 188°) do CPC, subsidiariamente aplicável ao processo de execução fiscal. Norma especial sobre a matéria é a do art. 190°, n.º 6 do CPPT onde se estabelece que “só ocorre falta de citação quando o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável”.
Ora, como se vê do probatório, nem o acto de citação foi, no caso, omitido nem ocorre qualquer das situações legalmente configuradas como constituindo falta de citação, geradora de nulidade insanável, nos termos do art. 165.º, n.º 1, al. a) do CPPT.
O que poderá existir, considerando o teor da p.i. e das Conclusões da Alegação de Recurso, é nulidade da citação, por inobservância das formalidades prescritas na lei, mormente os elementos essenciais da liquidação, incluindo a fundamentação, nos termos do art. 22.°, n.º 4 e art. 23°, n.º 4, ambos da LGT.
Só que a omissão desses elementos, como é jurisprudência deste Supremo Tribunal, não determina falta de citação determinando, quando muito, mera nulidade da citação, a arguir no prazo da oposição, ou seja, no prazo de 30 dias a contar da citação, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 191°, n.º 2 do CPC e 203°, n° 1 do CPPT (cfr., por todos, os doutos Acórdãos de 24.08.2005 e de 12-09-2012, in Rec. n.º 0934/05 e n.º 0884/12, respectivamente).
No caso vertente, como resulta dos factos provados, o Reclamante, ora Recorrente, excedeu o prazo para a arguição da nulidade da citação.
Nesta conformidade, negando-se provimento ao presente recurso, deverá ser mantida a sentença recorrida.
É o meu parecer.

5. Cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentos

De facto
A) Em 5/04/2013, foi instaurado em nome da sociedade B…………, Lda. no Serviço de Finanças de Santarém o processo de execução fiscal n° 2089201301035100, no valor de 986,45€, referente a uma dívida de IVA — cfr. fls. 13 dos Autos;
B) Em 10/04/2015, foi proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Santarém o despacho constante a fls. 84 dos Autos, e cujos termos se dão por integralmente reproduzidos, através do qual ordenou a reversão da dívida do processo n° 2089201301035100 e apensos contra o Reclamante no valor de 13.847,24€;
C) Em 10/04/2015, o Serviço de Finanças de Santarém remeteu para o Reclamante, por carta registada e com aviso de recepção, o instrumento constante a fls. 85 e 87 dos Autos, denominado de “Citação (Reversão)” cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, no qual consta o seguinte: «(…) Pelo presente fica citado(a) de que é executado por reversão, nos termos do art. 160° do Código de Procedimento e Processo Tributário (C.P.P.T), na qualidade de Responsável Subsidiário para no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, pagar a quantia exequenda de 13.847,24 EUR de que era devedor(a) o(a) executado(a) infra indicado(a), ficando ciente de que se o pagamento se verificar no prazo acima referido não lhe serão exigidos juros de mora nem custas. (…)»;
D) O “aviso de recepção” referido na alínea anterior foi assinado a 13/04/2015 — cfr. fls. 86 dos Autos;
E) Conjuntamente com o ofício referido em C), foi remetida a listagem constante a fls. 88 e 89 dos Autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, na qual consta a proveniência dos vários impostos em dívida, o período de tributação, data limite de pagamento, tributo e quantia em dívida;
F) Em 22/05/2015, no âmbito do PEF n° 2089201301035100 e apensos, o Reclamante apresentou junto do Serviço de Finanças de Santarém o instrumento constante a fls. 91 a 94 dos Autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, através do qual o Reclamante veio requerer a anulação de todo o processado em virtude da falta de citação;
G) Em 6/07/2015, o Chefe de Finanças de Santarém indeferiu o requerimento referido na alínea anterior — cfr. fls. 103 dos Autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
H) Em 7/07/2015, o Serviço de Finanças de Santarém remeteu para o Reclamante, por carta registada e com aviso de recepção, o instrumento constante a fls. 107 dos Autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, através do qual remete o despacho referido em G);
I) O “Aviso de Recepção” referido na alínea anterior foi assinado a 9/07/2015 — cfr. fls. 108 dos Autos;
J) A p.i. foi apresentada em 20/07/2015 junto do Serviço de Finanças de Santarém - cfr. fls. 2 dos Autos.

De direito
Perante a factualidade dada como provada o mº juiz “a quo” considerando não estar em causa falta de citação mas apenas a apreciação da sua eventual nulidade entendeu que tratando-se de nulidade da citação em processo de execução fiscal a sua arguição estava sujeita ao prazo legalmente fixado para a oposição.
E constatando que a arguição de tal nulidade fora extemporânea julgou improcedente a reclamação.
O recorrente insurge-se contra esta decisão e como se vê do teor das suas conclusões entende que o caso não é de nulidade de citação mas sim de falta de citação e que esta nulidade é invocável a todo o tempo até á decisão final
Entende que não tendo sido nela incluídos todos os elementos respeitantes à incidência objectiva do imposto exigido, designadamente as matrículas das viaturas por ele oneradas, ficou o mesmo impedido de conhecer o acto donde decorre a dívida, sendo que tal omissão de elementos prejudica a sua defesa.
Pelo que a sentença enferma de erro de direito por incorrecta aplicação do regime de nulidade da citação pois aplicou ao caso as normas dos artigos 198/2 do CPC e 203/1 do CPPT quando deveria ter aplicado as normas dos artigos 165/1 al. a) e 190 nº 1 do CPPT.
Vejamos
Sendo o processo de execução fiscal há que atentar às normas que este processo especificamente prevê para a nulidade de citação.
Prescreve o artigo 165 do CPPT:
Nulidades. Regime
1 - São nulidades insanáveis em processo de execução fiscal:
a) A falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado;
b) A falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental.
2 - As nulidades dos actos têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos.
3 - Se o respectivo representante tiver sido citado, a nulidade por falta de citação do inabilitado por prodigalidade só invalidará os actos posteriores à penhora.
4 - As nulidades mencionadas são de conhecimento oficioso e podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final.
Decorre dos nºs 1 e 2 do artigo citado que apenas duas situações constituem em processo de execução fiscal, nulidade insanável
Primeira: A falta de citação sendo que esta só relevará se tal falta prejudicar a defesa do interessado.
Segunda: A falta de requisitos essenciais do título mas esta omissão também só relevará no caso de não poder ser suprida documentalmente.
Relativamente à primeira da situação terá ocorrido falta de citação?
Entendeu o Mº juiz “a quo” que não ocorrera falta de citação porquanto tendo em consideração o disposto no artigo 188 do CPC e o teor do acto de citação constante do probatório se verificava que a citação continha todos os requisitos exigíveis pelo artigo 188 do CPC (anterior 195).
Vejamos:
Consta do probatório da sentença recorrida - e o recorrente não o põe em causa que o reclamante foi citado de acordo com o documento constante de fls. 85 e 87 dos autos, onde se refere: “Citação (Reversão)” cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, no qual consta o seguinte: « (…) Pelo presente fica citado(a) de que é executado por reversão, nos termos do art. 160° do Código de Procedimento e Processo Tributário (C.P.P.T), na qualidade de Responsável Subsidiário para no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, pagar a quantia exequenda de 13.847,24 EUR de que era devedor(a) o(a) executado(a) infra indicado(a), ficando ciente de que se o pagamento se verificar no prazo acima referido não lhe serão exigidos juros de mora nem custas.

Ora do teor deste documento é patente ter ocorrido o acto de citação, sem que tenha havido erro algum da identificação do citado ou uso indevido de citação edital sendo que o oponente não põe tal documento ou o acto em causa.
E sendo assim o reclamante não tem razão quando diz que ocorreu falta de citação.
Mas o recorrente entende que a citação é nula porquanto ela não vinha acompanhada de todos os elementos respeitantes à incidência objectiva do imposto exigido, designadamente as matrículas das viaturas por ele oneradas ficando por tal facto impedido de conhecer o acto donde decorre a dívida com prejuízo para a sua defesa.
Ao responsável subsidiário é dado o direito de reclamar ou impugnar a dívida que lhe é exigida nos termos do devedor principal.
Para tanto o artigo 22/4 da LGT estatui que a notificação ou citação que lhe for efectuada deve conter os elementos essenciais da liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais.
O artigo 190 do CPPT impõe ainda que a citação venha acompanhada do título executivo e da nota indicativa do prazo para oposição, pagamento em prestações ou dação em pagamento o que o reclamante não questiona.
De facto, só assim o responsável subsidiário ficará em condições de paridade como devedor originário de exercer correctamente a sua defesa e eleger o meio a utilizar.
Por isso a omissão desses elementos na citação do revertido poderiam acarretar a nulidade da citação, caso prejudicassem a sua defesa.
Todavia não ocorrendo falta de citação haveria que arguir tempestivamente esta nulidade sob pena de sanação da mesma.
Efectivamente nos termos do disposto no artigo 191/2 do CPC (anterior 198) aplicável subsidiariamente “ex vi” do disposto no artigo 2º al. e) do CPPT a arguição desta nulidade deveria ter sido efectuada no prazo da contestação.
Ora tendo a oposição a natureza de contestação em sede de processo de execução fiscal, o prazo de arguição era o consagrado no nº 1 do artigo 203 do CPPT ou seja, de 30 dias, a contar, no caso em apreço, da data da citação.
Não o tendo feito nesse prazo como ficou demonstrado na sentença recorrida a arguida nulidade por falta de elementos essenciais não podia ser conhecida e daí o indeferimento.
Decisão
Por todo o exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 20 de Abril de 2016. - Fonseca Carvalho (relator) - Isabel Marques da Silva - Pedro Delgado.