Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01855/11.9BELRS 037/16
Data do Acordão:07/03/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:SISA
JUROS COMPENSATÓRIOS
AQUISIÇÃO DE PREDIO PARA REVENDA
ISENÇÃO
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - A fundamentação mínima exigível da liquidação de juros compensatórios passa pela menção da quantia sobre a qual os mesmos incidem, do período de tempo considerado, e da taxa ou taxas aplicadas, sendo que essa menção tem de constar do próprio acto de liquidação, atenta a necessidade de a fundamentação ser contemporânea ou contextual e integrada no próprio acto
II - Nos termos dos artigos 11.º, n.º 3 e 16.º, n.º 1 do CIMSISSD, a isenção de imposto de SISA de que goza a aquisição de prédios para revenda caduca no caso dos mesmos não serem vendidos no prazo de três anos.
III - O prazo de caducidade do direito de liquidar, no caso do Imposto de Sisa, apenas se inicia a partir da verificação do não cumprimento da condição resolutiva de revenda no prazo de três anos.
Nº Convencional:JSTA000P24756
Nº do Documento:SA22019070301855/11
Data de Entrada:01/13/2016
Recorrente:A............, LDA.
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A…………, Ldª, com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente por não provada a impugnação por ela deduzida contra a liquidação de Imposto Municipal de Sisa e respectivos juros, no valor global de € 44.236,37.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1ª - O presente recurso é interposto da douta Sentença do Tribunal a quo, a qual julga improcedente a Impugnação Judicial apresentada pela ora Recorrente, relativamente à liquidação de IMT e respectivos juros, no valor global de 44.236,37€.
2ª - Na sua Impugnação Judicial, apresentada a 17/11/2011, pugnou a ora Recorrente, A…………, Lda. pela anulação da aludida liquidação emitida pelo Serviço de Finanças de Viseu, “base nos fundamentos de inexistência dos factos tributários subjacentes à liquidação, erro na determinação, qualificação e quantificação da matéria colectável por “correcções técnicas” vício de forma, preterição de formalidades legais, vício de violação da lei, ausência ou falta de fundamentação e outras irregularidades referidas nos arts. 99º do CPPT.”
3ª - A Recorrente permanece convicta de que existe vício ou falta de fundamentação na liquidação impugnada, pois, dessa mesma liquidação não se apura a taxa de cálculo dos juros compensatórios.
4ª - Tal situação conduz, como se sabe, à anulação da liquidação impugnada deste cálculo, por vício de fundamentação, com base no preceituado no art.77º da LGT.
5ª - Não restam dúvidas da falta de liquidação do tributo no prazo de caducidade, conforme determinava o nº 3 do art. 111º do CIMSISSD e actual nº 3 do art. 31º do CIMT, ou seja, nos 4 anos seguintes à ocorrência da obrigação tributária.
6ª - Nos termos do art.45º, nº 1 da LGT, o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos. Ora,
7ª - No caso em apreço, verificamos que o facto que originou a obrigação tributária - a Liquidação do IMT pela Escritura de Compra e Venda - ocorreu em 4 de Agosto de 2003, conforme consta do Relatório da Inspecção.
8ª - Tendo sido a ora Recorrente notificada da liquidação adicional em cálculo, mediante carta de 13 de Julho de 2011, conforme melhor resulta do referido no Anexo 1 da Impugnação e para o qual se remete.
9ª- Assim sendo, e por tudo o exposto, foi ultrapassado o prazo de 4 anos estipulado pelo art.45º da LGT, para a notificação da liquidação ao contribuinte, tal como estipulava o nº 3 do art. 111º do CIMSISSD.
10ª - Considerando que o prazo de caducidade se conta da mesma forma que o prazo para a prescrição (nesse sentido, cfr. art.45º, nº 4 e 483º, nº 1 da LGT), ou seja “a partir da data em que o facto tributário ocorreu”, ou seja, 4 de Agosto de 2003 e não a data de início das alegadas obras.
11ª- Temos, portanto, que o prazo de caducidade, no caso em apreço, começou a contar a partir do dia 4 de Agosto de 2003, conforme consta da escritura de compra e venda, data em que devia ser liquidada a ex-Sisa, uma vez que a impugnante deixou de beneficiar de isenção, por o prédio adquirido para revenda ter revestido destino diferente.
12ª- Nos termos das disposições legais supra descritas, a notificação da liquidação do tributo em causa, só poderia fazer-se até decorridos 4 anos contados da liquidação a corrigir, ou seja até 4 de Agosto de 2007.
13ª - Conclui-se, porém, que tal prazo foi ultrapassado, dado que na notificação remetida para a ora Recorrente, consta a data de 13 de Julho de 2011.
14ª - Termos em que se mostra forçoso concluir que o direito de liquidação do imposto, eventualmente em causa, já caducou por terem decorrido mais de 4 anos sobre a data do acto que originou a obrigação tributária.
15ª - Pelo que, existe vício de violação da lei ao n°3 do art. 111º do CIMSISSD e actual art.31º, n° 3 do CIMT, que remete para os arts.45° e 46° da LGT, o que conduz à anulação da liquidação impugnada.
16ª - No que tange às disposições legais da caducidade do direito à liquidação do IMT, previstas nos arts.45° e 35° da LGT, não podem existir dúvidas de que deverão ser as normas aplicáveis ao caso sub judice, atenta a data de ocorrência dos vários factos aqui relevantes para apuramento da obrigação tributária e subsequente caducidade da isenção dessa mesma obrigação, devendo ter sido Sentença a julgar procedente a Impugnação Judicial.
17ª - Por outro lado, a informação em que se suporta a liquidação refere que a caducidade da isenção ocorreu em 2003-09-12 e é referente à liquidação de Sisa.
18ª - Todavia, a nota justificativa remete para uma liquidação de IMT reportada a 05.08.2006, o que é contraditório e constitui vício de fundamentação, que conduz à anulação da liquidação impugnada.
19ª - Por último, verificando-se a ilegalidade do acto tributário da liquidação do IMT, referente ao caso, são os Juros Compensatórios também atingidos negativamente, por estarem com estes a sua ilegalidade conexionada.
20ª- E, a ser assim, o Tribunal a quo fez uma errónea interpretação da matéria de facto e, em consequência, uma errada aplicação das normas legais aplicáveis ao caso em concreto, não se conformando a Recorrente com a Sentença, mormente, na parte que defende como data de início da contagem do prazo de caducidade da isenção o início das obras e não a data da outorga da escritura pública.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Ministério Público a fls. 121 verso, emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
“Promovo que os autos sejam remetidos ao T.C.A. Sul para onde foi interposto o recurso e ainda por das conclusões de recurso ser possível descortinar discordância quanto à matéria de facto, nomeadamente, face ao que consta das 17ª e 18ª conclusões (fls. 100).”

4 – Notificadas as partes para se pronunciarem, querendo, sobre a suscitada questão da incompetência do STA, em razão da hierarquia, nada vieram dizer.

5 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

6 – O Tribunal Tributário de Lisboa deu como provada a seguinte matéria de facto:
1. No dia 4 de agosto de 2003 a Impugnante, A…………, L.da, adquiriu a B…………, S. A., pelo preço de €635.500, o prédio urbano, um lote de terreno para construção com a área de 640m2 designado “lote 20”, da zona 7 da ………, na freguesia e concelho de Odivelas, descrito na respetiva Conservatória do Registo Predial pela ficha 3720, inscrito na matriz predial urbana respetiva sob o art. 11.396°, com o valor patrimonial tributário de € 607.781,25.
2. Na celebração do negócio a Impugnante declarou destinar o bem à sua revenda e, em face dessa finalidade, celebrou-o sob isenção da sua tributação em sede de Imposto Municipal de Sisa, sendo o seu objeto social, que efetivamente vinha exercendo, [além da construção de edifícios, também] a compra e venda de imóveis.
3. Todavia, a Impugnante fez ali erguer um edifício, cuja construção iniciaria a 12 de setembro do próprio ano em que adquiriu o terreno, tendo concluído as obras a 3 de abril de 2006.
4. Tendo sido detetados esses factos numa ação inspetiva ao exercício de 2006 da Impugnante, foi então emitida uma nova ordem de serviço [de serviço 01201000147, de 22 de outubro de 2010] para uma nova ação inspetiva à Impugnante, interna e restrita à tributação sobre o património, a qual decorreu entre 2 de novembro de 2010 e 30 de novembro de 2010.
5. Nesta nova ação inspetiva foi comunicada à Impugnante a intenção de vir a elaborar liquidação de Imposto Municipal de Sisa, com base naqueles factos conjugados dos pontos 1.-3., por se entender que com eles houvera desvio da finalidade da aquisição/destinação do terreno, ao abrigo da qual ele beneficiara da isenção de tributação àquele título ao adquiri-lo, isenção essa que ali se lhe comunicou se considerava caducada com o início das referidas obras de construção no terreno, em 12 de setembro de 2003.
6. Mais se dizia ali que, a tributação a que havia lugar sobre aquele conjunto de facto em sede de Imposto Municipal de Sisa — sendo certo que a Impugnante não pedira a elaboração da liquidação, nomeadamente no prazo legal dos 30 dias que se seguiram ao início das obras, como no Código respetivo se estatui —, teria por base o preço do terreno convencionado, por superior ao valor patrimonial do bem, e à taxa vigente à data da aquisição para outros prédios urbanos, 6,5%, incluindo ainda o relatório um quadro demonstrativo da liquidação projetada, com todos esses elementos, de que resultava que o montante do Imposto Municipal de Sisa em causa era de €41.307,50, sob os parâmetros referidos e atentos os valores mencionados no ponto 1..
7. Notificada naquele âmbito, em dezembro de 2010, para se pronunciar e para dizer de sua justiça sobre o que lhe era exposto, a impugnante não exerceu essa faculdade.
8. Assim, essas conclusões, também contidas no relatório inspetivo de 21 de dezembro de 2010, viriam a ser aprovadas por despacho dessa mesma data, com notificação à Impugnante a 17 de janeiro de 2011, sendo ainda extraída certidão do relatório para no Serviço de Finanças de Odivelas, área de localização do terreno, ser elaborada a competente liquidação.
9. Essa notificação à Impugnante explicitava a sua função nos seguintes termos:
Título da notificação: «Correções de análise interna art. 77° da Lei Geral Tributária e do art. 62° do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributário […].
Texto da notificação: Fica […] notificado, [para efeito daquelas normas] […] das correções resultantes da ação de inspeção, cujo relatório se anexa como parte integrante da presente notificação […].
[…] A breve prazo, os Serviços da Direção-Geral dos impostos procederão à notificação da liquidação respetiva, a qual conterá os meios de defesa, bem como o prazo de pagamento, se a ele houver lugar.
Da presente notificação e respetiva fundamentação não cabe reclamação ou impugnação.»
10. No Serviço de Finanças de Odivelas veio então a ser elaborada à Impugnante a liquidação de Imposto Municipal de Sisa sobre a aquisição referida no ponto 1., seguindo os termos indicados no relatório inspetivo, supra-citado, e pelo seguinte modo, embora sob o título de “Liquidação de IMT [Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis] § Aquisição da propriedade plena sobre imóveis § Caducidade de Isenção de IMT — nº 1 do art. 16 do CIMSISSD [Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações]”:
a. valor patrimonial [mencionado lote de terreno] €607.781,25;
b. preço de aquisição [mencionado lote de terreno] €635.500:
c. [base de incidência do tributo. €635.500] x [taxa do tributo aplicável 6,5%] = €41.307,50;
d. juros compensatórios entre 5 de agosto de 2006 e 12 de maio de 2008 = €2.928,87
11. Nessa sequência foi então a liquidação notificada à Impugnante a 13 de julho de 2011, com a nota de demonstração da liquidação, por ofício com a epígrafe de «Assunto: caducidade da isenção de sisa — revenda», referindo o prazo de 30 dias para a Impugnante pagar a dívida de imposto pela liquidação, modo de o fazer e, bem assim, os prazos e meios de reclamação e de impugnação, antes disso referindo também que os juros compensatórios haviam sido «contados até à data da liquidação, nos termos do n° 3 do art. 35° da Lei Geral Tributária» e que a liquidação de referia à aquisição e ao prédio acima identificados, sendo mencionadas as atinentes normas do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, exclusivamente, seus arts. 141, 11º nº 3 e 16º nº 1 (isenção de Imposto Municipal de Sisa e sua caducidade).
12. No dia 19 de setembro de 2011 a Impugnante apresentou a petição na origem destes autos.
13. Entretanto, como não satisfez a liquidação referida nos pontos 9: no prazo de pagamento que lhe tinha sido assinalado, no dia 5 de setembro de 2011 foi dela extraída certidão para execução coerciva da dívida de imposto e juros ali determinada, a qual tomou o n° 4227201101169602, no mencionado Serviço de Finanças.

7. Da questão prévia suscitada pelo Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo
Importa antes do mais conhecer da questão levantada pelo Exmº Procurador Geral Adjunto no seu parecer o qual promove que os autos sejam remetidos ao T.C.A. Sul para onde foi interposto o recurso, sustentando ainda que, das conclusões 17ª e 18ª das alegações de recurso é possível descortinar discordância quanto à matéria de facto.
Como resulta dos autos – cf. fls. 96 - o recurso foi originariamente interposto para o Tribunal Central Administrativo Sul.
Por despacho de fls. 105 o Mº Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, considerando que nas alegações de recurso e nas respectivas conclusões a recorrente não pretendia a sindicância da matéria de facto e se insurgia apenas contra as soluções de direito em que assentou a decisão recorrida, ordenou a notificação daquela para vir aos autos esclarecer se mantinha a intenção de dirigir o recurso ao Tribunal Central Administrativo ou antes ao Supremo Tribunal Administrativo.
Por requerimento de fls. 113 veio a recorrente, ponderada a matéria sob sindicância, solicitar que o recurso fosse dirigido a este Supremo Tribunal Administrativo.
E de facto, porque, na verdade, as partes divergem apenas quanto à interpretação das regras jurídicas aplicáveis, não se vislumbrando que nas conclusões 17ª e 18ª das alegações a recorrente peça a alteração da matéria fáctica fixada na decisão recorrida ou invoque, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, também aqui se entende, na perspectiva considerada pelo Tribunal recorrido, que o recurso tem por exclusivo objecto matéria de direito (nº 1 do art. 280º do CPPT), sendo competente este Supremo Tribunal Administrativo.

Improcede pois a questão prévia suscitada pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto, daí que se imponha apreciar o objecto do recurso.

8. Do objecto do recurso
Da análise do segmento decisório da sentença e dos fundamentos invocados pela recorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que as questões objecto do presente recurso se reconduzem a saber:
1. Se ocorre a alegada falta de fundamentação a liquidação impugnada, por dessa liquidação não se apurar a fórmula de cálculo dos juros compensatórios e por ocorrer discrepância entre a informação em que se suporta a liquidação e o teor da respectiva notificação.
2. Se ocorre caducidade do direito à liquidação do tributo.

8.1 Do alegado vício de falta de fundamentação da liquidação impugnada no que respeita à fórmula de cálculo dos juros compensatórios.

Alega a recorrente, invocando o preceituado no art.77° da LGT, que permanece convicta de que existe vício ou falta de fundamentação na liquidação impugnada, pois, «dessa mesma liquidação não se apura a taxa de cálculo dos juros compensatórios».
No que toca a actos tributários de liquidação de juros compensatórios, o Supremo Tribunal Administrativo já deixou várias vezes explicitado que a fundamentação mínima exigível passa pela menção da quantia sobre a qual os mesmos incidem, do período de tempo considerado, e da taxa ou taxas aplicadas, sendo que essa menção tem de constar do próprio acto de liquidação, atenta a necessidade de a fundamentação ser contemporânea ou contextual e integrada no próprio acto (ainda que de forma remissiva para documento anexo) - cfr. os acórdãos de 21/4/2010, rec. nº 743/09; de 16/10/2010, rec. nº 830/10; de 30/11/2011, rec. nº 619/11; de 29/2/2012, rec. nº 928/11; de 14/2/2013, rec. nº 645/12; de 9/3/2016, rec. nº 805/15 e de 26.10.2016, recurso 1364/15.
No caso vertente, como resulta do probatório – ponto 11 - a recorrente foi notificada em 13 de Julho de 2011 da liquidação de juros compensatórios com nota de demonstração da liquidação.
Essa demonstração de liquidação dos juros compensatórios consta dos autos apensos a fls. 32 e da mesma se constata a indicação do capital sobre que incidem os juros (41 307,50 €) a data de início e de fim da contagem dos juros - 05.08.2006 e 12.05.2008 - respectivamente e a taxa considerada (4%) bem como o valor dos juros (2928,87 €).
Questão diversa, que não contende com a validade da fundamentação mas com eventual erro no cálculo dos juros, era a de saber se os mesmos deviam ser calculados a partir de 5 de Agosto de 2006, data relacionada com a acção inspectiva e com detecção da falta que motivou o retardamento da liquidação ou como se refere na decisão recorrida, a partir de 12 de Outubro de 2003, termo do prazo para o pedido de liquidação tardia omitido pela impugnante (artº 91º do CIMSISSD).
Trata-se no entanto de questão de que não cabe cuidar no presente recurso, porque não suscitada. Como quer que seja sempre se dirá, como bem se nota na decisão recorrida, que, em face do padrão legal citado, o termo inicial escolhido pelo serviço de finanças de Odivelas beneficiava largamente a recorrente.
Em suma a fundamentação que foi dada a conhecer ao contribuinte continha os elementos bastantes para que o mesmo tivesse informação sobre o valor do imposto em falta, e sobre o qual incidiam juros compensatórios, o período de tempo a que se reportam os juros, o valor dos mesmos e a taxa de juro aplicada.
Trata-se, pois, de parâmetros de fundamentação objectivos e claros, suficientes para responder às necessidades de esclarecimento do contribuinte e, por isso são facilmente sindicáveis.

Como se observa no supracitado Acórdão 743/09, «Essencial é que se não frustrem os fins últimos tidos em vista com a exigência de fundamentação: racionalidade da decisão e criação das condições materiais para o adequado exercício dos direitos de defesa por parte dos contribuintes, e não se crê que estes tenham sido frustrados pela forma como, no caso dos autos, o dever de fundamentação das liquidações de juros compensatórios foi cumprido.»
Perante o exposto não restam dúvidas de que a liquidação de juros compensatórios sindicada está devidamente fundamentada, tal como se julgou na sentença recorrida que neste ponto não merece censura.

8.2 Do alegado vício de falta de fundamentação da liquidação impugnada decorrente da discrepância entre a informação em que se suporta a liquidação e o teor da respectiva notificação.
Neste segmento do recurso a recorrente alega que a informação em que se suporta a liquidação refere que a caducidade da isenção ocorreu em 2003-09-12 e é referente à liquidação de Sisa e que todavia, a nota justificativa remete para uma liquidação de IMT reportada a 05.08.2006, o que é contraditório e, em sua tese, constitui vício de fundamentação, que conduz à anulação da liquidação impugnada.

Efectivamente resulta dos autos que com a notificação da liquidação foi junto um documento (documento nº 1 a fls. 6 dos autos), a que a recorrente se refere como nota justificativa, no qual, sob o título de “Liquidação de IMT [Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis] § Aquisição da propriedade plena sobre imóveis § Caducidade de Isenção de IMT — n° 1 do art. 16 do CIMSISSD [Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações]” se especificava: a. valor patrimonial [mencionado lote de terreno] €607.781,25; b. preço de aquisição [mencionado lote de terreno] €635.500: c. (base de incidência do tributo. €635.500] x [taxa do tributo aplicável 6,5%] = €41.307,50; d. juros compensatórios entre 5 de agosto de 2006 e 12 de maio de 2008 = €2.928,87

Porém já a notificação da liquidação especificava claramente «Assunto: caducidade da isenção de sisa — revenda», referindo o prazo de 30 dias para a Impugnante pagar a dívida de imposto pela liquidação, modo de o fazer e, bem assim, os prazos e meios de reclamação e de impugnação, antes disso referindo também que os juros compensatórios haviam sido «contados até à data da liquidação, nos termos do n° 3 do art. 35° da Lei Geral Tributária» e que a liquidação de referia à aquisição e ao prédio acima identificados, sendo mencionadas as atinentes normas do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, exclusivamente, seus arts. 141, 11° n° 3 e 16° n° 1 (isenção de Imposto Municipal de Sisa e sua caducidade).»
Sobre tal questão considerou-se na sentença recorrida os erros referidos pela impugnante na troca da menção de Imposto Municipal de Sisa, por Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis, se reconduzem a meros lapsos de escrita do Serviço de Finanças de Odivelas na comunicação de actos, os quais não constituem vício de fundamentação susceptível de conduzir à sua anulação da liquidação sindicada.
Também assim entendemos.
Para além da própria notificação da liquidação se referir expressamente à «caducidade da isenção de sisa — revenda» com referência e às atinentes normas do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, nomeadamente seus arts. 11° n° 3 e 16° n° 1, também o relatório dos serviço de fiscalização, notificado à impugnante no âmbito do direito de audição, se clarificava que estavam em causa actos de tributação em sede de Imposto Municipal de Sisa e ao abrigo do respectivo Código, com referência aos fundamentos de facto que suportam a tributação, a saber a aquisição do terreno sob isenção de tributação em Imposto Municipal de Sisa pela invocação da sua destinação a revenda, a alteração dessa finalidade, com a construção de um imóvel com início cerca de um mês depois, a omissão de comunicação dessa alteração à Administração Tributária, para que fosse liquidado o tributo, e bem assim, as normas jurídicas que suportavam a tributação elaborada.
Acresce que são coisas diferentes a fundamentação e a notificação do acto tributário.
A eventual irregularidade da notificação, decorrente da errada referência ao IMT na designada nota justificativa, não gera qualquer vício de forma do acto impugnado pois não respeita à validade do mesmo mas à sua eficácia. Tal notificação não constitui mais que um acto complementar que apenas assegura a plena eficácia do acto comunicando.
O que, aliás, está de acordo com a jurisprudência uniforme e reiterada deste Supremo Tribunal Administrativo em casos idênticos - cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos de 06.05.2015, recurso 291/13, de 29.10.2014, recurso 1381/12, de 18.09.2013, recurso 578/13, de 06.04.2011, recurso 037/11, de 03.05.2006, recurso 154/06 e de 26.09.2007, recurso 4/07, todos in www.dgsi.pt.
Improcede, pois, também este fundamento do recurso.

8.3 Da caducidade do direito à liquidação do tributo

No que concerne à caducidade do direito à liquidação do tributo a argumentação da recorrente baseia-se nas seguintes proposições:
- Nos termos do art.45°, n° 1 da LGT, o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos.
- No caso verifica-se falta de liquidação do tributo no prazo de caducidade, conforme determinava o nº 3 do art. 111º do CIMSISSD e actual n° 3 do art. 31° do CIMT, ou seja, nos 4 anos seguintes à ocorrência da obrigação tributária.

Esta argumentação não pode, porém, obter provimento.
Com efeito a recorrente invoca em abono da sua tese a norma do artº 111º, § 3º do CIMSISSD, regime legal que não tem aplicação no caso vertente por não estarmos perante uma liquidação adicional, mas sim perante uma liquidação originária.

A questão da caducidade do direito de liquidação no caso sub judice passa pela qualificação da liquidação sindicada, nomeadamente saber se trata ou não de uma liquidação adicional.

Com efeito nos termos do artº 92º do CIMSISSD poderá ser liquidado imposto municipal de sisa ou imposto sobre as sucessões e doações nos oito anos seguintes à transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito, sem prejuízo do disposto nos parágrafos seguintes e, quanto ao restante, no artigo 46º da Lei Geral Tributária.

Porém se se tratar de uma liquidação adicional resulta do artº 111º, § 3º do mesmo diploma legal que a notificação da liquidação só poderá fazer-se até decorridos quatro anos contados da liquidação a corrigir, excepto se for por omissão de bens à relação exigida no artigo 67.º, que então poderá ainda fazer-se posteriormente.
Ora a liquidação adicional não é mais do que a correcção de uma liquidação deficiente em consequência de erros ou omissões, que tanto podem ser da responsabilidade dos serviços como dos contribuintes.
O seu objectivo é apenas apurar a diferença de imposto de forma que ao contribuinte seja exigido, no total, importância igual à que resultaria de liquidação efectuada de uma só vez - cf., neste sentido, Francisco Pinto Fernandes e José Cardoso dos Santos, Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, edição da Imprensa Nacional, volume II, pag.992 e Acórdãos desta Secção de Contencioso Tributário de 18.05.2011, recurso 153/11 e de 14.09.2011, recurso 294/11.
No caso vertente a liquidação efectuada não é uma liquidação adicional já que a mesma não se destinou a corrigir uma liquidação anterior viciada por erro de facto ou de direito ou por omissões ou inexactidões praticadas nas declarações prestadas para efeitos de liquidação.
Com efeito a liquidação sindicada é uma primeira liquidação de Sisa porquanto na data da celebração da compra e venda do imóvel não foi efectuada qualquer liquidação desse imposto, por dela estar isenta a recorrente em face da invocação de que se se tratava de aquisição de prédio para revenda.
Assim, o direito à liquidação e cobrança só pôde ser exercido a partir da constatação do não cumprimento dos objectivos ou condições a que ficou subordinada a concessão de isenção (neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo – vide, entre outros, os Acórdãos de 22.09.2010, recurso 383/10, de 14.09.2011, recurso 294/11 e de 54/14 de 03.05.2017, os dois últimos no âmbito do IMT).
E, não se tratando de uma liquidação adicional, o prazo de caducidade do direito à liquidação de SISA é, nos termos do artº 92º do CIMSISSD, de oito anos contados da data de transmissão ou daquela em que a isenção ficou sem efeito.
Daí que, como bem se assinala na decisão recorrida, quando a Administração Tributária notificou a recorrente da liquidação impugnada que oficiosamente lhe elaborara, em 13 de Julho de 2011, o direito de liquidar ainda não tinha caducado, pois só caducaria a 12 de Setembro de 2011, quando se completariam os referidos oito anos sobre a exteriorização da alteração da destinação da aquisição do lote de terreno.

Pelo que fica dito improcede também este fundamento do recurso.

9. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente

Lisboa, 3 de Julho de 2019. – Pedro Delgado (relator) – Ascensão Lopes – Isabel Marques da Silva.