Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0996/06
Data do Acordão:09/25/2012
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL SINTRA-CASCAIS
RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS
PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PLANO DIRECTOR MUNICIPAL
DEVER DE INDEMNIZAR
DIREITO DE PARTICIPAÇÃO
Sumário:I - Com a revisão do POPNSC aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro, houve uma nova ordenação, uma nova regulamentação, uma nova classificação de utilização do solo, o que é inerente à política de ordenamento, sempre em busca das melhores soluções;
II - Essa revisão insere-se numa linha de continuidade na preocupação sobre a melhor maneira de garantir o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado;
III - A omissão nessa Resolução de normativo sobre indemnizações não reveste qualquer ilegalidade;
IV - Preenchidos os respectivos pressupostos, o dever de indemnização e correspectivo direito de indemnização resultam de lei;
V - O ordenamento do território através de diversos tipos de planos e da criação de reservas e parques naturais é um meio adequado para garantir o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado (art. 66.º da Constituição);
VI - As diversas tipologias e zonamentos estabelecidos com a revisão do POPNSC foram objecto da justificação, não havendo razão para duvidar que as restrições foram graduadas em função dos valores que se visa proteger, sem se vislumbrar que tenham ido além do mínimo necessário;
VII - O Regulamento aprovado pela Resolução n.º 1-A/2004 intentou o melhor equilíbrio entre os benefícios que se espera obter com o plano e seu regulamento e os custos, nomeadamente para interesses particulares, contendo, por isso, um regime transitório para titulares de certos direitos (artigo 43.º);
VIII - Atento que ascenderam a mais de cinco centenas os participantes na discussão pública, a resposta da entidades pública responsável às reclamações, observações, sugestões e pedidos de esclarecimento podia ser realizada no quadro do previsto no artigo 10.º, n.º 4, da Lei n.º 85/95, de 31/8.
Nº Convencional:JSTA00067800
Nº do Documento:SA1201209250996
Data de Entrada:12/06/2010
Recorrente:A..., S.A.
Recorrido 1:PRESIDÊNCIA DO CM
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:ACÇÃO ADM ESPECIAL
Objecto:PCM REGULAMENTO DO PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA CASCAIS
Decisão:IMPROCEDENTE
Área Temática 1:DIR URB - INSTR GESTÃO TERRITORIAL
Legislação Nacional:CPTA02 ART5 N1 ART90 N3 N4.
CONST76 ART2 ART66 N1 ART266 N2.
CPA91 ART3 ART5 ART6 ART7.
RPOPNSC ART11 ART12 ART13 ART14 ART15 ART43 N4.
POPNSC94.
RCM 96/97 DE 1997/06/19.
RCM 46/2000 DE 2000/06/05.
POPNSC04.
DL 33921 DE 1944/09/05 ART10 ART11.
DL 24802 DE 1934/12/21 ART1 ART8 ART12.
DL 292/81 DE 1981/10/15.
DRGU 8/94 DE 1994/03/11.
DL 19/93 DE 1993/01/23.
RCM 102/2002 DE 2002/07/05.
RCM 1-A/2004 DE 2004/01/08.
L 48/98 DE 1998/08/11 ART25 N2.
DL 380/99 DE 1999/09/22 ART95 N1 ART98 N2 ART143 N3 ART45 ART46 ART47.
DRGU 9/94 DE 1994/03/11 ART5.
DL 140/99 DE 1999/04/24 ART7.
DL 19/93 DE 1993/01/23.
RCM 142/97 DE 1997/08/28.
DL 226/97 DE 1997/08/27 ART3 ART4.
DL 380/99 DE 1999/09/22 ART48 N5.
L 83/95 DE 1995/08/31.
Legislação Comunitária:DIR CONS CEE 92/43/CEE.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC035723 DE 1999/11/16; AC STAPLENO PROC0873/03 DE 2007/03/06; AC STA PROC0762/05 DE 2006/03/14
Referência a Doutrina:OLIVEIRA ASCENSÃO O URBANISMO E O DIREITO DE PROPRIEDADE DIREITO DO URBANISMO INA 1989 PAG321.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1.
1.1. A……., S.A., com sede na Rua …, …, .... em Lisboa, apresenta impugnação da revisão do PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA-CASCAIS, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro.
Pede a declaração de ilegalidade das normas resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15.º do REGULAMENTO DO PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA-CASCAIS, com a Planta de Síntese 1D, ambos anexos àquela Resolução.
Cumula esse pedido com pedido de indemnização pelos danos resultantes da alegada ilegalidade.
Subsidiariamente, formula pedido de efectivação de responsabilidade civil por acto lícito.

1.2. Conforme se decidiu no despacho de fls. 1412, e de acordo com o artigo 5.º, n.º 1, do CPTA, a acção segue os termos da acção administrativa especial.

1.3. Ainda no cumprimento desse despacho, a Autora apresentou nova petição na qual passou a figurar como Ré a Presidência do Conselho de Ministros, em vez do Estado.
Indicou como contra-interessado o Instituto da Conservação da Natureza

1.4. A digna magistrada do Ministério Público emitiu parecer (fls. 2339 a 2351) pela improcedência da acção.
Notificado às partes, nada por elas foi dito.

1.5. Foi proferido despacho saneador, não se suscitando questões quanto à personalidade, capacidade, legitimidade e representação quer da Autora quer da Ré e do interessado ICN.
Nesse despacho e nos termos do artigo 90.º, n.º 3 e n.º 4, do CPTA diferiu-se a instrução respeitante aos pedidos de indemnização.

1.6. A Autora produziu alegações em que concluiu (faltando uma folha de paginação nas alegações e passando as conclusões da conclusão 2 para a conclusão 5, a Autora foi notificada para esclarecer, tendo indicado – fls. 2715 - que se tratou de mero lapso de paginação e de numeração):
«1. À data da aprovação do POPNSC de 2004, a Autora era titular do direito de urbanizar, com base nos seguintes títulos jurídicos:
a) Contrato de Urbanização celebrado com a Câmara Municipal de Cascais, em 14 de dezembro de 1922;
b) Novo Plano de Urbanização da Marinha, homologado por Despacho do Ministro das Obras Públicas, de 1 de julho de 1957;
c) Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha, com Despacho favorável do Subsecretário das Obras Públicas, de 15 de junho de 1967. e aprovado por Deliberação da Câmara Municipal de Cascais, de 31 de outubro de 1968 (esta Câmara Municipal viria a confirmar a vigência deste Plano, em 1992);
d) Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais, aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 9/94, de 11 de março;
e) Plano Diretor Municipal de Cascais, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/97, de 19 de junho;
f) Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sintra-Sado, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2003, de 13 de março.
2. O Contrato de Urbanização de 1922, estabeleceu as condições para a urbanização do prédio, bem como as condições a que ficaria vinculado o desenvolvimento dos loteamentos urbanos que concretizassem os planos de urbanização projetados.
[3. falta]
[4. falta]
5. Em 11 de junho de 1957, o Conselho Superior de Obras Públicas emitiu parecer favorável à aprovação do Novo Plano de Urbanização da Marinha e do Novo Plano de Urbanização da Zona da Guia, consolidando-se, assim, o direito de concretizar a urbanização da Marinha, já contratualizado em 1922, de acordo e em conformidade com o previsto nos planos apresentados.
6. Em 31 de outubro de 1968, a Câmara Municipal de Cascais “deliberou por unanimidade aprovar o Estudo do Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha nas condições postas na informação do Senhor Director-Geral dos Serviços de Urbanização”.
7. Até à aprovação do POPNSC de 2004, os direitos urbanísticos permaneceram inalterados, na medida em que nenhum diploma legal ou instrumento de ordenamento do território determinou ou pretendeu determinar a extinção dos mesmos.
8. Com a aprovação do POPNSC de 2004, e, em especial, das normas contidas nos artigos 11.º a 15.° do seu Regulamento, verificou-se a extinção (ilícita) dos direitos urbanísticos da Autora.
9. Com efeito, as normas que regulam o uso do solo da propriedade da Autora, resultantes da conjugação dos artigos 11.° a 15.° do Regulamento, com a Planta de Síntese 1D, do POPNSC de 2004 - aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de janeiro - são inválidas, uma vez que violam, de forma clamorosa, o princípio da proteção da confiança, o princípio da proporcionalidade e o princípio da participação dos interessados nas decisões administrativas urbanísticas que lhes dizem respeito.
10. Por um lado, as referidas normas do POPNSC de 2004 são inválidas por violarem o princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição e concretizado no artigo 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo, bem como o princípio da estabilidade dos planos com eficácia plurisubjetiva, contido no artigo 25.º, n.º 2, da Lei n.º 48/98, de 11 de agosto, na medida em que operaram uma rotura radical e surpreendente no ordenamento urbanístico aplicável à propriedade da Autora, cortando pela raiz o tipo de utilização do solo que se encontrava previsto há décadas e que foi e continua a ser o definido para a maioria das propriedades circundantes.
11. Rotura tão mais radical e surpreendente quanto se tem presente que:
a) Não lhe subjaz qualquer mudança nas características físicas, geológicas, morfológicas, paisagísticas ou ambientais do terreno Autora, que se mantiveram inalteradas desde a elaboração do POPNSC de 1994; e
b) Contraria a antiguidade (mais de 80 anos) do reconhecimento pelas autoridades públicas do direito subjetivo de aproveitamento urbanístico da Autora que, em face do Contrato de Urbanização de 1922, deve mesmo considerar-se um direito adquirido que se encontra definitivamente subjetivado na esfera jurídica desta.
12. Por outro lado, as referidas normas do POPNSC de 2004 são inválidas por violarem o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 266°, n.º 2, da Constituição e concretizado no artigo 5°, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo, não sendo normas adequadas, necessárias ou equilibradas (proporcionalidade em sentido estrito), na medida em que (i) partem de um erro manifesto sobres as características do terreno da Autora, (ii) criam um regime de proteção ambiental desnecessário em face dos valores ambientais realmente existentes e (iii) não ponderam - antes desconsiderando por completo - os direitos adquiridos da Autora.
13. Por fim, as referidas normas do POPNSC de 2004 são inválidas por violarem o princípio de participação dos interessados, consagrado no artigo 267.º, n.º 2, da Constituição, concretizado no artigo 7.º do Código do Procedimento Administrativo e, bem assim, nos artigo 5°, alínea f), e 21.° da Lei n.º 48/98, de 11 de agosto, e nos artigos 6.° e 48.°, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de setembro, na medida em que (i) incorporaram uma decisão administrativa anterior - Resolução do Conselho de Ministros n.º 142/97, de 28 de Agosto - sobre a qual a Autora não teve oportunidade de se pronunciar e (ii) não ponderaram as reclamações, observações e pedidos de esclarecimento formulados pela Autora, sem que tenha sido apresentada qualquer fundamentação para a mencionada falta ponderação.
Nestes termos, e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente ação ser julgada procedente e provada:
a) Declarando-se a nulidade das normas que determinam o uso do solo da propriedade da Autora, resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15. do Regulamento, com a Planta de Síntese 1D, do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais de 2004, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de janeiro, e condenando-se o Réu a pagar à Autora a quantia que vier a apurar-se em liquidação de sentença, correspondente aos prejuízos que aquelas disposições lhe causaram e que não serão removidos com a respetiva declaração de nulidade;
Não decidindo o Tribunal por esta declaração de nulidade,
b) Condenando-se o Réu Estado a pagar à Autora uma quantia que nunca será inferior ao mais baixo dos seguintes valores, correspondente aos danos que o POPNSC de 2004, objetivamente lhe causou:
i) 371.420.640,00 € (trezentos e setenta e um milhões, quatrocentos e vinte mil, seiscentos e quarenta euros);
ii) 308.873.136,00 € (trezentos e oito milhões, oitocentos e setenta e três mil, cento e trinta e seis euros);
iii) 349.004.640,00 € (trezentos e quarenta e nove milhões, quatro mil, seiscentos e quarenta euros);
iv) 374.305.440,00 € (trezentos e setenta e quatro milhões, trezentos e cinco mil, quatrocentos e quarenta euros)».

1.7. A Presidência do Conselho de Ministros, pelo Primeiro-Ministro, alegou em contrário, concluindo:
«1. O que está em causa é na presente ação é um direito à edificação e não o direito à propriedade, que nunca foi posto em causa;
2. Não integrando o jus aedificandi o núcleo do direito de propriedade também se não integra na proteção que a Constituição concede a esse direito quando lhe manda aplicar o regime dos direitos, liberdades e garantias;
3. Em nenhum momento o Estado Português, quando aprovou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro, violou o princípio da confiança dos particulares e da boa-fé da Administração Pública, pois foi movido, tão-somente e como, de resto, lhe cumpre, pela mais alta perceção do interesse geral que lhe cabe prosseguir, traduzida no dever de efetivação do direito ao ambiente, merecedor de tutela constitucional;
4. As normas do Decreto-Lei n.º 351/93 não são materialmente inconstitucionais em virtude da sua alegada retroatividade por afetarem os princípios do Estado de Direito democrático, da tutela da confiança, da igualdade, da proporcionalidade e por afetarem um direito fundamental de natureza análoga aos Direitos, Liberdades e Garantias e, tão pouco, o ato impugnado é nulo por configurar uma expropriação sem a correspondente indemnização;
5. A construção a que a A……, S.A. . se propunha levar a cabo implicaria, se concretizada, danos irreversíveis sobre o património ambiental do Parque Natural Sintra-Cascais;
6. A Autora, querendo beneficiar de um alegado direito a indemnização - que não se lhe reconhece - deveria ter invocado esse presuntivo direito antes de decorridos cinco anos sobre a entrada em vigor da Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro, que aprovou a revisão do POPNSC;
7. Mas, ainda que o referido prazo não tivesse expirado, a Autora em nenhum caso teria o direito a indemnização por não ser titular de uma licença de construção validamente emitida;
8. A Autora reconhece, na sua petição inicial, ter participado na discussão pública da revisão do POPNSC, pelo que é de todo incoerente vir agora alegar a violação do direito de participação nas decisões da Administração Pública;
9. Improcedendo todos os vícios alegados pela Autora, inexiste dever de indemnizar pela prática de ato ilícito;
10. Finalmente, o direito da Autora a uma possível indemnização por fato lícito caducou em momento anterior ao da propositura da presente ação e, ainda que assim não tivesse sido, o que não se concede, a caducidade das licenças de construção não preenche os requisitos legais então em vigor para o reconhecimento do direito à indemnização por fato lícito».

1.8. O contra interessado alegou, concluindo:
«I. À data da aprovação do POPNSC a A. não era titular de qualquer direito de urbanizar, o terreno do Cabo Raso;
II. As conclusões a que a A. chega sobre a alegada vontade das partes expressa no contrato de 1922 afiguram-se profunda e manifestamente incorretas, porquanto é absurdo interpretar a vontade das partes à luz de conceitos jurídicos que só surgiram na legislação portuguesa mais de quarenta anos depois, como é o caso das operações de loteamento urbano;
III. Esse contrato caducou, dele não podendo ser os efeitos jurídicos pretendidos pela A.;
IV. As alegadas “deliberações de aprovação dos Planos de Urbanização da Quinta da Marinha” não consolidaram na esfera jurídica da A. qualquer direito de urbanizar o terreno do Cabo Raso ou de nele poder erigir quaisquer edificações;
V. Desde logo porque tais planos não preenchiam os requisitos de validade e eficácia previstos na legislação aplicável em vigor à época, nomeadamente a aprovação da planta de síntese das respetivas disposições e a publicação no jornal oficial;
VI. Sem conceder, mesmo que se admitisse que tais planos tinham conferido à A. direitos de urbanização e construção no terreno do Cabo Raso, os mesmos sempre teriam caducado, primeiro com a Constituição de 1976, e depois com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 69/90, de 2 de Março;
VII. Não resulta do direito aplicável que a A. tivesse, à data de aprovação do POPNSC de 2004, qualquer direito urbanístico, ao contrário do que se arroga;
VIII. A aprovação do POPNSC não determinou, por isso, a extinção de quaisquer direitos urbanísticos da A.;
IX. As normas que a A. reputa aplicáveis ao seu terreno no Cabo Raso, resultantes da conjugação dos artigos 11.º e 15.º do regulamento com a planta de síntese 1D do POPNSC de 2004, não padecem de qualquer ilegalidade;
X. Tais normas não violam os princípios da proteção da confiança, da proporcionalidade e da participação dos interessados nas decisões administrativas urbanísticas que lhes dizem respeito;
XI. Para além de a A. não ter demonstrado ser titular de qualquer direito subjetivo a construir no seu terreno, resulta da lei e da experiência comum que os diversos instrumentos de gestão territorial, como os planos de áreas protegidas, são eminentemente mutáveis, fruto apreciação do interesse público que é feita pelas entidades competentes para a respetiva elaboração e aprovação;
XII. Enquanto podia ter realizado e concretizado materialmente projetos turísticos - pois, aparentemente, não teria dificuldades jurídicas administrativas sérias - a A. não o terá feito, à espera de melhores dias no mercado imobiliário;
XIII. Não existiu qualquer erro sobre os pressupostos de facto, nem qualquer desvio de poder no estabelecimento do regime de ordenamento previsto para a zona do Cabo Raso;
XIV. As medidas normativas do plano aplicadas ao alegado terreno sito em Cabo Raso respeitam o princípio da proporcionalidade nas as três vertentes, a saber
a. Adequação, através da previsão de vários zonamentos distintos a que correspondem regimes diferentes;
b. Necessidade, impondo a menor restrição possível dos interesses dos proprietários - tendo em conta que se está a regular uma área protegida - os quais já aí vão ponderados;
c. Proporcionalidade em sentido estrito, pois é bom de ver que a zona do Cabo Raso não se integra em nenhum aglomerado populacional, estando nitidamente fora de qualquer perímetro urbano e muito perto ou mesmo sobre a costa portuguesa, pelo que as restrições introduzidas na verdade não são tão grandes como parecem, dada a vinculação situacional do mesmo;
XV. Foram amplamente publicitadas e participadas pelos interessados as sessões de esclarecimento organizadas previamente à aprovação dos instrumentos jurídicos da Rede Natura 2000, num período de tempo que antecedeu em cerca de um ano a publicação dos sítios da lista nacional;
XVI. Improcede assim fatalmente a conclusão n.º 13 das doutas alegações da A.;
XVII. A A. não tem qualquer direito à indemnização que pede nos presentes autos, seja por facto lícito, seja por facto ilícito».

*
Cumpre apreciar e decidir.

2.

2.1. Considera-se o processo administrativo junto aos autos a fls. 2371.
Considera-se, ainda, a seguinte matéria, com base nos documentos, que se referem, juntos aos autos com a petição inicial:
1) Em 14 de Dezembro de 1922 foi celebrada, pelo notário privativo da Câmara Municipal de Cascais, a «Escritura de Transacção e Adjudicação à B…… Limitada Referente à Propriedade da Marinha e Exploração das C……», composta por escritura pública e respectiva transcrição dactilografada (doc. nº 1);
2) Em 11 de Junho de 1957, o Conselho Superior de Obras Públicas emitiu parecer sobre o «Novo plano de urbanização da Marinha» e «Novo plano de urbanização da Marinha – Zona da Guia», sobre o qual o Ministro das Obras Públicas despachou em 1 de Julho de 1957 (docs. nºs 2 e 3);
3) Em 20 de Setembro de 1961 operou-se a transformação da sociedade por quotas de responsabilidade limitada, designada por B……., Lda., em sociedade anónima de responsabilidade limitada, com a denominação de “D……, S.A.R.L”, (doc. nº 4);
4) Por escritura pública realizada em 19 de Novembro de 1976, a D……, cindiu-se em quatro novas sociedades anónimas de responsabilidade limitada, com as denominações de E……., S.A.R.L., F……, S.A.R.L., G……, S.A.R.L., e H……., S.A.R.L., (doc. nº 5);
5) De acordo com a escritura pública realizada em 19 de Novembro de 1976, «à sociedade G……, S.A.R.L., é atribuído e fica pertencendo um prédio rústico, denominado Zona C, formado pelas parcelas dois e três, resultantes da divisão da verba um, nos valores, respectivamente, de um milhão e quatrocentos mil escudos e de quarenta mil escudos, donde resulta o valor total de um milhão quatrocentos e quarenta mil escudos. Este prédio confronta, no seu todo, a norte com a Crismina, a poente e sul com a Estrada Marginal (desde Oitavos até à Ribeira da Crismina) e a nascente com a estrada que serve Oitavos e com o Mirante» (doc. n.º 5);
6) Em 26 de Fevereiro de 1992 a A. requereu à Câmara Municipal de Cascais a aprovação de um pedido de loteamento, que ficou registado com o n.º 1571/92-FV26-PUGF714/92 (doc. 6);
7) Esse requerimento foi indeferido por deliberação da Câmara Municipal, em 21 de Maio de 1992, com base num parecer da Divisão de Planeamento Urbanístico e Gestão Fundiária (PUGF) de 13 de Maio de 1992, (doc. n.º 6).
8) A Câmara Municipal de Cascais, por deliberação de 17 de Dezembro de 1992, revogou, por unanimidade, a deliberação de indeferimento proferida em 21 de Maio de 1992 (doc. nº 7);
9) A Comissão de Coordenação da Região de Lisboa e Vale do Tejo emitiu, em 19 de Fevereiro de 1993, um parecer sobre o processo de loteamento da Quinta da Marinha apresentado pela «G…….», sobre o qual veio a recair despacho do Director-Geral em 5 de Maio de 1993, (doc. n.º 8).
10) Por despacho conjunto do Ministro do Planeamento e Administração do Território, do Ministro da Agricultura e do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, de 25 de Janeiro de 1994, foi deferido o levantamento da proibição de loteamento, (doc. nº 9).
11) Esse despacho conjunto foi publicado em Diário da República, II Série, de 09/02/94;
12) Por despacho conjunto do Ministro do Planeamento e Administração do Território, do Ministro da Agricultura e do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, de 3 de Março de 1994, foi suspensa a eficácia do Despacho Conjunto de 25 de Janeiro de 1994 (doc n.º 10);
13) Esse despacho conjunto foi publicado em Diário da República, II Série, n.º 66, de 19/03/94;
14) A Autora, em sede de discussão pública, inserida no procedimento de revisão do POPNSC, apresentou uma Exposição (12 páginas) e um Parecer (54 páginas) designado por «Compatibilizar o Empreendimento Cabo Raso com a Proposta de Ordenamento do Parque Natural Sintra Cascais» (docs nºs 11 e 12 respectivamente).

2.2.1. Já se disse, no despacho saneador determinou-se, ao abrigo do disposto no artigo 90.º, n.º 3 e n.º 4, do CPTA, o diferimento da instrução respeitante aos pedidos de indemnização.
Assim, nesta fase, o julgamento reporta-se à apreciação do pedido de declaração de ilegalidade das normas resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15.º do REGULAMENTO DO PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA-CASCAIS, com a Planta de Síntese 1D, ambos anexos à Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro.

2.2.2. Será útil começar por recordar aqueles artigos:

«Artigo 11.º
Áreas de protecção
1 - A área abrangida pelo POPNSC integra as seguintes tipologias, ordenadas por ordem decrescente do nível de protecção das áreas onde se aplicam e cujos objectivos, actividades e restrições de uso se encontram previstos em secção própria:
a) Áreas de protecção total;
b) Áreas de protecção parcial:
i) Áreas de protecção parcial do tipo I;
ii) Áreas de protecção parcial do tipo II;
c) Áreas de protecção complementar:
i) Áreas de protecção complementar do tipo I;
ii) Áreas de protecção complementar do tipo II;
iii) Áreas de protecção complementar do tipo III.
2 - Nas áreas sujeitas aos níveis de protecção indicados no número anterior estão identificadas áreas de intervenção específica para o cumprimento dos objectivos referidos no artigo 25.º

SECÇÃO II
Zonamento
SUBSECÇÃO I
Áreas de protecção total
Artigo 12.º
Âmbito e objectivos
1 - As áreas de protecção total compreendem os espaços onde predominam sistemas e valores naturais e paisagísticos de reconhecido valor e interesse, incluindo formações geológicas, paisagísticas e ecológicas, com elevado grau de naturalidade, que assumem, no seu conjunto, um carácter de excepcionalidade, bem como elevada sensibilidade ecológica.
2 - As áreas de protecção total têm como objectivos:
a) Garantir a manutenção dos valores e processos naturais em estado tendencialmente imperturbável;
b) Preservar exemplos de excepcional valor e ecologicamente representativos num estado dinâmico e evolutivo;
c) Conservar jazidas de fósseis e minerais de importância excepcional.
3 - Nas áreas sujeitas a protecção total são prioritários os objectivos de conservação da natureza e da biodiversidade e incompatíveis com qualquer tipo de uso do solo, da água e do ar, com excepção das acções mencionadas no n.º 1 do artigo seguinte.
4 - Sempre que estas áreas não pertençam ao domínio público ou privado do Estado, deverá prioritariamente proceder-se a formas de contratualização com os proprietários ou, no caso de terrenos comuns, com os compartes, tendo em conta os objectivos de conservação da natureza.
5 - Em caso de perda, por alguma forma, dos valores que levaram à classificação máxima destas áreas, as mesmas não perdem a classificação que lhes foi atribuída.

Artigo 13.º
Disposições específicas
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 8.º, nas áreas de protecção total a presença humana só é permitida:
a) Por razões de investigação e divulgação científica;
b) Para monitorização ambiental e para a realização de acções de salvaguarda da área e dos interesses de conservação que levaram à sua classificação, a efectuar pelos órgãos do PNSC ou pelos proprietários e outros titulares de direitos reais destas áreas;
c) Em situações de risco ou calamidade.
2 - Para além do disposto no artigo 9.º, nos casos referidos nas alíneas a) e b) do número anterior, a presença humana está sujeita a parecer vinculativo da comissão directiva do Parque Natural, excepto quando se reporte aos proprietários destas áreas.

SUBSECÇÃO II
Áreas de protecção parcial
DIVISÃO I
Áreas de protecção parcial do tipo I
Artigo 14.º
Âmbito e objectivos
1 - As áreas de protecção parcial do tipo I compreendem os espaços que contêm valores excepcionais de moderada sensibilidade ecológica e valores naturais e paisagísticos com significado e importância relevantes do ponto de vista da conservação da natureza e ainda a área definida como Paisagem Cultural de Sintra, segundo a classificação no âmbito do Património Mundial pela UNESCO em 6 de Dezembro de 1995.
2 - As áreas de protecção parcial do tipo I constituem espaços com restrições à edificabilidade.
3 - Constituem objectivos prioritários das áreas de protecção parcial do tipo I a preservação e a valorização dos valores de natureza biológica, geológica e paisagística relevantes para a garantia da conservação da natureza e da biodiversidade.
4 - Nestas áreas são permitidas utilizações do solo e dos recursos hídricos compatíveis com a preservação dos recursos naturais, designadamente a manutenção de habitats e de determinadas espécies da fauna e da flora.
5 - Para a salvaguarda dos objectivos a que se refere o n.º 3 do presente artigo, podem ser celebrados contratos com os proprietários de terrenos privados.

Artigo 15.º
Disposições específicas
1 - Para além do disposto no artigo 8.º, nas áreas de protecção parcial do tipo I são ainda interditas as seguintes actividades:
a) A instalação de linhas de distribuição e transporte de energia eléctrica de alta ou média tensão e de linhas ou antenas de telecomunicações, aéreas e ou subterrâneas, com excepção das dirigidas à valorização paisagística e à prevenção e segurança das indispensáveis à salvaguarda do património histórico e cultural na zona nuclear da Paisagem Cultural de Sintra, e após parecer favorável da comissão directiva do PNSC;
b) A construção de barragens e pontos de água, excepto os destinados a protecção contra incêndios ou de regularização e controlo de cheias, e de infra-estruturas aeroportuárias, bem como de redes de pipelines para transporte de gás, combustíveis ou outros produtos, com excepção dos dirigidos à valorização paisagística e à prevenção e segurança e dos indispensáveis à salvaguarda do património histórico e cultural na zona nuclear da Paisagem Cultural de Sintra, e após parecer favorável da comissão directiva do PNSC;
c) A instalação de aproveitamentos eólicos;
d) A edificação e ampliação de construções, com excepção das construções de apoio às actividades florestais, agrícolas e pecuárias e da ampliação prevista no artigo 38.º;
e) A instalação ou ampliação de explorações agrícolas, pecuárias e silvo-pastoris em regime intensivo;
f) Qualquer alteração no relevo e a remoção da camada superficial de solo arável, com excepção das indispensáveis à salvaguarda do património histórico e cultural na zona nuclear da Paisagem Cultural de Sintra, e após parecer favorável da comissão directiva do PNSC;
g) A instalação de nitreiras fora de explorações agrícolas;
h) A realização de competições desportivas motorizadas praticadas em vias pavimentadas, exceptuando as existentes à data da entrada em vigor do POPNSC;
i) A instalação de estabelecimentos industriais isolados de qualquer natureza;
j) A ampliação de explorações para extracção de inertes, bem como a ampliação de acções de prospecção e pesquisa;
l) A instalação de explorações de recursos hidrogeológicos, nomeadamente de águas mineromedicinais e termais;
m) A instalação ou ampliação de parques de campismo e caravanismo, com excepção de locais de pernoita integrados em percursos aprovados pelo PNSC.
2 - Para além do disposto no artigo 9.º, nestas áreas encontram-se sujeitas a parecer da comissão directiva do Parque Natural as seguintes actividades, tendo em vista os objectivos de conservação da natureza:
a) A realização de obras de saneamento básico e de infra-estruturas rodoviárias e ferroviárias, independentemente da sua natureza;
b) A instalação ou ampliação de explorações agrícolas, pecuárias ou silvo-pastoris em regime não intensivo;
c) A alteração do coberto arbóreo ou arbustivo, incluindo vegetação ripícola, com excepção de situações de emergência, nomeadamente as decorrentes de protecção contra incêndios e até à entrada em vigor dos planos de gestão florestal;
d) A alteração da rede de drenagem natural, da qualidade das águas superficiais e subterrâneas e do respectivo caudal e a abertura de poços, furos e captações;
e) A alteração, recuperação ou reconstrução de edificações existentes;
f) Todas as operações de florestação, mesmo quando envolvam espécies indígenas, ficando dependentes da elaboração de planos de gestão florestal;
g) A realização de competições desportivas de qualquer natureza, com excepção das mencionadas na alínea h) do número anterior, as quais são interditas;
h) A instalação de campos de golfe;
i) A construção de apoios às actividades florestais, agrícolas e pecuárias, desde que cumpram os requisitos definidos no n.º 4 do presente artigo.
3 - Nestas áreas encontram-se também sujeitas a parecer do conselho consultivo do Parque Natural as seguintes actividades, tendo em vista os objectivos de conservação da natureza:
a) Acções de investigação científica, de salvaguarda ou de monitorização ambiental, incluindo o eventual maneio/manipulação de ecossistemas;
b) A alteração dos usos do solo ou da água, privilegiando-se a manutenção das formas de exploração actuais quando praticadas de forma tradicional e em equilíbrio com os objectivos de conservação da natureza;
c) Os repovoamentos piscícolas, mesmo com espécies autóctones;
d) A destruição da compartimentação existente de sebes, bem como de muros de pedra, e sua substituição por soluções não tradicionais;
e) A ampliação de explorações de recursos hidrogeológicos, nomeadamente de águas mineromedicinais.
4 - As construções de apoio às actividades florestais, agrícolas e pecuárias podem ser permitidas desde que não impliquem alterações significativas na morfologia natural do terreno ou no coberto vegetal, seja assegurada a sua adequada integração paisagística e sejam observados os seguintes condicionalismos:
a) A comprovação, por parte dos proprietários, de outros titulares de direitos reais ou de direitos de exploração sobre estas áreas, do exercício de actividade florestal, agrícola ou pecuária nos últimos cinco anos, através de declaração oficial de rendimentos ou, alternativamente, apresentação de certificado oficial de formação como profissional do sector reconhecido pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional;
b) A apresentação de memória descritiva do projecto de exploração e justificação da inexistência de alternativas para a localização das estruturas em construções preexistentes ou em área não abrangida por este regime de protecção ou de nível inferior;
c) A exploração, considerada no somatório das suas parcelas contíguas, deve ultrapassar a área da unidade de cultura aplicável, nos termos da legislação aplicável;
d) A fundamentação da viabilidade económica da exploração;
e) A superfície mínima da parcela de terreno para construção dos apoios é de 10000 m2;
f) Os apoios não podem, em qualquer caso, ultrapassar 250 m2 por exploração nem ultrapassar 4,5 m de cércea, em piso único.»

2.2.3. A causa de pedir da presente acção é uma causa de pedir complexa. Podem destacar-se dela, entre o mais, as seguintes invocações da Autora na sua petição inicial:
− Que é proprietária e legítima possuidora do prédio rústico com área total de 270 hectares, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha n.º 05390, e que se situa na parte mais ocidental da Quinta da Marinha, em Cascais (artigo 5.);
− Que o «novo Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais viola direitos adquiridos da A……,S.A. de aproveitamento urbanístico do seu Terreno» (artigo 187. a));
− Que «À data da aprovação do POPNSC, a A……., SA era titular do direito de urbanizar o seu Terreno, com base nos seguintes títulos jurídicos que constituem contratos ou actos administrativos constitutivos de direitos, válidos e eficazes:
a) Contrato de urbanização celebrado com a Câmara Municipal de Cascais, em 14 de Dezembro de 1922;
b) “Novo Plano de Urbanização da Marinha”, homologado por despacho do Ministro das Obras Públicas, de 1 de Julho de 1957;
c) “Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha”, com despacho favorável do Subsecretário das Obras Públicas, de 15 de Junho de 1967, e aprovado por Deliberação da Câmara Municipal de Cascais de 31 de Outubro de 1968 (esta Câmara Municipal viria a confirmar a vigência deste Plano, em 1992);
d) “Plano de Ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais”, aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 9/94, de 11 de Março.
e) “Plano Director Municipal de Cascais”, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/97, de 19 de Junho.
f) “Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sintra-Sado”, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2003, de 13 de Março.» (artigo 189.);
− Que «Após uma análise exaustiva da evolução da posição jurídica da A…….., SA, verificamos, de forma inequívoca, que esta é titular de um verdadeiro direito subjectivo a construir no seu Terreno» (artigo 299.);
− Que «Este direito de construir foi sucessivamente reconhecido pela Administração, através de actos jurídico-públicos conformes com a legislação à época vigente:
a) O Contrato de urbanização de 1922;
b) O Plano de Urbanização da Marinha de 1957;
c) O Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha de 1968 (cuja vigência foi confirmada pela Câmara Municipal de Cascais em 1992);
d) O POPNSC de 1994;
e) O PDM de Cascais de 1997;
f) O POOCSintra-Sado de 2003» (artigo 300.);
− Que «a A……. é titular de um verdadeiro e próprio direito a construir no seu Terreno» (artigo 309);
− Que «O desrespeito de um direito adquirido por parte da Administração constitui a forma mais intensa e grosseira de violação do princípio constitucional da protecção da confiança» (artigo 318.)

Essa linha de invocação mantém-na a Autora nas suas alegações, com síntese, designadamente, nas conclusões 1. a 9.

2.2.4. Como ressalta do que acabou de se destacar, a Autora baseia-se primariamente no facto de ser detentora de título jurídico que lhe confere o direito de construir no seu Terreno, de título que lhe confere o direito de urbanizar o seu Terreno.
Segundo alega, esse título jurídico foi obtido, inicialmente, em 14 de Dezembro de 1922, pela celebração, por escritura pública, de um contrato, entre a Câmara Municipal de Cascais e a B……., Lda. (antecessora mediata da Autora), o qual veio a ser sucessivamente reconhecido por outras actuações administrativas, que advoga serem válidas e eficazes.
E sustenta que o POPNSC, de 2004, «veio eliminar, pela primeira vez desde 1922, toda e qualquer possibilidade de aproveitamento urbanístico da propriedade da A……, S.A.» (artigo 85.º).
A Autora considera-se prejudicada por esse Plano na medida em que ele, interferindo com os direitos de que é titular, a impede agora de os exercer.

2.2.5. Ocorre que o Regulamento do POPNSC, no artigo 43.º, com a epígrafe, «Regime transitório», estabelece o seguinte:
«1 – (…).
2 – (…):
a) (…);
b) (…);
c) (…).
3 – (…).
4 – Mantêm-se sujeitos às regras que lhe eram aplicáveis à data da entrada em vigor do presente Plano:
a) As parcelas de terreno objecto de licenças ou alvarás de loteamento válidos e eficazes;
b) Os empreendimentos turísticos que disponham de estudo de localização, informação prévia, anteprojecto ou projecto válido e eficaz;
c) Os empreendimentos turísticos que tenham sido objecto de aprovação ou de parecer favorável das entidades competentes do sector do turismo e que sejam consideradas estruturantes, designadamente em virtude da sua qualidade de exploração turística e do seu impacte positivo no desenvolvimento económico da região de implantação e na protecção da sustentabilidade dos respectivos valores naturais, paisagísticos e culturais, pelo ministro do turismo e pela câmara municipal competente.
5 – (…).
6 – (…).
7 – (…).»

Ora, a ser verdade que os títulos jurídicos que a Autora alega deter são válidos e eficazes para exercer o seu direito de urbanizar, os artigos 11º a 15º do Regulamento, com a Planta de Síntese 1D, aprovado pela RCM n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro, não são susceptíveis de se lhe aplicar, na medida em que, sendo aqueles anteriores à publicação deste Regulamento, se estará, então, no âmbito das excepções contidas nas supra transcritas alíneas do artigo 43.º, n.º 4, do Regulamento.

Com efeito, nessas excepções tem de se considerar incluída a «titularidade de um verdadeiro direito subjectivo a construir no seu Terreno» (expressão do art. 299.º da PI), independentemente da designação atribuída aos respectivos títulos, decorrente da legislação em vigor na época.
Deste modo, a ser verdade o que a Autora alega quanto aos seus títulos, nenhum prejuízo lhe poderia advir do POPNSC, no âmbito do que traz ao processo.
Posta perante essa circunstância, pelo despacho do Relator de fls. 2376, a Autora veio observar que o artigo 43.º do Regulamento «não salvaguarda todas as situações jurídicas constitutivas de direitos a construir nos terrenos abrangidos pelo POPNSC de 2004, mas apenas aquelas em que à data da entrada em vigor do Plano pré-existiam: (i) "licenças ou alvarás de loteamento válidos e eficazes"; (ii) atos prévios ("estudo de localização, informação prévia, anteprojeto ou projeto", "parecer favorável") relativos a "empreendimentos turísticos"/ 3. Assim, é desde logo evidente que a norma não salvaguarda os direitos a construir decorrentes de atos prévios praticados em processos de loteamento que não se destinam a "empreendimentos turísticos", bem como de muitos outros títulos que a A. invoca na p.i ../ 4. É justamente esta a questão central que a A. colocou a este Supremo Tribunal, com a presente ação: / Apesar de ser titular de um direito subjetivo a construir no seu terreno, com base nos inúmeros títulos alegados na p.i, a A. assistiu à supressão radical desse direito pelo POPNSC de 2004, sem que o mesmo tivesse sido minimamente salvaguardado pelo "regime transitório" constante do artigo 43° do Regulamento do POPNSC de 2004» (requerimento de fls. 2384).
A Autora reconhece, pois, que não dispõe de títulos capazes de integrar o regime transitório e de salvaguarda do artigo 43.º do Regulamento.

Apesar desse reconhecimento, vejamos, em qualquer caso, os títulos que são arvorados pela Autora.

2.2.6.A) Em 14 de Dezembro de 1922 foi celebrada, pelo notário privativo da Câmara Municipal de Cascais, a «Escritura de Transacção e Adjudicação à B……. Referente à Propriedade da Marinha e Exploração das C…….», composta por escritura pública e respectiva transcrição dactilografada (doc. nº 1);

Segundo a Autora (artigo 7.º, b) da petição inicial), «A Câmara Municipal de Cascais concedeu à B……. o “exclusivo de urbanização “ da Quinta da Marinha (cláusula 10ª), compreendendo aqui a execução de “obras de turismo” (clausula 9ª) e urbanização, obras que deveriam ser executadas nos termos dos regulamentos e posturas aplicáveis ao “estabelecimento de bairros novos” (cláusula 11ª), de acordo com um “ante-projecto de urbanização dos seus terrenos” a apresentar pela Sociedade (cláusula 14ª).
Sustenta a autora que a CMC assumiu a «“obrigação principal de garantir o direito de urbanização da Marinha”», além de outras obrigações e vínculos acessórios. (p. ex., artigo 191 da petição)“.

Ocorre que, nos próprios termos do clausulado, não há aprovação de qualquer projecto, não há licenciamento de qualquer construção.
A cláusula «décima quarta» é nisso muito explícita:
«A Sociedade fica obrigada a dentro de seis meses a contar da data desta escritura apresentar à Câmara o ante-projecto de urbanização dos seus terrenos, para esta, ouvida a sua Comissão de Estética ou entidade que a substituta os apreciar e aprovar desde que esse anteprojecto obtenha a maioria da Comissão ou entidade que a substitua. Os projectos definitivos serão apresentados à medida das realizações.
Parágrafo único – os anteprojectos e os projectos definitivos apresentados à sanção da Câmara deverão ser por esta deliberados no prazo máximo de 30 dias da sua apresentação.»

Verifica-se, desde logo, a exigência de apresentação de ante projecto em seis meses e, depois, que este seja aprovado pela comissão de Estética. E ainda, depois, a necessidade de sanção da Câmara.
Ora, não há qualquer dado sobre a aprovação da Comissão e claro sobre a sanção da Câmara.
E não está em causa, no presente processo, qualquer incumprimento por parte da Câmara das obrigações a que se vinculou.
Em qualquer caso, se não houve anteprojecto, se não houve aprovação, ou projectos definitivos aprovados, não há sequer a possibilidade de descortinar direito de edificação concreto, superior ao que possa resultar do direito de propriedade, se dele resultar.
A autora vem a retomar a questão da aprovação no que alega quanto ao Plano de Urbanização da Marinha, que se verá a seguir.
Mas que não há aprovação em todo esse intervalo é o que se tem de afirmar perante a falta de qualquer dado que o revele.

2.2.6.B) Plano de Urbanização da Marinha de 1957
Está documentado que em 11 de Junho de 1957, o Conselho Superior de Obras Públicas emitiu parecer sobre o «Novo plano de urbanização da Marinha» e «Novo plano de urbanização da Marinha - Zona da Guia», sobre o qual o Ministro das Obras Públicas despachou em 1 de Julho de 1957 (docs. nºs 2 e 3).

Alega a Autora que «Em execução do contrato celebrado em 1922, que previa que o direito de “urbanização da Marinha” seria concretizado em harmonia com um “anteprojecto de urbanização dos seus terrenos”, a B…….. (antecessora mediata da A…….) sujeitou a aprovação um “Novo plano de Urbanização da Marinha”, abrangendo a área onde se situa o Terreno da A……, S.A., acompanhado de um “Novo plano de urbanização da Marinha — Zona da Guia”, sobre os quais a Câmara Municipal de Cascais solicitou a aprovação do Ministério das Obras Públicas por ofício de 28 de Maio de 1956, acompanhado do parecer elaborado pela Comissão designada por essa Câmara, em 11 de Maio do mesmo ano» (artigo 206.º da petição inicial).

Verifica-se que pretende uma ligação sem interrupção entre um anteprojecto a ter que ser apresentado até meados de 1923, para um plano apresentado 34 anos depois. Não se colhem elementos para essa ligação.
No caso concreto, o Conselho Superior das Obras Públicas foi chamado a pronunciar-se sobre dois planos da Autora: o Novo plano de Urbanização da Marinha e o Novo plano de urbanização da Marinha – Zona da Guia, tendo referido a dado passo do seu parecer, ainda em «I – Considerações gerais», o seguinte:
“O trabalho em consulta, mandado elaborar pela B……, Ldª, embora pelo título se possa deduzir que diz respeito apenas à urbanização de um vasto prédio rústico pertença da Sociedade, situado no concelho de Cascais, denominado “Marinha”, interessa também a outro prédio, contíguo, menos extenso, conhecido por “Cresmina” de que a mesma Sociedade é concessionária.
Nota-se desde já que o plano abrange também vastos terrenos que não pertencem à Sociedade ou à referida concessão” (em pág. 32 do parecer).
Mais adiante, já no sector «II – Plano geral da Marinha» chama-se à colação o parecer da Comissão de Revisão, que acompanhou este pedido de parecer, o qual chamou a atenção para o facto de a área em questão estar situada no extremo ocidental da região da Costa do Sol e de esta ter de ser integrada no Plano Regional de Lisboa, concluindo:
“Nestas condições, enquanto este plano regional não estiver elaborado e aprovado, ao Conselho, tal como sucede à Comissão de Revisão, não se afigura avisado dar ao plano geral proposto para a urbanização da Marinha se não uma aprovação sob expressa reserva de que ele fica sujeito a nele serem introduzidas todas e quaisquer alterações ou modificações, julgadas necessárias ou convenientes, resultantes da oportuna aprovação do Plano Regional de Lisboa» (em pág. 37).
Já no sector «III- Plano parcial da zona da Guia» pronunciou-se favoravelmente, embora condicionando a proposta à resolução de questões técnicas.
A proposta do Conselho Superior das Obras Públicas sofreu despacho ministerial de 1 de Julho de 1957:
«Homologo, acrescentando que a execução do plano de urbanização deverá ser precedida de acordo a estabelecer entre a C.M. de Cascais e os proprietários interessados pelo plano geral para garantia da realização integral desta e para definição das condições de execução do plano parcial, tendo em vista a defesa da posição financeira da Câmara no empreendimento e o cumprimento das recomendações de ordem técnica formuladas no corpo do parecer.
A DGSU deverá pedir à DGTT o mais cedo possível estabeleça os condicionamentos a respeitar eventualmente na urbanização planeada para atender às exigências futuras do caminho de ferro.
Semelhantemente procederá junto da DGAC em relação ao aeródromo» (documento nº 3).

Verifica-se, além da directa homologação de parecer opinando no sentido de só poder haver aprovação sob reserva expressa, o condicionamento, ainda, na execução, pela necessidade de um acordo prévio e da definição das condições de execução.
E mais uma vez não se descortina qualquer despacho a conceder, permitir, autorizar qualquer construção, qualquer edificação pela autora.
Do que se trata é de plano.

Alega a Autora «que o primeiro diploma legal sobre planos de urbanização, o Decreto-Lei n.º 33921, de 5 de Setembro, prevê a obrigação de as Câmaras elaborarem planos de urbanização relativamente às sedes dos respectivos municípios, admitindo que esses planos, gerais ou parciais, fossem aprovados mediante proposta ou sob requerimento de um particular, o que viria a suceder com os planos apresentados pelas antecessoras da A……., SA.» (artigo 203. b), da petição)
E por isso os planos da Marinha teriam sido apresentados a requerimento das antecessoras da Autora.

Não tem razão a Autora quando se refere ao DL n.º 33921, de 5 de Setembro de 1944, como sendo o primeiro diploma legal sobre planos de urbanização. Na verdade, já o D.L n.º 24802, de 21 de Dezembro de 1934, obrigava as câmaras municipais do continente e ilhas a promover o levantamento de plantas topográficas e a elaboração de planos gerais de urbanização:
«Artigo 1.º As câmaras municipais do continente e ilhas adjacentes são obrigadas a promover o levantamento de plantas topográficas e a elaboração de planos gerais de urbanização das sedes dos seus municípios, em ordem a obter a sua transformação e desenvolvimento segundo as exigências da vida económica e social, da estética, da higiene e da viação, com o máximo proveito e comodidade para os seus habitantes».
«Art. 8.º As câmaras municipais são obrigadas a submeter à apreciação do Governo, pelo Ministro das Obras Públicas e Comunicações, no prazo de três anos, a contar da data da conclusão das respectivas plantas topográficas, os planos gerais de urbanização elaborados nos termos deste decreto. […] § 4.º As câmaras municipais darão execução aos planos de urbanização pela ordem de maior interesse público e segundo as suas possibilidades financeiras e não poderão empreender a realização de qualquer das suas partes ou de obras que os prejudiquem antes da aprovação dos planos pelo Governo».
«Art. 12.º Na elaboração dos planos gerais de urbanização as câmaras poderão fazer-se substituir pelas comissões de iniciativa quando estas o desejem ou por empresas particulares mediante a celebração de contratos aprovados pelo Governo».

Ora, o DL n.º 33921, de 5.9.1944, nos seus próprios termos preambulares, visou «reunir a legislação em vigor, dispersa por vários diplomas, sobre levantamentos topográficos e planos de urbanização das cidades, vilas e outras localidades do país e reconhecendo-se a necessidade de algumas alterações a essa legislação e de disposições novas que a experiência aconselha».
E nesse diploma volta a impor-se às câmaras municipais a apresentação «à aprovação do Governo, no prazo de três anos, a contar da data da conclusão das respectivas plantas topográficas, os planos gerais de urbanização elaborados nos termos deste decreto-lei» (artigo 10.º).
E também se dispõe que «Compete às câmaras municipais promover a execução dos planos gerias de urbanização e expansão aprovados pelo Governo, salvo nos casos em que exista organismo especial que por lei tenha essa competência» (art. 11.º)

A Autora, saltando o diploma de 1934, passa para o diploma de 1944, e desta data para uma homologação em 1957. Estamos já, como se disse, 35 anos depois da escritura de 1922 e não há qualquer conexão entre um ante-projecto de urbanização dos seus terrenos, a que se havia obrigado a antecessora da autora a apresentar em seis meses, a contar de Dezembro de 1922, e um plano de urbanização em 1957, este já ao abrigo de diploma de 1944.
E seja pelo diploma de 1934 seja pelo de 1944 vê-se que a aprovação de plano não respeita à sua execução, nem a direitos de execução. Competia às câmaras a execução ou a sua promoção. Sendo o diploma de 1934 logo absolutamente claro: as câmaras municipais darão execução aos planos de urbanização pela ordem de maior interesse público e segundo as suas possibilidades financeiras; e o de 1944 cometendo-lhes a promoção de execução.
O que ocorre em qualquer caso é que a única coisa que se pode reiterar é que havia uma delimitação territorial. Naturalmente se há-de entender que poderia ser diferente da que ocorria antes e diferente da que vem a ocorrer depois.
Mas no plano, nem autorização, nem licença, nem permissão, nem direito de construção reconhecido concretamente à antecessora da autora.
Aliás, o próprio diploma de 1944 dispõe que: «Art. 29.º As licenças para construção ou transformação de prédios, nas áreas urbanizadas ou urbanizáveis abrangidas pelos planos a que se refere o artigo 1.º, serão condicionadas à observância rigorosa dos mesmos planos e seus regulamentos, cumprindo às câmaras municipais ou aos organismos a que se referem os artigos 11.º a 19.º embargar as obras em caso de transgressão».
Estabelecendo-se, pois, já então, a diferença entre plano e licença, esta que respeita a um direito concreto.
Não procede a alegação da Autora no sentido de que o seu direito de urbanizar estava suportado no citado despacho ministerial.

2.2.6.C) O Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha de 1968
Alega a Autora que na década de sessenta apresentou um outro plano designado por «Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha». Afirma:
«“desejando dar prosseguimento ao seu plano turístico hoteleiro para a Quinta da Marinha”, submeteu à aprovação da Câmara Municipal de Cascais “um estudo mais detalhado da localização dos vários elementos que compõem todo o conjunto”» (art. 15.º da p.i.), que «mereceu pareceres favoráveis dos serviços camarários, da Junta Autónoma de Estradas e do Comissariado do Turismo, tendo sido submetido a parecer da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização» (art. 16.º da p.i).
«Este “Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha” também seguiria os seus trâmites normais, neste caso, e uma vez que se tratava de uma alteração a um Plano de Urbanização anteriormente aprovado, prescritos no artigo 10°, § 5, do Decreto-Lei nº 33921, de 5 de Setembro de 1944: uma intervenção governamental a priori, a autorização, e só depois, a necessária aprovação pela Câmara Municipal de Cascais» (art. 214.º da p.i.).
«O Gabinete do Plano Director da Região de Lisboa forneceu sobre o mesmo a seguinte informação: “O plano de urbanização da Marinha e da zona da Guia foi aprovado por despacho de 01/07/57 (Proc. C1-F2-L3) dentro de pequenos ajustamentos. Conforme se verifica na planta de zonas do plano aprovado, estava previsto para este sector uma ocupação quase total do terreno com moradias em grandes talhões (tipo clássico), uma zona para instalações hoteleiras e outra para instalações desportivas. O estudo agora em causa estabelece três zonas hoteleiras, um centro comercial e de recreio com uma praia artificial e uma zona de “Clube”, sendo toda a restante área ocupada por moradias e cabanas, tipo apartamento, de piso único e sem divisão de lotes e com características turísticas. Este estudo tem parecer favorável da Câmara, J A. Estradas e do Comissariado do Turismo. Nada temos a objectar sobre esta pretensão cujo interesse turístico considerámos incontestável, parecendo-nos, no entanto, ser de notar que, quando da realização da praia artificial, deverá ser elaborado um estudo mais detalhado a submeter à a apreciação da D. G. S. U.» (art. 215.º, p.i.)».
«O Director-Geral dos Serviços de Urbanização emitiu, em 14 de Junho de 1967, a seguinte informação, sobre todo este processo:
“O novo tipo de ocupação e, até, a própria expressão plástica que se mostra pretender dar-lhe, - adaptam-se muito melhor às exigências turísticas de hoje e correspondem muito mais adequadamente às potencialidades do terreno, que, assim, será mais aproveitado. Julgo, por isso, que a nova solução urbanística pode ser desenvolvida em projectos formais, de que farão, evidentemente, parte os projectos das infraestruturas urbanísticas, integradas nos sistemas camarários existentes ou previstos. Deverão ser indicados os faseamentos e prioridades de execução. Levanta-se-me a dúvida (que os futuros estudos poderão esclarecer) se a solução prevista para a praia artificial, por profunda escavação, será de adoptar talvez estudo sumário mais pormenorizado esclareça este importante aspecto do planeamento. 14-6- 67. (a) …….”» (art. 216.º, da p.i.).
«Logo a seguir, em 15 de Junho de 1967, o Subsecretário de Estado das Obras Públicas proferiu um despacho de concordância sobre a informação do Director-Geral dos Serviços de Urbanização: “Concordo. 15-6-67. (a) ……..» (art. 217.º, p.i).
«Autorizada pelo despacho ministerial de 15 de Junho do 1967, a Câmara Municipal de Cascais, em reunião de 31 de Outubro de 1968, “deliberou por unanimidade aprovar o Estudo do Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha nas condições postas na informação do Senhor Director-Geral dos Serviços de Urbanização”, conforme consta do ofício n°9921, enviado à D…….. em 8 de Novembro de 1968» (art. 219.º, p.i.).
Apesar de todo o alegado no que concerne ao «Plano Turístico e Hoteleiro para a Quinta da Marinha», 1967/1968, aqui simplesmente acabado de sintetizar, a verdade é que não foi efectuada, nos presentes autos, a necessária prova documental.
E logo o contra-interessado na sua contestação impugnou essa alegação (art. 104.º).
Pelo que no despacho saneador não se deu a correspondente matéria de facto como provada, e desse despacho saneador não houve qualquer reclamação; e continua a não se poder dar aqui como assente, por isso que também não se registou no precedente ponto 2.1.
Não se esquece que a Autora, quer na petição inicial (p. ex. arts. 231, 232 e 233) quer nas alegações, intenta a demonstração desse plano pela alegada remissão para ele feita na deliberação da Câmara Municipal, de 21 de Maio de 1992 (ver 7 da matéria de facto).
Todavia, vai longe de mais nesse intento.
Na verdade, essa deliberação indeferiu pedido de loteamento que havia apresentado (ver 6 da matéria de facto), tendo assentado em vários pressupostos, entre os quais, o constante do ponto 3 de Informação da Divisão de Planeamento Urbanístico e Gestão Fundiária, PUGF: «O terreno é abrangido pelo Plano da Quinta da Marinha considerado legalmente em vigor […]». E voltou a dizer nas conclusões da informação: “E. Considerando que o Plano de Urbanização da Quinta da Marinha se mantém eficaz. F. Considerando que o terreno em causa se situa dentro do perímetro abrangido pelo Plano de Urbanização da Quinta da Marinha. G. Considerando que o terreno em causa se encontra abrangido pela área de Paisagem Protegida Sintra Cascais, cujo estudo de ordenamento se não encontra ainda aprovado, e considerando também que se encontra em elaboração o Plano Director Municipal, circunstâncias que justificam não serem de aceitar presentemente alterações ao Plano e Urbanização da Quinta da Marinha em vigor, dada a inexistência de parâmetros alternativos aprovados para o local».

Ora, as menções a «Plano da Quinta da Marinha» e «Plano de Urbanização da Quinta da Marinha» não permitem qualquer inferência de que se tratava do alegado «Plano Turístico e Hoteleiro para a Quinta da Marinha»; e muito menos dessa referência pode resultar, evidentemente, a identificação do que nele pudesse constar.
E decisivamente, mais uma vez, não se detecta qualquer acto conferidor, autorizador, permissivo, licenciador de qualquer edificação, de qualquer concreto loteamento. Na circunstância, aliás, o que vem demonstrado é o indeferimento de loteamento requerido.
Não é possível, pois, concluir-se por qualquer acto conferidor ou confirmador de qualquer concreto direito de urbanizar.

2.2.6.D) O POPNSC de 1994
Articula a autora na petição inicial:
«260. Durante a vigência da proibição prescrita pelo DL n.º 327/90, em 11 de Março de 1994, foi publicado o Decreto Regulamentar n.º 8/94, que cria o Parque Natural de Sintra-Cascais e o Decreto Regulamentar n.º 9/94, que aprovou o Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais e o respectivo Regulamento.
261. O Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais mantinha as possibilidades de aproveitamento urbanístico visadas pela autora, uma vez que continuava a permitir a construção numa área significativa do Terreno da A……., que qualifica como “área preferencial para turismo e laser” e uma outra área (por erro manifesto) fora classificada como “área de ambiente rural».

A afirmação essencial da Autora de que o Plano de 1994 mantinha as possibilidades de aproveitamento urbanístico por ela visadas não releva de qualquer direito conferido, atribuído, ou confessado concretamente à Autora.
Quando um plano mantém a utilização prevista em plano precedente naturalmente que se pode dizer que mantém as possibilidade de aproveitamento urbanístico. Mas isso nada releva de direito concreto de construção. É ainda em nível genérico que se trata. Nada de acto administrativo licenciador ou autorizativo concreto. Nada de direito de construção consolidado na esfera jurídica de qualquer dos titulares de direito de propriedade. É a possibilidade que está conferida. A concretização dessa possibilidade depende, aí sim, de cada acto concreto da entidade competente para o efeito.
E a distinção entre o que é genericamente disposto no plano, no caso no Regulamento do Plano de Ordenamento de 94 e o que pode decorrer de acto, encontra mesmo uma expressão no seu artigo 24.º quando, ainda normativamente, dispôs:
«1 – São estabelecidas no Parque natural áreas de intervenção específica que abrangem as parcelas de terreno objecto de licenças ou alvarás de loteamento em vigor e que se encontram inseridas em áreas prioritárias para a conservação da natureza.
2 – Nas áreas intervenção específica não são aplicáveis os parâmetros constantes do presente Regulamente, sem prejuízo de as áreas em causa serem objecto de planos de pormenor.
3 – A caducidade dos alvarás referidos no n.º 1 implica a sujeição da área às normas previstas na secção II do capítulo II do presente Regulamento».

Quer dizer, perante a existência de actos concretos, «licenças ou alvarás de loteamento em vigor», resolveu o regulamento prever um regime próprio.
Afinal, um regime de certo modo paralelo ao que o ponto 9 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/2000, de 5 de Junho, e o artigo 43.º do Regulamento do Plano de 2004 depois contemplaram, salvaguardando direitos adquiridos.
Sempre, um e outro, dependentes da existência de acto concreto conferidor ou autorizativo de algo.

2.2.6.E) Plano Director Municipal de Cascais, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/97, de 19 de Junho.
A Autora entende que a RCM n.º 96/97, de 19/06, que ratificou o Plano Director Municipal de Cascais, veio confirmar os direitos de exploração da A…… previsto no POPNSC de 1994 na medida em que mantém a classificação de parte substancial do solo como «área preferencial para turismo e recreio».
Deve notar-se que já à data os planos especiais de ordenamento do território se qualificavam como «vinculativos para todas as entidades públicas e privadas, devendo com eles ser compatibilizados os planos municipais de ordenamento do território (do artigo 1.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 151/95, de 24 de Junho. E a sua prevalência veio reiterada no Decreto-Lei n.º 380/99, de 22/09, que, revogando o diploma de 95 (art. 159.º) dispõe no artigo 24.º, n.º 4, que «os planos especiais do ordenamento do território prevalecem sobre os planos intermunicipais de ordenamento do território, quando existam e sobre os planos municipais de ordenamento do território».

Ora, não está suscitada qualquer colisão entre o PDM e o POPNSC. O que a Autora na realidade afirma é que o PDM respeita o POPNSC, confirmando os alegados direitos consagrados neste.
Só que, como vimos, do POPNSC de 1994 não decorrem os alegados direitos. O que faz cair a confirmação que vem alegada.

2.2.6.F) Entende ainda a Autora que a RCM n.º 86/2003, de 13/03, que aprovou o POOC Sintra-Sado, não afecta as faculdades urbanísticas da A…… porque «abrange apenas uma parcela limitada do terreno» (artigos 80 e 280 da p.i.).
Não é mister essa discussão, neste segmento.
O que releva é que, afinal, mais uma vez, não se reivindica e realmente não se retira desse POOC Sintra-Sado qualquer título para urbanização.
Alega a Autora que não foi afectada, mas essa alegada não afectação não constitui qualquer título, mas sim a eventual não retirada de direitos provindos de outros títulos.
Assim não se colhe do POOC Sintra-Sado, qualquer título jurídico para urbanizar.

Não se detecta, pois, a existência de qualquer direito adquirido de urbanização.

2.2.7. Os vícios apontados às normas do REGULAMENTO DO PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA-CASCAIS radicam em grande parte, como se disse, num alegado atentado aos direitos adquiridos de urbanização.
No que se dirá a seguir ter-se-á já em atenção que não foram detectados esses alegados direitos adquiridos. E, por isso, os vícios que deles eram essencialmente dependentes, não podem, evidentemente, ser reconhecidos.

2.2.8. A alegada violação do princípio da confiança
Alega a A. que as normas resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15.º e a planta síntese 1D do POPNSC de 2004 são inválidas por violação do princípio da protecção da confiança consagrado nos artigos 2.º da CRP e 6.º do CPA (art. 315 da p.i.).
Para a Autora aquelas normas do POPNSC de 2004 operaram uma rotura no ordenamento urbanístico aplicável à A……. considerando que:
«a) não lhe subjaz qualquer mudança nas características físicas, geológicas, morfológicas, paisagísticas, ou ambientais do Terreno que se mantiveram desde a elaboração do POPNSC de 1994;
b) contraria a antiguidade (mais de 80 anos!) do reconhecimento pela autoridades públicas do direito subjectivo de aproveitamento urbanístico da Autora que, face ao contrato de 1922, deve mesmo considerar-se um direito adquirido que se encontrava definitivamente subjectivado na esfera jurídica desta» (do art. 317 da p.i.).
Acresce, segundo a A., que as referidas normas do POPNSC de 2004 têm eficácia retroactiva uma vez que afectam anormal e decisivamente uma relação contratual duradoura com mais de oito décadas de duração que nunca foi posta em causa por qualquer das partes nem pela legislação de urbanismo entretanto aprovada (v. artigo 319 da pi.).
Acrescenta que embora a Administração Pública não seja «obrigada a cumprir, ponto por ponto, o contrato celebrado em 1922, há um núcleo essencial do contrato – o direito a construir, que permitia a realização concreta de “operações urbanísticas” – que se mantém e que tem de ser respeitado!» (art. 320 da pi).
Continua referindo que esta situação de confiança se consubstanciava, ainda, no facto de a Administração Pública, após conferir contratualmente à A…… um direito de construir, reconheceu sucessivas vezes esse direito (art. 325 p.i).
Entende a A. que, face à situação de confiança criada pela Administração Pública, houve um investimento de confiança da A……. como seja, os sucessivos e detalhados projectos de urbanização que a A. e as suas antecessoras realizaram ao longo do tempo. Neste investimento de confiança inclui-se a execução do contrato de 1922, que teve lugar a partir de Julho de 1957, o qual se traduziu na abertura de várias ruas, na venda de lotes e na construção de casas (ver arts. 328 a 330 da p.i).
Alega, ainda, a A. que esta lesão da confiança é reforçada pela violação de disposições legais do ordenamento urbanístico respeitantes ao princípio da estabilidade dos planos com eficácia plurisubjectiva (art. 336 da p.i.).
No caso concreto, entende estar violado o princípio constante do n.º 2 do artigo 25.º da Lei n.º 48/98, de 11/08, o qual veio a ser concretizado no n.º 1 do artigo 95.º e n.º 2 do artigo 98.º, bem como o n.º 3 do artigo 143.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22/09, os quais fixam prazos para os particulares concretizarem o aproveitamento do solo que lhes foram reconhecidos com a aprovação dos planos com eficácia plurisubjectiva (p. ex. art°s. 337 e 338 da p.i.).
Entende a Autora ter havido uma clara violação, por razões que lhe são totalmente estranhas das normas atrás referidas consubstanciadas no facto de a A…… dispor de apenas uns escassos meses para concretizar o seu direito de edificar constante do POPNSC 1994 e do PDM de 1997 o que constitui uma violação clamorosa das regras sobre a estabilidade dos Planos (art. 343 da p.i.).
Com efeito, refere que a A……. foi vítima de uma violação particularmente intensa do princípio da protecção da confiança pela:
a) Aplicação de uma norma (que considera inconstitucional) do Decreto-Lei n.º 327/90, de 22 de Outubro, sobre incêndios florestais, que a impediu de concretizar os seus direitos de edificação, em conformidade com o “Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha”, de 1968;
b) Aplicação conjugada desta proibição, com as novas regras sobre classificação e qualificação do solo constantes do POPNSC de 2004, que impediram o aproveitamento do solo, em conformidade com o POPNSC de 1994 e com o PDM de Cascais de 1997 (art. 345 da p.i.).
A Autora argumenta, ainda, que a revisão do POPNSC de 2004 não respeitou a alínea a) do artigo 4.º e o artigo 98.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro (artigos 347 da p.i.), porque «basta conhecer a situação do Terreno da A……., para concluir que a revisão do POPNSC não se baseou num “conhecimento sistemático das características físicas, morfológicas e ecológicas do Terreno”, nem foi determinada por necessidade de adaptação do terreno a novas condições económicas, sociais ou ambientais» (artigo 350 da p.i.).

Vejamos.

2.2.8.1.A) A A. refere que as normas resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15.º e a planta síntese 1D do POPNSC de 2004 são inválidas por violação do princípio da protecção da confiança consagrado nos artigos 2.º da Constituição da República Portuguesa e 6.º do Código do Procedimento Administrativo.
A CRP estipula no seu artigo 2.º que «A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa» (redacção em 2004 e que é também a actual).
O CPA no artigo 6.º determina que «no exercício da sua actividade a Administração Pública deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação».
A CRP prevê expressamente que todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender (art. 66.º, n.º 1). Nesse âmbito e no quadro de um desenvolvimento sustentável incumbe ao Estado com o envolvimento e a participação dos cidadãos «ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento socio-económico e a valorização da paisagem» art. 66.º, n.º 2, b)).
Por isso, naturalmente, a jurisprudência tem entendido que «o direito de propriedade em matéria urbanística (de direito de construção) é juspublicamente condicionável e regulável. /Inexiste, pois, um direito ou liberdade constitucionais de construir o que se quiser (como se quiser e onde se quiser), só pelo facto de ser proprietário de um terreno. A garantia da propriedade privada não abrange o direito de construir, como algo inerente à liberdade natural do homem ou ao poder de dispor do que é seu» (do acórdão deste STA 16/11/1999, proferido no Processo n.º 35 723).
Também, naturalmente, «toda a regulamentação referente a ordenamento do território é dinâmica tendo que se conformar com as novas concepções que a evolução da vida em sociedade vai impondo. Nessa medida, quer sob o ponto de vista científico quer sob o ponto de vista social há uma busca permanente visando descobrir as melhores formas de garantir a vida dos seres humanos na mais completa harmonia possível com a natureza. Essas novas concepções vão sendo plasmadas na lei, nas diversas leis, sempre no sentido de procurar evitar cometer alguns dos erros que se cometeram no passado, de modo que só é possível falar em estabilidade definitiva nesta área em casos muito excepcionais que terão de resultar inequivocamente da lei» (do acórdão do Pleno deste Tribunal de 06/03/2007, Processo n.º 0873/03).
E é a própria lei de bases da política do ordenamento do território e de urbanismo, Lei 48/98, de 11.8, que impõe a mutação dos instrumentos reguladores por mutação da realidade: «Os instrumentos de desenvolvimento territorial e os instrumentos de política sectorial são alterados sempre que a evolução das perspectivas de desenvolvimento económico e social o determine» (artigo 25.º, n.º 1). Sendo que quanto aos instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares, determinando embora um período de vigência mínima, determina, também, a obrigatoriedade de revisão em prazo legalmente definido (art. 25.º, n.º 2 e art. 27; o problema do prazo será abordado mais adiante).

2.2.8.1.B) A propriedade da A. insere-se numa área que, ao longo de décadas, tem vindo a ser alvo de uma plúrima regulamentação, motivada por diversos factores, designadamente pelo facto de a zona ser considerada de «grande sensibilidade, (…), pelas suas características geomorfológicas, florísticas e paisagísticas, por um lado, e pela intensa pressão urbana e degradação a que está sujeita, por outro, (…)», conforme consta no preâmbulo do DL n.º 292/81, de 15 de Outubro, o qual criou a Área de Paisagem Protegida Sintra-Cascais.
E logo então aquele decreto-lei sujeitou a autorização prévia ministerial um conjunto de actividades entre as quais, na área de reserva, a construção de imóveis, a construção ou alteração das vias rodoviárias, a alteração da morfologia do terreno, a destruição da vegetação natural, e na área agrícola, praticamente qualquer loteamento, loteamento com vista à urbanização, loteamento para fins industriais, loteamento turístico condicionava (artigo 7.º).

Posteriormente, a Área de Paisagem Protegida Sintra-Cascais foi reclassificada em Parque Natural Sintra-Cascais pelo Decreto-Regulamentar n.º 8/94, de 11 de Março, de acordo com os critérios definidos pelo DL n.º 19/93, de 23 de Janeiro, com o fundamento de que “…a conservação da natureza, a preservação das espécies da fauna e da flora, a manutenção dos equilíbrios ecológicos e a protecção dos recursos naturais, além de constituírem objectivos de interesse público de âmbito municipal, extravasam claramente este âmbito e justificam medidas de protecção adequadas a uma zona que constitui património nacional” (do preâmbulo do DR n.º 8/94).
Pelo Decreto Regulamentar n.º 9/94, de 11 de Março, foi aprovado o Plano de Ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais e o respectivo Regulamento, estabelecendo no seu artigo 5.º que este Plano vigorava por um período de dez anos a contar da data da sua publicação, mas seria revisto no prazo máximo de cinco anos a contar da mesma data.
Ora, o Regulamento dividia a área territorial abrangida pelo Plano em diversas áreas de protecção:
«Artigo 8.º
Áreas de protecção
1 - A área territorial abrangida pelo Plano de Ordenamento integra as seguintes áreas de protecção, de acordo com a carta que constitui o anexo III ao presente Regulamento, do qual faz parte integrante:
a) Áreas prioritárias para a conservação da natureza;
b) Áreas de ambiente rural;
c) Áreas de ambiente urbano;
d) Áreas preferenciais para turismo e recreio;
2 - Além das áreas de protecção referidas no número anterior, são ainda estabelecidas áreas de intervenção específica»

Para cada uma dessas áreas estabeleciam-se diversos condicionalismos, sendo que algumas dessas áreas tinham subdivisão classificativa.
Mais exigente e com completa proibição de construção era o que se passava nas áreas prioritárias para a conservação da natureza de protecção total:
«Nas áreas de protecção total apenas são permitidas as seguintes actividades, mediante autorização da comissão directiva do Parque Natural:
a) A investigação científica;
b) A monitorização do estado do ambiente natural;
c) A educação ambiental numa perspectiva de apoio à gestão sustentada dos recursos;
d) Outras actividades de conservação da natureza» (art. 11.º, n.º 1).

Menos exigente o que se passava nas áreas de ambiente urbano, embora também com actos e actividade condicionados:
«Artigo 18.º
Actos e actividades condicionados
1 - Nas áreas de ambiente urbano ficam sujeitos a parecer favorável da comissão directiva do Parque Natural:
a) Os planos de urbanização;
b) Os planos de pormenor.
2 - Nas áreas qualificadas, na ausência de planos de urbanização ou de pormenor plenamente eficazes, ficam igualmente sujeitos a parecer favorável da comissão directiva do Parque Natural:
a) As operações de loteamentos urbanos;
b) Os projectos de novas edificações e de ampliação ou recuperação das existentes;
c) A abertura de novas vias de comunicação;
d) As infra-estruturas de utilidade pública, nomeadamente escolas, campos de jogos e pavilhões desportivos.
3 - Nas áreas de ambiente urbano, e na ausência de instrumentos de planeamento urbanístico plenamente eficazes, as novas construções devem enquadrar-se na arquitectura tradicional do aglomerado, não podendo ultrapassar o número de dois pisos acima do solo e devendo obedecer a critérios de qualidade arquitectónica ao nível dos materiais utilizados, dos cromatismos e da traça proposta, de acordo com o disposto no artigo 7.º
4 - Sempre que o entendam necessário, os municípios de Sintra e de Cascais podem solicitar ao Parque Natural a emissão de parecer relativo a novas construções nas áreas indiferenciadas, o qual não se reveste de carácter vinculativo».

Já no que respeita a áreas preferenciais para turismo e recreio dispunha:
«Artigo 19.º
Áreas preferenciais para turismo e recreio
As áreas preferenciais para turismo e recreio integram as zonas que apresentam aptidão preferencial para a implantação de equipamentos turísticos, maioritariamente de ocupação hoteleira, de recreio e de lazer.

Artigo 20.º
Actos condicionados
Nas áreas preferenciais para turismo e recreio, para além do previsto no artigo 4.º, são sujeitos a parecer favorável da comissão directiva do Parque Natural os novos loteamentos urbanos e os empreendimentos turísticos.

Artigo 21.º
Empreendimentos turísticos
1 - Os projectos de empreendimentos turísticos dentro das áreas preferenciais para turismo e recreio devem obedecer a critérios de qualidade ambiental, paisagística e arquitectónica, de acordo com o disposto no artigo 7.º
2 - A equipa de projectistas destes empreendimentos deve integrar obrigatoriamente um arquitecto paisagista.
3 - Os projectos de empreendimentos turísticos devem ser instruídos com estudos comprovativos das disponibilidades hídricas destinadas a assegurar a manutenção respectiva e do tratamento dos efluentes.
4 - Nos casos em que a totalidade de uma propriedade, ou uma sua parcela com área igual ou superior a 90% da área total da propriedade, se encontre dentro das áreas preferenciais para turismo e recreio, os projectos de empreendimentos turísticos ficam sujeitos aos seguintes parâmetros:
a) Densidade máxima de ocupação - 40 habitantes por hectare;
b) Índice de ocupação - 0,1;
c) Índice de construção - 0,2;
d) Número de pisos acima do solo - 2;
e) Índice de permeabilidade - 0,8;
f) Índice de cobertura arbóreo potencial - 0,5.
5 - Nos casos em que apenas uma parcela, com área inferior a 90% da área total da propriedade, se situe dentro das áreas preferenciais para turismo e recreio, a densidade de ocupação global da propriedade não pode, em caso algum, ultrapassar os 10 habitantes por hectare.
6 - As edificações são obrigatoriamente implantadas na zona da propriedade situada nas áreas preferenciais para turismo e recreio, onde ficam sujeitas aos parâmetros estipulados no n.º 4.
7 - Em casos excepcionais e devidamente justificados, o número de pisos acima do solo referido no n.º 4 pode ir até três, mediante parecer favorável da comissão directiva do Parque Natural, ou até quatro, mediante autorização do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.

Artigo 22.º
Construção de habitações
Nas áreas preferenciais para turismo e recreio são aplicáveis à construção de habitações os parâmetros previstos para as áreas de reduzida protecção paisagística».

E, para além do específico, lembre-se que nos termos do
«Artigo 25.º
Autorizações e pareceres
1 - Salvo disposição em contrário, as autorizações e pareceres emitidos pela comissão directiva do Parque Natural são sempre vinculativos e não dispensam outros pareceres, autorizações ou licenças que forem devidos.
2 - As autorizações e pareceres emitidos pela comissão directiva do Parque Natural ao abrigo do presente Regulamento caducam dois anos sobre a data da sua emissão, salvo se nesse prazo as entidades competentes tiverem procedido ao respectivo licenciamento».

Portanto, mesmo nas Áreas preferenciais para turismo e recreio eram condicionados um conjunto largo de actos e actividades. Além de, ainda em geral, carecer de autorização da comissão directiva do Parque um conjunto amplo de actividades (art. 4.º)

Ora, logo quando foi determinada a revisão daquele plano especial do território, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/2000, de 5 de Junho, visando «assegurar, à luz da experiência e das novas circunstâncias que ele possa corresponder de modo mais eficaz ao desiderato de proteger os valores ambientais, paisagísticos e histórico-culturais do Parque Natural de Sintra-Cascais e de definir o adequado enquadramento jurídico da gestão territorial que promova a necessária compatibilização entre esses valores e as actividades humanas» (do preâmbulo), foram estabelecidas medidas preventivas de diferente intensidade, as quais interditavam a realização de acções que pusessem em causa a viabilidade da execução do POPNSC.
Destas medidas ficaram excepcionados os licenciamentos concedidos bem como os licenciamentos a conceder com base em: «a) Informação prévia favorável, válida e eficaz, emitida em data anterior à entrada em vigor da presente resolução; b) Aprovação de ante-projecto ou projecto, emitido pela Direcção-Geral do Turismo em data anterior à entrada em vigor da presente resolução; c) Alvará de loteamento, válido e eficaz, emitido em data anterior à entrada em vigor da presente resolução» (do ponto 9 da Resolução).
O prazo de vigência destas medidas era de dois anos; esse prazo foi prorrogado por mais um ano pela RCM n.º 102/2002, de 5 de Julho.
Depois, foi publicada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro, que aprovou a revisão do POPNSC, «desenvolvido numa convergência de objectivos relativamente à salvaguarda da orla costeira e do património natural, paisagístico e cultural em presença», e «articulado e está coerente com os objectivos, os princípios e as regras aplicáveis ao território em causa que foram definidos pelo Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa, aprovado através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 68/2002, de 8 de Abril» (do preâmbulo).
Neste contexto, a ilação a retirar é a de que as normas resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15.º e a planta síntese 1D do POPNSC de 2004 não são violadoras do princípio da protecção da confiança nem enquanto derivado do princípio do Estado de direito consagrado no artigo 2.º da CRP, nem enquanto derivado do princípio do tratamento com justiça e imparcialidade de todos os que entram em contacto com a Administração Pública, plasmado no artigo 6.º do CPA.
Procederam a uma nova ordenação, uma nova regulamentação, a uma nova classificação de utilização do solo, o que é inerente à política de ordenamento, sempre em busca das melhores soluções. Mas não romperam sequer com qualquer passado de esquecimento ou de desregulamentação na área. Antes inserem-se numa linha de continuidade na preocupação sobre a melhor maneira de garantir o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado.
Ademais, nem sequer pode alegar a Autora qualquer surpresa ou estupefacção. O passado e experiência da Autora e seus antecessores de envolvimento na problemática do planeamento da área davam-lhe completa percepção da sua evolução e, por isso, da sua não rigidez.
Assim, afastada, como se preveniu, a alegada violação resultante de direitos adquiridos, que não tinha, e que quer a Resolução de 2000 (ponto 9), quer o Regulamento do POPNSC de 2004 (artigo 43.º) intentaram não ofender, o mais também não se verifica.

2.2.8.2. Vejamos, ainda, o que concerne à alegada violação do disposto nos artigos 25.º, n.º 2, da Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, 95.º, n.º 1, 98.º, n.º 2, e 143.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, o qual desenvolve as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo, definindo o regime de coordenação dos âmbitos nacional, regional e municipal do sistema de gestão territorial, o regime geral de uso do solo e o regime de elaboração, aprovação, execução e avaliação dos instrumentos de gestão territorial (artigo 1.º).
Relembrem-se os preceitos:
«Artigo 25.º
Alteração
1 - Os instrumentos de desenvolvimento territorial e os instrumentos de política sectorial são alterados sempre que a evolução das perspectivas de desenvolvimento económico e social o determine.
2 - Os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares devem respeitar um período de vigência mínima legalmente definido, durante o qual eventuais alterações terão carácter excepcional, nos termos a definir por lei.
3 - São directamente aplicáveis aos instrumentos de gestão territorial referidos no número anterior as novas leis ou regulamentos que colidam com as suas disposições ou estabeleçam servidões administrativas ou restrições de utilidade públicas que afectem as suas prescrições».

«Artigo 95.º
Alteração dos instrumentos de desenvolvimento territorial e dos instrumentos de política sectorial
1 - O programa nacional da política de ordenamento do território, os planos regionais, os planos intermunicipais e os planos sectoriais são alterados sempre que a evolução das perspectivas de desenvolvimento económico e social o determine.
2 - Os planos regionais, os planos sectoriais e os planos intermunicipais são ainda alterados por força da posterior ratificação e publicação de planos municipais de ordenamento do território ou da aprovação de planos especiais de ordenamento do território que com eles não se conformem, indicando expressamente as normas alteradas, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 25.º
3 - Nas situações previstas nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 93.º, o conteúdo dos novos planos ou regras é, com as necessárias adaptações, integrado no conteúdo dos instrumentos de gestão territorial assim alterados».

«Artigo 98.º
Revisão dos instrumentos de planeamento territorial e dos instrumentos de natureza especial
1 - A revisão dos planos especiais e dos planos municipais de ordenamento do território pode decorrer:
a) Da necessidade de adequação à evolução, a médio e longo prazo, das condições económicas, sociais, culturais e ambientais que determinaram a respectiva elaboração, tendo em conta os relatórios de avaliação da execução dos mesmos;
b) De situações de suspensão do plano e da necessidade da sua adequação à prossecução dos interesses públicos que a determinaram.
2 - A revisão prevista na alínea a) do número anterior só pode ocorrer decorridos três anos sobre a entrada em vigor do plano.
3 - Os planos directores municipais são obrigatoriamente revistos decorrido que seja o prazo de 10 anos após a sua entrada em vigor ou após a sua última revisão».

«Artigo 143.º
Dever de indemnização
1 - As restrições determinadas pelos instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares apenas geram um dever de indemnizar quando a compensação nos termos previstos na secção anterior não seja possível.
2 - São indemnizáveis as restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo, preexistentes e juridicamente consolidadas, que comportem uma restrição significativa na sua utilização de efeitos equivalentes a uma expropriação.
3 - As restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo resultantes de revisão dos instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares apenas conferem direito a indemnização quando a revisão ocorra dentro do período de cinco anos após a sua entrada em vigor, determinando a caducidade ou a alteração das condições de um licenciamento prévio válido.
4 - Nas situações previstas nos números anteriores, o valor da indemnização corresponde à diferença entre o valor do solo antes e depois das restrições provocadas pelos instrumentos de gestão territorial, sendo calculado nos termos do Código das Expropriações.
5 - Nas situações previstas no n.º 3, são igualmente indemnizáveis as despesas efectuadas na concretização de uma modalidade de utilização prevista no instrumento de gestão territorial vinculativo dos particulares se essa utilização for posteriormente alterada ou suprimida por efeitos de revisão ou suspensão daquele instrumento e essas despesas tiverem perdido utilidade.
6 - É responsável pelo pagamento da indemnização prevista no presente artigo a pessoa colectiva que aprovar o instrumento de gestão territorial que determina directa ou indirectamente os danos indemnizáveis.
7 - O direito à indemnização caduca no prazo de três anos a contar da entrada em vigor do instrumento de gestão territorial ou da sua revisão».

2.2.8.2.A) Estritamente em razão dos prazos, não pode ter ocorrido violação de qualquer dos preceitos invocados pela autora.
Na verdade, como facilmente se verifica, o plano de 1994 manteve-se em vigor para além do período de vigência mínima de três anos, previsto no artigo 98.º, n.º 2.
E também se manteve em vigor para além do período de vigência reportado aos cinco anos previstos no artigo 143.º, n.º 3, como elemento da fattis species da norma conferidora de direito de indemnização.
A autora pretende é estabelecer uma ligação desses prazos com o alegado efectivo período de tempo durante o qual não foi possível exercer as possibilidades conferidas pelo plano de 94, em face das medidas legislativas sobre a ocupação de solo objecto de incêndio florestal, determinadas pelo DL 327/90, de 22 de Outubro (com sucessivas alterações).
Mas essa é outra questão, que é exterior aos tempos para revisão e vigência.
Para a revisão, a lei basta-se com o tempo contado desde a entrada em vigor, sendo-lhe indiferente o circunstancialismo que lhe seja exterior.

2.2.8.2.B) Depois, também não se descortina como é que a Resolução que aprova o Plano, e o Regulamento em si mesmo, designadamente as normas contra as quais se insurge a Autora, possam violar o preceituado no artigo 143.º, n.º 3, em matéria de indemnização.
Esse preceito surge no quadro de cumprimento do artigo 18.º da Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto:
«Artigo 18.º
Compensação e indemnização
1 - Os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares devem prever mecanismos equitativos de perequação compensatória, destinados a assegurar a redistribuição entre os interessados dos encargos e benefícios deles resultantes, nos termos a estabelecer na lei.
2 - Existe o dever de indemnizar sempre que os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares determinem restrições significativas de efeitos equivalentes a expropriação, a direitos de uso do solo preexistentes e juridicamente consolidados que não possam ser compensados nos termos do número anterior.
3 - A lei define o prazo e as condições de exercício do direito à indemnização previsto no número anterior”.

Como se disse no acórdão deste Tribunal de 28.9.2010, processo 412-10, a lei de bases impõe a existência de diploma legal que estabeleça o prazo e condições de exercício do direito de indemnização quando, não sendo possível compensação, haja restrições equivalentes a expropriação.
Mas, desde logo, fica assente que essa equivalência só existe perante restrição significativa de direito de uso de solo preexistente e juridicamente consolidado – é aqui que se processa uma equivalência à expropriação constitucionalmente prevista e impondo a indemnização adequada.
É nesse quadro que se move o DL n.º 380/99, de 22 de Setembro, que estabelece o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial.
Ora, como se reiterou, não fica demonstrado nos autos que a Autora seja titular de qualquer licença ou autorização, conforme exigido legalmente.
E se fosse titular não era lesada por qualquer omissão pois que não havendo nesse caso sujeição às normas do Regulamento, em virtude do seu artigo 43.º, a situação estava excluída.
Depois, e em qualquer caso, a falta de previsão de mecanismos equitativos de perequação compensatória determina que haverá lugar a indemnização, se a ela houver lugar.
E aí o que se aplica são já precisamente as normas da lei que prevêem o dever de indemnizar e as condições e prazos de exercício do direito à indemnização.
Assim, a omissão no Plano de 2004 de normativo sobre indemnização não reveste qualquer ilegalidade.
O dever de indemnização e correspectivo direito de indemnização resultarão da lei.
Se houver esse dever, e não tiver sido cumprido, a Autora providenciará, se o entender, no sentido de ser cumprido. E é afinal o que intenta também neste processo.
Mas não pode ser assacada ilegalidade às normas contra que se insurge a Autora por qualquer violação do dever de indemnização; é que elas em nada tratam dessa matéria nem tinham de tratar.

2.2.8.2.C) Finalmente, no que respeita ao artigo 4.º e ao artigo 98.º do DL 380/99.
Tem a alegação a ver com a bondade da revisão por não se basear em conhecimento sistemático das características do terreno e não ser determinada pela necessidade de adaptação a novas circunstâncias.
Essa matéria será tratada no ponto seguinte.

2.2.9. Alegada violação do princípio da proporcionalidade

A A. entende que foram violados os artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 5.º n.º 2, do CPA.
Justifica esta violação no facto de as regras do POPNSC 2004, sobre a qualificação do solo da propriedade da A……., serem desadequadas porque assentes em erro manifesto sobre as características ambientais do terreno (artigos 353 e 357 da p.i.).
Segundo a A., para evitar as situações de erro, o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, exige o fundamento técnico dos instrumentos de gestão territorial, incluindo os planos especiais como é o caso do POPNSC de 2004 – artigo 45.º, n.º 2, a), do mesmo diploma – (artigos 361 e 362 da p.i.).
Alega a A. que o «planeamento urbanístico tem de assentar num conhecimento sistemático e efectivo da realidade e a Administração tem de ser capaz de explicar (…) as razões que determinaram as soluções adoptadas quanto à ocupação, uso e transformação do solo» (artigo 363 da p.i.).
Para ilustrar a sua posição, invoca o parecer ambiental que apresentou nos autos, referindo que os técnicos que o elaboraram chegaram à conclusão de que «é um facto manifesto, que o terreno da A……. não possui um valor excepcional, do ponto de vista ambiental ou ecológico o que é facilmente comprovável a olho nu no Terreno» (artigo 367 da p.i.).
A A. entende que as autoridades administrativas que elaboraram o PONSC 2004 não possuíam um conhecimento sistemático adquirido das características ambientais do Terreno o que na sua perspectiva conduziu a um zonamento e classificação do solo absolutamente inadequados aos fins a prosseguir (artigo 372 da p.i.).
Entende, ainda, que as regras do PONSC 2004 violam o princípio da proporcionalidade por serem manifestamente desequilibradas, devido à ausência de ponderação, ou deficiente ponderação, dos direitos adquiridos da A. a construir na sua propriedade (artigo 384 da p.i.).
A suportar a sua tese refere que «a necessidade de preservar valores ambientais não prescinde da sua ponderação em face dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, designadamente os direitos que estão consagrados na CRP como o direito de propriedade e o direito de edificar, que lhe está associado» (art. 385 da p.i.).
Acresce, continua a A., que dos documentos obrigatórios para a formação do plano não consta qualquer referência à propriedade privada do solo – e aos direitos adquiridos dos proprietários – desconsiderando em absoluto estes direitos nas regras sobre a respectiva ocupação (art. 396 da p.i.).

Vejamos.

2.2.9.1. Como se observou, a CRP prevê expressamente que todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender (artigo 66.º, n.º 1).
Nesse âmbito e no quadro de um desenvolvimento sustentável incumbe ao Estado com o envolvimento e a participação dos cidadãos «ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento socio-económico e a valorização da paisagem» (artigo 66.º, n.º 2, b)). Incumbe ao Estado por meio de organismos próprios criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza (artigo 66.º, n.º 1 e n.º 2, c)).
Ora, o citado Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro (aqui na redacção à data da Resolução impugnada), determinou as regras a ser observadas na elaboração de um plano especial do ordenamento do território:
«Artigo 45.º
Conteúdo documental
1 – Os planos especiais de ordenamento do território são constituídos por um regulamento e pelas peças gráficas necessárias à representação da respectiva expressão territorial.
2 – Os planos especiais de ordenamento do território são acompanhados por:
a) Relatório que justifica a disciplina definida;
b) Planta de condicionantes que identifica as servidões e restrições de utilidade pública em vigor.
3 – Os demais elementos que podem acompanhar os planos especiais de ordenamento do território são fixados por portaria do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente.

Artigo 46.º
Elaboração
1 – A decisão de elaboração dos planos especiais de ordenamento do território compete ao Governo.
2 — A elaboração dos planos especiais de ordenamento do território é determinada por resolução do conselho de ministros, da qual devem nomeadamente constar:
a) O tipo de plano especial;
b) A finalidade do plano especial, com menção expressa dos interesses públicos prosseguidos;
c) A especificação dos objectivos a atingir;
d) O âmbito territorial do plano especial, com menção expressa das autarquias locais envolvidas;
e) A indicação da entidade, departamento ou serviço competente para a elaboração, bem como das autarquias locais que devem intervir nos trabalhos;
f) A composição da comissão mista de coordenação;
g) O prazo de elaboração.

Artigo 47.º
Acompanhamento e concertação
1 – A elaboração técnica dos planos especiais de ordenamento do território é acompanhada pela comissão mista de coordenação cuja composição deve traduzir a natureza dos interesses a salvaguardar, designadamente pela participação de organizações não governamentais de ambiente, e a relevância das implicações técnicas a considerar.
2 – O acompanhamento mencionado no número anterior será assíduo e continuado, devendo, no final dos trabalhos de elaboração, formalizar-se num parecer escrito assinado pelos representantes das entidades envolvidas com menção expressa da orientação defendida.
3 - No âmbito do processo de acompanhamento e concertação a comissão de coordenação e desenvolvimento regional emite um parecer escrito incidindo sobre a articulação e coerência da proposta com os objectivos, princípios e regras aplicáveis ao território em causa, definidos por quaisquer outros instrumentos de gestão territorial eficazes.
4 – São adoptados na elaboração dos planos especiais de ordenamento do território, com as necessárias adaptações, os mecanismos de concertação previstos no artigo 32.º»

Em execução do disposto no artigo 46.º, n.º 2, e), a RCM n.º 46/2000 cometeu ao Instituto da Conservação da Natureza, (ICN), pessoa colectiva pública tutelada pelo Ministro do Ambiente e dos Recursos Naturais, competente, nos termos do artigo 2.º, n.º 2, e), do DL n.º 193/93, de 24 de Maio, a elaboração da revisão do Plano de Ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais de 1994.

Essa elaboração assenta no facto de esse Plano dever ser revisto no prazo máximo de cinco anos, como já se referiu, a que se juntam outros factores, elencados no ponto 1 da citada RCM, a saber:
«a) Assegurar, à luz da experiência e dos conhecimentos entretanto adquiridos sobre o património natural da área, uma melhor adequação do Plano de Ordenamento aos objectivos que levaram à criação do Parque Natural Sintra-Cascais;
b) Corresponder aos imperativos de conservação dos habitats naturais, da fauna e da flora selvagem protegidos nos termos do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de Abril, que procedeu à transposição para o direito interno das directivas relativas à implementação da Rede Natura 2000;
c) Equacionar as utilizações actuais do solo face aos valores em presença e à necessária reavaliação das propostas de ocupação do solo, nomeadamente por operações de natureza imobiliária ou turística;
d) Reavaliar as disposições relativas às áreas de ambiente rural, no contexto da avaliação dos valores sociais, económicos e ambientais em presença, no sentido de conter a edificação dispersa;
e) Ajustar os limites das classes e categorias de espaço, tendo em conta os novos instrumentos de gestão territorial convergentes naquela área, tendo presente também a classificação de Sintra como património mundial;
f) Actualizar os limites e estatutos das diferentes áreas de protecção, atendendo aos valores em causa;
g) Reformular as competências para a emissão de pareceres no interior dos perímetros urbanos;
h) Clarificar as normas constantes do Regulamento do Plano, evitando dúvidas de interpretação que conduzam à sua deficiente aplicação».

Para alcançar esse desiderato, o ICN elaborou um Relatório (ver Pasta “Relatório” no processo instrutor, cuja cópia se encontra junto ao processo, págs. 889 e ss.) em que procedeu à caracterização do Parque Natural Sintra-Cascais nas suas múltiplas vertentes, das quais se destaca o seguinte:
- Enquadramento legal;
- Articulação entre os vários instrumentos de gestão territorial;
- Caracterização biofísica (a qual encerra a análise dos seguintes aspectos: clima; geologia; zonas de protecção total no sistema dunar Guincho-Oitavos; recursos hídricos; habitats naturais; flora; fauna; cartografia do valor faunístico);
- Ecologia humana (a qual encerra a análise dos seguintes aspectos: agricultura; a vinha de Colares; caracterização sócio-económica; enquadramento das actividades turísticas)
- Percepção do PNSC.

Esse Relatório foi acompanhado por diferentes peças de carácter técnico e jurídico à semelhança das exigidas pelo artigo 45.º do Decreto-Lei n.º 380/99 já referido.

Todo esse trabalho técnico foi acompanhado por uma comissão mista cuja composição foi identificada na RCM n.º 46/2000:
«3 – Estabelecer, nos termos do artigo 47.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, a composição da comissão mista de coordenação, que integra as seguintes entidades:
a) Três representantes do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, um dos quais presidirá;
b) Um representante do Ministro do Equipamento Social;
c) Um representante do Ministro da Defesa Nacional;
d) Um representante do Ministro da Economia;
e) Um representante do Ministro do Planeamento;
f) Um representante do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas;
g) Um representante do Ministro da Cultura;
h) Um representante da Câmara Municipal de Cascais;
i) Um representante da Câmara Municipal de Sintra;
j) Um representante das associações não governamentais de ambiente, a designar pela Confederação Portuguesa de Associações de Defesa do Ambiente.»

A Comissão de Acompanhamento no seu Parecer Final refere a propósito do desenvolvimento dos trabalhos:
«4 - DESENVOLVIMENTO DOS TRABALHOS
A 1ª reunião da CMCoord. constituiu o inicio formal dos trabalhos com vista à elaboração da revisão do POPNSC.
A elaboração da revisão do Plano de Ordenamento (PO) foi realizada por uma equipa de técnicos do PNSC. Decorreu em duas fases: inicialmente procedeu-se à aquisição de dados e de equipamento, nomeadamente de material informático e de fotografia aérea da área do PNSC no concelho de Sintra. Constrangimentos financeiros do PNSC determinaram uma maior morosidade desta fase.
Numa fase posterior começaram a desenvolver-se os trabalhos técnicos de recolha de nova informação, cruzamento com a do anterior PO e actualização, através do trabalho de campo, dos dados relativos ao património natural e em particular, os da Rede Natura 2000 (espécies e habitats dos Anexos l e II da Directiva Habitats 92/43/CEE).
Ao longo do processo de elaboração do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Síntra-Cascais foram efectuadas 11 reuniões da CMCoord., entre 24 de Abril de 2001 e 2 de Junho de 2003.» (ver Pasta “Parecer Final Comissão Mista /Diversos” no processo instrutor).

Tendo concluído o seu Parecer Final do seguinte modo:
«7 - CONCLUSÃO
A CMCoord., no âmbito das suas competências e designadamente para os efeitos previstos no artigo 47° do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, não obsta a que o processo de revisão do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais possa prosseguir para a fase de Discussão Pública, A presente Proposta de Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais será assim submetida a Discussão Pública a partir de 4 de Junho de 2003.
Esta posição da CMCoord. é adoptada assumindo que as entidades representadas poderão solicitar reuniões específicas, durante o período em que decorre a Discussão Pública, para apresentar quaisquer propostas e contributos, nos termos da lei, que permitam complementar a proposta de POPNSC elaborada na fase de acompanhamento, que hoje se encerra, sem prejuízo de participação na fase de Discussão Pública.»

A discussão pública sobre a proposta do POPNSC teve lugar entre 4 de Junho e 26 de Setembro de 2003, conforme consta do preâmbulo da RCM n.º 1-A/2004.

Do exposto, verifica-se que a elaboração documental do POPNSC, como plano especial de ordenamento do território, foi complexa envolvendo diferentes fases de carácter técnico, jurídico e participação pública.

Nesta conformidade, improcedem as alegações da A. no sentido de desmerecer o citado Relatório pretendendo, ao invés, impor a Exposição e Parecer por si apresentados sobre esta matéria. (doc.s nºs 11 e 12 respectivamente).
Esta Exposição e Parecer, independentemente do valor científico que encerram, reflectem essencialmente as características da propriedade da Autora, a qual, por sua vez, faz parte do Parque Natural Sintra Cascais, motivo pelo qual a sua avaliação não pode ser efectuada fora do contexto onde está inserida, sob pena de se subverter o desígnio da classificação do próprio parque natural.

2.2.9.2. Mas vejamos com mais pormenor o que decorre dos artigos 4.º, 45.º, n.º 2, a), e 98.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 380/99.
O artigo 4.º, inserido no Capítulo I, Disposições gerais, dispõe:
«Os instrumentos de gestão territorial devem explicitar, de forma racional e clara, os fundamentos das respectivas previsões, indicações e determinações, a estabelecer com base no conhecimento sistematicamente adquirido:
a) Das características físicas, morfológicas e ecológicas do território;
b) Dos recursos naturais e do património arquitectónico e arqueológico;
c) Da dinâmica demográfica e migratória;
d) Das transformações económicas, sociais, culturais e ambientais;
e) Das assimetrias regionais e das condições de acesso às infra-estruturas, aos equipamentos, aos serviços e às funções urbanas».

Por seu turno, o artigo 45.º, inserido na Subsecção III, Planos especiais de ordenamento do território, da Secção I, Relação entre os instrumentos de gestão territorial, do Capítulo II, Sistemas de gestão territorial, dispõe, como já se transcreveu:
«1 – Os planos especiais de ordenamento do território são constituídos por um regulamento e pelas peças gráficas necessárias à representação da respectiva expressão territorial.
2 – Os planos especiais de ordenamento do território são acompanhados por:
a) Relatório que justifica a disciplina definida;
b) Planta de condicionantes que identifica servidões e restrições de utilidade pública em vigor.
3 – (…)».

Mostra-se adequado referir, ainda, do disposto no artigo 42.º, inserido na mesma Subsecção do artigo anterior:
«2 – Os planos especiais de ordenamento do território constituem um meio supletivo de intervenção do Governo, tendo em vista a prossecução de objectivos de interesse nacional com repercussão espacial, estabelecendo regimes de salvaguarda de recursos e valores naturais e assegurando a permanência dos sistemas indispensáveis à utilização sustentável do território».

Finalmente, volta-se a transcrever o artigo 98.º, n.º 1:
«Artigo 98.º
Revisão dos instrumentos de planeamento territorial e dos instrumentos de natureza especial
1 - A revisão dos planos especiais e dos planos municipais de ordenamento do território pode decorrer:
a) Da necessidade de adequação à evolução, a médio e longo prazo, das condições económicas, sociais, culturais e ambientais que determinaram a respectiva elaboração, tendo em conta os relatórios de avaliação da execução dos mesmos;
b) De situações de suspensão do plano e da necessidade da sua adequação à prossecução dos interesses públicos que a determinaram».

Vejamos se a RCM n.º 1-A/2004 deu cabal cumprimento aos preceitos supra transcritos.
O preâmbulo deste diploma refere que:
«A Área de Paisagem Protegida de Sintra-Cascais (APPSC) foi criada pelo Decreto-Lei n.º 292/81, de15 de Outubro, decorrente da necessidade de fazer frente à crescente e intensa pressão urbana e à degradação que ameaçava uma zona de grande sensibilidade, repleta de valores naturais, culturais e estéticos a preservar, como a serra de Sintra, a faixa litoral e as áreas adjacentes.
A conservação da natureza, a protecção dos espaços naturais e das paisagens, a preservação das espécies da fauna e da flora, a manutenção dos equilíbrios ecológicos e a protecção dos recursos naturais, além de constituírem objectivos de interesse público de âmbito municipal, extravasam claramente esse âmbito e justificam medidas de protecção adequadas a uma zona que constitui património nacional.
Impôs-se, portanto a necessidade de reclassificação da APPSC em parque natural, atendendo aos critérios definidos no Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro, que estabelece a Rede Nacional de Áreas Protegidas.
Assim, o Parque Natural de Sintra-Cascais foi criado pelo Decreto Regulamentar n.º 8/94, de 11 de Março. Por seu turno, o Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais e o respectivo Regulamento foram aprovados pelo Decreto Regulamentar n.º 9/94, de 11 de Março. (…)»

Mais à frente, o preâmbulo refere ainda que a necessidade de revisão do POPNSC 94 assenta em três factores determinantes, a saber:
«A evolução do nível do conhecimento, nomeadamente pela monitorização e pelo acompanhamento promovidos pelos serviços do Instituto da Conservação da Natureza;
As transformações na área protegida resultantes da evolução demográfica e sócio-económica e a dinâmica natural de resposta dos sistemas naturais, que se revelam na menor adequação do Plano de Ordenamento aprovado em 1994;
Uma nova visão do Parque Natural de Sintra-Cascais decorrente de normativos e directrizes resultantes da Paisagem Cultural de Sintra - UNESCO (1995), dos Planos Directores Municipais de Cascais e de Sintra e da Rede Natura 2000. (…)».

Do transcrito resulta, como também já se observou, que ao longo de várias décadas têm vindo a ser tomadas sucessivas medidas no sentido de salvaguardar os recursos e valores naturais daquela zona.
Intenta-se, à “luz da experiência e dos conhecimentos adquiridos” (do preâmbulo da RCM n.º 1-A/2004) que a utilização daquele território seja sustentável com os valores a defender.

Este objectivo de utilização do território de forma sustentável com os valores a defender foi, pelo Regulamento do POPNSC, aprovado pela RCM n.º 1-A/2004, procurado, nomeadamente, pela divisão da área territorial abrangida pelo Plano em diversas áreas de protecção:
«Artigo 10.º
Âmbito
1 - A área territorial abrangida pelo POPNSC integra áreas prioritárias para a conservação da natureza, sujeitas a diferentes níveis de protecção e de uso.
2 - O nível de protecção de cada área é definido de acordo com a importância dos valores biofísicos presentes, e a sua delimitação encontra-se expressa na planta de síntese.
Artigo 11.º
Áreas de protecção
1 - A área abrangida pelo POPNSC integra as seguintes tipologias, ordenadas por ordem decrescente do nível de protecção das áreas onde se aplicam e cujos objectivos, actividades e restrições de uso se encontram previstos em secção própria:
a) Áreas de protecção total;
b) Áreas de protecção parcial:
i) Áreas de protecção parcial do tipo I;
ii) Áreas de protecção parcial do tipo II;
c) Áreas de protecção complementar:
i) Áreas de protecção complementar do tipo I;
ii) Áreas de protecção complementar do tipo II;
iii) Áreas de protecção complementar do tipo III.
2 - Nas áreas sujeitas aos níveis de protecção indicados no número anterior estão identificadas áreas de intervenção específica para o cumprimento dos objectivos referidos no artigo 25.º»

De acordo com a classificação atribuída a cada uma das áreas foram estabelecidos diversos condicionalismos, sendo que algumas destas áreas têm subdivisão classificativa, conforme decorre dos preceitos transcritos.
Na área de protecção total, mais exigente, a presença humana só é permitida em determinadas situações:
«Sem prejuízo do disposto no artigo 8.º, nas áreas de protecção total a presença humana só é permitida:
a) Por razões de investigação e divulgação científica;
b) Para monitorização ambiental e para a realização de acções de salvaguarda da área e dos interesses de conservação que levaram à sua classificação, a efectuar pelos órgãos do PNSC ou pelos proprietários e outros titulares de direitos reais destas áreas;
c) Em situações de risco ou calamidade.
Para além do disposto no artigo 9.º, nos casos referidos nas alíneas a) e b) do número anterior, a presença humana está sujeita a parecer vinculativo da comissão directiva do Parque Natural, excepto quando se reporte aos proprietários destas áreas» (art. 13.º)

A exigência diminui no caso das áreas de protecção parcial, a qual se subdivide em (i) áreas de protecção parcial do tipo I e (ii) áreas de protecção parcial do tipo II,
Contudo, as áreas de protecção parcial do tipo I «constituem espaços com restrições à edificabilidade» (art. 14.º n.º 2).
No caso das áreas de protecção parcial do tipo II, os valores a defender nestes espaços leva a que «… a intervenção humana e a alteração do uso do solo ou da água são submetidas a regimes de condicionamento, privilegiando-se a conservação da natureza e a gestão associada à zona tampão da Paisagem Cultural de Sintra, nomeadamente pela articulação com os órgãos competentes da Paisagem Cultural de Sintra/Património Mundial.
Admitem-se algumas formas de actividade humana relativas aos usos tradicionais do solo ou da água, designadamente o uso agrícola, florestal ou misto, de carácter temporário ou permanente, desde que constituam suporte dos valores naturais a proteger e que não promovam a sua degradação, ou seja, que se encontrem adaptados às características e à aptidão do território e à conservação dos valores naturais e das paisagens relevantes associadas a esses sistemas» (dos arts. 16.º nºs 6 e 7).

E ainda, com menor ou diferente exigência, as áreas de protecção complementar (art.s. 18.º a 24.º) e as áreas de intervenção específica (art.s 25.º a 28.º).

De todo o indicado, retira-se a ilação de que este instrumento de gestão territorial fundamenta a necessidade de diferentes tipos de zonamento mediante a identificação dos valores que cada uma das áreas tem de proteger e a identificação das respectivas restrições, graduando a exigência das restrições em função dos valores defender, tudo no respeito do artigo 4.º do DL 380/99.
De igual modo se apresenta a justificação para salvaguardar o território da pressão urbana que estava sujeito, no respeito do artigo 42.º, do mesmo.

Verifica-se, ainda, que este instrumento de gestão territorial é constituído e acompanhado por Regulamento, Planta síntese, Relatório, Carta de Condicionante e Peças gráficas (Habitats Naturais, Valores Florísticos e Valores Faunísticos) dando inteiro cumprimento ao exigido pelo artigo 45.º:

Por último, a necessidade de revisão do Plano decorreu de imposição normativa (artigo 5.º do D. Regulamentar 9/94, de 11.3), bem como, conforme se observou, de se pretender «assegurar, à luz da experiência e dos conhecimentos entretanto adquiridos sobre o património natural da Área, uma melhor adequação do Plano de Ordenamento aos objectivos que levaram à criação do Parque Natural de Sintra-Cascais, equacionar as utilizações actuais do solo face aos valores em presença e a necessária reavaliação das propostas de ocupação do solo, reavaliar as disposições relativas às áreas de ambiente rural, no contexto da avaliação dos valores sociais, económicos e ambientais em presença, no sentido de conter a edificação dispersa, ajustar os limites das classes e categorias de espaço e, por último, clarificar as normas constantes do Regulamento do Plano, evitando dúvidas de interpretação que conduzam à sua deficiente aplicação.» (preâmbulo da RCM n.º 1-A/2004).
Não se revela, assim, qualquer infracção do artigo 98.º, n.º 1, do DL 380/99.

2.2.9.3. Inserido no quadro geral da alegada violação do princípio da proporcionalidade, sustenta a Autora, concretamente, que a “flora relevante é composta apenas por duas espécies, das quais uma delas não se encontra na Directiva de Habitats (Armeria welwilschii), e a segunda apenas foi identificada em quatro pontos no terreno (Verbascum litigiosum).” (al. b) do art. 369 da p.i.). Pelo menos, «cerca de 30 hectares da propriedade encontra-se fora do Sítio de Interesse proposto para Sintra-Cascais (PTCON0008) pelo Instituto da Conservação da Natureza” o que revela inequivocamente o “menor interesse ambiental dessa parcela” e contradiz as integrais as integrais exigências de protecção que decorrem do POPNSC.» (al. c) do art. 369 da p.i.). “O levantamento efectuado no terreno (…) evidencia a existência de um conjunto de espécies invasoras (chorão e acácia) (…) presentes na zona do terreno o que desvaloriza significativamente o real valor ecológico local -, que tem vindo a aumentar nos últimos anos chegando agora a atingir 87 hectares, isto é, 33,5% dos terrenos da A……” ((al. c) do art. 369 da p.i.).

Vejamos.

2.2.9.4. O Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de Abril, que revê, entre o mais, a transposição para ordem jurídica interna da Directiva n.º 92/43/CEE, do Conselho, de 21 de Maio (relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagem) estabelece, no artigo 7.º, com a epígrafe “Planeamento e ordenamento”:
“1 - A totalidade ou a parte dos sítios da lista nacional referidos no n.º 1 do artigo 4.º e os sítios de interesse comunitário e as ZEC referidos, respectivamente, nos nºs 1 e 2 do artigo 5.º, que se localizem dentro dos limites das áreas protegidas classificadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro, ou de legislação anterior, ou das ZPE, criadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 75/91, de 14 de Fevereiro, ficam sujeitas ao regime previsto nos respectivos diplomas de classificação ou criação da área protegida e de criação da ZPE.
2 - A totalidade ou a parte das ZPE criadas ao abrigo do presente diploma que se localizem dentro dos limites das áreas protegidas classificadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro, ou de legislação anterior, ficam sujeitas ao regime previsto nos respectivos diplomas de classificação ou criação da área protegida.
3 - (…).
(…).
10 – (…).”

O preceito acima transcrito estabelece que nas áreas classificadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 19/93 (que estabelece a Rede Nacional de Áreas Protegidas) a protecção das espécies, de fauna e flora, e habitats naturais fica sujeita ao seu regime próprio.
A Autora sustenta que as espécies existentes no seu terreno são a Armeria welwilschii e o Verbascum litigiosum, referindo que a primeira não se encontra na Directiva e a segunda apenas foi identificada em quatro pontos deste terreno.
Ora, a Armeria welwilschii é uma planta endémica cuja protecção decorre do estipulado no artigo 2.º, n.º 2, al. f), da RCM n.º 1-A/2004 («Promover a conservação e a valorização dos elementos naturais da região, desenvolvendo acções tendentes à salvaguarda da fauna, da flora, nomeadamente a endémica, e da vegetação, principalmente terrestre climácica, bem como do património geológico e paisagístico»).
Relativamente ao Verbascum litigiosum o Relatório refere que se trata de uma «Espécie Vulnerável segundo a “Lista de Espécies Botânicas a Proteger em Portugal Continental” (SNPRCN, 1990) e segundo a publicação “Plantas a Proteger em Portugal Continental” (Dray, 1985).
Foi proposta a atribuição de estatuto de ameaça no âmbito da elaboração do Livro Vermelho das Plantas de Portugal.» (pág.220).
Ainda, na mesma página do Relatório refere-se que a protecção desta espécie está prevista nos Anexos II e IV da Directiva Habitats.
O Relatório no item “Estatuto no PNSC” classificou esta planta como: “Espécie rara e ameaçada” (pág.220).
Continua referindo que os factores de ameaça são “semelhantes às restantes espécies do litoral. Verificou-se que a construção no litoral determinou a redução da área ocupada pela espécie em alguns núcleos populacionais. O pisoteio foi responsável pela redução das populações da Adraga e poderá também ter sido responsável pelo seu desaparecimento na zona do Abano.” (pág.221).
As medidas de conservação propostas para incluir no Plano de Ordenamento consistem “na manutenção da classificação das áreas de ocorrência e áreas adjacentes como áreas non aedificatii. Ordenamento de actividades de ar-livre e de todo-o-terreno como forma de prevenir situações de pisoteio.
Proibição da abertura de novas estradas e caminhos nas áreas de ocorrência.” (pág. 221).
Para o caso em análise, interessa, ainda, referir que o Relatório sustenta que «quanto a protecção da flora, as manchas mais importantes para a conservação da biodiversidade localizam-se no troço Sul do Parque designadamente Abano, Guincho até Oitavos, onde suportam populações de espécies com estatuto de ameaça, designadamente Omphalodes kuzinskyanae e Verbascum litigiosum (…)» (na pág. 142).
A conclusão que, desde já, se pode retirar do exposto é a de que a construção e o pisoteio são factores de ameaça não só para estas duas espécies mas também para as demais espécies existentes no litoral, conforme refere o Relatório.
Assim, para restabelecer/manter as manchas destas espécies de flora o Relatório reclassificou determinadas áreas, designadamente, as áreas preferenciais para turismo e recreio, de modo a remover os factores de ameaça nos polígonos que no caso interessam, da seguinte forma:
“Polígono de Oitavos - Reclassificados em áreas de protecção total nas áreas onde se incluíam habitats classificados como prioritários no âmbito da Directiva Habitats, e reclassificados em Áreas de Protecção Parcial Tipo I, no caso de ocorrerem habitats não prioritários. Esta opção permitirá ainda conservar o habitat de Verbascum litigiosum, espécie ameaçada presente na zona das dunas do Guincho, a área de ocorrência potencial de Omphalodes kuzinskyanae (Miosótis-das-Praias) (extinto recentemente no local), e Armeria welwilschii, endemismo lusitano/ Polígono do Abano, correspondente à área do Hotel, reclassificado em Áreas de Protecção do Tipo I, que conjuntamente com a classificação da encosta adjacente até ao mar, permitirá a conservação do melhor núcleo de Omphalodes kuzinskyanae (miosótis-das-praias), que contém mais de 90% da população desta espécie em risco crítico de extinção, diminuindo a pressão antrópica sobre o litoral adjacente.” (pág. 354).
Estes são alguns dos fundamentos técnicos em que, no segmento da flora, se alicerçou a RCM n.º 1-A/2004 para definir os diferentes tipos de zonamento, por ordem decrescente do nível de protecção, os quais visam proteger não só as áreas de ocorrência como também as áreas adjacentes dos factores de ameaça a que essas espécies estavam sujeitas.

2.2.9.5. Ainda no âmbito da flora do Parque Nacional Sintra Cascais, a Autora refere que «cerca de 30 hectares da propriedade encontram-se fora do Sítio de Interesse proposto para Sintra-Cascais pelo Instituto da Conservação da Natureza» o que revela inequivocamente o «menor interesse ambiental dessa parcela» (art. 369, c) da pi).

Vejamos.
Advirta-se, preliminarmente, que neste segmento de invocação a Autora descuida de um problema que também suscita, noutra vertente, da falta de participação precedendo a RCM n.º 142/97, de 28/08, que aprovou a lista nacional de sítios (1.ª fase). A invocação, agora, apropria-se da própria proposta de sítio constante da Resolução, independentemente da sua bondade.
E é nesse quadro que se deve analisar.

Retomando, pois, a RCM n.º 142/97 foi elaborada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 226/97, de 27/08, cujos artigos 3.º e 4.º se transcrevem:
«Artigo 3.º
Lista nacional de sítios
1 - O Instituto de Conservação da Natureza (ICN) elaborará uma proposta de lista nacional de sítios, indicando os tipos de habitats naturais do anexo I e as espécies do anexo II que tais sítios incluem, de acordo com os critérios previstos no anexo III do presente diploma, que dele faz parte integrante.
2 - A lista referida no número anterior é aprovada por resolução do Conselho de Ministros, podendo ocorrer pela mesma forma a desclassificação de qualquer sítio, sempre que a evolução natural assim o justifique.»

«Artigo 4.º
Planeamento e ordenamento dos sítios
1 - As áreas da lista nacional de sítios que se localizem dentro dos limites das áreas classificadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro, ou de legislação anterior, ou das zonas de protecção especial (ZPE), criadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 75/91,de 14 de Fevereiro, ficam sujeitas ao regime previsto nos respectivos diplomas de classificação ou criação.
(…)».

Note-se que o Decreto-Lei 226/97, de 27/08, foi revogado pelo supra citado Decreto-Lei n.º 140/99, de 24/04, que, no seu artigo 7.º, manteve o mesmo regime do artigo 4.º do diploma de 1997.
Ora, da alegação da Autora há que sublinhar que, desde logo, aceita que parte da sua propriedade se integra no Sítio de Interesse proposto para Sintra-Cascais pelo Instituto da Conservação da Natureza. O que desde logo indicia o seu interesse ambiental.
Já o contrário, a alegada exterioridade de cerca de 30 hectares dessa propriedade em relação a esse sítio não é imediatamente revelador de menor interesse, e de qualquer modo não é revelador de falta de interesse.
Como se tem vindo a discorrer (veja-se em particular, supra, o ponto 2.2.8.1.B), o interesse ambiental das áreas integrantes do Parque assenta em diversos factores, designadamente florísticos, paisagísticos, geomorfológicos, habitats naturais, de entre outros, não se limitando, naturalmente, ao que decorre da inserção dos sítios da lista de Sítios.
O regime dos parques naturais é um regime próprio.
Ora, não oferece dúvida, como já vimos, que a RCM n.º 1-A/2004 define diferentes tipos de zonamento, por ordem decrescente de nível de protecção. Há pois diferentes níveis de interesse ambiental, não revelando aquela alegada parcial exterioridade qualquer erro na protecção estabelecida.

2.2.9.6. Finalmente, a Autora sustenta «a existência de um conjunto de espécies invasoras (chorão e acácia) (…) presentes na zona do terreno o que desvaloriza significativamente o real valor ecológico local».
Sobre essa problemática, o Relatório reconhece, que «a expansão dos povoamentos de espécies de acácias originárias da Austrália constitui actualmente um dos problemas mais graves para o Parque Natural Sintra-Cascais no que respeita à conservação da flora, da fauna e dos habitats naturais. Devido à sua capacidade invasora ocupam vastas áreas do Parque, ocorrendo, frequentemente, em formações extremes»”. Reconhece, ainda, que «nas áreas do litoral, sobretudo na zona Sul do Parque, o Chorão (Carboptotus edulis) é a espécie invasora mais espalhada, ocupando, actualmente, algumas centenas de hectares» (pág. 184).
Na verdade, essas espécies invasoras causam efeitos adversos à fauna, flora e habitats naturais do Parque Natural Sintra-Cascais.
Mas esse reconhecimento não colide com reclassificação operada pelo POPNSC, tendente a obstaculizar ainda outros factores de ameaça.
Na verdade, é de aceitar, com o Relatório, que «No século XX salientou-se a expansão das áreas urbanas, actividades frequentemente ligadas ao turismo ou à construção de segunda habitação. A expansão dos núcleos urbanos afectou mais intensamente a zona Norte do Parque, salientando-se neste aspecto o eixo Sintra – Praia das Maçãs e a expansão da vila de Cascais.
O incremento das actividades ligadas ao turismo determina a ocorrência de vários tipos de pressões sobre os ecossistemas naturais tem consequências negativas na flora. Neste aspecto salientam-se:
O recente incremento das actividades ao ar-livre, incluindo desportos de natureza, gerando localmente níveis de pisoteio incompatíveis com a conservação da flora.
Os elevados níveis de visitação de alguns locais originando pisoteio intenso e alterações edáficas (nomeadamente nitrificação dos solos) em áreas importantes para a conservação da flora.
Por último, saliente-se a ocorrência periódica e frequente de fogos, facto que tem tido consequências negativas, nomeadamente (…)» (pág. 185).

2.2.9.7. Ainda no quadro da alegada violação do princípio da proporcionalidade, a Autora sustenta, sobre a fauna, que a «existente nos terrenos é escassa e de pouco ou nenhum interesse ecológico, facto, que, aliás, também é assumido pelo Parque Natural« (al. a) do art. 369 da p.i.).
Ora, no Relatório refere-se a propósito deste segmento que «as zoocenoses do Parque Natural Sintra-Cascais apresentam alguns aspectos particulares que lhe conferem não apenas um valor particular, mas também características de grande sensibilidade». (pág. 233).
E procede ao elenco dos diferentes itens que integram o factor de ameaça, a saber: a perturbação directa, o atropelamento, a degradação biótica, a fragmentação de habitat e isolamento populacional e perseguição directa (págs. 233 a 237).
Referindo, a propósito da perturbação directa, que «resulta do impacte visual e do ruído gerado pela presença humana. Usualmente, as espécies reagem a este tipo de interferências afastando-se das áreas que ocupam para áreas menos adequadas à sobrevivência. (…)» (pág.233).
Apesar da área onde se insere a propriedade da Autora não ser qualificada (cfr., no processo instrutor, Carta dos Valores Faunísticos, integrada numa Pasta sem numeração ou identificação autónomas, onde constam as diferentes Cartas relativas ao POPNSC) neste segmento, tal não significa qualquer erro na tipologia que lhe foi atribuída, na medida em que é o seu enquadramento global que releva naquela classificação.

2.2.9.8. Finalmente, a Autora, ainda no quadro da violação do princípio da proporcionalidade, refere que «a dinâmica dunar inicia-se e desenvolve-se essencialmente fora da propriedade da A……, nomeadamente na zona de praia e dunas, na zona de passagem e na zona de acumulação, dominantemente na zona de Cresmina. Assim, a zona da propriedade, tal como uma parte da Quinta da Marinha, é referida como zonas de dunas isoladas e de dunas parabólicas, onde a dinâmica dunar é muitíssimo atenuada». (alínea f) do art. 369 da p.i).
No Relatório, a esse propósito, é referido que o sistema dunar Guincho-Oitavos, designado por «“Corredor Eólico” (ROXO et. al., 1978) ou “Headland bypass dunefield” – são as designações dadas a este tipo de sistema dunar, uma vez que a areia entra no continente num ponto da costa, migra sobre uma plataforma rochosa consolidada e regressa novamente ao mar, num local diferente (REBÊLO, 1998, 2002; REBÊLO et. al., 2002, TINLEY, 1985), (…). O corredor dunar assim estabelecido recebe areia proveniente das praias do Guincho e da Cresmina e sai na linha de costa compreendida entre Oitavos e a Guia. A configuração deste sistema dunar depende fundamentalmente da variação da quantidade de vegetação e areia disponível para transporte, sendo grandemente condicionado pelas variações de energia ocasionadas pelo regime de ventos. A análise de fotografias aéreas num período compreendido entre 1944 e 1995 permitiu verificar grande variação no volume de areia no sistema, sendo o acréscimo desse volume a tendência actual da dinâmica desse corredor dunar (REBÊLO, 1995). Por sua vez, a observação de ortofotomapas relativos ao ano de 2000 não parece contrariar essa tendência. No que diz respeito à duna móvel da Cresmina, estudos levados acabo por REBÊLO et. al. (2002) permitiram concluir acerca de acréscimo de volume de areia nesta formação, associada a um transporte eólico direccionado de NNW para SSW.» (pág. 63).
No último parágrafo da pág. 63, o Relatório refere que o sistema dunar em apreço constitui «… um dos corredores dunares mais notáveis da Europa. (…)»
O Relatório, na parte atinente à «Dinâmica e estado actual do sistema», diz que «…a dinâmica dos sistemas dunares relaciona-se profundamente com o coberto vegetal existente (…). No caso concreto desta formação dunar, e para iguais condições associadas ao factor “vento”, a configuração do sistema depende fundamentalmente da variação da quantidade de vegetação e areia disponível para transporte, (…) (pág.66).
Mais adiante, no caso da duna móvel de Cresmina, o Relatório refere que «… estudos de monitorização levadas a cabo por REBÊLO et. al. (2002) permitiram concluir acerca da continuidade do avanço para sul desta duna entre os anos de 2000 e 2001, tendo-se conseguido estimar um input de areia no sistema superior à remobilização de areia já existente para sul (…).» (pág. 68).
Relativamente aos ambientes dunares no corredor do Guincho-Oitavos, o Relatório frisa que «a zonagem representada na Figura 25 tem como factores subjacentes a variação da quantidade de vegetação e areia disponível para transporte podendo e devendo constituir uma base para a gestão espacial das medidas de conservação a aí adoptar. Assim, podem ser estabelecidos, de norte para sul, quatro ambientes dunares principais: 1 – Zona de alimentação; 2 – Zona de passagem; 3 – Zona de acumulação e 4 – Zona de dunas isoladas (…) (REBELO et. al., 2002)». (págs. 69, 70 e 71).
Relativamente à metodologia e critérios para o estabelecimento das áreas de protecção total o Relatório refere que «o registo cartográfico do sistema dunar do Guincho-Oitavos (item de legenda “corredor dunar” no mapa da Figura 26) teve como base o trabalho efectuado por REBÊLO (1995). Por seu turno, o estabelecimento das áreas de protecção total teve como critérios a dimensão espectacular deste fenómeno natural e o seu elevado risco de degradação, risco esse associado à instabilidade característica deste corredor dunar. Convém igualmente referir que as referidas zonas permitem reconstruir a sucessão de diferentes formações - dunas móveis e semifixas - que integram um sistema dunar.
Outra base de informação para o estabelecimento das zonas de protecção em questão foi a análise de ortofotomapas do Concelho de Cascais para o ano 2000, a qual permitiu detectar tanto alguns sinais como alguns factores de conservação ou de degradação deste tipo de formação geológica. São exemplos desses sinais as manchas de vegetação correspondendo a dunas móveis ou semifixas, grandes depósitos de areia acumulada, dunas parabólicas, e áreas construídas ou queimadas. A presença de qualquer destes sinais foi confirmada no terreno.
Outro aspecto que foi tido em consideração na cartografia elaborada baseou-se no facto de estar previsto que estas áreas de protecção total sejam objecto de intervenções humanas no sentido de promover a conservação da natureza. Assim, no caso concreto do corredor dunar Guincho-Oitavos, parte de cada uma das áreas de protecção total poderá e deverá ser objecto de intervenções tais como instalação de sebes artificiais, plantação de vegetação ou extracção criteriosa de areias». (pág. 71).
Por último, o Relatório elenca os factores de ameaça nas áreas de protecção total evidenciando, de entre outros, «a introdução sem critérios de barreiras artificiais, o pisoteio das dunas, onde se inclui a circulação de veículos todo-o-terreno e cavalos, tem consequências nefastas em termos de fixação de areias e as extracções de areia mal conduzidas». (pág. 73).

Importa realçar os diversos levantamentos efectuados ao longo de várias décadas deste fenómeno natural, com o intuito de verificar a necessidade de alterar os critérios de reclassificação da área onde se encontram.
De igual forma, importa sublinhar que, das figuras acima referidas, constantes do Relatório, maxime figura 26, o corredor dunar desenvolve-se para sul, no sentido da propriedade da Autora.
Aliás, a Autora reconhece a existência de uma dinâmica dunar no seu terreno, embora de forma muito atenuada, mas o facto de essa dinâmica ser atenuada não implica que não deva ser protegida.
Mais, no caso concreto, a área onde se insere a propriedade da Autora evidencia a existência, nomeadamente, do habitat natural 2270 ao qual foi atribuído um valor excepcional e do habitat natural 2260 ao qual foi atribuído um valor elevado (cfr., no processo instrutor, Carta dos Habitats Naturais integrada na Pasta supra referida, 2.2.9.7.), de zonas dunares que importa salvaguardar.
E pretende-se, para defender o corredor dunar reverter o desequilíbrio que a acção do homem já originou relativamente ao coberto vegetal (cfr. pág. 74 do Relatório).
Para alcançar esse objectivo, o Relatório (na mesma página), apontou as seguintes medidas de gestão:
«Medidas de protecção: Visam controlar os impactos humanos no sistema, nomeadamente:
Interdição de ampliação de estruturas associadas ao restaurante Muchacho;
Interdição da circulação de pessoas, cavalos viaturas todo-o-terreno dentro das áreas em referência;
Desactivação do troço da E.N. 247 correspondente à transição da zona de alimentação para a zona de passagem.
Medidas de recuperação: Visam criar condições para controlar a migração das areias, quer possibilitando um acréscimo de cobertura vegetal nas formações dunares (…) quer procedendo à remoção de areias nos locais onde tal venha a considerar-se necessário. Como a deslocação se faz Norte-Sul, toda a areia que sair das referidas áreas deverá ser removida (…)»
Assim, e à semelhança do que já se referiu a propósito de outros segmentos já analisados, o que releva é defender a preservação destes fenómenos, no seu todo, dado que a fragilidade dos seus equilíbrios é indubitável.

2.2.9.9. De todo o exposto, resulta que não se vislumbra estar violado o princípio da proporcionalidade em qualquer das suas vertentes.
Como se viu, o ordenamento do território através de diversos tipos de planos e da criação de reservas e parques naturais é um meio adequado para garantir o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado (art. 66.º da Constituição).
A revisão do POPNSC teve em vista, exactamente, corresponder «de modo mais eficaz ao desiderato de proteger os valores ambientais, paisagísticos e histórico-culturais do Parque Natural de Sintra-Cascais e de definir o adequado enquadramento jurídico da gestão territorial que promova a necessária compatibilização entre esses valores e as actividades humanas» (do preâmbulo da Resolução 46/2000). E esse desiderato foi assumido pela Resolução 1-A/2004.
As medidas adoptadas no plano, nomeadamente através das diferentes tipologias e zonamentos, com a consequente diversidade de restrições que implicam na actividade que nas respectivas áreas pode ser desenvolvida, aparecem como ajustadas aos objectivos traçados.
As diversas tipologias e zonamentos foram objecto da justificação, não havendo razão para duvidar que as restrições foram graduadas em função dos valores que se visa proteger, sem se vislumbrar que tenham ido além do mínimo necessário.
Como se disse, naturalmente que as mutações da realidade física determinam alteração na realidade jurídica e não se descortina que essas alterações tenham superado, nas restrições impostas, o mínimo necessário.
Também, como se observou inicialmente, o Regulamento aprovado pela Resolução 1-A/2004 intentou o melhor equilíbrio entre os benefícios que se espera obter com o plano e seu regulamento e os custos, nomeadamente para interesses particulares, contendo, por isso, um regime transitório, para titulares de certos direitos (artigo 43.º).
A pretensão de ver algum exagero na integração de terrenos da Autora em área de certa tipologia, nomeadamente por alegada falta de valia ecológica excepcional, decorrerá de uma visão centrada no particular, mas que não atende ao geral, isto é, ao facto de que o presente plano e regulamento obedeceram à verificação de uma multiplicidade de segmentos que interagem. Foi a multiplicidade desses segmentos que foi objecto de discussão e análise em todo este ponto 2.2.9, não havendo lugar, agora, à sua repetição.

2.2.10. Alegado desvio de poder
Alega a Autora que «o motivo que realmente determinou as soluções vertidas no POPNSC, de 2004, para a zona do Cabo Raso não residiu numa análise objectiva e científica dos valores naturais a preservar, nem numa ponderação adequada entre estes valores e os direitos adquiridos a salvaguardar, mas sim na pressão de movimentos ambientalistas, com projecção na comunicação social e na opinião pública, e que poderiam afectar a imagem do Parque» (artigo 403 da p.i.).

A Autora sustenta-se, essencialmente, nas conclusões efectuadas no Relatório relativamente à análise da imprensa, de onde destaca o seguinte trecho: «“em relação ao POPNSC, e baseando-se nas posições assumidas pelas entidades com acesso aos meios de comunicação social, em termos de percepção pública da sua eficácia e de aspectos a corrigir em sede de revisão, destacam-se as críticas ao anterior plano por ser demasiado permissivo, permitindo a construção em locais com importantes valores naturais e paisagísticos. Críticas essas que surgiram na sequência, sobretudo dos processos de Abano e do Raso (pág.296)”». (artigo 402 da p.i.) [Note-se que há um lapso material na referência da pág. 296. O trecho citado pela Autora está inserto nas págs. 371 e 372, do Relatório].
A Autora conclui que o exposto «indicia a existência de um verdadeiro vício de desvio de poder do POPNSC de 2004» (artigo 404 da p.i.).

Atentemos.

O Relatório procedeu, na «Análise de Imprensa», ao elenco das referências ao PNSC, integrando-as em várias categorias temáticas e desenvolvendo cada um delas.
Esse trabalho de análise culminou no ponto «5.5.2.4 Conclusões»:
“No que respeita aos níveis de notoriedade do PNSC, entendendo-se notoriedade como o conhecimento que existe do Parque, já foi referido que estes têm, à partida, condições para serem elevados, dado o número também elevado de referências na imprensa. Assim sendo, conclui-se que, pelo menos para os cidadãos com acesso aos jornais da região, dificilmente o PNSC poderá constituir uma entidade desconhecida.
Porém, uma coisa é a notoriedade, outra bastante diferente será (ou poderá ser) a imagem junto da opinião pública que, em virtude do que foram os temas dominantes das referências na imprensa, não será muito positiva. De facto, a maioria dos assuntos a que o PNSC se viu associado eram, como foi possível verificar, situações problemáticas. Alguém que conheça o PNSC apenas pelo que foi referido na imprensa, terá, até porque são os aspectos negativos que normalmente têm mais impacto na comunicação social, deste Parque Natural a ideia de uma instituição marcada por polémicas, alterações frequentes nos seus órgãos de gestão, alguma permissividade na actuação, regulamentos ineficientes, intensas pressões para a ocupação do espaço por habitação ou projectos turísticos, degradação dos seus principais valores e alguma falta de aceitação por parte da sociedade, face ao que são as constantes críticas das ONG’s com intervenção no local e da população em geral. Porém, até por tudo isto, ficará também com a ideia de que se trata de uma área com enormes valores e potencialidades, daí suscitar tantas paixões, quer pelos que o defendem como pelos que o vêem como um obstáculo à sua actuação.
Como de cada situação de crise se pode sempre criar uma oportunidade, há a destacar o facto de que, partindo dos (prováveis) elevados níveis de notoriedade do PNSC mais fácil se tornara reverter esta imagem a partida não multo positiva junto da opinião pública. Depois de uma entidade se tomar conhecida, tem uma boa parte do trabalho realizado, “bastando” então delinear estratégias de promoção e divulgação - e de relacionamento com os cidadãos - conducentes a uma melhoria da sua imagem e a uma melhor explicitação dos seus objectivos e prioridades de actuação. Isto porque a polémica também aguça a curiosidade e, portanto, há que aproveitar essa vontade de ouvir falar do PNSC, mas canalizá-la para assuntos de cariz mais positivo.
Critica-se o Parque por não fazer, ou fazer mal, mas, em última análise, este facto vem revelar que se olha para e Parque como uma entidade com legitimidade para actuar e que poderá contribuir para a valorização da área, afirmando o seu papel marcante.
É necessário procurar outras formas de relacionamento com a comunicação social e com os cidadãos, promovendo um maior conhecimento do Parque, seja em termos da área abrangida, valores que existem para preservar e comportamentos que é necessário adoptar. Isto porque não basta impor limitações, é preciso explicar as razões porque tal é feito e, sobretudo, apresentar compensações. É necessário explicar às pessoas que viver num Parque Natural constitui um privilégio e não um castigo, e que a conservação da natureza também pode ser lucrativa, pela promoção que faz de um local, das suas gentes e dos seus modos de vida. Para além de que as populações locais constituem os melhores aliados para a prossecução dos objectivos do Parque.
A comunicação social poderá constituir um dos melhores aliados para a transmissão destas mensagens, porém, o Parque terá de fazer um esforço neste sentido, por exemplo através da promoção de iniciativas - e sua divulgação junto da o comunicação social - ou associando-se a outras que normalmente despertam o interesse destes meios, e em que o Parque poderá aparecer perante a população residente e visitantes de uma forma positiva. Entre estas situações, encontra-se por exemplo a possibilidade de uma maior participação nas inúmeras actividades desportivas e culturais que se realizam no seu território.
O impacto das iniciativas promovidas ou patrocinadas pelo PNSC não tem sido, até á data, muito assinalável. Entre os assuntos que mereceram algum destaque na imprensa encontram-se, sobretudo, algumas questões ligadas à conservação/recuperação da natureza e a acções de sensibilização; assuntos aos quais os jornais consultados têm dado alguma atenção.
O posicionamento, por parte dos agentes com intervenção na área, em relação ao Parque, foi já antes devidamente abordado, pelo que o que urge destacar é o aproveitamento - que se poderá fazer da sua actuação para a prossecução dos objectivos do PNSC.
Em relação ao Plano de Ordenamento do PNSC, e baseando-nos nas posições assumidas pelas entidades com acesso aos meios de comunicação social, em termos de percepção pública da sua eficácia e de aspectos a corrigir em sede de revisão, destacaram-se as críticas ao anterior plano por ser demasiado permissivo, permitindo a construção em locais com importantes valores naturais e paisagísticos. Críticas estas que surgiram na sequência, sobretudo, dos processos do Abano e do Raso, mas também da expansão urbanística verificada em algumas áreas litorais e, de uma forma geral, da construção dispersa em áreas rurais. De forma paralela, foi muitas vezes referido que o anterior plano tinha uma filosofia que assentava, sobretudo, no controlo da construção (embora não tenha sido muito eficaz neste particular), devendo o novo plano assentar numa lógica mais positiva, i.e., criando regulamentações não a pensar em impedir algo mas antes em proteger/valorizar o que necessita de protecção/valorização. A Adega Regional de Colares, por exemplo, sugere a necessidade de incluir as áreas de vinha no novo Pano de Ordenamento, encarando o PNSC, s sua regulamentação, como um garante da preservação do seu produto.” (págs. 371, 372 e 373).
Nada da Análise, designadamente das Conclusões, permite afirmar que o que está subjacente ao plano e regulamento é algo diferente do que neles é declarado. E de maneira nenhuma permite inferir que se tratou de submissão a pressão exterior.
Dir-se-ia, se fosse necessário, que, ao invés, a Análise realizada permite detectar que se perspectivou, sim, a possibilidade de fazer pender para o lado da protecção do Parque e dos interesses e objectivos que lhe subjazem a comunicação social e a opinião pública: «A comunicação social poderá constituir um dos melhores aliados para a transmissão destas mensagens, porém, o Parque terá de fazer um esforço neste sentido, por exemplo através da promoção de iniciativas».
A interpretação inversa realizada pela Autora não tem, assim, razão de ser.

2.2.11. Alega a A. que da elaboração do POPNSC não consta qualquer referência à propriedade privada do solo – e aos direitos adquiridos dos proprietários – desconsiderando em absoluto estes direitos nas regras sobre a respectiva ocupação.
Quanto aos direitos adquiridos, não é verdade.
Como repetidamente tem sido salientado, o artigo 43.º do Regulamento do POPNSC salvaguarda direitos adquiridos.
E a coligação do direito de propriedade ao direito irrestrito de construir não é adequada. Nem, aliás, a Autora a defende, verdadeiramente. De outro modo não cuidava de sustentar-se em direitos reconhecidos pelas entidades administrativas, e não mera e directamente no seu direito de propriedade.
De qualquer maneira, reiterando o que já se mencionou, sempre se dirá que é abundante a jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido da não integração do direito de construir no direito de propriedade. Ela foi renovada, por exemplo, no ac. de 14.3.2006, rec. 762/05, que, com indicação de precedentes arestos quer deste Tribunal quer do Tribunal Constitucional, sintetizou: «[…] o já referido "jus aedificandi" não se inclui no direito de propriedade privada, a que se refere o artº 62º da CRP, sendo antes o resultado de uma atribuição jurídica pública decorrente do ordenamento jurídico urbanístico pelo qual é modelado. Por isso, os poderes de uso, fruição e disposição em que o direito de propriedade se manifesta só podem ser exercidos se se contiverem dentro dos limites de tal modelação e respeitarem as restrições por ela impostas».

E não se olvidará que mesmo entre aqueles que dão resposta positiva à questão da integração do direito de edificar no direito de propriedade se observa que não negam que o direito de construir conhece limites, ainda que durante muito tempo tivessem sido pouco expressivos: «É todavia difícil imaginar, desde o Direito Romano, que tenha sido admitida a construção sem quaisquer limites. Alguns terão sempre existido, pelo menos os resultantes da vizinhança. De facto em todas as épocas, vemos no nosso sistema jurídico o Poder interferir na faculdade de construção do proprietário. O que quer dizer que essa faculdade sempre teve limites» (José de Oliveira Ascensão, O Urbanismo e o Direito de Propriedade, em “Direito do Urbanismo”, INA 1989, pág. 321).
Aliás, na linha, em qualquer caso, da possibilidade de regulamentação da utilização dos bens, veja-se, por exemplo, o artigo 17.º, n.º 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, Carta que intenta, nomeadamente, plasmar direitos que decorrem das tradições constitucionais dos Estados Membros: «[…] A utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral».
E já antes (1952) o artigo 1.º do Protocolo Adicional n.º 1 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem: «Qualquer pessoa singular ou colectiva tem direito ao respeito dos seus bens. Ninguém pode ser privado do que é sua propriedade a não ser por utilidade pública e nas condições previstas pela lei e pelo direito internacional./ As condições precedentes entendem-se sem prejuízo do direito que os Estados possuem de pôr em vigor as leis que julguem necessárias para a regulamentação do uso dos bens, de acordo com o interesse geral, ou para assegurar o pagamento de impostos ou outras contribuições ou multas».

Decorre que não se descortina que o Regulamento do POPNSC tivesse que conter algo expressamente sobre a propriedade privada, nomeadamente sobre o direito de edificar dos seus titulares, para além do que fez, particularmente, na salvaguarda de direitos adquiridos; e sendo, conforme já se disse, uma regulamentação dinâmica, não há impedimento para, na defesa do interesse público relevante, se tornar mais exigente/selectiva a classificação das zonas/terrenos, mesmo que, desse modo, se inviabilize a construção nos mesmos.

2.2.12. Alegada violação do direito de participação dos interessados
Alega a A. a violação deste princípio essencialmente pelas seguintes razões:
«a) Desde logo, o artigo 5.º, alínea f), da Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, estabelece que a participação dos interessados constitui um princípio geral da política de ordenamento do território;
b) Este princípio é concretizado no artigo 21.º da mesma Lei, que prescreve a sujeição dos instrumentos de gestão a “prévia apreciação pública”, e submete a respectiva elaboração e aprovação a “mecanismos reforçados de participação dos cidadãos, nomeadamente através de formas de concertação de interesses”.
c) Estas disposições são concretizadas no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, que prevê o direito dos cidadãos e das pessoas colectivas de “participar na elaboração, alteração, revisão, execução e avaliação dos instrumentos de gestão territorial” e vincula as entidades administrativas planificadoras “ao dever de ponderação das propostas apresentadas, bem como de respostas fundamentadas aos pedidos de esclarecimento formulados”.
d) Por sua vez, o artigo 48.º, n.º 5, do referido Decreto-Lei n.º 380/99, concretiza este direito de participação dos interessados em relação aos planos especiais de ordenamento do território estabelecendo que “a entidade pública responsável ponderará as reclamações, observações, sugestões e pedidos de esclarecimento apresentados pelos particulares, ficando obrigada a resposta fundamentada perante aqueles que invoquem designadamente, (…) a eventual lesão de direitos subjectivos”. O n.º 6 desta norma esclarece que “a resposta referida no número anterior será comunicada por escrito aos interessados” e o n.º 7 prescreve mesmo que sempre que necessário ou conveniente, a entidade pública responsável promoverá o esclarecimento directo dos interessados.”» (do artigo 410 da p.i.).
Segundo a A. essas disposições foram claramente violadas, uma vez que foi desrespeitado o direito de participar em todo o procedimento conducente ao POPNSC de 2004 (artigo 411 da p.i.).
Refere ainda que a violação do direito de participação da A……, SA remonta aos procedimentos destinados à aprovação da Lista Nacional de Sítios da Rede Natura pela RCM n.º 142/97, de 28/08, (artigos 412 e 413 da p.i.).
Alega, ainda, que «a entidade pública responsável pela elaboração do POPNSC não só não ponderou as reclamações, observações e pedidos de esclarecimento formulados pela A……, S.A. como não lhe deu qualquer resposta fundamentada» (do artigo 424 da p.i.)

Vejamos.

2.2.12.1. Preliminarmente, diga-se que não há lugar a emitir pronúncia sobre a alegada violação do direito de participação da Autora nos procedimentos destinados à aprovação da Lista Nacional de Sítios da Rede Natura pela RCM n.º 142/97.
É que esses procedimentos e essa Resolução não integram o âmbito do presente processo, não bastando a sustentação de que ainda nela se alicerça a Resolução n.º 1-A/2004. Todos os vícios decorrentes dessa falta de participação, nomeadamente qualquer discordância quanto à lista de sítios que pudesse ser relevante para esta última (de 2004) haveriam e poderiam ser aqui directamente indicados com alegação do erro, debilidade ou prejuízo carentes de emenda.
A participação no procedimento atinente à Resolução 1/2004 e o presente processo conferiram à Autora todos os mecanismos para a adequada supressão, no que lhe interessasse, das debilidades que entendesse dever ser corrigidas.

2.2.12.2. A Lei n.º 48/98, de 11/08, estabelece, no artigo 5.º, f), e no artigo 21.º, os princípios da participação dos cidadãos nos procedimentos de elaboração, de execução, avaliação e revisão dos instrumentos de gestão territorial.
Estes princípios foram concretizados no Decreto-Lei n.º 380/99, de 22/9.
O regime de participação dos interessados na elaboração dos planos especiais de ordenamento do território está regulado no artigo 48.º do citado diploma, do qual entende a Autora terem sido violados os nºs 5, 6 e 7.

Vejamos.

A Exposição e Parecer apresentados pela Autora (doc.s. nºs 11 e 12 da pi.) foram integradas a fls. 4568/4637 da «Pasta 10, Fichas de Participação Discussão Pública», do processo instrutor.
Ora, também no processo instrutor consta um Anexo I, com duas Pastas, Volume 1 e Volume 2, com o título «Análise dos Resultados da Discussão Pública Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais».
Reportam-se essas Pastas à análise e consideração da participação de cada interessado na discussão pública.
Mais à frente, quando nos referirmos ao «Relatório de Ponderação», indicar-se-á a metodologia e os termos gerais que foram seguidos nessa apreciação.
Mas desde já se diga que se verifica nessas Pastas que foi expressamente contemplada e sujeita a apreciação a participação da Autora.
Aquela apreciação ressalta do documento respeitante à ora Autora, sob o número 455, a fls. 156 do volume 2, no qual se aponta o essencial das questões por ela suscitadas. Reproduz-se, no que importa, o que consta desse documento:
«Alteração da classificação da Área de Protecção Total I e Parcial Tipo; «Aprovados diversos tipos de projectos para o empreendimento turístico por diferentes entidades com competência (VER FICHA); POPNSC viola os direitos adquiridos pela A……»; Apresentado documento”Compatibilizar o Empreendimento Turístico Cabo Raso com o POPNSC” (VER FICHA); entrega nova ficha com o CD de Documento apresentado (3.10.03)»; «A resposta a esta participação encontra-se patente no capítulo 7 do relatório de ponderação, bem como no início deste anexo».

Ora, no referenciado anexo, no volume 1, vê-se, no que aqui importa: «Classificação de Uso dos solos […] Os zonamentos foram determinados por critério técnico em relação aos valores a salvaguardar e não por razões de cadastro» (a pág. 2).
E contém esse início diversos segmentos relativos a diferente problemas suscitados, não só pela Autora, como o da relação entre o POPNSC e os PDM (pág. 4), o da mera compatibilização do POPNSC com a Rede Natura 2000, PDM Sintra ou outros instrumentos de gestão (pág. 5), da protecção do sistema dunar Guincho Oitavos (pág. 7), de respeito do artigo 48.º do DL 380/99 (pág. 10), de respeito dos art. 3.º, 5.º, 6.º e 7.º do CPA e 4.º do DL 380/99 (pág. 12), de não correspondência dos dados cadastrais (pág. 14).

E ainda no processo instrutor, agora, já, na pasta relativa à «Análise dos Resultados da Discussão Pública Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais – Relatório de Ponderação» (adiante designado por Relatório de Ponderação), refere-se que pelo Aviso n.º 6133/2003, do Instituto da Conservação da Natureza, publicado em Diário da República, 2ª série, n.º 115, de 19 de Maio de 2003, foi anunciada a discussão pública deste plano de ordenamento, bem como o período de tempo em que a mesma tinha lugar e os locais onde poderia ser consultada, nos termos dos nºs 3 e 4 do artigo 48.º do Decreto-Lei n.º 380/99.
Nesse Relatório de Ponderação diz-se, no ponto: «3.2. “Objectivo e Âmbito de Análise” Conforme definido à priori, são objecto de análise todas as participações à proposta do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais, efectuadas ao abrigo da discussão pública, aberta em cumprimento do preceituado nos nºs. 3 e 4 do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro.
São considerados os documentos colocados em discussão pública e que constituem a Proposta do Plano de Ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais, nomeadamente:
- Plano Operacional de gestão;
- Regulamento (Anexo 1, Anexo II e Anexo III);
- Relatório do Plano de Ordenamento do PNSC.
(…)». (pág. 16).
Em seguida, o Relatório de Ponderação especifica a metodologia de análise das participações dos interessados (pontos 3.3. a 4.2., págs. 18 a 24), indicando, entre o mais: «4.1. Foi analisada cada uma das participações recebidas, sendo cada uma delas analisada de per si./ A análise das participações foi efectuada com um conjunto de técnicas que permitiram obter, por procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) desta mensagens».
Conforme o mesmo Relatório de Ponderação foram recebidas 582 participações, tendo todas sido objecto de análise específica (pág. 38).
Observa-se que o Relatório de Ponderação se liga ao que havia sido efectuado já na supra indicada Análise constante do Anexo I, procedendo às respectiva quantificações e qualificações categoriais.
Mas não faz só isso.
Na verdade, na incumbência de apreciação concreta que lhe vinha cometida exactamente na Análise constante do Anexo I, procede ele mesmo, no seu ponto 7, à apreciação de diversas questões suscitadas nas participações.
Com efeito, nas páginas seguintes do citado Relatório de Ponderação, além de se voltar a responder a questões já tratadas no citado Anexo 1, responde-se a outras.
É o caso das questões suscitadas pela A. relativas ao respeito pelas situações jurídicas validamente constituídas. Expressamente o Relatório refere: «Na versão final será referido que as regras constantes do POPNSC não serão aplicáveis nas parcelas de terreno objecto de licenças ou de alvarás de loteamento válidos à data da entrada em vigor do Plano» (pág. 57).
E, mais à frente, já sobre o artigo 48.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 380/99: «A eventual lesão dos direitos subjectivos terá de ser ponderada em sede própria, sendo todavia salvaguardadas as licenças ou alvarás de loteamento válidas e eficazes à data da entrada em vigor do POPNSC»” (pág. 61).

E, como vimos o artigo 43.º, n.º 4, do Regulamento do Plano veio efectivamente a contemplar aquelas situações

Do exposto, não se detecta a alegada violação do direito de participação. Naturalmente que cada participante poderá entender que o seu contributo deveria ter sido mais alargadamente considerado. Só que não se pode esquecer a dimensão e complexidade do que estava em causa. A metodologia, forma e extensão da apreciação utilizadas teriam de ser necessariamente compatíveis com essa dimensão e complexidade.
Afigura-se que foi cumprido o sentido da previsão normativa no que à ora Autora diz respeito.

2.2.12.3. Nos termos, ainda, do Relatório de Ponderação, «A resposta ao número 5 do artigo 48.º é efectuada de acordo com o disposto no Artigo 10.º, n.º 4, da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto» (ver pág. 61).
E, na verdade, tendo em consideração o número de participantes, que ascenderam a várias centenas, e no quadro do previsto no artigo 48.º, n.º 6, do DL n.º 380/99, que remetia para a Lei n.º 83/95, a entidade responsável ficava nessas circunstâncias desobrigada de comunicar por escrito a cada um dos participantes a sua resposta, podendo realizá-la por publicação em dois jornais diários e num jornal regional, quando exista.
A alegada falta de comunicação escrita encontra-se, assim, justificada.
Não se deixará de dizer, porém, embora esse ponto não chegue a ser equacionado pela Autora, que não se conseguiu detectar no processo instrutor publicação em qualquer jornal.
Mas não será necessário proceder a um nova pesquisa sobre esse tema.
Com efeito, entende-se que mesmo que não tenha chegado a existir publicação na imprensa escrita, se deve aplicar a doutrina do Acórdão do Pleno de 02/07/2008, processo n.º 01157/05, confirmando acórdão em subsecção:
«Por fim, alegam os recorrentes que o recorrido Conselho de Ministros, confrontado com uma apresentação de observações escritas em número superior a 20, e optando pela dispensa da comunicação individualizada, não procedeu todavia à publicação das respostas aos interessados “em dois jornais diários e num jornal regional, quando exista”, como lhe impunha o art. 10º, nº 4 da Lei nº 83/95, de 31 de Agosto, tendo antes publicado as respostas na Internet e patenteado as mesmas para consulta nos respectivos serviços.
Sustenta, pois, que foi violada a referida disposição legal, daí emergindo, em seu entender, a ilegalidade do Regulamento do POPNA.
Sem razão, porém.
É verdade, conforme resulta da matéria de facto, que a Administração não observou o disposto no citado art. 10º, nº 4 da Lei nº 83/95, pois que não publicou as «respostas fundamentadas» às objecções dos interessados “em dois jornais diários e num jornal regional, quando exista”, tendo-se limitado a publicar essas respostas na Internet e a patenteá-las para consulta nos respectivos serviços, concretamente no Instituto de Conservação da Natureza e na sede do Parque Natural da Arrábida.
Porém, da inobservância ou incorrecto cumprimento dessa formalidade não resulta a invalidade do procedimento de elaboração do plano, e, por via dela, a invalidade do próprio plano.
Tal como decidiu a Subsecção, estamos perante uma formalidade não essencial, cuja inobservância ou deficiente cumprimento não afecta a validade substancial do acto de ponderação anteriormente efectuado, e que tal formalidade se limitava a levar ao conhecimento dos interessados.
E dessa comunicação aos interessados (correcta ou incorrectamente feita) não advinha sequencialmente qualquer intervenção destes no âmbito procedimental, pelo que a mesma nada tem a ver com a sua validade substancial.
Por outro lado, importa sublinhar que o escopo nuclear da regularidade do procedimento de elaboração do plano repousa, sim, na efectiva ponderação das objecções postas pelos interessados em sede de discussão pública (que, como vimos, não foi posta em causa), e não propriamente na forma de comunicação dessa resposta, levada a cabo posteriormente, e que nada adianta ao conteúdo do procedimento comunicado.
Afirma-se, a este propósito, no acórdão recorrido:
“(...) esta simples ilegalidade era insusceptível de inquinar minimamente o procedimento, fosse na sua marcha, fosse no seu resultado. Pois, a um cumprimento perfeito da formalidade prevista no art. 10º, n.º 4, da Lei n.º 83/95 não se seguiria uma qualquer intervenção procedimental dos autores, que a ilegalidade praticada tivesse impossibilitado; e esse cumprimento perfeito também não levaria a que o POPNA tivesse um conteúdo diferente do que tem.
Sendo as coisas assim, torna-se perceptível que a ilegalidade havida no modo de publicação das respostas não traduziu a ofensa de uma formalidade essencial à regularidade do procedimento e à correcção do seu desiderato final. E, se as disposições do POPNA são, em si mesmas, alheias à existência da dita ilegalidade, não se vê como é que esta poderia projectar os seus efeitos nocivos ao ponto de inquinar o regulamento do plano. Portanto, o que ora está em causa é algo muito inferior ao desrespeito de uma formalidade essencial – sendo antes assimilável aos vícios próprios das notificações dos actos administrativos, os quais, como é sabido, são impotentes para refluírem sobre a sua causa e aí provocarem a ilegalidade dos actos.”
O aludido vício procedimental não tem, pois, virtualidade invalidante do Regulamento».

2.2.12.4. A A. entende, ainda, estar violado o artigo 48.º, n.º 7, do DL n.º 380/99, por a entidade pública responsável não ter promovido o esclarecimento directo dos interessados, apesar da forte compressão dos direitos dos particulares.
O n.º 7 deste preceito estipula que «sempre que necessário ou conveniente, a entidade pública responsável promoverá o esclarecimento directo dos interessados».
Ora, como se acabou de ver, logo no Relatório de ponderação foi indicada a opção pelo disposto no artigo 10.º, n.º 4, da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto. A possibilidade não utilizada de esclarecimento directo não revela qualquer infracção normativa.
E sempre se aplicaria a jurisprudência que também se acabou de indicar.

3. Nos termos expostos, improcede o pedido de declaração de ilegalidade e, consequentemente, o pedido de indemnização pelos danos resultantes da alegada ilegalidade.
Logo que transite em julgado o presente acórdão voltam os autos ao juiz relator.
Custas pela Autora.

Lisboa, 25 de Setembro de 2012. – Alberto Augusto Oliveira (relator) – António Bento São Pedro – Rosendo Dias José.