Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:09/17
Data do Acordão:04/11/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
DESPACHO DE NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
PRAZO
INTERPOSIÇÃO DO RECURSO
Sumário:Não prevendo o ETAF de 2002 a prolação de decisões uniformizadoras relativamente a divergências jurisprudenciais ocorridas em áreas diferentes do contencioso da jurisdição administrativa e fiscal, não é de admitir, por não se enquadrar no recurso previsto no art. 284.º do CPPT, uma invocada oposição entre acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo e da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
Nº Convencional:JSTA000P23127
Nº do Documento:SA22018041109
Data de Entrada:01/05/2017
Recorrente:REPSOL PORTUGUESA, SA
Recorrido 1:INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -

1 – REPSOL PORTUGUESA, S.A., com os sinais dos autos, vem, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 145.º/5 do CPTA, ex vi artigo 2.º alínea c) do CPPT, reclamar para a Conferência do despacho da relatora de fls. 305, que não lhe admitiu o recurso que pretendera interpor para o Pleno do Acórdão da Secção proferido nos presentes autos - a fls. 232 a 245 - em 13 de Dezembro último, alegando, em síntese, que embora não desconheça a jurisprudência já produzida sobre a questão em análise e que constitui fundamento para a decisão ora reclamada, não pode a ora reclamante concordar com a mesma, porquanto esta assenta numa clara interpretação restritiva das normas contidas nos citados artigos 27.º/1, alínea b) do ETAF e 152.º/1 alínea b) do CPTA, o que constitui uma restrição, sem fundamento válido, ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Lei Fundamental e que a garantia da via judiciária, enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, exige que se afaste uma tal interpretação restritiva em benefício de uma outra mais favorável à tutela judicial efectiva (cfr. fls. 320 a 322 dos autos).

2 – A recorrida foi notificada da presente reclamação (fls. 327 e 328 dos autos) e nada veio dizer.

Com dispensa dos vistos, dada a simplicidade da questão, vêm os autos à Conferência.


- Fundamentação –

3 – É do seguinte teor o Despacho reclamado:

«A recorrente REPSOL vem interpor recurso para o Pleno do acórdão da Secção de 13/Dez/2017 – a fls. 232 a 245 – invocando oposição do decidido com acórdão da Secção de Contencioso Administrativo deste STA, proferido em 12/5/2016 e junto pela recorrente.

Sucede, porém, que não prevendo o ETAF de 2002 a prolação de decisões uniformizadoras relativamente a decisões proferidas em áreas diferentes – administrativa e tributária – da jurisdição, o recurso é legalmente inadmissível.

Neste sentido, o Ac. do Pleno de 04/06/2014, rec. n.º 142/14 e demais jurisprudência e doutrina aí citadas.

Pelo que não admito o recurso.

Lisboa, 6 Fev. 2018

(…)»

4 – Apreciando

4.1 Da não admissão do recurso

O despacho reclamado não admitiu o recurso que a recorrente pretendera interpor do Acórdão da Secção de Contencioso Tributário deste STA proferido nos autos, por alegada oposição com o decidido em Acórdão proferido pela Secção de Contencioso Administrativo deste STA, no entendimento de que tal recurso é legalmente inadmissível em face do ETAF vigente, porquanto o ETAF de 2002 não prevê a prolação de decisões uniformizadoras relativamente a decisões proferidas em áreas diferentes – administrativa e tributária – da jurisdição.

Fundamentou-se o decidido no Acórdão do Pleno da Secção de 4 de Junho de 2014, rec. n.º 142/14 e demais jurisprudência e doutrina aí citadas.

Discorda do decidido a recorrente, alegando, em síntese, que embora não desconheça a jurisprudência já produzida sobre a questão em análise e que constitui fundamento para a decisão ora reclamada, não pode a ora reclamante concordar com a mesma, porquanto esta assenta numa clara interpretação restritiva das normas contidas nos citados artigos 27.º/1, alínea b) do ETAF e 152.º/1 alínea b) do CPTA, o que constitui uma restrição, sem fundamento válido, ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Lei Fundamental e que a garantia da via judiciária, enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, exige que se afaste uma tal interpretação restritiva em benefício de uma outra mais favorável à tutela judicial efectiva.

Não há, porém, à luz do ETAF vigente, como ultrapassar a interpretação adoptada no despacho recorrido e sufragada por vários acórdãos do Pleno deste STA - cfr., para além do citado no despacho recorrido, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo deste STA de 7 de Julho de 2011 (rec. n.º 310/09) e os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA de 10 de Setembro de 2008 (rec. n.º 0768/07), de 25 de Março de 2009 (rec. n.º 595/08) e de 5 de Junho de 2013 (rec. n.º 01184/11).

É que, como reconhece a recorrente, enquanto o ETAF de 1984 atribuía ao Plenário do STA a competência para decidir Dos recursos de acórdãos das secções, ou dos respectivos plenos proferidos ao abrigo das alíneas a) dos artigos 24.º e 30.º, que, relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica, perfilhem solução oposta à de acórdão de diferente secção, ou do respectivo pleno – cfr. a alínea a) do seu artigo 22.º -, o actual ETAF de 2002 restringe a competência do Plenário do STA ao conhecimento dos conflitos de competência entre tribunais administrativos de círculo e tribunais tributários ou entre as Secções de Contencioso Administrativo e de Contencioso Tributário - cfr. o seu artigo 29.º.

Ora, como se consignou no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA de 25 de Março de 2009, rec. n.º 595/08 (também citado pelo acórdão do Pleno em que se fundamentou o despacho reclamado), O artigo 152.º do CPTA prevê o “recurso para uniformização de jurisprudência, quando, sobre a mesma questão fundamental de direito, exista contradição” entre acórdão do TCA e outro anteriormente proferido pelo mesmo tribunal ou pelo STA – alínea a) – ou entre dois acórdãos do STA.// Trata-se da concretização processual da competência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário prevista no artigo 27.º, n.º 1, alínea b), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais de 2002.// (…)// O artigo 29.º do mesmo ETAF estabelece a competência do Plenário: “conhecer dos conflitos de jurisdição entre tribunais administrativos de círculo e tribunais tributários ou entre as secções de contencioso administrativo e do contencioso tributário”. //Temos, assim, que o novo ETAF não prevê qualquer competência para conhecer de recursos, por oposição de acórdãos, das secções do contencioso tributário e administrativo, do STA.// Na verdade, estando em causa acórdãos das duas secções, a respectiva oposição só podia ser equacionada por uma formação mista, integrando elementos das secções tributária e administrativa já que, na circunstância, o tribunal se pronuncia “sobre a mesma questão fundamental de direito” pelo que a respectiva competência só podia ser do plenário – cfr. artigo 28.º do ETAF.// Como acontecia com o ETAF de 1984, na redacção do Decreto-Lei n.º 229/96, de 29 de Novembro, pois que o seu artigo 22.º, alínea a), justamente previa recurso para o Plenário, nomeadamente de acórdãos das secções, proferidos ao abrigo das alíneas a) dos artigos 24.º e 30.º, isto é, das secções do contencioso administrativo e tributário. // Cfr. o acórdão do STA de 10 de Setembro de 2008, recurso n.º 768/07. //Verifica-se, assim, não ser admissível recurso por oposição de julgados, para uniformização de jurisprudência, da Secção do Contencioso Tributário e do Contencioso Administrativo do STA. (…)

Ora, tendo o Plenário do STA, no ETAF de 2002, a sua competência restrita ao conhecimento dos conflitos de competência entre tribunais que integram a jurisdição administrativa e fiscal, haverá necessariamente que interpretar as demais normas do ETAF , designadamente o seu artigo 27.º, n.º 1, alínea b), e as do CPTA, designadamente a alínea b) do n.º 1 do seu artigo 152.º, de harmonia com a competência do Plenário estabelecida no ETAF vigente, o que conduz necessariamente à inadmissibilidade legal do recurso por oposição de acórdãos quando a divergência decisória surja entre acórdãos das secções de contencioso administrativo e de contencioso tributário do STA, como no caso dos autos.

Alega a recorrente que a interpretação adoptada no despacho reclamado constitui uma restrição, sem fundamento válido, ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Lei Fundamental e que a garantia da via judiciária, enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, exige que se afaste uma tal interpretação restritiva em benefício de uma outra mais favorável à tutela judicial efectiva.

Não se vislumbra, porém, no quadro legislativo actual, como afastar tal interpretação, nem se antevê que a interpretação adoptada constitua restrição, sem fundamento válido, do direito de acesso aos Tribunais.

Como consignou o Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 36/2009, de 20 de Janeiro de 2009 (e reiterou no seu Acórdão n.º 69/2009, de 11 de Fevereiro de 2009), após a pretensão do recorrente já ter sido apreciada por duas instâncias, a mera oposição de julgados relativamente à mesma questão de direito, não constitui motivo suficiente para que se considere que o direito ao acesso aos tribunais, nomeadamente o direito à impugnação jurisdicional dos actos da Administração, imponha ao legislador a previsão de um recurso extraordinário para a fixação de jurisprudência em todas as hipóteses possíveis, a nível de tribunais superiores, de oposição de decisões.// A possibilidade de previsão e conformação de um recurso deste tipo situa-se na ampla margem de manobra que assiste ao legislador nesta temática processual, pelo que a interpretação questionada não viola qualquer parâmetro constitucional.

Improcede, deste modo, a reclamação deduzida, sendo de confirmar o despacho de não admissão do recurso.


- Decisão –

5 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em indeferir a reclamação e confirmar o despacho reclamado.

Custas do incidente pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC.

Lisboa, 11 de Abril de 2018. - Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro Delgado – Dulce Neto.