Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01301/16
Data do Acordão:07/05/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:EMBARGOS
BENS IMÓVEIS
BENS COMUNS DO CASAL
Sumário:Proferido despacho, em 2014.06.26, no âmbito dos processos de execução fiscal, ordenando a constituição de hipoteca legal sobre imóveis comuns, pertencentes ao executado e mulher, não podia esta, em 2014.12.17, apresentar embargos ainda que só viesse a ser citada, na execução fiscal, em 2015.01.08, no âmbito do PEF pelo que não devia a FP ser condenada em custas.
Nº Convencional:JSTA00070276
Nº do Documento:SA22017070501301
Data de Entrada:11/21/2016
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA DE 2015/11/11.
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART165 N1 A ART167 ART189 N1 ART195 N1 A ART220 ART237 N1 ART239.
CPC13 ART342 N1 ART535 ART536 N1 ART539.
CPC96 ART351 N1 ART352.
RCP ART6 N7 ART14-A D.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0478/13 DE 2014/02/19.; AC STA PROC01302/13 DE 2013/10/30.; AC STA PROC0973/09 DE 2011/05/18.; AC STA PROC0626/07 DE 2007/10/24.; AC STA PROC0174/06 DE 2006/11/29.; AC STA PROC01838/03 DE 2003/04/09.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO 4ED PAG759.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença de 11/11/2015 (fls.70/77) do Tribunal Tributário de Lisboa que indeferiu liminarmente os embargos de terceiro, intentados por A…………, bem como da sua condenação em custas em partes iguais, formulando, em alegações, as seguintes conclusões:
«1 - Vem o presente recurso interposto da douta decisão de fls.., que indeferiu liminarmente os embargos de terceiro com fundamento em que os mesmos se tornaram supervenientemente inadmissíveis, em virtude da Requerente ter adquirido a qualidade de co-executada, por força da citação ocorrida posteriormente à dedução dos embargos, condenando ambas as partes no pagamento das custas judiciais, em partes iguais.
2 - A Fazenda Pública não se conforma com tal decisão, considerando existir erro de julgamento em matéria de direito no que diz respeito ao fundamento do indeferimento liminar dos embargos de terceiro, considerando igualmente existir erro de julgamento na condenação em custas.
3 - Entende a Fazenda Pública que os embargos de terceiro, no caso dos autos, eram legalmente inadmissíveis “ab initio”, por não constituírem meio próprio de reacção contra as hipotecas efectuadas nos autos executivos.
4 - No entender da Fazenda Pública, o meio de reacção contra tais hipotecas seria a arguição da nulidade da falta da citação, nos termos do n.º 1 alínea a) do artigo 195º do CPPT.
5 - A Fazenda Pública não deu causa à acção nem deduziu qualquer contestação, pelo que não deveria ter sido tributada em sede de custas judiciais, nos termos dos artigos 535º e artigo 539º ambos do NCPC.
6 - A douta decisão em crise violou pois os artigos 165º nº 1 alínea a), 167º, 220º, 239º do CPPT e artigos 535º e 539º do NCPC.
7 - Devendo, por via disso, ser revogada e substituída por douto acórdão que dê provimento ao presente recurso, anulando a decisão recorrida, conforme peticionado.
Termos em que, com o douto suprimento, requer a V. Ex.ªs, se dignem admitir o presente recurso, julgando-o totalmente procedente por provado, e, em consequência, seja revogada a douta decisão recorrida, substituindo-se a mesma por douto acórdão que decida pela inadmissibilidade legal dos embargos, por não constituírem o meio próprio de reacção contra as hipotecas dos autos, absolvendo a Recorrente do pagamento de quaisquer custas judiciais, com todas as consequências legais.
Assim decidindo, farão V. Ex.ªs, aliás como sempre, justiça.
A Fazenda Pública requer muito respeitosamente a V. Ex.ªs, ponderada a verificação dos seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º 7 do art.º 6.º do RCP.».
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1.2. Não foram apresentadas contra alegações.
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1.3. Por Despacho de 07/12/205 (fls. 85) o recurso foi admitido «com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo».
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1.4. Recebidos os autos neste Supremo Tribunal foi dada vista ao Ministério Público que emitiu a seguinte pronúncia:
«…
Está em causa decidir se há erro na condenação em custas em partes iguais, invocando a recorrente não ter dado causa à dedução de embargos por ser a arguição de nulidade da citação o meio próprio para reagir, nos termos do n.º 1 al. a) do art. 165.º do C.P.P.T. — a referência ao 195.º é manifesto lapso -, e não ter deduzido qualquer contestação, não sendo de a tributar, nos termos dos arts 535.º e 539.º do C.P.C.
Não se afigura ser de afastar a possibilidade do cônjuge que pretenda reagir contra penhora ou ato equivalente que ofenda a sua posse em bens comuns por os embargos de terceiro serem o meio próprio para reagir a tal, conforme previsto no art. 342.º do C.P.C subsidiariamente aplicável.
Esta disposição resulta aplicável ainda que de uma forma precária e temporária, enquanto não for efetuada a citação do dito cônjuge, conforme foi decidido pelo acórdão do S.T.A. de 18-5-2011 proferido no proc. 973/09, acessível em www.dgsi.pt.
Assim, por não estarem reunidos os pressupostos previstos nos ditos artigos 535.º e 539.º do C.P.C., bem se andou ao aplicar o art. 536.º n.º 1 do C.P.C.
Concluindo:
O recurso é de improceder.».
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1.5. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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2. A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
A) Por despacho de 2014.06.26, da Chefe de Finanças de Alenquer, proferido no âmbito dos processos de execução fiscal n° 1465201201033140, 465201001034510, 146520060140502, 1465200901013173 e 1465200601001469, foi ordenada a constituição de hipotecas legais sobre o prédio inscrito na matriz predial respetiva da freguesia de Cascais sob o artigo 11160, e sobre os prédios inscritos na matriz predial urbana de Sintra sob o artigo 6013 e artigo 9009, frações G, H, I, J, K, L, M e N (cf. fls. 13 e 14 dos autos - numeração do suporte físico);
a. O prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 6013, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 290/19851119 (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 15/18 do processo, numeração do suporte físico;
b. O prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 19/22 do processo, numeração do suporte físico;
c. A fração autónoma H do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009 – H, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – H (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 24 do processo, numeração do suporte físico;
d. A fração autónoma I do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009 – I, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – I (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 28 do processo, numeração do suporte físico;
e. A fração autónoma J do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009 – J, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – J (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 26 do processo, numeração do suporte físico;
f. A fração autónoma K do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009 – K, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – K (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 20 14.06.26) – cf. fls. 30 do processo, numeração do suporte físico;
g. A fração autónoma L do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009 – L, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – L (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 32 do processo, numeração do suporte físico;
h. A fração autónoma M do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009 - M, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – M (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 2014.06.26) – cf. fls. 34 do processo, numeração do suporte físico;
i. A fração autónoma N do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Sintra sob o artigo 9009, fração N, encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 292/19851119 – N (inscrita a hipoteca legal a favor da Fazenda Pública através da ap. 2176, de 20 14.06.26) – cf. fls. 36 do processo, numeração do suporte físico;
B) Em 2014.12.17, no Serviço de Finanças de Alenquer, deram entrada os presentes Embargos;
C) Em 2015.01.08, no âmbito do PEF a Embargante foi citada para requerer, querendo, a separação de bens (cf. fls. 12 e 51 do processo — numeração do suporte físico);
D) Em 2015.02.03, no Serviço de Finanças de Alenquer, deu entrada oposição à execução fiscal, que corre termos neste Tribunal Tributário de Lisboa sob o n.º 891/12.OBELRS.».
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3.1. Sustenta a recorrente FP, em síntese, que o presente recurso vem interposto da decisão que indeferiu liminarmente os embargos de terceiro com fundamento em que os mesmos se tornaram supervenientemente inadmissíveis, em virtude de a requerente ter adquirido a qualidade de co-executada, por força da citação ocorrida posteriormente à dedução dos embargos, condenando ambas as partes no pagamento das custas judiciais, em partes iguais.
Que existe erro de julgamento em matéria de direito no que diz respeito ao fundamento do indeferimento liminar dos embargos de terceiro, considerando igualmente existir erro de julgamento na condenação em custas.
Que os embargos de terceiro, no caso dos autos, eram legalmente inadmissíveis “ab initio”, por não constituírem meio próprio de reação contra as hipotecas efetuadas nos autos executivos.
Que o meio de reação contra tais hipotecas seria a arguição da nulidade da falta da citação, nos termos do n.º 1 alínea a) do artigo 195º do CPPT, que a FP não deu causa à ação nem deduziu qualquer contestação, pelo que não deveria ter sido tributada em sede de custas judiciais, nos termos dos artigos 535º e artigo 539º ambos do NCPC.
Que a decisão em crise violou pois os artigos 165º nº 1 alínea a), 167º, 220º, 239º do CPPT e artigos 535º e 539º do NCPC.
Que deve ser revogada e substituída por acórdão que dê provimento ao recurso e anule a decisão recorrida.
Conclui pela inadmissibilidade legal dos embargos, por não constituírem o meio próprio de reação contra as hipotecas dos autos, e pela absolvição da recorrente do pagamento de quaisquer custas judiciais.
Solicita, ainda, porque se verificam os seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º 7 do art.º 6.º do RCP.
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3.2. Defende a recorrente FP, se bem entendemos o seu pensamento, a inadmissibilidade legal dos embargos, por não constituírem o meio próprio de reação contra as hipotecas dos autos, e a absolvição da recorrente do pagamento de quaisquer custas judiciais.
A decisão recorrida afirmou, em síntese, que “o artigo 239º do CPPT impõe a obrigatoriedade da citação do cônjuge do executado, para intervir no processo de execução fiscal (ficando o mesmo, desde então, na posição de co-executado e podendo usar todos os meios de defesa que a lei lhe confere nessa qualidade) quando e sempre que a penhora recaia sobre bens imóveis ou móveis sujeitos a registo.
Todavia, …, apenas tem a qualidade de terceiro o cônjuge quando o ato forçado e judicial sobre o património próprio não diz respeito a causa, nomeadamente execução, em que seja parte.
Não estão, pois, presentes os pressupostos de admissibilidade dos embargos de terceiro do artigo 237/1 CPPT.
Em consequência do exposto: vão liminarmente indeferidos os presentes embargos de terceiro, por razão de a Requerente não ser já terceiro em face do objeto da execução em que também foram hipotecados bens próprios que é base da sua pretensão, artigo 237/1 CPPT e artigo 342/1 nCPC.
Custas em partes iguais, atendendo a que a demanda da Requerente era fundada no momento em que foi intentada [536/1 nCPC aplicável ex vi artigo 2. e) CPPT], reduzidas, atenta a fase processual e com dispensa do remanescente da taxa de justiça atendendo à simplicidade da causa e à conduta processual das partes [artigo 14-A.d) e artigo 6/7 RCP].».
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3.3. A questão controvertida, nos presentes autos, consiste em saber se “a demanda da Requerente era fundada no momento em que foi intentada”, nos termos do artigo 536º 1 do nCPC aplicável ex vi artigo 2. e) CPPT, como afirmou a sentença recorrida e que, por isso, fixou as custas em partes iguais.
A questão de saber se o cônjuge do executado pode ou não embargar foi já apreciada neste STA, por diversas vezes, ainda que em situações factuais não totalmente sobreponíveis.
Assim o sumário do acórdão de 19-02-2014, prc. 478 é do seguinte teor:
“I - Em caso de penhora de imóveis, a citação do cônjuge do executado confere-lhe a qualidade jurídica de co-executado, permitindo-lhe não só requerer a separação de bens, mas também exercer os direitos processuais atribuídos ao executado originário: oposição à execução, pagamento em prestações, extinção total ou parcial da obrigação exequenda mediante dação em pagamento (nº 1 do art. 189º do CPPT).
II - A qualidade jurídica de co-executado conferida pela citação é incompatível com a qualidade de terceiro, porquanto o citado passou a ser parte da causa com intervenção no processo (nº 1 do art. 342º do novo CPC, correspondente ao anterior art. 351º).
No âmbito desta temática pode consultar-se o acórdão de 30-10-2013, proc. 1312, em cujo sumário se escreveu que:
“São diferentes os actos de citação referidos no art. 220º e no art. 239º, ambos do CPPT.
Se devia ter sido feita citação do cônjuge, nos termos do art. 239º do CPPT, por se tratar de caso de penhora de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, e apenas se procedeu à citação a que se reporta o art. 220º do mesmo Código, ocorre uma nulidade insanável por falta de citação (art. 165º do mesmo CPPT), por ter sido omitido o acto que deveria ter sido praticado.”.
Também no acórdão deste STA de 18-05-2011, proc. 973, apreciando situação em que a dívida exequenda foi constituída pelo executado, após a dissolução do matrimónio com a embargante, sem que tivessem efetuado partilhas, afirma o respetivo sumário que:
“…
III – O cônjuge que tenha a posição de terceiro pode, sem autorização do outro, defender por meio de embargos os direitos relativamente aos bens próprios e aos bens comuns que hajam sido indevidamente atingidos pela diligência.
IV – A penhora de um bem que faz parte de património comum sem que todos os titulares sejam executados é ilegal, podendo os restantes co-titulares reagir para defesa dos seus direitos através dos adequados meios de resistência legal, por ocorrer uma indevida apreensão de bem comum para satisfação de obrigação que pertence a um só co-titular.
V – Numa situação em que a dívida exequenda foi constituída pelo executado após a dissolução do matrimónio com a embargante, em que esta não consta do título executivo, a dívida não lhe é comunicável, não houve reversão da execução contra si nem foi citada para a execução, não se pode negar à embargante a qualidade de terceiro para efeitos de embargos.
VI – E porque nessa situação a embargante não pode assumir na execução uma posição igual à do cônjuge, não sendo caso de a citar para os efeitos previstos nos artigos 220.º e 239º do CPPT, os embargos de terceiro constituem o meio processual adequado para defesa dos seus direitos relativamente a um bem comum penhorado, tendo em conta que a penhora não pode incidir sobre esse bem mas apenas sobre o direito que o executado detém no património comum.”.
Não é, contudo, esta a situação dos autos em que a embargante está casada com o executado e no âmbito da execução foram hipotecados imóveis comuns segundo afirma a embargante.
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3.4. O STA apreciou já, em 24-10-2007, proc. 626, situação semelhante à dos presentes autos, pelo que o acompanharemos de perto, tendo-se escrito no sumário o seguinte:
“o cônjuge do executado, em execução fiscal em que foi penhorado um imóvel, devendo ser citado nos termos do artigo 239º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que lhe confere os direitos de defesa do executado, está impedido de defender a sua posse mediante a dedução de embargos de terceiro.”.
Tinham sido deduzidos embargos de terceiro por quem alega ser cônjuge do executado, vigorando o regime de comunhão de bens adquiridos, não tendo sido citado para a execução, visando os embargos o bem penhorado, um imóvel comum do casal.
O indeferimento liminar sob apreciação assentou em doutrina que este Tribunal tem adotado na sua jurisprudência mais corrente.
É certo que a mesma doutrina tem distinguido várias situações, nomeadamente, aquelas em que o cônjuge do executado é (ou deve ser) citado para a execução, para nela assumir a posição de executado, gozando, então, de todos os meios de defesa de que este goza, e que não abrangem, em regra, os embargos de terceiro (o executado não é terceiro…), e aquelas outras em que o cônjuge é (deve ser) citado, apenas, para requerer a separação de bens, sem passar a ter a posição de executado nem, consequentemente, dispor dos meios de defesa deste.
Isto porque, quando se trate, na execução, de exigir o pagamento de dívida tributária da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges, não convém ao outro, não responsável por ela, a posição de executado, embora haja que citá-lo para, querendo, requerer a separação, e só para isso, nos termos do artigo 220º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Porém, quando a execução fiscal deva ser dirigida contra ambos os cônjuges, por os dois serem responsáveis pela dívida, mas só contra um tenha sido instaurada a execução fiscal, a citação do outro é imprescindível para que ele possa reagir como executado; e, enquanto tal, não poderá deduzir embargos de terceiro.
Mas há uma terceira hipótese: quando a penhora recaia sobre imóveis, como acontece no caso sob exame, o cônjuge é sempre citado para a execução, nos termos do artigo 239º do citado diploma, independentemente de ser ou não responsável pela dívida exequenda.
E, neste caso, não tem a possibilidade de embargar de terceiro, uma vez que a citação, nos termos daquela disposição, não visa, exclusivamente, possibilitar-lhe requerer a separação de bens, mas confere todos os direitos de defesa próprios do executado – e entre esses direitos não figura o de embargar de terceiro.
Nem vale o apelo ao artigo 352º do Código de Processo Civil, que permite ao cônjuge do executado que tenha a posição de terceiro deduzir embargos, já que, no caso, a recorrente não tem essa posição, face à disposição do apontado artigo 239º.
Assim e apropriando-nos do que se lê no acórdão proferido no processo nº 174/06, citado:
«Dispõe o artº 237º, nº 1 do CPPT que, “quando o arresto, a penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular um terceiro, pode este fazê-lo valer por meio de embargos de terceiro”.
Daqui resulta, que o incidente dos embargos de terceiro é o meio processual adequado para, quem for ofendido na sua posse por penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, reagir contra a ofensa dos seus direitos.
Dispõe, porém, o citado artº 237º, nº 1 que para se poder embargar é necessário ser terceiro.
Não nos dá, contudo, o CPPT um conceito próprio de terceiro. Todavia, no artº 351º, nº 1 do CPC (atual artigo 342º 1) define-se o “terceiro”, para efeito de embargos, como aquele que não é parte na causa.
Terceiro “é todo aquele que não tenha intervindo no processo ou no acto jurídico de que resultou a diligência judicial, nem represente quem foi condenado no processo ou quem no acto se obrigou” (Ac. desta Secção do STA de 9/4/03, in rec. nº 1.838/03).
Ora, no caso dos autos (…) esta [a então recorrente] não foi citada para intervir na execução fiscal em causa e que a penhora recaiu sobre um bem imóvel (…).
“Nestes casos, não podendo o processo prosseguir sem a citação do cônjuge (art. 239.º, n.º 1, deste Código), seria incompreensível que se admitisse o cônjuge a deduzir embargos de terceiro, por ter a qualidade de terceiro (por não ter sido ainda citado), para, depois de constatada a falta da sua obrigatória citação, ter de a efectuar, retirando-lhe ao embargante a qualidade de terceiro, com a consequente ilegitimidade superveniente, mas atribuindo-lhe os muito mais vastos poderes de intervenção processual que são concedidos ao próprio executado originário.
Sendo a falta de citação, nestas situações, susceptível de prejudicar a defesa do citando, ela constituirá uma nulidade insanável de conhecimento oficioso a todo o tempo (art. 165.º, n.ºs 1, alínea a), e 4 deste Código), pelo que o meio processual mais adequado para o cônjuge indevidamente não citado defender os seus direitos processuais será a arguição da correspondente nulidade, para, na sequência da citação obrigatória, exercer todos os poderes que a lei lhe confere.
Por isso, no processo de execução fiscal, em todos os casos em que tem de ser efectuada a citação referida no art. 239.º, n.º 1 (isto é, sempre que forem penhorados bens imóveis ou móveis sujeitos a registo), aquela regra do n.º 2 do art. 97.º da L.G.T., impõe a conclusão de que não será permitido ao cônjuge a dedução de embargos de terceiro, mesmo enquanto não tiver sido citado, devendo a defesa dos seus direitos ser efectuada através da arguição da nulidade por falta de citação, com a consequente possibilidade de exercício de todos os direitos processuais, em que se inclui a oposição à penhora, nos termos dos arts. 276.º e 278.º deste Código” (Jorge Sousa, in CPPT anotado, 4ª ed., pág. 759).
É de concluir que os embargos de terceiro deduzidos não mereciam prosseguir.
Concorda-se, por isso, com a decisão em apreciação quando a mesma afirma que são de indeferir liminarmente os presentes embargos de terceiro, por a requerente não ser terceiro em face do objeto da execução em que foram hipotecados imóveis comuns.
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3.5. Concluiu, contudo, a decisão recorrida o seguinte: “custas em partes iguais, atendendo a que a demanda da Requerente era fundada no momento em que foi intentada [536/1 nCPC aplicável ex vi artigo 2. e) CPPT], reduzidas, atenta a fase processual e com dispensa do remanescente da taxa de justiça atendendo à simplicidade da causa e à conduta processual das partes [artigo 14-A.d) e artigo 6/7 RCP].”.
Concorda-se com a recorrente FP quando afirma que os embargos de terceiro, no caso dos autos, eram legalmente inadmissíveis “ab initio”, por não constituírem meio próprio de reação contra as hipotecas efetuadas nos autos executivos.
O meio de reação contra tais hipotecas seria a arguição da nulidade da falta da citação, nos termos do n.º 1 alínea a) do artigo 165º do CPPT.
Concorda-se que não foi a FP que deu causa à ação nem deduziu qualquer contestação.
Não devia, por isso, a FP ter sido condenada nas custas judiciais, nos termos dos artigos 535º e artigo 539º ambos do CPC.
Contrariamente ao que parece sugerir a decisão recorrida ao afirmar “custas em partes iguais, atendendo a que a demanda da requerente era fundada no momento em que foi intentada” já nesse momento não podia defender-se por meio de embargos mas diversamente, como se viu, com a arguição da sua eventual falta de citação.
É, por isso, de revogar a condenação em custas da FP.
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3.6. Solicita a FP, porque se verificam os seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no n.º 7 do art.º 6.º do RCP.
E poderia dispensar-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do art.º 6.º do RCP, atendendo à simplicidade da causa e á normal conduta das partes.
Contudo como se concluirá entende-se que este recurso não tem custas neste STA, pelo que se torna desnecessário emitir pronúncia sobre este pedido.
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Proferido despacho, em 2014.06.26, no âmbito dos processos de execução fiscal, ordenando a constituição de hipoteca legal sobre imóveis comuns, pertencentes ao executado e mulher, não podia esta, em 2014.12.17, apresentar embargos ainda que só viesse a ser citada, na execução fiscal, em 2015.01.08, no âmbito do PEF pelo que não devia a FP ser condenada em custas.
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4. Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida na parte em que condenou a FP, em metade das custas, na 1ª instância.
Sem custas neste STA e custas, na totalidade, pela embargante na 1ª instância (com dispensa do remanescente na 1ª instância, conforme se decidiu na sentença recorrida).
Lisboa, 5 de julho de 2017. – António Pimpão (relator) – Ascensão Lopes – Ana Paula Lobo.